Após dúvidas, Minas Gerais segue sem pagar serviço da dívida até abril

Apesar de pedido da AGU, liminar de Kassio Nunes Marques deixou em aberto retomada da cobrança de juros e comissões sobre o passivo de cerca de R$ 162 bilhões

Após dúvidas diante da liminar concedida pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Kassio Nunes Marques em dezembro, o Estado de Minas Gerais seguirá, ao menos até 20 de abril, sem pagar as parcelas do serviço da dívida de cerca de R$ 162 bilhões com a União, ou seja, juros e comissões. A informação foi confirmada a O TEMPO pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN) e pela Advocacia Geral do Estado (AGE).

retomada da cobrança das parcelas do serviço da dívida foi reivindicada pela Advocacia Geral da União (AGU). Quando deu aval à extensão do prazo para o fim da carência da dívida até 20 de abril, a AGU pediu a Nunes Marques que uma eventual liminar favorável incluísse “um comando expresso determinando a retomada dos pagamentos das parcelas do serviço de dívida nos termos preconizados pela STN”. 

A AGU argumentou que, caso o plano apresentado pelo governo Romeu Zema (Novo) para a adesão ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF) fosse homologado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Minas voltaria a pagar os valores destinados à amortização da dívida. O próprio plano previa que, caso entrasse no RRF até o prazo anterior, 20 de dezembro, o governo pagaria R$ 4,2 bilhões do serviço da dívida em 2024.  

Ao conceder em caráter provisório a prorrogação, Nunes Marques afirmou apenas que a prorrogação deveria ser acompanhada por “contrapartidas mínimas, que, inclusive, podem ser melhor desdobradas ao longo da negociação”. A liminar, então, provocou dúvidas, já que, segundo interlocutores do governo Zema e até mesmo deputados estaduais, teria sido vaga. 

Em reunião no dia 8 de janeiro, a comitiva do governo Zema teria questionado à STN qual era o entendimento da União, mas não houve resposta da secretaria. Até o esclarecimento, o Estado entendia que a liminar de Nunes Marques havia congelado todos os prazos e, como precisaria de uma diretriz da STN sobre o quê pagar, não havia retomado o pagamento.

Ainda em 19 de dezembro, ao ser questionada, a AGU informou apenas que a União cumpriria a decisão de Nunes Marques, na qual, pontuou o órgão, “foi deferido ‘o pedido de prorrogação por 120 dias de todos os prazos em curso no processo de adesão do Estado de Minas Gerais ao RRF’”. “O Ministério da Fazenda ficará responsável por aplicar as previsões legais, atendidos os requisitos previstos”, acrescentou a AGU.

Antes, no dia anterior, a AGE havia informado que ainda estava “analisando os efeitos da decisão” do STF. “Atualmente, o único contrato de dívida com a União pago pelo Estado refere-se à adesão ao artigo 23 da Lei Complementar 178, devidamente autorizada pela Assembleia Legislativa. Desde agosto de 2022, têm sido pagas parcelas de cerca de R$ 200 milhões por mês, perfazendo um total de, aproximadamente, R$ 3,4 bilhões”, pontuou.

Estimativa era de R$ 1 bi em juros até 20 de abril

Quando foi contestada sobre quanto o Estado eventualmente pagaria até 20 de abril, a STN chegou a estimar que Minas Gerais pagaria pouco mais de R$ 1 bilhão em parcelas do serviço da dívida. Em janeiro, a prestação seria de R$ 55 milhões; em fevereiro, R$ 319 milhões; em março, R$ 394 milhões; e, em abril, R$ 272 milhões.

Entretanto, a STN observou que, até aquele momento, desconhecia o “conteúdo da petição” apresentada por Zema e Tadeuzinho para pleitear a prorrogação do prazo do fim da carência. “Desta forma, qualquer alteração nas premissas, como a efetiva data de homologação (da adesão de Minas ao RRF), por exemplo, pode levar a valores completamente distintos”, ponderou.

Por que o valor? Quando ingressa no RRF, o Estado paga apenas as parcelas do serviço da dívida durante os nove anos de adesão. O valor cresce anualmente 11,11 pontos percentuais até chegar à “parcela inteira”, valor que o Estado pagaria sem a adesão, ao fim da vigência do programa. No caso do Estado de Minas Gerais, esta prestação seria de R$ 18,4 bilhões.

Pleno do STF analisa liminar de Nunes Marques

Desde a última sexta-feira (9/2), o plenário do STF aprecia a liminar concedida por Nunes Marques para prorrogar até 20 de abril o fim da carência da dívida de Minas. Relator, o ministro, que reiterou que “a concretização do Plano de Recuperação Fiscal é indispensável para o Estado não alcançar situação financeira de difícil reversão”, votou para referendar a extensão da data-limite.

Até às 17h30 dessa segunda (12/2), apenas a ministra Cármen Lúcia, que seguiu o relator, havia votado. Como a sessão é virtual, o julgamento irá se estender até o dia 20 de fevereiro. Para que haja maioria e o plenário autorize a prorrogação, é necessário o voto favorável de quatro dos oito ministros restantes.

FONTE O TEMPO

Córrego do Feijão: Vida que segue para honrar os que se foram

População de Córrego do Feijão encontra forças para lutar pela sobrevivência e aproveitar as oportunidades dentro do projeto de ressignificação da comunidade

As feridas ainda estão abertas, o passado assombra a qualquer hora e as perdas só cicatrizam com a união de moradores, o trabalho em nova dinâmica de vida, a confiança no futuro. “Não esquecemos nem um minuto sequer de tudo o que aconteceu, mas estamos vivos, e, assim, vamos honrar a memória dos que morreram. É preciso ter força de vontade para seguir”, diz Kele Cristina Gamas, de 38 anos, casada, mãe de Carlos, de 21, Eduardo, 17, e Miqueias, de 8. A família mora em Córrego do Feijão, primeira comunidade afetada, e a mais impactada, pelo rompimento da Barragem 1 da Mina Córrego do Feijão, da Vale, em Brumadinho, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. No próximo 25 de janeiro, faz cinco anos que a maior tragédia humanitária na história do país tirou a paz do bairro distante 15 quilômetros da sede municipal.

Em Córrego do Feijão, 20 pessoas morreram durante o rompimento da barragem, a tranquilidade se transformou em caos absoluto de um dia para o outro. O campo de futebol do time local, Novo Ideal, virou, na época da tragédia, um necrotério, recebendo corpos das vítimas e servindo de apoio para bombeiros, Polícia Militar e Instituto Médico Legal (IML) e autoridades. Será um espaço simbólico de respeito à memória e de reflexão. Na mesma intensidade dos fatos, os cerca de 450 moradores foram reencontrando forças para lutar pela sobrevivência e pelos seus direitos, além de reivindicar benefícios para garantir condições dignas de vida.

Hoje, com o coração mais calmo, Kele Cristina conta que aproveitou as oportunidades do projeto “Ressignificação de Córrego do Feijão”, em execução desde 2019, que, a partir das demandas dos moradores e acompanhamento permanente deles, levou a mineradora a propor soluções e encontrar saídas para as urgências e emergências nas áreas atingidas, incluindo empreendedorismo social, com oferta de cursos, fortalecimento da economia e requalificação urbana.

Empreendedora e crocheteira, com vários produtos artesanais bonitos e de qualidade à venda no Mercado Central Ipê Amarelo, de gestão coletiva, Kele Cristina vê novos rumos para sua família e a comunidade. “Pensei em fazer, inicialmente, o curso de corte e costura. Mas vi, na primeira aula, que não era do meu gosto. Então, passei para o crochê, e, de imediato, já estava à vontade”, diz a moradora, mostrando tapetes, jogos americanos e outros trabalhos criativos feitos com linha e agulha.

“Estou sempre com o novelo na bolsa. Enfrentamos muitas dificuldades e olhamos para frente a fim de tentar superá-las”, explica Kele Cristina. No domingo, ela e demais empreendedores locais participaram da feira de artesanato e produtos agroflorestais “Sabores do Feijão”, perto do Mercado Ipê Amarelo, que fica na Praça 25 de janeiro, nome que remete à data do rompimento da barragem.

NOVOS DIAS

Na manhã de 29 de novembro, a equipe do Estado de Minas esteve em Córrego do Feijão para conhecer novos equipamentos sociais, culturais e urbanísticos, frutos de uma “arquitetura regenerativa”, e conversar com os moradores sobre as mudanças. “Ressignificar é um processo, todo ele discutido com os moradores. Isso se traduz pela busca de um novo sentido para o local e a vida das pessoas. Todos têm um vínculo forte com a terra, as tradições, as raízes, então se trata de um processo coletivo, colaborativo, onde todos têm voz, incluindo as crianças”, informa a gerente de Fomento Econômico da Diretoria de Reparação da Vale em Brumadinho, Flávia Soares, que era gerente de relacionamento da Vale com a comunidade no município antes da catástrofe ocorrida em 25 de janeiro de 2019. Desde então, a mina onde houve o rompimento está desativada.

Diante da maquete, que pode ser vista na Casa Rosa, hoje um ponto de informações do projeto, Flávia mostra os equipamentos concluídos e em uso. São eles: a Praça 25 de janeiro, com a esplanada, forrada de grama, pérgula, outra esplanada com o mirante (sobre a caixa-d’água), o mercado, com refeitório, uma cozinha comunitária e uma cozinha escola, a horta Cheiro Verde, existente desde 2015 e um dos “xodós” dos moradores, pois fornece frutas e legumes para a cozinha, o Centro de Cultura e Artesanato Laudelina Marcondes, com sala multiuso, com programação de cinema e teatro, uma biblioteca, sala de artesanato. “O espaço se integra à comunidade, ligando duas ruas, sem ferir a estética do local”, segundo Flávia.

A gerente de Fomento Econômico conta sobre os trabalhos a serem feitos, a exemplo da reforma da Escola Municipal Nossa Senhora das Dores, do Parque Ecológico Córrego do Feijão, que deverá ser concluído em três anos, e o campo de futebol, em outro local, que terá um plano de negócios e novidades como arquibancada coberta, cabines para transmissão, vestiários e outros serviços para atividades esportivas, de lazer e comunitárias. Atualmente, o time treina em outro campo. “Aqui, há grupos fortes, como associação de moradores, associação de produtores e comitê gestor, além de um atuante grupo de jovens”, diz Flávia.

O EM conferiu as obras no campo de futebol, onde há maquinário em operação. A última fase do projeto contempla o núcleo central de Córrego do Feijão, devendo ser construída uma nova capela velório. A ideia é fazer uma via ligando esse espaço ao cemitério, cruzando o Caminho da Vida, que conduz à Igreja Nossa Senhora das Dores.

QUALIDADE DE VIDA

De acordo com a Vale, o processo de ressignificação busca promover a melhoria da qualidade de vida e o fortalecimento da economia, em diálogo com o empreendedorismo social. Inclui a urbanização completa do Córrego do Feijão com a implantação de um novo sistema de saneamento básico, modernização da rede de abastecimento de água, iluminação pública e pavimentação de todas as ruas.

Mesmo com os novos ventos soprando sobre o Córrego do Feijão, as dificuldades são imensas, avalia o agricultor Clenilson Geraldo de Paula, de 42, casado com Carmem e pai de Sofia Maria, de 15, e Celina, de 11. “Desde o rompimento da barragem, vivemos uma vida de tentativas. Não é que as coisas tenham melhorado, estão apenas diferentes. Espero que as pessoas venham nos visitar, conhecer nossa história, consumir nossos produtos, trazendo esperança, pois perdemos quase tudo”, afirma Clenilson, aguardando que seus “direitos completos”, e de outros atingidos pela barragem, sejam honrados. Na horta Cheiro Verde, ele atua em parceria com agricultora Aline Muniz.

Segundo a gerente de Fomento Econômico, produtores locais recebem, desde 2019, apoio para a estruturação e aprimoramento de suas atividades. Atualmente, 21 negócios e coletivos e 51 pessoas são apoiados com assessoria técnica e atividades de capacitação. “Iniciativas de promoção da economia em rede vêm valorizando os saberes locais, criando vínculos e fortalecendo o repertório criativo da comunidade.”

Com a entrega dos equipamentos comunitários, os empreendedores passaram a usá-los para produção e comercialização local. Atualmente, são fabricados alimentos de padaria e confeitaria, na cozinha; e de artesanato, como crochê, bordado e saboaria, no centro de cultura e artesanato. Estão à venda no Mercado Central Ipê Amarelo, atraindo visitantes e fortalecendo o turismo.

Famosa pelas suas empadas, que dissolvem na boca e fazem a festa no paladar, Sônia Aparecida da Silva, a Soninha, de 50, casada, mãe de Dayane, de 29, e Derlaine, de 28, e orgulhosa dos três netos, diz que dificilmente as lembranças serão apagadas, mas “a vida continua” e o trabalho serve também para amenizar, dentro do possível, a saudade parentes e amigos.

Na cozinha, Dileyvande Assunção de Assis, a Diley, de 43, casada e mãe de Isabela e Daniel, mostra os pães de mel em produção permanente. “Nos últimos três meses, fiz 6,4 mil unidades”, alegra-se a confeiteira. “Tivemos oportunidade de apreender e empreender. Aproveitamos a chance”, diz Diley, que criou doces com produtos da terra, entre eles um “cupcake” recheado de geleia de amora.


REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA

Uma iniciativa importante para a urbanização sustentável do Córrego do Feijão foi sua inclusão no Projeto de Regularização Fundiária Urbana – parte do Acordo de Reparação Integral assinado em 2021 pela Vale, governo de Minas, ministérios públicos Federal e de Minas Gerais e Defensoria Pública de Minas Gerais, para a reparação dos danos causados pelo rompimento da barragem em Brumadinho. Esse projeto constitui uma das obrigações de serem cumpridas pela Vale. Assim, todas as áreas públicas e privadas da comunidade serão regularizadas e os moradores terão seus títulos de propriedade registrados em cartório.

*O repórter visitou Córrego do Feijão a convite da Vale

FONTE ESTADO DE MINAS

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