Urbanicidade – Boechat

Em outubro do ano passado tive a oportunidade de assistir uma palestra do jornalista Ricardo Boechat, em Vitória, no Estado do Espirito Santo. Casualmente fiquei na entrada destinada aos palestrantes e de repente ele sai do recinto para fumar um cigarro. Ainda faltava uma meia hora para o evento. Fiquei de longe olhando e enfim tomei coragem. Me aproximei dele, cumprimentei-o e para não perder tempo, perguntei rápido: “E então Boechat, como será o ano de 2019?”. Ainda não estava definido o 2º turno das eleições. Ele me respondeu: “- Ninguém sabe.” “- Mas e a questão internacional, como ficaremos perante o resto do mundo, com esse processo eleitoral tão caótico?”, provoquei (e ainda estava completamente indefinido o quadro eleitoral, repito). Ele me respondeu: “- Isso não vai se alterar em nada. Eles, lá no primeiro mundo, sabem o que está acontecendo aqui, são bem atualizados”. Conversamos mais um pouco, mas ele talvez impaciente pelo atrevimento daquele reles cidadão, ou até mesmo ansioso pelo próprio clima instalado no final do ano passado e pronto para encarar uma palestra para mais de mil pessoas não quis estender muito a conversa. Eu, simplório como sempre, nem foto com ele quis tirar. Nos despedimos, desejei felicidades e fui me assentar na platéia. Foi uma palestra muito boa. Inteligente, bem articulado e isento de paixões ele levou seus argumentos com firmeza e sem tropeços. Fiquei ali analisando para ver se ele cometia alguma bobagem ou falasse alguma coisa sem pé nem cabeça, mas ele foi coerente até o fim e sem demonstrar preferência eleitoral. Valeu a pena. Bem diferente da palestra de um jornalista da Globo News e de um ministro do supremo, que pude assistir em distintas oportunidades, onde não disseram nada que se aproveitasse. O jornalista da GN quase pediu desculpas por estar ali, tamanho despreparo. Boechat não, foi firme em suas explanações. Enfim, perdemos hoje mais do que um bom jornalista, mas um grande brasileiro. Que hora ruim, heim Boechat?

Urbanicidade – Com Bolsonaro, economia do país pode voltar à de 100 anos atrás

Marcio Pochmann. Foto: Reprodução/YouTube

Sempre no intuito de trazer aqui idéias e opiniões sérias, independentes de colorações ideológicas, reproduzo o artigo de Marcio Pochmann (Professor do Instituto de Economia e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit), ambos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)), original aqui, fazendo uma análise dos primeiros passos da nova gestão brasil. Vamos lá…

“O país que Bolsonaro assumiu em 2019 detém apenas 85% da produção manufatureira registrada em 2013, quando o peso da indústria de transformação no PIB era a metade da registrada em 1985, o primeiro ano da retomada democrática. O corte atual dos ministérios da Indústria e do Trabalho, símbolos do exitoso ciclo da industrialização nacional iniciado na década de 1930, enuncia perspectiva econômica ao largo da produção manufatureira.

Isso porque o mercado interno, pressuposto básico de sustentação do inédito crescimento do Brasil desde 1930, perde dinamismo frente às diversas ações indicadas pelo governo Bolsonaro para enxugar o conjunto do gasto das famílias dependentes do trabalho.

A redução no valor do salário mínimo em 8 reais pode significar cerca de R$ 5 bilhões a menos na massa de rendimentos do trabalho deste ano, assim como o possível esvaziamento do sistema “S” tornaria ainda mais frágil a qualificação de quem depende de sua força de trabalho para viver. Isso sem comentar a deforma da previdência social e as nefastas heranças de Temer, com a “reforma” trabalhista e a terceirização geral.

A irracionalidade da política macroeconômica levada às últimas consequências pelo ultraneoliberalismo do governo Bolsonaro aponta para a possibilidade de retorno da vocação primário-exportadora, quase aos moldes da vigente durante a República Velha (1889-1930).

Naquela época, o Brasil possuía somente 35% da população adulta alfabetizada e mais de dois terços da população residindo no meio rural, que praticava, na maioria das vezes, agricultura de subsistência e criação de gado.

Nas poucas cidades, com algum grau de modernidade, a dependência ao investimento externo na infraestrutura (iluminação, telefonia, transporte urbano, água e esgoto) era inegável. Somente em bairros com poder econômico havia infraestrutura, como para proprietários rurais e cafeicultores que residiam em mansões e palacetes rodeados de uma massa de serviçais que desconhecia legislação social e trabalhista (salário mínimo, jornada de trabalho, férias, descanso semanal remunerado e outras conquistas somente após 1930).

Sem o dinamismo do mercado interno, a economia de cem anos atrás dependia da especialização das exportações de produtos primários, como o café. Um produto de baixa escala de investimento e assentado no baixo custo imposto à mão de obra excedente que vivia na miséria e sem organização sindical, nem Justiça do Trabalho.

Como a oferta da produção de café era elástica no Brasil, o contraste com a inelasticidade da demanda externa dos países ricos importadores de café gerava excedente crescente do produto. O resultado era a tendência de queda no preço internacional do café, uma vez que se desconhecia qualquer modalidade de controle sobre a comercialização do produto.

Pela política liberal dos governos da República Velha (aqueles que dizem não haver “almoço grátis”), o interesse dos cafeicultores era atendido por ações de valorização do preço que implicavam tomar empréstimos externos pelo Estado para financiar a formação e a sustentação de estoques do café excedente no mercado.

Com as divisas obtidas pelo comércio externo de produtos primários, o Estado deveria pagar o serviço da dívida externa, assim como o custo das importações, em geral de produtos industriais de consumo das classes de alta renda provenientes dos países compradores do café brasileiro. Além de brutal transferência de renda interna para o exterior, o país convivia com crises não triviais do Balanço de Pagamentos.

No Brasil de hoje, com quase 210 milhões de habitantes, sendo mais de 85% da população residindo nas cidades, o retorno da vocação primário-exportadora impõe terapia brutal e perversa de choque por conta do governo Bolsonaro para comprimir a sociedade urbana de 2019 na rural de 1900.

Dificilmente isso será possível transcorrer no regime democrático diante do considerável sofrimento humano e da regressão socioeconômica que se espera, jamais vista no país.”

 

Urbanicidade – “180 milhões de brasileiros fora da política econômica”

Na minha insanável ânsia de compreender meu país, encontrei esse artigo de André Araújo que expõe um pouco da teoria econômica muito acreditada por aqui, mas que tem angariado muitos críticos de peso e credibilidade por este mundo afora. Deixo claro que acredito piamente na Democracia, também por um de seus pressupostos pétreos, que é o consenso que permite a abertura da opinião de todos. Aliás, não só da opinião pura e simples, mas principalmente do conhecimento intelectual, que contribui de sobremaneira para a tomada das melhores decisões. Essas que, afinal, direcionam o nosso caminho. Resumindo, temos que ouvir todos os lados da moeda, sem apegos ideológicos. Esse texto, transcrito na modesta e simples intenção de ampliar o debate público, pode ser encontrado aqui. Vamos lá.

“Qual o foco da política econômica de Paulo Guedes? São os trinta milhões de brasileiros que têm renda segura e vida financeira estabilizada, e os demais 180 milhões?

São 60 milhões de desocupados, a soma dos desempregados do mercado formal mais os que desistiram de procurar emprego mais os subempregados mais os autônomos biscateiros. Precisa de confirmação? São 64,3 milhões com ficha suja no SERASA, o pobre só perde o credito quando NÃO tem mais nenhuma renda. Por qualquer lado que se olhe a imensa massa da população brasileira está mal de vida. Qual a mensagem do plano Paulo Guedes para eles? Virem-se, você não estão no radar, não há nenhuma política para os pobres, ao contrário, vamos cortar o máximo em seguro desemprego, bolsa família, aposentadoria por invalidez.

Ministro da Fazenda precisa ter vasta visão de Pais, de Estado, de povo, de geopolítica, não pode ser um mero operador de bolsa, câmbio e juros. Essa pequenez que aflige hoje o mundo econômico brasileiro com colocação de empresários com foco micro em funções que exigem visão macro e especialmente uma noção de Estado, que é muito diferente de mercado.

O Estado inclue a totalidade daquilo que se considera NAÇÃO, inclui a memória do passado, a História do País, a população presente, as gerações futuras, o Estado não é somente um acerto de contas orçamentarias, é muito mais do que isso.

A SITUAÇÃO DOS POBRES PARA 2019

E visível a olho nu, não é preciso o trabalho profissional do IBGE, para se notar o avanço da miséria, dos desajustes sociais, da desesperança da população brasileira mais carente, desde a classe C que teve no passado emprego e uma perspectiva de melhora de vida, até os muito pobres ou miseráveis, das classes D e E não só em um arco geral, mas especialmente nas faixas mais jovens. Um vasto contingente de 20 milhões de indivíduos entre 14 e 24 anos sem escolaridade adequada, sem treinamento profissional, sem apoio mínimo para ter alguma perspectiva de futuro. Essa população tinha esperança entre 1950 e 1980, hoje não.

Na nova politica econômica não há ABSOLUTAMENTE NADA para essa população de adultos, velhos, jovens e crianças, é como se ela não existisse, ou pior anda, um estorvo.

O “dream team” dos “Chicago boys” do projeto Paulo Guedes é muito mais pro-mercado do que os economistas do Real, que apesar de neoliberais tinham uma certa visão de Pais.

Os “Chicago Boys”, portadores de uma teoria econômica inteiramente superada e desconsiderada nos EUA de hoje, fazem questão de não ter visão social alguma, seu inimigo é exatamente o Estado, um ente que para eles nem deveria existir. São inimigos do Estado, no limite eles pretendem que o País não precise de Estado para existir, tampouco reconhecem diferenças entre os países que desenvolveram um estágio maior de economia de mercado, Inglaterra e EUA e países de outra formação histórica como o Brasil, Índia, Rússia e China, onde o Estado tem uma forte raiz construtiva . O Brasil teve Estado antes de ter povo e o Estado é quem criou o País em 1822. Uma outra trajetória que é muito diferente dos Estados Unidos, onde o povo chegou antes do Estado, são formações diferentes.

A cultura da competição, lastro filosófico do neoliberalismo, tem pés de barro no Brasil. O Plano Real criou toda uma aura de desejada competição no setor bancário, com a vinda de bancos estrangeiros como arautos da concorrência. Nada aconteceu. O mercado bancário nunca foi tão cartelizado como hoje no Brasil, após a liquidação dos bancos estaduais sob o pretexto do “Estado mínimo” e com a esperança de que só com bancos privados haveria mais concorrência. O mesmo aconteceu no mercado de combustíveis, acabou o tabelamento histórico, sob o pretexto de aumento da competição, com o que se cartelizou o mercado pelo qual os preços sobem quando a cotação internacional do barril e do dólar sobe, MAS os preços não caem na contramão. De Setembro a Novembro o preço da gasolina na refinaria caiu 46 centavos e nas bombas cai no máximo 4 centavos. Essa é a competição neoliberal em terreno construído por outra lógica cultural onde a moldura de regência tem peso essencial.

A regulação do Estado é fundamental nas sociedades que tem histórico de berço onde não existe o DNA de competição pura do estilo inglês e americano. Essa realidade é reconhecida na Europa continental e se projeta para a América Latina. Querer impor a ferro e fogo uma cultura neoliberal de corte anglo-americano, sendo outras as bases culturais, jamais dará certo. O risco é a importação do pior dos efeitos do neoliberalismo selvagem sem nenhum de seus benefícios civilizatórios. Importa-se os defeitos e as qualidades não se impõem por falta de ambiente cultural e aceitação social, os atavismos são terríveis instrumentos da realidade.

O PODEROSO ESTADO AMERICANO

A Escola de Chicago foi desmontada duas vezes na história econômica dos EUA. Na sua primeira fase, em 1929, quando seu grande mentor, Irving Fisher, disse duas semanas antes do “crash” de 24 de outubro de 1929 que a “economia americana nunca esteve tão óolida”. Isso dias antes da maior crise econômica do século até aquela semana. Desmoralizado, Fisher desapareceu do mapa. A segunda Escola, a de Milton Friedman, foi desmontada na crise de 2008, causado pelo “livre mercado” e resolvida pelo Estado, desconstruindo a mística.

Mas é bom frisar que a Escola de Chicago e suas vertentes nunca foram unânimes nos EUA, nem no seu apogeu nos anos 70 e muito menos agora. As escolas de economia da costa leste, chamada de “salt water schools”, especialmente MIT e depois Harvard, têm hoje muito maior prestigio intelectual do que a Escola de Chicago. Incensada por saudosistas brasileiros, nos EUA de hoje ninguém mais leva a sério suas derrotadas lições. Até mesmo a eleição de Trump, no conceito brasileiro um nacionalista econômico, é contraponto às ideias neoliberais.

Na verdade a História dos EUA teve sempre um forte e sólido Estado a amparar a economia.

Hoje todo o setor agrícola americano existe pela mão do Estado através de subsídios em larga escala, seguro agrícola suportado pelo Estado, credito à agricultura dado pelo Estado (Commodity Credit Corp.). O enorme incremento do etanol de milho produzido nos EUA só existiu por causa de um super subsidio do Tesouro americano, sem o que o etanol de milho é inviável economicamente. Mas o Estado americano subsidia por razões estratégicas.

Todo o setor de hipotecas de habitação popular nos EUA é estatal, assim como maior parte da geração de energia hídrica (TVA), os trens de passageiros (Amtrak), os aeroportos, portos, transportes coletivos nas metrópoles, bem como saneamento, água e esgoto, rodovias pedagiadas, são estatais, não sob a forma de empresas, mas sim como “entes públicos” com o nome de “Authority”. A presença estatal na economia americana é ENORME, ao contrário do que inventam os “Chicago boys” brasileiros. Hoje, longe de serem “boys”, são velhotes bem gastos e de mente antiquada, démodés, vivem do passado de glórias dos tempos de Pinochet no Chile dos anos 70, apogeu da Escola de Chicago até a queda do então Ministro da Economia Sergio de Castro. Quando o próprio Pinochet viu o estrago que os Chicago boys causaram, mandou prender o ex-Ministro Castro e reverteu sua politica econômica.

A QUESTÃO DO AJUSTE FISCAL

O déficit primário da União e dos Estados no Brasil é causado por dois fatores: o NÃO crescimento que derruba a arrecadação fiscal enquanto as despesas de custeio são constantes e crescentes e os monumentais gastos de vencimentos e de aposentadoria e pensões da elite do funcionalismo dos três poderes, gastos que crescem a taxas muito maiores que os demais custeios do Estado, tomando parcela cada vez maior dos orçamentos.

Nenhuma dessas causas dos déficits fiscais se deve aos pobres. As despesas típicas para essa parte majoritária da população não só não crescem como diminuem na União e nos Estados.

Nas propostas de “ajustes fiscais” os alvos não são as elites do funcionalismo e sim as verbas típicas da pobreza como seguro desemprego, bolsa família, auxílios doença, aposentadoria rural mais as verbas de saúde publica e educação.

Já no conjunto da economia, é a gigantesca despesa de juros da divida publica o maior dispêndio do custo geral do Estado, seus beneficiários são os bancos e os rentistas, a camada mais alta da população brasileira, que estão nos 30 milhões do grupo de padrão de vida elevado, consolidando a concentração de renda tanto pelos salários e aposentadorias da elite do funcionalismo como pelos rentistas que auferem renda do sistema financeiro.

A AUSÊNCIA DE UM PLANO DE EMERGENCIA PARA RECUPERAÇÃO DA RENDA

Sem aumento da renda da massa da população não haverá demanda nova para justificar investimentos na produção de bens e serviços. O novo investimento privado só virá quando a capacidade ociosa, hoje existente na indústria, for ocupada. No setor de cimento, bom para medir a ocupação da indústria, a capacidade não usada é de 60%. As indústrias só investirão quando ocupada toda sua capacidade em um turno e numa segunda fase se partirá pra um segundo ou terceiro turno sem investimento físico. Só quando se esgotar o aproveitamento das linhas usando o mesmo equipamento e instalação e houver indicadores sólidos de maior demanda é que ocorrerão novos investimentos em capital físico e isso hoje está longe de acontecer. Reformas, restabelecimento da confiança e outros indicadores de mercado financeiro não são suficientes como gatilho de crescimento da economia, que irá patinar com pequenas oscilações de índices, comemorados como “inicio de um novo ciclo”, o que não são. Oscilações milimétricas dentro de uma recessão são a regra, nada é constante em economia, mas isso não indica por si só um novo ciclo de crescimento como a toda hora a mídia econômica faz, com “fake News” sobre novo crescimento inexistente.

UM MODELO ECONÔMICO FRACASSADO

O atual modelo econômico instalado em 1994 com o Plano Real completa 24 anos com um DÉFICIT NOMINAL, isso é o déficit primário mais a conta de juros da divida publica, de 7,5% do PIB. A divida pública cresce TODO ANO à razão desse mesmo déficit, já chegando nos 80% do PIB, que por sua vez não cresce há 4 anos. Não há prova maior de fracasso.

Todo o ajuste fiscal apontado, cortando-se o máximo possível de despesas, não resolverá essa equação. Trata-se um modelo inadequado para um País que precisa crescer, não funciona.

O modelo está assentado em um alicerce errado as “metas de inflação” como eixo central de toda a economia, engessando qualquer possibilidade de crescimento natural pelo aumento da demanda. O modelo impede o uso da politica monetária para geração de renda que antecede a demanda e esta gera o estímulo ao investimento, sem o aquecimento da demanda não há porque haver crescimento. É a demanda que puxa o investimento e não o contrário.

Para quê construir fábricas se não há demanda porque a população sem renda não tem poder de compra nova. A economia hoje se sustenta pela camada que tem boa situação de emprego e renda, 30 milhões de pessoas, camada que não cresce há anos. A demanda nova teria que vir dos 180 milhões de brasileiros de baixa ou nenhuma renda. Mas não há nenhuma politica para esse imenso contingente sair do lodo do desemprego, da desocupação e do desalento.

O ÚNICO CAMINHO DO CRESCIMENTO É A INCLUSÃO DE 180 MILHÕES COMO CONSUMIDORES, FOI ESSE O CAMINHO DO CRESCIMENTO DE 7 e 8% AO ANO DA INDIA E DA CHINA. O PLANO GUEDES NÃO PREVÊ NENHUM PROCESSO NESSA DIREÇÃO.”

 

Urbanicidade – “Brasil, um país do passado”

Com o titulo acima, o colunista Philipp Lichterbeck, do DW (Deutsche Welle. Uma empresa de comunicação internacional da Alemanha, que é reconhecida internacionalmente por sua cobertura jornalística analítica e de alta credibilidade, destinada a promover o intercâmbio e a compreensão mútua entre os povos e culturas do mundo, conforme suas próprias colocações) expõe suas impressões (aqui) de uma forma bastante forte, para nossos mal acostumados ouvidos moucos. Só acredito que devamos sempre nos posicionar abertos à qualquer opinião, mesmo aquelas menos agradáveis. E que cada um tire suas conclusões.

Partidários de Bolsonaro comemoram vitória eleitoral no fim de outubro, Rio de Janeiro

“É sabido que viajar educa o indivíduo, fazendo com que alguém contemple algo de perspectivas diferentes. Quem deixa o Brasil nos dias de hoje deve se preocupar. O país está caminhando rumo ao passado.

No Brasil, pode ser que isso seja algo menos perceptível, porque as pessoas estão expostas ao moinho cotidiano de informações. Mas, de fora, estas formam um mosaico assustador. Atualmente, estou em viagem pelo Caribe – e o Brasil que se vê a partir daqui é de dar medo.

Na história, já houve momentos frequentes de regresso. Jared Diamond os descreve bem em seu livro Colapso: Como as sociedades escolhem o fracasso ou o sucesso. Motivos que contribuem para o fracasso são, entre outros, destruição do meio ambiente, negação de fatos, fanatismo religioso. Assim como nos tempos da Inquisição, quando o conhecimento em si já era suficiente para tornar alguém suspeito de blasfêmia.

No Brasil atual, não se grita “herege!”, mas “comunismo!”. É a acusação com a qual se demoniza a ciência e o progresso social. A emancipação de minorias e grupos menos favorecidos: comunismo! A liberdade artística: comunismo! Direitos humanos: comunismo! Justiça social: comunismo! Educação sexual: comunismo! O pensamento crítico em si: comunismo! Tudo isso são conquistas que não são questionadas em sociedades progressistas. O Brasil de hoje não as quer mais.

Porém, a própria acusação de comunismo é um anacronismo. Como se hoje houvesse um forte movimento comunista no Brasil. Mas não se trata disso. O novo brasileiro não deve mais questionar, ele precisa obedecer: “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”.

Está na moda um anti-intelectualismo horrendo, “alimentado pela falsa noção de que a democracia significa que a minha ignorância é tão boa quanto o seu conhecimento”, segundo dizia o escritor Isaac Asimov. Ouvi uma anedota de um pai brasileiro que tirou o filho da escola porque não queria que ele aprendesse sobre o cubismo. O pai alegou que o filho não precisa saber nada sobre Cuba, que isso era doutrinação marxista. Não sei se a historia é verdade. O pior é que bem que poderia ser.

A essência da ciência é o discernimento. Mas os novos inquisidores amam vídeos com títulos como “Feliciano destrói argumentos e bancada LGBT”. Destruir, acabar, detonar, desmoralizar – são seus conceitos fundamentais. E, para que ninguém se engane, o ataque vale para o próprio esclarecimento.

Os inquisidores não querem mais Immanuel Kant, querem Silas Malafaia. Não querem mais Paulo Freire, querem Alexandre Frota. Não querem mais Jean-Jacques Rousseau, querem Olavo de Carvalho. Não querem Chico Mendes, querem a “musa do veneno” (imagino que seja para ingerir ainda mais agrotóxicos).

Dá para imaginar para onde vai uma sociedade que tem esse tipo de fanático como exemplo: para o nada. Os sinais de alerta estão acesos em toda parte.

O desmatamento da Floresta Amazônica teve neste ano o seu maior aumento em uma década: 8 mil quilômetros quadrados foram destruídos entre 2017 e 2018. Mas consórcios de mineradoras e o agronegócio pressionam por uma maior abertura da floresta.

Jair Bolsonaro quer realizar seus desejos. O próximo presidente não acredita que a seca crescente no Sudeste do Brasil poderia ter algo a ver com a ausência de formação de nuvens sobre as áreas desmatadas. E ele não acredita nas mudanças climáticas. Para ele, ambientalistas são subversivos.

Existe um consenso entre os cientistas conhecedores do assunto no mundo inteiro: dizem que a Terra está se aquecendo drasticamente por causa das emissões de dióxido de carbono do ser humano e que isso terá consequências catastróficas. Mas Bolsonaro, igual a Trump, prefere não ouvi-los. Prefere ignorar o problema.

Para o próximo ministro brasileiro do Exterior, Ernesto Araújo, o aquecimento global é até um complô marxista internacional. Ele age como se tivesse alguma noção de pesquisas sobre o clima. É exatamente esse o problema: a ignorância no Brasil de hoje conta mais do que o conhecimento. O Brasil prefere acreditar num diplomata de terceira categoria do que no Instituto Potsdam de Pesquisa sobre o Impacto Climático, que estuda seriamente o tema há trinta anos.

Araújo, aliás, também diz que o sexo entre heterossexuais ou comer carne vermelha são comportamentos que estão sendo “criminalizados”. Ele fala sério. Ao mesmo tempo, o Tinder bomba no Brasil. E, segundo o IBGE, há 220 milhões de cabeças de gado nos pastos do país. Mas não importa. O extremista Araújo não se interessa por fatos, mas pela disseminação de crenças. Para Jared Diamond, isso é um comportamento caraterístico de sociedades que fracassam.

Obviamente, está claríssimo que a restrição do pensamento começa na escola. Por isso, os novos inquisidores se concentram especialmente nela. A “Escola Sem Partido” tenta fazer exatamente isso. Leandro Karnal, uma das cabeças mais inteligentes do Brasil, com razão descreve a ideia como “asneira sem tamanho”. A Escola Sem Partido foi idealizada por pessoas sem noção de pedagogia, formação e educação. Eles querem reprimir o conhecimento e a discussão.

Karl Marx é ensinado em qualquer faculdade de economia séria do mundo, porque ele foi um dos primeiros a descrever o funcionamento do capitalismo. E o fez de uma forma genial. Mas os novos inquisidores do Brasil não querem Marx. Acham que o contato com a obra dele transformaria qualquer estudante em marxista convicto. Acreditam que o próprio saber é nocivo – igual aos inquisidores. E, como bons inquisidores, exortam à denúncia de mestres e professores. A obra 1984, de George Orwell, está se tornando realidade no Brasil em 2018.

É possível estender longamente a lista com exemplos do regresso do país: a influência cada vez maior das igrejas evangélicas, que fazem negócios com a credulidade e a esperança de pessoas pobres. A demonização das artes (exposições nunca abrem por medo dos extremistas, e artistas como Wagner Schwartz são ameaçados de morte por uma performance que foi um sucesso na Europa). Há uma negação paranoica de modelos alternativos de família. Existe a tentativa de reescrever a história e transformar torturadores em heróis. Há a tentativa de introduzir o criacionismo. Tomás de Torquemada em vez de Charles Darwin.

E, como se fosse uma sátira, no Brasil de 2018 há a homenagem a um pseudocientista na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul, que defende a teoria de que a Terra seria plana, ou “convexa”, e não redonda. A moção de congratulação concedida ao pesquisador foi proposta pelo presidente da AL e aprovada por unanimidade pelos parlamentares.

Brasil, um país do passado.”

 

Urbanicidade – “Economista x Gestor, o desastre anunciado de Paulo Guedes”

Tenho insistido em postar artigos que tratam dos assuntos a nível nacional porque não tenho nenhuma dúvida que hoje existe uma centralização excessiva das decisões em Brasília, deixando estados e municípios à míngua. Sufocados. Engessados. A máquina federal assambarca o dinheiro e, consequentemente, o controle de tudo, deixando os outros níveis de poder e gestão completamente desnorteados. Não adianta nada termos bons gestores, como é o caso daqui de Conselheiro Lafaiete, competentes, leais e honestos com sua população, se não existe combustível para tocar a máquina. Precisamos de um novo pacto federativo, tirando da União essa verdadeira ditadura. A do dinheiro. Nesse artigo (aqui), Luiz Nassif levanta alguns pontos críticos do próximo “dono” de nossas riquezas, do fruto de nossos trabalhos, que é o sempre superpoderoso Ministro da Fazenda. Porque afinal, o controle de nossas riquezas é o que determina nosso modo de vida, nosso presente e o nosso futuro. Outra coisa, não existe essa questão de alinhamento automático com a nova presidência. Na convivência democrática é fundamental a consciência crítica, o contraponto e até a oposição. Recentemente li algo sobre o relacionamento entre um famoso socialista com um ministro de Estado, na época em questão, coronel reformado do exército. Eram fervorosos adversários em suas idéias e posições políticas, mas sempre que se encontravam se cumprimentavam com todo respeito. Eles eram verdadeiros homens públicos. São eles o professor Florestan Fernandes e Jarbas Passarinho, ambos falecidos. Vamos ao Nassif;

“O Brasil sempre cultivou uma cultura livresca – com exceção dos tempos escabrosos atuais. Bastava o sujeito ostentar diploma em universidade reputada, para ser pau para toda obra, até para funções que nada tinham a ver com sua especialidade.

Foi o que aconteceu com os economistas pós-ditadura.

Aprendi a apreciar os programas de gestão e qualidade vendo a completa disfuncionalidade de economistas no exercício do poder. Começou com o Plano Cruzado. Os economistas que assumiram a Fazenda – respeitáveis como intelectuais – tinham ojeriza aos funcionários de carreira, que acusavam de terem sido “cúmplices” da ditadura.

Sem eles, a máquina da Fazenda emperrou. Nada andava, porque os economistas não tinham a menor ideia sobre processos básicos de gestão, quanto mais sobre os procedimentos burocráticos da administração pública. A sorte é que mantiveram na Fazenda um funcionário exemplar, João Batista de Abreu, que garantiu um mínimo de funcionamento para a pasta.

Mesmo grandes gestores privados naufragam quando se trata da administração pública. Foi o caso de Alcides Tápias, alto executivo do Bradesco. No banco, uma ordem de cima chegava na base rapidamente. Na administração pública o jogo é outro. E são muitas as razões.

Algumas, na própria máquina, que é um cipoal burocrática, com pouca clareza sobre os processos. A falta de um carimbo para tudo. E quem tem o carimbo são os burocratas. Quem chega de fora não tem a menor ideia sobre os processos de decisão e procedimentos burocráticos internos.

Outro problema são as implicações políticas. Gestor público precisa ter absoluto conhecimento sobre os sistemas de decisão, o jogo de interesses políticos, os reflexos na opinião pública, no Congresso.

Pérsio Arida, o grande formulador dos conceitos básicos do Plano Real, foi presidente do BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social) e do Banco Central. Não conseguia sequer dar conta da agenda diária, por absoluta inadequação com funções burocráticas.

Por tudo isso, o superministério nas mãos de Paulo Guedes tem tudo para dar errado. Guedes é um formulador, assim como Arida. Mas sem a humildade, a paciência e a clareza de ideias de Arida.

É ruim como gestor até no setor privado. Dia desses, o Valor Econômico trouxe uma bela reportagem com ex-sócios de Guedes, falando sobre o seu comportamento profissional. Elogiavam sua visão de cenário, sua inteligência. Não embarcou no Cruzado, acreditou no Real, previu a explosão do câmbio em 1999. Mas todos – repito, todos! – mencionaram sua incapacidade absoluta como gestor e sua dificuldade de relacionamento e de tomar decisões. Como todo não-gestor, tem uma insegurança atávica em tomar decisões – inversamente proporcional à sua capacidade de dar declarações estapafúrdias. A maior qualidade que Bolsonaro viu nele – a rude franqueza – é a pior característica de um gestor.

Como gestor público, nem se fale! Não tem o menor conhecimento sobre o funcionamento da máquina, conforme se conferiu em sua atitude de confrontar o Congresso, sem se dar conta de que o orçamento de 2019 é votado agora. E menos ainda sobre as implicações políticas de cada medida.

Mesmo assim, chegou esfomeado, contando com a desinformação de Bolsonaro para ocupar todos os terrenos, julgando que o superpoder de um Ministro depende da quantidade de ministérios que comanda.

Luiz Carlos Mendonça de Barros, um dos economistas do Real, descrevia bem esses movimentos dos neófitos em administração pública. Assumem julgando que seus antecessores falhavam por falta de vontade política. Saem fazendo bobagem por todos os lados. Quando ganham sabedoria, não há mais tempo de empregar os ensinamentos: estão demitidos.

Delfim Neto controlava a Fazenda, o Banco Central, os bancos públicos, pelas ideias claras e por uma inédita capacidade de formulação e de gestão. Não precisava de um superministério debaixo dele. O guru de Guedes – o grande Roberto Campos – aprendeu as artimanhas da burocracia no Itamaraty e tinha ao seu lado um grande gestor, Octávio Gouvêa de Bulhões. E um país muito mais simples.

De outro lado, João Santana, conhecido como João-Bafo-de-Onça, ocupou um superministério do governo Collor sem ter a menor noção sobre como administrar um café.

Guedes quer trazer para si até o CADE (Conselho Administrativo de Direito Econômico) que, em qualquer país moderno, é subordinado ao Ministério da Justiça, não à Fazenda. Sua função é garantir os direitos dos consumidores preservando as condições de competitividade na economia, não ser instrumento de poder do Ministro da Fazenda. Nos anos 90, a escola de Chicago comprometeu esses princípios, defendendo a ideia de que quanto maior a empresa, maior o ganho de escala e maior os benefícios para a inovação os consumidores. Os gigantes da Internet mataram a concorrência e a capacidade de inovação da rede. Mas Guedes quer repetir a fórmula em um país que sequer tem um Google para se preocupar.”

 

Urbanicidade – Para entender a reforma previdenciária de Paulo Guedes

Luiz Nassif começa a analisar (aqui) a proposta da reforma da previdência do futuro superministro Paulo Guedes. Tudo ainda está na fase de montagem, mas vamos diretamente ao texto.

“Há dois modelos de previdência pública:

  • Repartição simples: aquele em que as contribuições dos empregados da ativa bancam a aposentadoria dos aposentados.
  • Capitalização: no qual cada trabalhador tem uma conta individual, capitalizada para garantir a aposentadoria futura.

Mas não apenas isso. No caso da capitalização, há dois modelões de previdência:

  • Benefício definido: aquele em que o plano garante o valor do benefício, independentemente dos resultados alcançados.
  • Contribuição definida: no qual apenas a contribuição é definida. O benefício dependerá dos resultados apresentados pelo plano de previdência.

Há tempos, as propostas liberais tentam introduzir o sistema de capitalização no país. A maior dificuldade é como garantir o pagamento dos aposentados.

No início do processo de privatização, defendi o Plano K – uma ideia de criar uma alternativa de capitalização com os ativos das estatais que seriam privatizadas. Não deu certo porque sucessivos governos, Collor, Itamar e especialmente Fernando Henrique Cardoso, já tinham um jogo de cartas marcadas com grupos candidatos à privatização – que garantiam o financiamento das campanhas de seus candidatos.

Agora se tenta voltar à ideia da capitalização com um Estado quebrado. Como ficariam os direitos adquiridos?

A primeira pancada dura na Previdência pública foi a mudança na legislação trabalhista. O financiando da Previdência depende essencialmente do trabalho formalizado. Ao comprometer a formalização do trabalho, a legislação quebrou um dos pilares da Previdência.

Agora, surge a proposta Armínio Fraga de um sistema misto. Ou seja, os novos trabalhadores vão contribuir em parte para a Previdência pública, em parte para a previdência individual.

Ora, se com as contribuições atuais a Previdência está deficitária – por conta do quadro recessivo e do aumento da informalidade -, como ficaria com as contribuições sendo repartidas entre os dois sistemas?

Mais que isso: qual seria o valor da aposentadoria, pelo sistema de capitalização, sendo que a única garantia é a contribuição definida – não o benefício? Provavelmente o mesmo que na previdência chilena, privatizada, e hoje com problemas enormes de déficit atuarial com benefícios irrisórios.

Uma saida seria repetir o que foi feito no setor público, de definir um teto de aposentadoria pelo sistema antigo e uma complementação bancada pelos funcionários, com descontos adicionais de sua aposentadoria.

A diferença essencial é que o teto no Regime Geral da Previdência é muito menor que o mínimo do sistema público. E a intenção explícita do modelo pinochet-Guedes é tentar os da base da pirâmide, inclusive liquidando com os Benefícios de Prestação Continuadas – que amparam idosos em acesso à Previdência e pessoas com deficiência.

Vamos aguardar a explicitação melhor da proposta.”

 

Urbanicidade – Xadrez do grande pacto nacional contra Bolsonaro

Tempos sombrios se avizinham. E a coisa está tão polarizada e radicalizada que existe bate-boca até no seio familiar. Marido contra mulher. Irmão contra irmão. Preservo-me de colocar aqui a minha opinião, pois neste momento só colocaria mais lenha na fogueira. Quero apenas e simplesmente publicar este artigo (com o título acima) de Luiz Nassif (aqui). Que cada um cuide de si.

 

 

Peça 1 – tem jogo

A pesquisa DataFolha, com a contagem de 58 a 42 para Bolsonaro em relação a Fernando Haddad, mostra que tem jogo.

Motivo 1 – Em outras eleições, com menos volatilidade, houve viradas. A eleição atual é atípica, com mudanças radicais de posição, criação de ondas de tsunami. Por isso mesmo, não há estratificação de votos. Nem mesmo entre aqueles que, no primeiro turno, garantiam votos consolidados.

Motivo 2 – com Bolsonaro se posicionando sobre diversos temas, em cada posição que assume deixa de ser a encarnação irracional da unanimidade antissistema, e passa a ser uma pessoa de carne e osso, sendo desenhada por cada opinião.  Aliás, é curioso que nas duas únicas vezes em que mostrou bom senso – quando disse que a reforma da previdência deveria ser consensual e que o governo não poderia abrir mão do controle sobre a geração de energia – foi alvo de críticas de Carlos Alberto Sardenberg na CBN, filho dessa mistura de liberalismo econômico cego e autoritarismo político míope. Pelo menos a irracionalidade cega do mercado ajuda a dissipar sua adesão irracional a Bolsonaro.

Motivo 3 – a onda de ataques de seus seguidores a adversários por todo o país e a constatação clara de que será um governo de arbítrio, de selvageria, do qual não sairá incólume nenhuma forma de poder, da Justiça à mídia.

O exemplo mais flagrante é o inacreditável ex-juiz Wilson Witzel (PSC), candidato ao governo do Rio de Janeiro, ameaçando prender seu opositor, o ex-prefeito Eduardo Paes e se valendo de um amigo juiz para inabilitar outro candidato, Antony Garotinho. E ainda anunciando que acabará com a Secretaria de Segurança para evitar interferência civil no trabalho da polícia.

Os sinais de fascismo se tornaram tão evidentes que não comportam mais o jogo de cena de fingir que não se vê a guerra. Até o Ricardo Boechat vai se dar conta de que as violências que se espalham por todo país não podem ser comparadas a brigas de torcidas. Entre outros aspectos, pela relevante razão de que nenhuma torcida organizada esteve perto de assumir o poder de Estado.

Já se percebe um movimento nítido da mídia de lançar luzes sobre o bolsonarismo. Nos últimos dois dias, a mídia começa a dar o devido peso a essa onda de violência, sendo oficialmente apresentada a um fenômeno que só existia nas suas fantasias antipetistas: o fascismo em estado bruto.

O sistema Globo é particularmente influente nas grandes metrópoles do sudeste, onde há maior concentração de votos para Bolsonaro. E poderá jogar um pouco de luz nos grupos empresariais, tão primários quanto texanos de fins do século 19.

Resta a outra incógnita da equação: o desafio de reduzir o antipetismo.

O caminho passa pelo grande acordo nacional, que reedite o pacto da Nova República. E, aí, Fernando Haddad poderá ter papel fundamental.

Peça 2 – o fim do ciclo da Nova República

Há vários pontos em comum entre os meses que antecederam a Nova República e o quadro atual.

A Nova República foi um pacto de governabilidade que se seguiu ao fim da ditadura.

Nos últimos anos, o país experimentou um novo tipo de ditadura, o estado de exceção em vigor no país, com perseguição aos inimigos, censura ao livre pensamento, atentados à constituição pelo Supremo Tribunal Federal, abusos de juizes, procuradores e delegados, e a mídia encetando uma campanha de ódio em tudo similar aos anos 60. O resultado foram as explosões de violência, preconceito, intolerância, potencializados pelas redes sociais e de whatsapp.

Agora, se tem a bocarra escancarada da besta, a poucas semanas de engolfar o país. E, ainda que algo tardiamente, vai caindo a ficha de todos os protagonistas políticos, das instituições, mídia, partidos políticos, sobre os riscos de venezuelização do país.

São os gatilhos que dão início a um novo pacto de governabilidade.

Peça 3 – a concertação brasileira

Quando a Espanha estrebuchava no período pós-franquismo, sem conseguir se encontrar, surge a figura de Felipe Gonzales. Primeiro, unificou a esquerda. Depois, fez um movimento importante para o centro, colocando o aprofundamento da democracia como a meta maior. Esvaziou a direita, consolidou a socialdemocracia e acertou um pacto que garantiu a consolidação da democracia espanhola e se manteve por muitos anos.

No Brasil, nenhuma figura pública está mais apta a desempenhar esse papel do que Fernando Haddad. Mas, para tanto, terá que enfrentar um desafio freudiano: matar o pai.

Haddad nutre por Lula o reconhecimento genuíno de um intelectual capaz de entender sua grandeza política. Mas, no novo tempo que se avizinha, terá a missão de enterrar o lulismo. Aliás, o próprio Lula há tempos havia se dado conta da necessidade de superação dessa etapa, quando tentou emplacar Eduardo Campos, quando apostou em Dilma, a gestora, e mesmo agora, quando ensaiou aproximação com Ciro Gomes. Mas, principalmente, quando apostou em Haddad como seu sucessor, por várias razões.

Primeiro, por ter feito carreira no partido que mais se aproximou do desenho social-democrata, o PT. Depois, por sempre ter colocado a negociação, a racionalidade como ponto central de sua atividade como Ministro e como prefeito premiado de São Paulo, abrindo as portas para a contribuição de diversos setores – do MTST a ONGs privadas – sem relação direta com o partido. Finalmente, por uma idoneidade não apenas moral, como intelectual, de jamais ter tergiversado de suas posições políticas, nem cedendo ao populismo, nem aos acenos do mercado.

Ou seja, tem-se as condições políticas para o cargo, um roteiro razoavelmente definido. Resta saber se Haddad e o próprio PT estarão à altura do momento.

Peça 3 – as condições para o pacto

O primeiro ponto é isonomia com essa história da autocrítica.

O PT deve, sim, uma autocrítica por ter enveredado pelas regras do jogo político tradicional. E se a autocrítica é condição para o eleitor ter a garantia de que não repetirá os malfeitos, é de se esperar uma autocrítica da Globo, que não mais estimulará o estado de exceção, como fez de 2013 para cá, processo que resultou na ascensão do bolsonarismo. Haveria necessidade também de autocrítica do STF pela quantidade de vezes que se curvou à pressão da besta das ruas, atropelando a Constituição; da Procuradoria Geral da República, nem se pense em Rodrigo Janot, que não tem dimensão para esses gestos, mas de Raquel Dodge e da cúpula do Ministério Público? Do PSDB por ter abdicado da princípios democráticos e impulsionando o golpe

Para poupar todos esses personagens da profunda irresponsabilidade com que trataram o futuro do país, há uma maneira mais indolor e eficaz de purgar os erros e de mostrar o novo: um grande pacto nacional contra a besta que, desde já, acene para a opinião pública sobre a extensão do pacto, seus compromissos sociais, com o desenvolvimento e com o combate sistemático à violência que está grassando de cabo a rabo no país, no rastro do fenômeno Bolsonaro.

Peça 4 – os personagens

O desenho ideal futuro para o pacto seria um novo partido, da socialdemocracia brasileira, com predomínio do PT – como único partido que se manteve estruturado nesse tsunami, por sua base social e sindical. Mas abrindo as portas para os setores liberais do PSDB, que serão jogados ao mar caso João Dória Jr seja eleito governador. E todos os setores racionais do empresariado, das organizações sociais, do pequeno e micros empresários, da indústria, assim como os legalistas do Poder Judiciário. E, obviamente, da mídia, com ambos os lados tapando suas narinas.

O segundo turno poderá ser a semente dessa movimentação que coloque, em um partido, o Brasil civilizado, institucional, democrático, contra a barbárie.

A Nova República exigiu um novo modelo partidário, desde que o bipartidarismo do regime militar se espatifou. Agora se tem um quadro no qual os dois partidos que garantiram a governabilidade nas últimas décadas, não podem mais caminhar sozinhos: o PSDB morto por inanição; o PT pela constatação de que, sozinho, provavelmente não conseguirá nem a vitória nas eleições, nem a governabilidade.

Esse risco enorme deverá convencer sua executiva a abrir mão do controle absoluto do processo e repartir poderes – dentro da estratégia que vem sendo costurada por Jacques Wagner.

Tem-se, então, o barco com náufrago em um mar coalhado de tubarões. Terão que se acertar.

É nesse clima que poderá emergir a figura de Fernando Haddad. Se bem-sucedido, poderá ser o Felipe Gonzales brasileiro. Malsucedido, afundará junto com a democracia brasileira, a liberdade de imprensa, a liberdade de expressão, a Constituição e qualquer réstia de civilização.

 

Urbanicidade – Economia Eleitoral

Com o titulo “Ajustes para todos os gostos”, o jornalista de temas econômico André Araújo publica um artigo (aqui) abordando alguns tópicos interessantes. Vamos lá.

“Ajustes para todos os gostos, por André Araújo

Nos cômicos debates entre “conselheiros” econômicos de várias correntes politicas colocam-se na mesa curiosas disjuntivas: ou se faz o ajuste rigoroso em cima dos programas sociais, dos ambulatórios, museus, centros de pesquisas ou “se perderá o controle da dívida” (direitos autorais para Marcos Lisboa). Outros raciocínios bifurcados aparecem na boca do mesmo tipo de economistas de “uma fórmula só”, para eles não há duas maneiras de se fazerem as coisas, há uma só. Que pobreza de cultura da história, da história da economia, da história do pensamento econômico, tão ricas em contextos, propostas e exemplos híbridos.

Há mil e uma maneiras de se resolverem questões econômicas, para o bem ou para o mal. A História não escolhe sempre o melhor caminho, apenas escolhe um caminho, tampouco a história econômica se repete, os ciclos não são iguais, os contextos políticos de cada ciclo são específicos, não há dois momentos sequer parecidos porque as variáveis mudam de lugar.

Já que no Brasil NÃO HÁ CORAGEM para se fazer um ajuste fiscal racional, que começa por um Congresso que gastara em 2018 ONZE BILHÕES DE REAIS, mais que o Congresso dos Estados Unidos, que é suportado por uma economia doze vezes maior que a brasileira, já que nem por sonho se ousa discutir o estratosférico gasto das corporações jurídicas, o maior do mundo em números absolutos e relativos ao PIB, o ajuste se dará em cima dos pobres e da infra estrutura, dos interesses de quem não tem força politica para se defender ou interesses difusos sem rosto, como a infra estrutura, o saneamento, a educação elementar, a saúde pública.

Como também esse ajuste é quase impossível porque já não há mais onde cortar, há outro modo de ajuste simples e tradicional, a inflação, modelo onde o Brasil tem larga tradição e experiência, tecnologia para vender nas indexações sofisticadas. Não é o que se deseja mas é o que vai acontecer porque não há um déspota no Brasil para cortar as mordomias e privilégios do bacharelismo público que paga a advogados dez vezes o que se paga a um médico e vinte vezes o que se paga a um professor de escola elementar e  tampouco há o tirano para impedir que se paralisem obras essenciais por causa de um lençol encardido no alojamento ou falta de duas vírgulas em um edital de licitação.

Sem o ditador a solução será a inflação, precisa ser mais claro?

A inflação é a RAINHA DO AJUSTE FISCAL, a inflação foi inventada para se fazer ajuste fiscal.

Como não se faz inflação porque a politica econômica tem como objetivo a proteção da riqueza financeira sobra a saída da recessão, que é a combinação do desajuste fiscal com meta de inflação para resguardar o rentismo que depende da moeda estável.

A POLITICA ECONÔMICA GIRA EM TORNO DA META DE INFLAÇÃO

A partir do Plano Real a TOTALIDADE da politica econômica passou a girar em torno de um único eixo: a meta de inflação. A politica de juros, a de crédito e a de câmbio foram, desde 1994, traçadas para defender a meta de inflação, em prejuízo de todos os demais fatores que constituem o conjunto da politica econômica, ai incluindo a economia produtiva e os empregos que ela gera. Tudo foi sacrificado em nome da meta de inflação, o que é uma politica econômica no mínimo medíocre, preguiçosa e de baixa eficiência com um único objetivo, proteger a riqueza financeira que interessa aos mercados e aos rentistas, mas que tem muito menor importância do que a possibilidade de ter um emprego.

Politica econômica virtuosa consiste na combinação de muitos fatores sempre com uma conta de custo benefício, ajustada continuamente de acordo com as circunstâncias. Não cabem formulas fixas permanentes no manejo de politica econômica, essa é a lição dos grandes economistas políticos a partir de Keynes até Alan Greenspan.

O economista símbolo da fórmula fixa, Milton Friedman não é hoje o exemplo seguido nas economias centrais; O próprio Friedman reconheceu pouco antes de falecer em 2006 que a flexibilidade de Greenspan tinha mais méritos do que a rigidez de sua pregação monetarista.

https://www.investopedia.com/ask/answers/012615/what-difference-between-keynesian-economics-and-monetarist-economics.asp

Após a crise de 2008 as economias centrais partiram para politicas de “quantitative easing” que significa o uso de ferramentas de expansão monetária, dosadas mês a mês, para estimular a economia e manter o nível de emprego. Essas politicas foram uma radical mudança dos conceitos de fórmula rígida propostos pelo monetarismo, que sacralizava a moeda como fetiche abominando a ideia de moeda como instrumento para estimular a economia, marca do keynesianismo original dos anos 30 e dos que seguiram essa escola de inteligência superior, como Albert Hirschman, Celso Furtado, Alan Greenspan, Paul Krugman, Joseph Stiglitz, Ann Pettifor, Raul Prebish. Já os medíocres preferem as regrinhas fixas que dispensam a atividade de pensar em soluções especificas para cada momento e circunstância.

A crise de 2008 fez com que os bancos centrais das economias ricas ficassem com maior receio da deflação do que da inflação e as políticas de estímulos monetários passaram a ser manejadas para ampliar o poder de compra e evitar a retração e o travamento das economias por falta de crédito. Nesse mesmo período de tempo, o Banco Central do Brasil passou a operar com cada vez maior rigidez em politicas pró-mercado como a liberalização do controle de câmbio em 2013, permitindo liberdade para o capital especulativo. E, a partir de 2016, o BC brasileiro passou a reduzir o centro da meta de inflação e fazer girar a politica de câmbio para atingir a meta como sendo esse o objetivo máximo de toda a politica econômica, valorizando Real, favorecendo as importações e os gastos no exterior, uma recessão contratada que proporcionou a continua desindustrialização e a perda de empregos industriais, tudo em nome da meta de inflação. Uma politica ortodoxa monetarista, arquivada nas economias centrais passou a ser a politica oficial da equipe econômica de Malan a Meirelles.

Dessa fórmula nasce a obsessão dos “economistas de mercado”, no governo e fora dele, pelo ajuste fiscal como meta e mantra de politica econômica, abandonando completamente a noção de que o mega desemprego é O problema central e que o ajuste fiscal por si só não aumenta emprego. Ao contrário, faz criar mais desemprego e não menos, é veneno e não antidoto para a recessão, trava mais a economia ao invés de relançar o crescimento.

O ajuste fiscal é necessário por ser norma de higidez em finanças públicas, mas não ajuda o emprego, muito ao contrário. Então esse ajuste NÃO tem porque ser o problema central da economia, este é o CRESCIMENTO do PIB que só existirá com expansão do poder de compra e o investimento que segue a necessidade de atender essa demanda. Não haverá investimento privado enquanto houver capacidade ociosa na indústria, no comércio e nos serviços. Então não há como sair da recessão sem criação de renda e poder de compra que antecederá o investimento privado e isso só pode ser criado por expansão monetária decorrente de investimentos públicos a serem financiados por nova dívida pública a ser adquirida ou pelo sistema bancário ou pelo Banco Central pela criação de moeda. Nada disso é novidade, mas é preciso coragem politica e autoridade para fazer o País voltar a crescer. A primeira providência seria recolocar o “mercado” no seu lugar e não como centro do País.

Com o crescimento, o AJUSTE necessário se fará com muito maior facilidade e menor custo social porque o crescimento faz crescer a arrecadação e com isso o déficit primário diminui, fazendo com que o ajuste seja mais palatável e mais factível do que em um ambiente recessivo.

Cabe ao Estado olhar para o conjunto do País, inclusive para os que não tem aplicações no mercado financeiro, que são a esmagadora maioria dos brasileiros em busca de emprego.

Politica econômica é uma COMBINAÇÃO de ações com o menor custo social possível, não é e nunca foi uma politica de um só objetivo como a que se pratica hoje no Brasil.”

Urbanicidade – Privatizações? “Fim de uma era: o reino unido volta a nacionalizar estatais privatizadas”

PRIVATIZAÇÕES?

 

“Fim de uma era: o reino unido volta a nacionalizar estatais privatizadas”

 

Com o titulo acima, Luiz Nassif (aqui) comenta a respeito das tão mal discutidas privações de empresas estatais. Mal discutidas aqui, em Pindorama, já que no primeiro mundo as discussões são mais proveitosas, pois a democracia é estável e as instituições sob o controle de sua população são sólidas e assim conseguem evitar turbulências politicas a todo momento. E as empresas estatais não são demonizadas pelo “mercado”, como acontece aqui. Bem diferente daqui. Acredito que as empresas estatais são peças fundamentais para a saúde da Nação e de seu povo. Uma Justiça limpa consegue evitar os desvios. Desvios esses que existem também no mundo desenvolvido, que seja dito. Vamos lá…

“Pioneira nas privatizações do serviço público, o Reino Unido promoveu, nos últimos dias, o controle estatal de uma prisão e uma ferrovia. Os dois episódios serviram de gancho para um balanço das privatizações inglesas pelo jornal francês Le Monde.

Chefe da Pesquisa da Unidade de Estratégia de Serviços Europeus, Dexter Whitfiel entende que se está chegando ao fim da era Thatcher. A reversão da tendência poderá ter repercussões profundas em outros países europeus.

O presídio foi nacionalizado depois de uma inspeção de Peter Clarke, diretor da Inspetoria Prisional Britânica, na penitenciária de Birmingham. Encontrou nos chuveiros roupas manchadas de sangue cercadas por excrementos de ratos; vestígios de vômito e sangue; um preso em estado de choque, sentado nas molas de uma cama que teve o colchão roubado por outros presos. Durante a inspeção, nove carros foram queimados em um estacionamento normalmente reservado para os funcionários.

No dia 16 de agosto, Clarke ordenou ao estado que assumisse a direção da prisão, que era administrada desde 2011 pela empresa privada G4S.

O caso foi explorado pela oposição. Sem admitir o fracasso das privatizações, o governo britânico nacionalizou diversas companhias privatizadas, como a companhia ferroviária East Coast Main Line, que operava trens em uma linha que ligava Londres a Edimburgo.

Tão influente que era tratada pela oposição como “a empresa que administra o Reino Unido”, a Carillion faliu. Ela operava centenas de cantinas escolares, limpava hospitais, fazia a manutenção de quartéis.

Pioneira nas privatizações, a Inglaterra está repensando radicalmente o modelo, diz a reportagem.

Liderados por Jeremy Corbyn, a oposição trabalhista está pedindo a nacionalização das principais empresas de água, eletricidade, gás e ferrovias. As pesquisas indicam que mais de três quartos dos ingleses são a favor.

O mesmo destino aguarda as PPPs (Parcerias Público-Privadas). Nos últimos dez anos, houve cerca de 50 PPPs por ano. Em 2017, apenas uma PPP havia sido concluída.

De acordo com o National Audit Office, as PPP se tornaram extremamente onerosas: os 700 contratos em andamento vão exigir reembolsos de 199 bilhões de libras (221 bilhões de euros) até a década de 2040.

Paradoxalmente, há enorme semelhanças com os excessos que ocorreram no antigo bloco soviético.

A privatização britânica foi radical. Privatizaram-se a água, a eletricidade, o gás e as ferrovias, e uma infinidade de serviços públicos do dia-a-dia, como call centers de prefeituras, estacionamentos e coleta de lixo, assistência social a pessoas com deficiência, reintegração de presos libertados sob fiança.

Entrevistada, Abby Innes, da London School of Economics, explicou que “ao tentar criar um mercado em áreas que não comportam mercado, o estado britânico teve que embarcar em um tipo de planejamento socialista”.

Todas as PPPs são reguladas por contratos. Em projetos simples, como limpar hospitais ou cuidar de jardins, os contratos dão conta. Mas em áreas de difícil quantificação – como ajudar a reintegrar presos -, os abusos se tornaram comuns. E fica impossível quantificar, planejar e definir metas.

O mesmo ocorreu com os serviços públicos de água, gás e eletricidade.

Tanto Clement Attlee, que comandou as nacionalizações no pós-guerra, como Margareth Thatcher, que implementou as privatizações, diziam que importa a regulação. Mas, segundo Dieter Helm, professor da Universidade de Oxford, desde 1989 dezoito empresas mantêm monopólios regionais de água por prazos ilimitados. De 2007 a 2016, elas distribuíram 95% de seus lucros para acionistas. Portanto, reinvestiram apenas 5% no seu negócio. Em vez de ser reinvestido em benefício dos consumidores, o dinheiro fugiu do setor. Tudo graças à regulação implementada.

Não que a situação fosse melhor antes. Quando eram públicas, as empresas também foram subcapitalizadas pelo receio dos políticos em aumentar as tarifas.

Também nas ferrovias privatizadas não houve aumento de oferta de assentos e os preços aumentaram. Mas a solução não é meramente a nacionalização dos serviços, diz Helm.

Os trens, por exemplo, convivem com pistas não eletrificadas e com apenas uma linha de alta velocidade. Houve problemas de responsabilidade compartilhada na linha principal da costa leste, renacionalizada em maio. Para ganhar seu contrato, Virgin e Stagecoach prometeram pagar ao Estado 3,3 bilhões de libras (3,7 bilhões de euros) entre 2015 e 2023. Contavam com um aumento acentuado no número de passageiros, que deveria vir, em especial, de pistas melhoradas no norte da Inglaterra. Mas a Network Rail, a empresa nacionalizada que controla a rede ferroviária, não investiu.

Da mesma forma, a crise da prisão de Birmingham pode ter vindo da má gestão da G4S, mas não exclusivamente. Todas as penitenciárias estão em crise, porque a população carcerária dobrou desde a década de 1990 e o número de carcereiros caiu um terço desde 2010, com as políticas de austeridade implementadas.

O que impõe uma conclusão, segundo o Le Monde: sejam serviços subcontratados ou não, privados ou não, o Estado não pode fugir de sua responsabilidade como investidor e regulador.”

 

Urbanicidade – “O Ralo da Riqueza no Brasil”

O jornalista Fernando Brito, em um artigo assustador (aqui), citando outra reportagem, relata com extrema lucidez um retrato do que se passa na mais alta esfera de poder e mando, desta tão combalida república, assolada por uma quadrilha e castas de entes que se acham superiores. E o pior é que muita gente boa só consegue enxergar “boniteza” nisso tudo e ainda chamar quase que carinhosamente de “mercado”. Como se não bastasse, a mídia quer transformar a política (a única maneira de mediação numa democracia) e, por conseguinte os políticos, em representantes do capeta, culpando-os o tempo todo de nossos males. Credo!

“A capa do Jornal do Brasil de hoje vale por mil palestras de economistas sobre as dificuldades da economia brasileira.

R$ 41 bilhões, em seis meses, são um escândalo em um país avassalado pela crise econômica, que está cortando serviços públicos, benefícios a idosos e deficientes, remédios e o que mais se possa imaginar.

Não, não são negócios saudáveis, onde se ganha o justo, mas resultado da extorsão que se faz sobre as pessoas físicas, em juros e tarifas despropositadas.

Os bancos públicos, especialmente Banco do Brasil e Caixa, não funcionam mais como “travas” às taxas cobradas pela banca privada, mas associam-se a elas no papel de agiotas. O resultado, na linha de baixo, é óbvio: um mar de inadimplentes, a caminho de serem excluídos de tudo.

Semana passada, uma agência volante da Light, no Largo do Machado, no Rio, recebia gente que não tem como honrar as contas de luz. Oferecia parcelamento em até 60 vezes, mediante uma “entrada” e juros. Necessário, mas inócuo, porque quem não tem dinheiro para pagar a luz não terá de onde tirar para pagá-la e mais a “prestação” do “atrasado”. O negócio da concessionária, claro, é pegar “o que der”.

Enquanto isso, divertem a classe média apontando os garotos das favelas os maiores ladrões do Brasil.”

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