19 de abril de 2024 22:54

O país que rechaça a vacina contra covid e diz que não há coronavírus

Há meses, o governo da Tanzânia insiste que o país está livre de covid-19 — portanto, não há planos de vacinação.

Dickens Olewe, da BBC, conversou com uma família de luto pela morte de um marido e pai com suspeita de ter tido a doença. O medo é que, em meio à negação, haja muito mais vítimas não reconhecidas desse vírus altamente contagioso.

Uma semana depois de Peter (nome fictício) chegar em casa do trabalho com tosse seca e perda do paladar, ele foi levado ao hospital, onde morreu em poucas horas. Ele não havia sido testado para covid.

De acordo com o governo da Tanzânia, que não publica dados sobre o coronavírus há meses, o país está “livre da covid-19”.

Disputa de vacina

Desde junho do ano passado, quando o presidente John Magufuli declarou o país “livre da covid-19”, ele, junto com outros altos funcionários do governo, zombou da eficácia das máscaras, duvidou que os testes funcionassem e zombou dos países vizinhos que impuseram medidas para controlar a disseminação do vírus.

Magufuli também disse, sem fornecer qualquer evidência, que as vacinas contra a covid-19 podem ser prejudiciais e, em vez disso, tem instado os tanzanianos a usar inalação de vapor e medicamentos fitoterápicos. Nenhum deles foi aprovado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como tratamento.

Não está claro por que o presidente expressou tal ceticismo sobre as vacinas, mas ele disse recentemente que os tanzanianos não deveriam ser usados ​​como “cobaias”.

“Se o homem branco conseguiu chegar a uma vacina, deveria já ter encontrado uma vacina para Aids, câncer e tuberculose”, disse Magufuli, que muitas vezes se declarou contra o imperialismo ocidental.

A OMS discorda. “As vacinas funcionam e encorajo o governo [da Tanzânia] a se preparar para uma campanha de vacinação da covid”, disse Matshidiso Moeti, diretor da OMS para a África, acrescentando que a organização está pronta para apoiar o país.

A ministra da Saúde, Dorothy Gwajima, reiterou a posição de Magufuli sobre as vacinas, acrescentando que o ministério tem “seu próprio procedimento sobre como receber quaisquer medicamentos e o fazemos depois de nos satisfazermos com o produto”.

Ela fez os comentários em uma coletiva de imprensa nesta semana, na qual um funcionário demonstrou como fazer um smoothie usando gengibre, cebola, limão e pimenta — uma bebida, eles disseram, sem fornecer evidências, que ajudaria a prevenir contra o coronavírus.

“Devemos melhorar nossa higiene pessoal, lavar as mãos com água corrente e sabão, usar lenços, vapor de ervas, fazer exercícios, comer alimentos nutritivos, beber muita água e usar remédios naturais dos quais nossa nação é dotada”, disse Gwajima.

Mas a justificativa dos cuidados não é que o vírus está no país. Os tanzanianos precisam estar preparados porque o vírus está “devastando” os países vizinhos, disse ela.

Alguns médicos estão céticos quanto à postura do governo.

“O problema aqui é que o governo está dizendo aos tanzanianos que a mistura de vegetais, que tem benefícios nutricionais, é tudo de que precisam para manter o coronavírus sob controle, o que não é o caso”, disse um médico local à BBC, em condição de anonimato, acrescentando que as pessoas ainda têm que tomar precauções contra o vírus.

Gwajima, o presidente e três outros altos funcionários são os únicos que podem dar informações sobre covid-19 no país, de acordo com decisão de Magufuli.

Mas, em um movimento sem precedentes, líderes da Igreja Católica no país quebraram o silêncio recentemente e alertaram a população para seguir medidas de saúde para conter a propagação do vírus.

“A covid não acabou, a covid ainda está aqui. Não vamos ser imprudentes, precisamos nos proteger, lavar as mãos com água e sabão. Também temos que voltar a usar máscaras”, disse o bispo de Dar es Salaam, Yuda Thadei Ruwaichi.

O secretário da Conferência Episcopal da Tanzânia, Padre Charles Kitima, disse à BBC Swahili que a igreja notou um aumento nos serviços funerários em áreas urbanas.

“Estávamos acostumados a ter uma ou duas missas de réquiem por semana nas paróquias urbanas, mas agora temos missas diárias. Definitivamente, algo está errado”, disse ele.

O ministro da Saúde disse que as declarações foram alarmistas.

A falta de dados oficiais torna difícil ter uma discussão pública com base em informações confiáveis.

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