18 de abril de 2024 21:43

Patrimônio Cultural e memória, Conselheiro Lafaiete um não lugar?

Resumo: Esse artigo surgiu do imperativo de investigar as condições em que se encontram o acervo fotográfico do Museu e Arquivo Antônio Perdigão, situado na cidade de Conselheiro Lafaiete. O contato com esse acervo surge na pesquisa de doutorado em andamento sobre perímetro de entorno de bens tombados. Algumas das fotografias que a compõe mostram a evolução urbana do perímetro de entorno do antigo Fórum Drº Assis Andrade. O objeto de análise nesse trabalho é o acervo fotográfico que se encontra atualmente no Museu Ferroviário e Centro Cultural Maria Andrade de Resende. O objetivo é mostrar as condições em que ele se encontra e levantar premissas para sua correta salvaguarda. Para isso usou-se como metodologia uma pesquisa de campo e uma revisão bibliográfica. Como resultados apresenta-se um relato das condições em que se encontra esse acervo.

Foto: Residência do Barão de Queluz e primeiro prédio do Fórum Drº Assis Andrade.
Fonte: Imagem pertencente ao Museu e Arquivo Antonio Perdigão, sem autoria conhecida.
Cedida pelo fotógrafo, colecionador e colaborador Mauro Dutra.

Introdução

Durante o desenvolvimento da pesquisa de doutorado sobre perímetro de entorno de bens tombados optou-se por pesquisar o entorno do antigo Fórum Drº Assis Andrade, por causa da observação empírica da sua evolução urbana.

O local onde se encontra o prédio moderno da década de 50, pertencente ao antigo Fórum Drº Assis Andrade, foi no passado residência do Barão de Queluz (IBGE, online). Na antiga fotografia do edifício em estilo colonial é possível observar as características do séc. XVIII nas residências do seu entorno. Porém, em 1950, esse prédio é demolido e em seu lugar é construído o edifício moderno obra do arquiteto Rafael Hardy Filho (IBGE, online), já nas fotografias pós essa nova construção é possível observar que o entorno do fórum também começa ligeiramente a se modificar com construções modernas que acompanham o estilo do mesmo.

Essas observações são possíveis por causa das fotografias que fazem parte do então acervo fotográfico do Museu e Arquivo Antônio Perdigão. Ao iniciar a pesquisa e o uso das fotos surge um questionamento, quem foram os fotógrafos responsáveis por guardar a memória da cidade? Partindo dessa pergunta, foi-se a campo procurar por essas fotos, e o que se tem de resultados dessa ida a campo, são duas situações: não existe nenhuma pesquisa com relação à autoria das fotos, o acervo possui aproximadamente 3 mil fotos, e atualmente está sob a salvaguarda o Museu Ferroviário e Centro Cultural Maria Andrade de Resende.

Se considerarmos que Conselheiro Lafaiete perdeu grande parte da sua arquitetura dos séculos XVIII e XIX, esse acervo fotográfico é de suma importância para o acesso a memória e para os estudos de evolução urbana e da história da cidade. A valorização, organização e salvaguarda desse acervo se faz urgente.

Memória, Patrimônio Cultural e Não Lugar.

Conceituando a fotografia, “fotos nos fornece um testemunho. Algo que ouvimos falar, mas, que duvidamos parece comprovado quando nos mostram uma foto numa das versões de sua utilidade o registro da câmera incrimina” (SONTAG, Susan, 1977, p.09).

Esse testemunho proposto por SONTAG (1977) pode ser um testemunho do passado, de algo que não exista mais. Nesse sentido, o acervo fotográfico do Museu e Arquivo Antônio Perdigão é de extrema importância para a guarda e preservação da memória de Conselheiro Lafaiete.

Conselheiro Lafaiete é considerada por alguns autores como um eterno local de passagem, essa ideia de local de passagem é construída ao longo da história do município e se deve em partes pela sua localização geográfica. Segundo o Dossiê de Tombamento da Locomotiva a Vapor Orenstein e Koppel, os primeiros habitantes teriam sido índios da tribo Carijó que se alojaram nas terras do que hoje é Conselheiro Lafaiete, fugindo da invasão portuguesa no Rio de Janeiro, o local teria sido escolhido por ter várias rotas de fuga. (CONSELHEIRO LAFAIETE, 2010).

Outro ponto importante da história do município que comprova a vocação para lugar de passagem, foi à discórdia entre a bandeira de Dom Rodrigo Castel Branco, que era espanhol com a bandeira de Borba Gato, que culminou no assassinato de um dos homens de Borba Gato. Os integrantes da bandeira de Dom Rodrigo escolheram a região de Conselheiro Lafaiete para se esconderem por se tratar de um local estratégico caso precisassem fugir. (CONSELHEIRO LAFAIETE, 2010)

Posto esses fatos históricos, ao longo de 400 anos o município cresceu com essa vocação “de local de passagem” e é comum ouvir dos moradores mais antigos sobre como a implantação de siderurgias na região impactou o município trazendo pessoas de todas as regiões do país. A partir da década de 50, começa-se um processo de modernização da cidade, seu primeiro prédio moderno é o edifício do Fórum Drº Assis Andrade, a modernização somada ao progresso fez com que a cidade fosse perdendo paulatinamente o seu patrimônio cultural edificado e dando lugar a novas construções.

Atualmente o município possui bem pouco do casario do Séc. XVIII, XIX e princípio do XX, com isso a cidade perde sua identidade cultural ligada à arquitetura. Nesse sentido cabe aqui o conceito de “Não Lugar” elaborado por Marc Augé (1994). Os “não lugares” segundo Augé (1994) são locais que não possuem uma identidade própria e que podemos visualizar em qualquer lugar do mundo.

Conselheiro Lafaiete, talvez por ser local de passagem, talvez pelo afã do progresso e da modernização uma das únicas fontes de memória que o município dispõe está nas fotografias do acervo do Museu e Arquivo Antônio Perdigão. Desta forma, Dallago diz:

Podemos dizer então que a fotografia pode, ao mesmo tempo, traz em si a dimensão da memória, do registro do passado, e o poder de impactar, “flechar”, despertar afetos, emoções, naquele que a observa. Memórias, então, carregadas de afetividade. (…) Marcel Proust, Em Busca do Tempo Perdido, os conceitos de memória voluntária e involuntária, na tentativa de estabelecer uma teorização mais aprofundada sobre o poder afetador intrínseco a imagem fotográfica. (DALLAGO, 2008, p.2 (online)).

Trabalho De Campo

Como esse artigo não tem pretensão de se esgotar, mas de suscitar um assunto/problema, o trabalho de campo foi breve, mas essencial para o inicio da análise crítica a respeito das condições do acervo do Museu e Arquivo Antônio Perdigão. Foi feita uma visita ao Museu Ferroviário e Centro Cultural Maria Andrade de Resende, local onde se encontra o acervo fotográfico atualmente.

Foto: observa-se as caixas e pastas onde ficam guardadas as fotos.
Fonte: autoras

O acervo é composto por mais de 3 mil fotografias aproximadamente, as quais estão em pastas, sem nenhum tipo de catalogação e indexação, o que dificulta a pesquisa e o uso das mesmas. A falta de registro sobre quem são os autores das fotos também faz com que essa dificuldade torna-se mais evidente.

O acervo necessita por tanto de dois tipos de trabalho um de catalogação e indexação dessas fotos, talvez até mesmo com digitalização para evitar o manuseio, e outro de pesquisa sobre quem são os autores dessas fotografias.

Conclusão

Conselheiro Lafaiete perdeu grande parte do seu patrimônio cultural edificado ao longo dos últimos sessenta anos. O acervo fotográfico do Museu e Arquivo Antônio Perdigão, é um dos únicos meios existentes de resgate da memória lafaietense.

Porém o acervo necessita de atenção especial, para que possa ser preservado e conservado adequadamente, além de pesquisas sobre os possíveis autores das fotos.

Espera-se que esse artigo ainda que breve possa provocar além dessas pesquisas também a organização e a gestão do acervo de forma adequada e destacar a importância dessa pesquisa para a cidade.


– Msc Ambiente Construído Patrimônio Sustentável/ EA – UFMG. Doutoranda, Gestão do Conhecimento/ ECI – UFMG. Gestora Socio-ambiental/ Adm – UFSJ. Turismóloga/ DETUR – UFOP _ Kelly Juliane Dutra

– Arquiteta, cientista da computação, mestre e doutora em Ciência da Informação, professora do PPGOC-ECI-UFMG. Renata Maria Abrantes Baracho

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