MINAS SEM FOME: Projeto que arrecada latinhas de alumínio, com renda revertida em cestas básicas para famílias com insuficiência alimentar no Vale do Paraopeba, começa em Betim, Ibirité, Esmeraldas, Mário Campos e Brumadinho

O programa Minas sem Fome, que visa contribuir para o combate à insuficiência alimentar e para a preservação do meio ambiente, buscando a conscientização da sociedade sobre a importância da reciclagem, acaba de ser implementado em Betim e Ibirité. Com o envolvimento de associações comunitárias, escolas, comércio local e comunidade em geral, a ação é voltada para os 12 municípios mineiros que compõem o Vale do Paraopeba.
O Programa de Auxílio ao Combate à Insuficiência Alimentar do Vale do Paraopeba prevê auxílio a famílias em extrema pobreza. A iniciativa conta com instalação de containers em pontos estratégicos dos municípios para coleta das latinhas, que posteriormente serão vendidas para instituições que tratam e condensam o material em fardos de alumínio.

Em Betim, o container foi instalado na Associação Bem Estar (Rua Contagem, 100 – bairro Industrial). Na cidade de Ibirité, as doações podem ser feitas na Associação São Lázaro (Rua Gonçalves Dias, 205 – bairro Washington Pires).

No dia 3 de abril, o programa foi implantado em Esmeraldas, na Escola Municipal Aparecida do Socorro (rua João Guimarães Rosa, 23 – bairro São Pedro), em Mário Campos (Supermercados Super Luna – Centro) e em Brumadinho (Supermercados Super Luna – centro).

Os valores arrecadados com a venda dos fardos serão utilizados para a compra de cestas básicas, mensalmente distribuídas a famílias carentes. Estão programadas ainda palestras e blitzes de trânsito para divulgar a ação e também conscientizar o público sobre a importância da reciclagem e preservação do meio ambiente.

Apresentação e parcerias

Patrícia Pacheco, da Promo Produtora, responsável pela execução do Minas sem Fome, explica que a implementação do programa está prevista para os meses de abril e maio. ”Estamos em contato com as demais prefeituras e associações comunitárias, para instalação dos pontos de coleta em escolas, praças e comércios”, afirma.

Segundo Patrícia Pacheco, o programa será executado durante 12 meses.

Os demais municípios onde o programa deverá ser realizado são Congonhas, Conselheiro Lafaiete, Igarapé, Mateus Leme, Ouro Branco, Sarzedo e São Joaquim de Bicas.

O Programa de Auxílio ao Combate à Insuficiência Alimentar é realizado com recurso destinado pelo Comitê Gestor do Dano Moral Coletivo, pago a título de indenização social pelo rompimento da Barragem em Brumadinho.

Programa Minas sem Fome

Pontos de coleta de latinhas:

Betim – Associação Bem Estar (Rua Contagem, 100 – bairro Betim Industrial)

Brumadinho (Supermercados Super Luna – centro)

Esmeraldas – Escola Municipal Aparecida do Socorro (rua João Guimarães Rosa, 23 – bairro São Pedro)

Ibirité – Associação São Lázaro (Rua Gonçalves Dias, 205 – bairro Washington Pires)

Mário Campos (Supermercados Super Luna – Centro)

MINAS SEM FOME: Projeto vai arrecadar latinhas de alumínio em 12 municípios do Vale do Paraopeba, com renda revertida em cestas básicas para famílias com insuficiência alimentar

Projeto vai arrecadar latinhas de alumínio em 12 municípios do Vale do Paraopeba, com renda revertida em cestas básicas para famílias com insuficiência alimentar

Contribuir para o combate à insuficiência alimentar e para a preservação do meio ambiente, buscando a conscientização da sociedade sobre a importância da reciclagem, com o envolvimento de escolas, do comércio local e comunidade em geral. Esse é o objetivo do Programa Minas sem Fome, que deverá ser implantado em 12 municípios mineiros que compõem o Vale do Paraopeba, a partir do mês de abril.

O Programa de Auxílio ao Combate à Insuficiência Alimentar do Vale do Paraopeba prevê auxílio a famílias em extrema pobreza. A ação contará com instalação de containers em pontos estratégicos dos municípios para coleta das latinhas, que  posteriormente serão vendidas para instituições que tratam e condensam o material em fardos de alumínio.

Os valores arrecadados com a venda dos fardos serão utilizados para a compra de cestas básicas, mensalmente distribuídas às famílias carentes. Estão programadas ainda palestras e blitzes de trânsito para divulgar a ação e também conscientizar o público sobre a importância da reciclagem e preservação do meio ambiente.

Apresentação e parcerias

Patrícia Pacheco, da Promo Produtora, responsável pela execução do programa, explica que a implementação do Minas sem Fome está prevista para os meses de abril e maio. ”Estamos em fase de apresentação do projeto junto aos municípios e de solicitação de apoio às prefeituras e associações comunitárias, para instalação dos pontos de coleta em escolas, praças e comércios”, afirma.

Segundo Patrícia Pacheco, Betim e Esmeraldas serão as primeiras cidades a receber o programa, que será executado durante 12 meses. Prosseguimos nas reuniões com os demais municípios”, completa.

Os municípios onde o programa está sendo apresentado são Betim, Brumadinho, Congonhas, Conselheiro Lafaiete, Esmeraldas, Ibirité, Igarapé, Mário Campos, Mateus Leme, Ouro Branco, Sarzedo e São Joaquim de Bicas.

O Programa de Auxílio ao Combate à Insuficiência Alimentar é realizado com recurso destinado pelo Comitê Gestor do Dano Moral Coletivo, pago a título de indenização social pelo rompimento da Barragem em Brumadinho.

Estudo afirma que 13 milhões de brasileiros deixaram de passar fome em 2023

Sob Bolsonaro, Brasil se afasta de meta de erradicar pobreza

Número de brasileiros na pobreza aumentou em 10 milhões entre 2020 e 2021, representando agora quase 30% da população. Especialistas criticam foco eleitoreiro do Auxílio Brasil e falta de propostas na campanha.

O mundo não conseguirá cumprir a meta estabelecida pela Organização das Nações Unidas (ONU) de erradicar a pobreza até 2030 — e o Brasil apresenta retrocessos sociais que também vão nesse sentido. Esse é o panorama 30 anos após a ONU instituir o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza, em 17 de outubro de 1992.

O prognóstico negativo foi confirmado em relatório divulgado no início deste mês pelo Banco Mundial. E encontra eco nos números, segundo os quais a pandemia de covid-19 causou o pior momento desde que os dados vêm sendo monitorados, nos anos 1990, empurrando mais de 70 milhões de pessoas para a linha extrema em 2020. E os prognósticos, com a guerra na Ucrânia e a inflação decorrente do conflito, indicam que esse contingente ficará ainda maior.

De acordo com a instituição, 719 milhões de pessoas atualmente subsistem com menos de 2,15 dólares por dia — o que significa pobreza extrema. E a projeção é que até o fim deste ano 115 milhões a mais estejam nesse limiar da fome.

A linha da pobreza teve o valor mínimo reajustado pelo banco, tendo em vista o aumento dos custos em escala global. Antes, era de 5,50 dólares por dia. Agora é de 6,85. Considerando essa faixa, uma em cada cinco pessoas do mundo está abaixo da linha da pobreza.

O balde de água fria no sonho de acabar com a fome até 2030 tem sua explicação justamente no clima de otimismo dos anos 1990.

“Existia naquele contexto de final de século a expectativa de que o fortalecimento das democracias no pós-Guerra Fria fortaleceria os mercados e promoveria a redução da miséria, através da globalização e do neoliberalismo. Essas pretensões acabaram não acontecendo. Ao contrário, acabaram criando mais desigualdade pelo mundo”, avalia o sociólogo Paulo Niccoli Ramirez, professor da Fundação Escola de Sociologia de São Paulo e da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM).

Brasil: 30% do país na pobreza

No Brasil, o cenário é preocupante. “A queda [dos índices de pobreza] no Brasil foi até 2015”, aponta o economista Marcelo Neri, diretor do Centro de Políticas Sociais FGV Social.

Ele se baseia em dados que apontam que, no fim do ano passado, havia um recorde do contingente de pobres no país desde o início da série histórica — 62,9 milhões de brasileiros, ou quase 30% da população, vivendo com renda domiciliar per capita igual ou inferior a R$ 497 por mês (5,50 dólares por dia). O número significa 10,1 milhões pessoas a mais do que no ano anterior, 2020.

O levantamento realizado pelo FGV Social com base nos microdados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apresenta um quadro nítido e preciso do que ocorreu nos últimos dez anos, início da série histórica. Em 2012, eram 54 milhões pobres no Brasil, número que caiu para 47,6 milhões em 2014, quando voltou a subir. Em 2018, eram 55,1 milhões. E 2021 terminou com o recorde histórico de 62,9 milhões de brasileiros abaixo da linha da pobreza.

Para Ramirez, nesta conta é preciso acrescentar, além do cenário global, os cortes de programas sociais durante os governos Michel Temer e Jair Bolsonaro, ou mesmo a não atualização compatível dos valores destinados a eles. Mas ele também observa que como essas estatísticas se baseiam no ganho diário em dólar, a desvalorização da moeda brasileira significa “o aumento da quantidade de pessoas que entram” nessa desfavorável lista.

Avanços e retrocessos

Segundo Neri, nos últimos 30 anos, é possível destacar uma série de esforços históricos para a redução desse cenário. Nos anos 1990, havia a famosa campanha empreendida pelo sociólogo Herbert de Souza (1935-1997), o Betinho, com sua organização Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida.

Em 2001, no fim do segundo governo de Fernando Henrique Cardoso, foram implementados os programas Bolsa-escola e Bolsa Alimentação, precursores dos modelos de transferência de renda.

O auge da luta contra a pobreza extrema viria, contudo, na gestão posterior, sob o comando do petista Luiz Inácio Lula da Silva, com o programa Fome Zero e a instituição do Bolsa Família.

“O compromisso [de erradicar a pobreza] veio com o governo FHC, com algumas bolsas, e conseguiu uma expansão eficaz nos governos Lula e Dilma, quando a fome foi de fato extirpada do país e houve um compromisso com a empregabilidade, permitindo que o brasileiro pudesse ter três refeições por dia”, comenta Ramirez. “Mas isso ainda não significou o fim da pobreza.”

O Bolsa Família unificou e ampliou os programas de transferência de renda então existentes. Em 2014 quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) considerou que o Brasil havia saído do mapa da fome, o programa foi apontado como um dos responsáveis pelo feito.

O programa beneficiava 14,7 milhões de famílias em 2021, quando foi extinto pela gestão Jair Bolsonaro. Em seu lugar, foi implementado o Auxílio Brasil, uma das principais bandeiras eleitoreiras do candidato à reeleição.

Neri avalia que “a política social de cunho assistencial está crescendo em dinheiro, mas perdendo em eficácia operacional”, com o domínio de uma “visão oportunista eleitoral e pouco foco na superação da pobreza estrutural”. “Anda para trás em relação ao que o Bolsa Família já fazia.”

“Hoje [o programa Auxílio Brasil] tem foco eleitoreiro mas provavelmente não [funcionará] depois das eleições”, considera o economista.

Ele aponta que há gargalos bastante problemáticos, a começar porque o benefício foi aprovado graças a um Projeto de Emenda Constitucional (PEC), apelidado de “Kamikaze”, que colocou o Brasil em estado de emergência até o fim deste ano. Ao contrário do Bolsa Família, portanto, o Auxílio Brasil não é um programa com previsão de continuidade.

Outra questão que vem sendo trazida de forma recorrente por estudiosos é que o Bolsa Família fazia parte de um conjunto de políticas sociais implementadas pelo governo federal. Era condicionado à frequência escolar e vacinação em dia das crianças e caminhava em paralelo com outras medidas, como o projeto Minha Casa Minha Vida, de habitação popular, e melhorias no acesso ao ensino superior, com cotas e programas de financiamento. Também foi um período em que havia ganho real do salário mínimo, com reajustes anuais acima da inflação.

Discussão politizada

Neri crê que no momento qualquer solução fica difícil de ser avaliada, pois “a discussão está muito politizada e volúvel no Brasil”. No cenário de campanha eleitoral, o vale-tudo das promessas não permite enxergar o que vem por aí.

“Bolsonaro implementou um pacote de benefícios no fim do mandato, mas não há nenhuma garantia de que serão mantidos ou que teremos orçamento para mantê-los”, alerta Ramirez. “Lula carrega o histórico de ter liquidado a fome no Brasil, mas em sua campanha não fica nítido de onde viriam os recursos [para implementar programas do tipo].”

“Infelizmente, esta campanha eleitoral é uma das mais pobres em termos de propostas políticas. Pouco demonstram o que vai ser feito [para erradicar a pobreza] ou como vai ser feito”, lamenta o sociólogo. “As pautas morais ganharam fôlego porque debater pobreza tem tido pouca repercussão entre eleitores em um mundo em que o sensacionalismo e os factoides ganham destaque.”

FONTE DW

Sob Bolsonaro, Brasil se afasta de meta de erradicar pobreza

Número de brasileiros na pobreza aumentou em 10 milhões entre 2020 e 2021, representando agora quase 30% da população. Especialistas criticam foco eleitoreiro do Auxílio Brasil e falta de propostas na campanha.

O mundo não conseguirá cumprir a meta estabelecida pela Organização das Nações Unidas (ONU) de erradicar a pobreza até 2030 — e o Brasil apresenta retrocessos sociais que também vão nesse sentido. Esse é o panorama 30 anos após a ONU instituir o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza, em 17 de outubro de 1992.

O prognóstico negativo foi confirmado em relatório divulgado no início deste mês pelo Banco Mundial. E encontra eco nos números, segundo os quais a pandemia de covid-19 causou o pior momento desde que os dados vêm sendo monitorados, nos anos 1990, empurrando mais de 70 milhões de pessoas para a linha extrema em 2020. E os prognósticos, com a guerra na Ucrânia e a inflação decorrente do conflito, indicam que esse contingente ficará ainda maior.

De acordo com a instituição, 719 milhões de pessoas atualmente subsistem com menos de 2,15 dólares por dia — o que significa pobreza extrema. E a projeção é que até o fim deste ano 115 milhões a mais estejam nesse limiar da fome.

A linha da pobreza teve o valor mínimo reajustado pelo banco, tendo em vista o aumento dos custos em escala global. Antes, era de 5,50 dólares por dia. Agora é de 6,85. Considerando essa faixa, uma em cada cinco pessoas do mundo está abaixo da linha da pobreza.

O balde de água fria no sonho de acabar com a fome até 2030 tem sua explicação justamente no clima de otimismo dos anos 1990.

“Existia naquele contexto de final de século a expectativa de que o fortalecimento das democracias no pós-Guerra Fria fortaleceria os mercados e promoveria a redução da miséria, através da globalização e do neoliberalismo. Essas pretensões acabaram não acontecendo. Ao contrário, acabaram criando mais desigualdade pelo mundo”, avalia o sociólogo Paulo Niccoli Ramirez, professor da Fundação Escola de Sociologia de São Paulo e da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM).

Brasil: 30% do país na pobreza

No Brasil, o cenário é preocupante. “A queda [dos índices de pobreza] no Brasil foi até 2015”, aponta o economista Marcelo Neri, diretor do Centro de Políticas Sociais FGV Social.

Ele se baseia em dados que apontam que, no fim do ano passado, havia um recorde do contingente de pobres no país desde o início da série histórica — 62,9 milhões de brasileiros, ou quase 30% da população, vivendo com renda domiciliar per capita igual ou inferior a R$ 497 por mês (5,50 dólares por dia). O número significa 10,1 milhões pessoas a mais do que no ano anterior, 2020.

O levantamento realizado pelo FGV Social com base nos microdados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) apresenta um quadro nítido e preciso do que ocorreu nos últimos dez anos, início da série histórica. Em 2012, eram 54 milhões pobres no Brasil, número que caiu para 47,6 milhões em 2014, quando voltou a subir. Em 2018, eram 55,1 milhões. E 2021 terminou com o recorde histórico de 62,9 milhões de brasileiros abaixo da linha da pobreza.https://www.dw.com/display/22/10/221017_IG_Menschen_im_Armut_Brasilien_PT-BR/221017_IG_Menschen_im_Armut_Brasilien_PT-BR.html​

Para Ramirez, nesta conta é preciso acrescentar, além do cenário global, os cortes de programas sociais durante os governos Michel Temer e Jair Bolsonaro, ou mesmo a não atualização compatível dos valores destinados a eles. Mas ele também observa que como essas estatísticas se baseiam no ganho diário em dólar, a desvalorização da moeda brasileira significa “o aumento da quantidade de pessoas que entram” nessa desfavorável lista.

Avanços e retrocessos

Segundo Neri, nos últimos 30 anos, é possível destacar uma série de esforços históricos para a redução desse cenário. Nos anos 1990, havia a famosa campanha empreendida pelo sociólogo Herbert de Souza (1935-1997), o Betinho, com sua organização Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida.

Em 2001, no fim do segundo governo de Fernando Henrique Cardoso, foram implementados os programas Bolsa-escola e Bolsa Alimentação, precursores dos modelos de transferência de renda.

O auge da luta contra a pobreza extrema viria, contudo, na gestão posterior, sob o comando do petista Luiz Inácio Lula da Silva, com o programa Fome Zero e a instituição do Bolsa Família.

“O compromisso [de erradicar a pobreza] veio com o governo FHC, com algumas bolsas, e conseguiu uma expansão eficaz nos governos Lula e Dilma, quando a fome foi de fato extirpada do país e houve um compromisso com a empregabilidade, permitindo que o brasileiro pudesse ter três refeições por dia”, comenta Ramirez. “Mas isso ainda não significou o fim da pobreza.”

O Bolsa Família unificou e ampliou os programas de transferência de renda então existentes. Em 2014 quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) considerou que o Brasil havia saído do mapa da fome, o programa foi apontado como um dos responsáveis pelo feito.

O programa beneficiava 14,7 milhões de famílias em 2021, quando foi extinto pela gestão Jair Bolsonaro. Em seu lugar, foi implementado o Auxílio Brasil, uma das principais bandeiras eleitoreiras do candidato à reeleição.

Neri avalia que “a política social de cunho assistencial está crescendo em dinheiro, mas perdendo em eficácia operacional”, com o domínio de uma “visão oportunista eleitoral e pouco foco na superação da pobreza estrutural”. “Anda para trás em relação ao que o Bolsa Família já fazia.”

“Hoje [o programa Auxílio Brasil] tem foco eleitoreiro mas provavelmente não [funcionará] depois das eleições”, considera o economista.

Ele aponta que há gargalos bastante problemáticos, a começar porque o benefício foi aprovado graças a um Projeto de Emenda Constitucional (PEC), apelidado de “Kamikaze”, que colocou o Brasil em estado de emergência até o fim deste ano. Ao contrário do Bolsa Família, portanto, o Auxílio Brasil não é um programa com previsão de continuidade.

Outra questão que vem sendo trazida de forma recorrente por estudiosos é que o Bolsa Família fazia parte de um conjunto de políticas sociais implementadas pelo governo federal. Era condicionado à frequência escolar e vacinação em dia das crianças e caminhava em paralelo com outras medidas, como o projeto Minha Casa Minha Vida, de habitação popular, e melhorias no acesso ao ensino superior, com cotas e programas de financiamento. Também foi um período em que havia ganho real do salário mínimo, com reajustes anuais acima da inflação.

Discussão politizada

Neri crê que no momento qualquer solução fica difícil de ser avaliada, pois “a discussão está muito politizada e volúvel no Brasil”. No cenário de campanha eleitoral, o vale-tudo das promessas não permite enxergar o que vem por aí.

“Bolsonaro implementou um pacote de benefícios no fim do mandato, mas não há nenhuma garantia de que serão mantidos ou que teremos orçamento para mantê-los”, alerta Ramirez. “Lula carrega o histórico de ter liquidado a fome no Brasil, mas em sua campanha não fica nítido de onde viriam os recursos [para implementar programas do tipo].”

“Infelizmente, esta campanha eleitoral é uma das mais pobres em termos de propostas políticas. Pouco demonstram o que vai ser feito [para erradicar a pobreza] ou como vai ser feito”, lamenta o sociólogo. “As pautas morais ganharam fôlego porque debater pobreza tem tido pouca repercussão entre eleitores em um mundo em que o sensacionalismo e os factoides ganham destaque.”

FONTE DW.COM

Pesquisa: brasileiros sofrem com o aumento do preços e comem biscoito pra saciar fome 

Os preços dos alimentos mais saudáveis, como legumes, estão mais caros. O levantamento foi feito pela Horus

Brasileiros estão consumindo mais biscoitos e salgadinhos e menos verduras, legumes e frutas. Isso é o que indica um levantamento feito pela Horus e publicado pelo Jornal Hoje, da TV Globo, nessa quarta-feira (28).

A pesquisa analisou 500 milhões de notas fiscais do varejo alimentar e revelou que os brasileiros estão comprando 8,4% mais biscoitos. E esses itens, hoje, são mais de 22% do carrinho de compras.

Segundo o levantamento, o consumo desses alimentos é ainda maior nas classes D/E. Isso porque são produtos mais baratos.

Por outro lado, os preços dos alimentos mais saudáveis, como legumes, estão mais caros.

“É um dado alarmante porque você vê que a população está fazendo uma substituição em termos de nutrientes importantes os salgados, biscoitos, a gente sabe que tem baixo poder nutritivo e o que a gente está vendo é que os produtos que estão sendo mais consumidos são nas classes mais baixas e de valor de preços também mais baixos”, disse à reportagem Luiza Zacharias, diretora de novos negócios da Horus.

FONTE ITATIAIA

Fome avança no país e atinge mais de 33 milhões de brasileiros

Pesquisa mostra que mais 14 milhões de pessoas passaram a enfrentar esse drama em um ano e só 4 entre 10 famílias têm acesso pleno à alimentação

A escalada da fome no Brasil de Bolsonaro e da pandemia ganha números para mostrar sua face trágica com uma nova pesquisa sobre insegurança alimentar: em 2022, 33,1 milhões de pessoas não têm o que comer; são 14 milhões de novos brasileiros em situação de fome desde a conclusão do estudo anterior em 2021; e mais da metade (58,7%) da população brasileira convive com a insegurança alimentar em algum grau – leve, moderado ou grave (fome). O quadro dramático é revelado pelo 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil (II Vigisan), lançado nesta quarta-feira, 8 de junho.

De acordo com a Rede Penssan (Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional), responsável pelo estudo, o Brasil regrediu para um patamar equivalente ao da década de 1990. A pesquisa anterior, de 2020, mostrava que a fome no país já tinha voltado para patamares equivalentes aos de 2004. A continuidade do desmonte de políticas públicas, a piora no cenário econômico, o acirramento das desigualdades sociais e o segundo ano da pandemia da Covid-19 tornaram o quadro desta segunda pesquisa ainda mais perverso. “A pandemia surge neste contexto de aumento da pobreza e da miséria, e traz ainda mais desamparo e sofrimento. Os caminhos escolhidos para a política econômica e a gestão inconsequente da pandemia só poderiam levar ao aumento ainda mais escandaloso da desigualdade social e da fome no nosso país”, aponta médica epidemiologista Ana Maria Segall, pesquisadora da Rede Penssan.

O objetivo principal do II VIGISAN é manter o monitoramento ativo da Segurança Alimentar (SA) e dos níveis de Insegurança Alimentar (IA), com divulgação ampla de seus resultados para dar transparência e relevo à situação emergencial da fome. De acordo com o 2º Inquérito, em números absolutos, são 125,2 milhões de brasileiros que passaram por algum grau de insegurança alimentar. É um aumento de 7,2% desde 2020, e de 60% em comparação com 2018. “Já não fazem mais parte da realidade brasileira aquelas políticas públicas de combate à pobreza e à miséria que, entre 2004 e 2013, reduziram a fome a apenas 4,2% dos lares brasileiros. As medidas tomadas pelo governo para contenção da fome hoje são isoladas e insuficientes, diante de um cenário de alta da inflação, sobretudo dos alimentos, do desemprego e da queda de renda da população, com maior intensidade nos segmentos mais vulnerabilizados”, avalia Renato Maluf, coordenador da Rede Pensann.

O avanço da fome no país (Arte: Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil)
O avanço da fome no país (Arte: Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil)

A coleta de dados ocorreu entre novembro de 2021 e abril de 2022,com a utilização de questionário contendo a Escala Brasileira de Insegurança Alimentar (EBIA) – também utilizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os resultados revelam que apenas 41,3% dos domicílios estavam em situação de segurança alimentar, enquanto em 28% havia incerteza quanto ao acesso aos alimentos, além da qualidade da alimentação já comprometida – a insegurança alimentar (IA) leve. Em um terço dos domicílios (30,7%) já havia relato de insuficiência de alimentos que atendessem às necessidades de seus moradores – ou seja, insegurança alimentar moderada ou grave.

A fome – insegurança alimentar grave na pesquisa – foi constatada em 15,5% dos domicílios. Em termos populacionais, são 125,2 milhões de pessoas residentes em domicílios com insegurança alimentar e mais de 33 milhões em situação de fome.  “Os níveis alarmantes de insegurança alimentar e de fome integram o contexto de crises que seguem vulnerabilizando um crescente contingente populacional, agora incorporando segmentos das camadas médias antes socialmente mais protegidas”, alerta o relatório da Rede Penssan, constituída por pesquisadores, professores, estudantes e profissionais. A pesquisa, executada em campo pelo Instituto Vox Populi, teve apoio da Ação da Cidadania, da ActionAid Brasil, da Fundação Friedrich Ebert Brasil, do Ibirapitanga, da Oxfam Brasil e do Sesc. O estudo completo pode ser acessado na página Olhe para a Fome.

Fome no campo e na cidade (Arte: Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil)
Fome no campo e na cidade (Arte: Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil)

Apesar dos recordes de produção agrícola apresentados pelo Brasil, a fome é maior no campo do que nas cidades. Nas áreas rurais, a insegurança alimentar (em todos os níveis) esteve presente em mais de 60% dos domicílios. Destes, 18,6% das famílias convivem com a insegurança alimentar grave (fome), valor maior do que a média nacional. E até quem produz alimento está pagando um preço alto: a fome atingiu 21,8% dos lares de agricultores familiares e pequenos produtores. “O segmento da agricultura familiar sofreu o impacto da crise econômica, mas foi especialmente afetado pelo desmonte das políticas públicas voltadas para o pequeno produtor do campo”, aponta relatório.

Regiões com maiores índices de pobreza do país, o Norte e o Nordeste foram mais impactados, como já ocorrera na pesquisa anterior, pelo agravamento da fome no país – a insegurança alimentar atinge as regiões do Brasil de forma desigual. No Norte e no Nordeste, os números chegam, respectivamente, a 71,6% e 68%: esses índices são expressivamente maiores do que a média nacional de 58,7%. A fome fez parte do dia a dia de 25,7% das famílias na região Norte e de 21% no Nordeste. A média nacional é de aproximadamente 15%, e, do Sul, de 10%.·

Fome por região no país (Arte: Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil)
Fome por região no país (Arte: Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil)

O 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil (II Vigisan) indica ainda que a fome tem cor e gênero. Enquanto a segurança alimentar está presente em 53,2% dos domicílios onde a pessoa de referência se autodeclara branca, nos lares com responsáveis de raça/cor preta ou parda ela cai para 35%. Na comparação com o 1º inquérito da Rede Penssan ,de 2020, em 2021/2022, a fome saltou de 10,4% para 18,1% entre os lares comandados por pretos e pardos. As diferenças também são expressivas na comparação entre os lares chefiados por homens e os lares chefiados por mulheres entre os dois relatórios da Rede PENSSAN. Nas casas em que a mulher é a pessoa de referência, a fome passou de 11,2% para 19,3%. Nos lares que têm homens como responsáveis, a fome passou de 7,0% para 11,9%.

Outros números da pesquisa são reveladores da dimensão do drama trágico da fome no país. Em pouco mais de um ano, a fome dobrou nas famílias com crianças menores de 10 anos – de 9,4% em 2020 para 18,1% em 2022. Na presença de três ou mais pessoas com até 18 anos de idade no grupo familiar, a fome atingiu 25,7% dos lares. A fome é maior nos domicílios em que a pessoa responsável está desempregada (36,1%), trabalha na agricultura familiar (22,4%) ou tem emprego informal (21,1%). Há fome em 22,3% dos domicílios com responsáveis com baixa escolaridade — quatro anos ou menos de estudo; em 2020, esse percentual era de 14,9%.

O inquérito também indica que a fome quase desaparece nos lares com renda superior a um salário mínimo por pessoa. Em 67% dos domicílios com renda maior que um salário mínimo por pessoa, o acesso a alimentos (segurança alimentar) é pleno e garantido. Porém, se em 2020 não havia domicílios com renda maior que um salário mínimo por pessoa em situação de fome, no início de 2022 essa deixou de ser uma garantia contra a privação do consumo de alimentos – consequência da crise econômica e dos reajustes do salário mínimo abaixo da inflação. Agora, 3% dos lares nesta faixa de renda tem seus moradores em situação de fome, e 6% convivem com algum grau de restrição quantitativa de alimentos (insegurança alimentar moderada) e 24% não conseguem manter a qualidade adequada de sua alimentação (insegurança alimentar leve).·

Na apresentação da pesquisa, as instituições envolvidas alertam para o avanço da fome no Brasil. “Não podemos mais tolerar que 33 milhões de pessoas não tenham o que comer em um país com tanta diversidade como o Brasil. É um retrocesso total. Nossa instituição nasceu com a comoção de Betinho ao se deparar com esse mesmo número de brasileiros em Insegurança Alimentar grave. Hoje, estamos aqui revivendo a mesma tragédia”, afirma o texto da Ação da Cidania, organização que completa 29 anos. “O quadro de apagão de dados oficiais e de negligência das autoridades permanece, mas o contexto de fome e Insegurança Alimentar nos seus diversos aspectos chega a níveis ainda mais estarrecedores”, destaca a ActionAid Brasil.

FONTE PROJETO COLABORA

Fome atinge mais de 24 milhões de brasileiros

Um levantamento recente feito pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan), apontou que a fome no Brasil já atinge 24,5 milhões de brasileiros. Este é o número de cidadãos que passam 24 horas ou mais sem se alimentar, nem mesmo ter a certeza de que conseguirão comer alguma coisa no dia seguinte. 

Enquanto isso, outros 74 milhões estão inseguros se também irão enfrentar essa mesma situação. A pesquisa se refere a dezembro de 2020, época em que mais de 55% dos brasileiros já sofriam com algum tipo de insegurança alimentar, seja ela leve, moderada ou grave. Os dados foram obtidos mediante a amostra de 1.662 domicílios urbanos e 518 rurais, lembrando que este tipo de levantamento costuma ser feito a cada quatro anos. 

Neste levantamento foi possível observar que nas regiões onde há uma maior concentração da população em situação de vulnerabilidade social, no Norte e Nordeste do país, a fome no patamar de insegurança grave atinge entre 18% e 14% dos domicílios, respectivamente. Enquanto isso, a média nacional é de 9%.

Enquanto isso, na região Centro-Oeste, popularmente conhecida como o “celeiro do Brasil”, abriga um terço das famílias que sofrem com o grau moderado de fome. De acordo com o coordenador da Rede Penssan, Renato Maluf, a pesquisa será feita novamente este ano, desta vez, pesquisando a situação em sete mil municípios brasileiros. “Antes mesmo da pesquisa, esperávamos o agravamento do quadro. Mas não que fosse tão profundo”, declarou. 

A principal razão para este acontecimento é o alto índice da taxa inflacionária. A pesquisa foi capaz de mostrar que 64% dos alimentos que normalmente são consumidos pelos brasileiros passaram por um reajuste abusivo no preço. A inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) teve um aumento de 1,16% em setembro deste ano, conforme dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Este é o patamar mais alto que a inflação já atingiu desde o Plano Real, lançado no ano de 1994, responsável por extinguir a superinflação. Porém, ao observar o acumulado de 12 meses, a inflação já chegou a 10,25%. Mesmo diante de toda a precariedade, foi possível encontrar uma maneira de driblar a fome. Trata-se do aumento no consumo de alimentos hiperprocessados e de baixo teor nutricional. 

Esta foi a maneira encontrada por milhares de brasileiros para não ficar à míngua. De acordo com o Instituto Datafolha, este tipo de consumo aumentou de 9% para 16% entre adultos na faixa etária de 24 a 55 anos de idade. A insegurança alimentar estava em queda no Brasil desde 2004, mas voltou a crescer 10 anos mais tarde. Para a Fundação Getúlio Vargas (FGV) Social, desde 2014, o real rendimento domiciliar per capita do trabalho caiu de R$ 249 para R$ 172, na média da metade da população em situação de pobreza. A inflação acumulada de 2014, até hoje, beira 50%.

Por essa entre outras razões, os parlamentares tentam estabelecer medidas de combate ao agravamento da fome no Brasil. Um conjunto entre especialistas e parlamentares ressalta que 59,3% dos brasileiros, o equivalente a 125,6 milhões de pessoas, não consumiram uma quantidade adequada e de qualidade de comida desde o início da pandemia da Covid-19

Os dados foram apresentados na pesquisa “Efeitos da pandemia na alimentação e na situação da segurança alimentar no Brasil”, realizada pela Universidade Livre de Berlim, na Alemanha, em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais e a Universidade de Brasília.

No Plenário, o deputado Roberto de Lucena (Pode-SP), bem como o presidente da Casa, o deputado Arthur Lira (PP-AL), reconheceram que a fome no Brasil atingiu os mesmos índices registrados pelo IBGE no ano de 2004. O parlamentar fez questão de ressaltar que este problema não está relacionado à falta de alimentos, tendo em vista que o ramo de agronegócio e de agricultura familiar no Brasil crescem cada vez mais. 

O problema tem relação com a desigualdade social e econômica do país, junto à queda na promoção de vagas de emprego combinado ao aumento da inflação. A taxa inflacionária tem provocado aumentos absurdos nos alimentos, gás de cozinha, combustível e conta de luz. 

FONTE BRASIL 123

Em Brasília, professores decidem matar a fome antes de ensinar

Denize Francisco Constâncio de Assis é vice-diretora do Centro Educacional Gisno, uma escola pública na Asa Norte, em Brasília. Assim como milhões de crianças e adolescentes país afora, os alunos do Gisno não vão ao colégio desde março de 2020, em virtude da pandemia. Por determinação do Governo do Distrito Federal, há um ano e três meses as aulas estão sendo dadas pela internet. Denize enumera uma série de problemas que o sistema tem trazido ao aprendizado dos alunos, mas o principal problema deles não é de ordem pedagógica. Segundo a vice-diretora, o principal problema dos alunos é a fome.

No levantamento feito pela direção, no ano passado, 30% dos estudantes abandonaram as aulas simplesmente por falta de comida. E o início da equação também é muito simples: com a pandemia, os pais perderam o emprego ou outra fonte de renda que possuíam para manter a família. É o caso da mãe de duas alunas do Gisno, que chegou à escola dizendo que as filhas estavam há quatro dias sem comer. “Eu peguei, tirei do meu próprio bolso e falei vamos ali no mercado e fazer uma compra agora. Ela foi chorando no caminho, contando que não consegue arrumar trabalho”, conta a vice-diretora.

A atitude de Denize é recorrente no Gisno, uma escola que fica numa área nobre de Brasília – o Plano Piloto -, mas que só tem 0,5% de alunos moradores da região. A esmagadora maioria mora na periferia da capital do país e entre esses alunos a chamada insegurança alimentar sempre foi uma realidade, independentemente da pandemia. Os professores se acostumaram a tirar do salário para que alunos e suas famílias tenham o que comer em casa e não haja evasão escolar. O próprio diretor do Gisno, Isley Marth, ajuda há tempos as famílias de três alunos.

Nas aulas presenciais, a merenda escolar era para muitos a garantia da refeição do dia. Mas agora, o governo local substituiu a merenda por um cartão alimentação de cerca de R$ 200, o que acaba sendo utilizado pela família inteira.  Então, o que já era difícil, ficou mais ainda, e o lado pedagógico é afetado pelo social.

É o caso de uma família de seis filhos, metade crianças, metade adolescentes, sendo três alunos do Gisno. “Ninguém está trabalhando na família. Tinham um quiosque, que fechou. A mão vive de bicos, e isso quando consegue. Então falta dinheiro para o aluguel, para o gás, para uma dipirona. Ficou difícil para os filhos fazerem as atividades escolares. E quando não se consegue manter o básico (a comida), que é o principal, as outras coisas (estudo, entre elas) ficam em segundo plano. Me corta o coração que esses estudantes não tenham um biscoito, não tenham uma fruta. Eles têm o quê? Eles têm o cuscuz (de milho) no café da manhã, no almoço e no jantar. Do ponto de vista nutricional, a gente não precisa ser técnico para saber que isso é insuficiente”, a vice-diretora explica de modo enfático, ao mesmo tempo em que se emociona, lembrando que a pandemia escancarou de vez as diferenças sociais na capital do país. “Enquanto uma criança de escola particular tem no café da manhã fruta, cereal, uma criança de escola pública muitas vezes só tem água e farinha”, explica.

Professores compram cestas básicas para atender a principal necessidade dos alunos: comida. Foto André Giusti
Professores compram cestas básicas para atender a principal necessidade dos alunos: comida. Foto André Giusti. Julho/2021

Além do cartão alimentação para substituir a merenda, o Governo do Distrito Federal também entrega nas escolas, uma vez por semana, cestas com frutas, verduras e legumes, mas nem de longe é a solução. “Em uma das remessas, veio uma abóbora, um repolho, couve e três bananas. Isso é muito pouco para quem precisa estudar”, lamenta Denize. Foi então que ela tomou uma inciativa que, pode se dizer, oficializou a ajuda financeira dos professores às famílias dos alunos mais carentes. Ela convocou os colegas para uma vaquinha com o objetivo de arrecadar dinheiro e comprar cestas básicas para distribuir às famílias*.

Com os cerca de R$ 1,8 mil arrecadados, em junho, conseguiram comprar 30 cestas básicas, que foram entregues juntamente com a chamada cesta verde distribuída pelo governo local. Funcionários da escola montaram as cestas de acordo com o tamanho da família. Quem tem mais gente em casa levou mais itens.

No dia da distribuição, quem esperava ver uma fila grande para pegar as cestas ficou espantado. Os pais dos alunos apareciam aos poucos. “Tem muita gente que nem tem o dinheiro da passagem para vir pegar a cesta”, explicou uma funcionária da cantina da escola, que estava trabalhando na distribuição.

Foi o que aconteceu a Sara Gomes, desempregada há três anos. Ela tem seis filhos, dois dos quais no Gisno, e só pode ir pegar a cesta porque uma das professoras depositou R$ 20 para a passagem do ônibus.

A situação piorou com a pandemia, porque as diárias que fazia na limpeza de restaurantes começaram a minguar a partir de março de 2020. No fim de semana anterior à distribuição, ela havia conseguido R$ 200 em duas diárias, mas para o fim de semana seguinte não havia trabalho em vista. O marido faz bicos como pintor e a família recebe R$ 250 do auxílio emergencial do Governo Federal. Eles pagam R$ 700 de aluguel em Santa Maria, cidade a 40 minutos de Brasília. “Ontem mesmo meu gás acabou e quem ajudou foi uma professora daqui”, explica Sara, que conseguiu comprar o botijão de R$ 95, lembrando que o que ganhou com as diárias foi embora na primeira compra de supermercado.

Cesta Verde do Governo do DF não atende necessidades das famílias. Foto André Giusti. Julho/2021
Cesta Verde do Governo do DF não atende necessidades das famílias. Foto André Giusti. Julho/2021

Outra mãe que pegou a cesta básica foi Karina Martins. Ela tem duas filhas, uma de 6 anos e outra de 13, que estuda no Gisno.

Na casa de Karina há uma dificuldade ainda maior que a financeira. “É a dificuldade emocional de lidar com tudo isso. Sinto frustração, tristeza em ver minhas filhas precisarem das coisas e eu não poder dar. Eu não estou conseguindo conciliar o ensino remoto com elas. A adolescente, que estuda aqui no Gisno, é uma briga todo dia para ela estar estudando. Ela não se sente motivada a estudar assim, ela quer estar perto dos colegas. Ela se isolou. Sempre foi boa aluna, sempre tirou notas boas e eu estou muito triste de vê-la assim, uma menina inteligente. Ela é muito crítica e isso tudo está se apagando nela. Ela não quer assistir às aulas, não faz os deveres. E isso está acabando comigo”, lamenta Karina, desempregada há mais de um ano.

Francisco da Cruz, sem emprego fixo por causa da pandemia, também enxerga a saturação emocional dos quatro filhos, dois, alunos do Gisno, que segundo ele “estão de saco cheio” com as aulas remotas. “A gente sente que o aprendizado não é o mesmo. Vamos dizer que seja 50%, porque no computador você não tem a mesma concentração do que ‘in loco’ com o professor ali no pé vendo se a atividade está mesmo sendo feita”.

Segundo ele, a principal queixa dos quatro é a saudade da escola e dos colegas. “Eles têm amigos que veem desde a primeira série, é muito tempo longe. Eles conviviam mais com os amigos do que com pai e mãe”, explica Francisco, que consegue pôr comida em casa fazendo bicos em lanchonetes ou pedalando dia sim, dia não 50 quilômetros como entregador de aplicativo (ele não consegue pedalar tanto a semana inteira). A cesta básica veio em boa hora, Francisco comemora, contando que o que tem ali só dará para dois dias.

Os filhos dele e os de Karina estão entre os poucos alunos do Gisno que conseguem ter aulas online, justamente porque possuem celular e computador compatíveis com a plataforma que o Governo do Distrito Federal oferece para o ensino. No caso de Karina, ela divide com as filhas o computador emprestado pelo Instituto Federal do Brasil, IFB, onde estuda. A mesma sorte não têm os filhos de Sara. Eles não assistem às aulas pela internet porque simplesmente não têm celular. Sara aposta no esforço dos meninos, que segundo ela “gostam muito de estudar”, para aprender por intermédio das apostilas que o colégio disponibiliza a cada dois meses, e que Sara vai pegar porque a mãe ou alguma conhecida dá o dinheiro da passagem.

“Eles têm no máximo um celular para dividir para três, quatro meninos, e não têm internet paga que comporte entrar em sala de aula. Eles falam ‘professora, eu não tenho como entrar na aula, eu não tenho como entrar na reunião’. E aí é como se não tivessem assistido à aula”, resume Denize a realidade de parte considerável dos alunos do Gisno. Pelos cálculos da direção, em uma turma de 30 ou 35 alunos, no máximo 20 conseguem ter aula pela plataforma.

O Gisno possui um laboratório com 20 computadores que poderiam atender aos alunos na tele aula, “Só que, além de não poder haver aglomeração, muitos que não têm internet boa em casa também não têm dinheiro da passagem. Com cuidados e responsabilidade poderíamos atender três ou quatro alunos a cada semana, desses que têm dificuldade de acesso”, lamenta o diretor do Gisno, Isley Marth. “Digo de coração partido. Esse longo prazo será recuperado em seis ou oito anos, quando os do ensino fundamental já estiverem no médio. E isso se tiverem oportunidade (de fazer um cursinho, por exemplo), o que não será a realidade da maioria. Os governos não estão preocupados com a educação e nem com os educandos”, desabafa Isley.

Professores e três orientadoras tentam compensar tanta deficiência tirando dúvidas pelo WhatsApp, mas a vice-diretora não se furta a ser realista. “Quando essa geração estiver no mercado de trabalho, estará com essa lacuna. Alguns vão conseguir superar, outros não. Para um país como o nosso, é uma regressão, um caminho sem volta para algumas pessoas”, é o vaticínio de Denize.

A partir dos relatos dos professores do Gisno, chega-se à certeza de que a pandemia e a crise econômica agravada pelo vírus estão levando o país a jogar pela janela talentos que brotam da escola pública. Glauciete Sarmento Maciel, que atende os alunos considerados superdotados e que possuem as chamadas altas habilidades, ajudava um aluno morador da Vila Estrutural, uma comunidade que nasceu a partir de um lixão que existia no local. Além de pagar as passagens e ter dado um computador para ele, inscreveu o aluno em um projeto de iniciação científica da UnB.  Lá, segundo ela, ele ganhava uma bolsa pequena, mas que ajudava nas despesas básicas da casa.

Com isso, o rapaz conseguiu entrar para a faculdade de mecatrônica, na própria UnB. “Eu achei que com isso ele estivesse encaminhado. Mandei mensagem para saber como ele estava indo, mas ele não me respondeu. No início deste ano (2021) ele respondeu, dizendo que havia abandonado o curso de mecatrônica porque precisou trabalhar em um supermercado. Foi um momento dramático porque eu esperava que dentro da universidade os caminhos estivessem trilhados, porque ele superou tudo até conseguir entrar em um curso difícil, mas com a pandemia os pais perderam o emprego, e ele, como é o mais velho dos cinco filhos, teve que parar de estudar para ajudar nas despesas de casa”.

Nas respostas em áudio pelo WhatsApp é possível ouvir a voz embargada de Glauciete. “Eu fiquei pensando o que eu poderia ter feito lá atrás para que não chegasse nesse extremo, mas o aluno carente anda sempre no limite dele, é um aluno que acha que vai dar conta até o último momento, quando está faltando tudo dentro de casa, e de uma hora para a outra ele precisa largar o estudo para arrumar emprego”, conta. A partir da experiência, Glauciete montou um grupo de ex-alunos para saber como cada um está se virando e tentar ajudar quem precisa, para que a pessoa não largue os estudos. “Mas, infelizmente, às vezes a gente chega tarde. E esse foi um caso em que eu cheguei tarde. O aluno já havia abandonado o curso”, lamenta.

Escola fica em área nobre, mas quase todos os alunos são da periferia de Brasília. Foto André Giusti. Julho/2021
Escola fica em área nobre, mas quase todos os alunos são da periferia de Brasília. Foto André Giusti. Julho/2021

Os estragos emocionais da pandemia alcançaram também a área de Altas Habilidades e Superdotação, que recebe alunos a partir da 6ª série, entre eles vencedores em olimpíadas de matemática, física e informática, e a Educação de Jovens e Adultos, a EJA.

No caso dos adultos que voltaram a estudar depois de anos, ir à escola era algo muito além de aprender.  “O contato deles com os professores era uma terapia para eles. São todos trabalhadores com problemas em casa, até de locomoção, e o contato era uma terapia. Os poucos com quem tenho falado sentem falta do contato físico. A gente faz o possível, mas não é a mesma coisa (a aula à distância)”, lamenta o professor Rubens dos Santos, que dá aulas de literatura e língua portuguesa para adultos das 7ª e 8ª séries.

No caso dos adultos, a refração à tecnologia é ainda maior e eles não conseguem acompanhar aulas pelo computador (isso quando têm computador em casa). O professor arrisca a dizer que dos 55 alunos para quem lecionava presencialmente somente dois estão conseguindo manter o ritmo online, e, para a direção do Gisno, essa dificuldade dos adultos com a tecnologia desnuda outro problema: o analfabetismo digital. Fora isso, os adultos da EJA vivem a mesma realidade dos pais dos alunos do ensino regular.  Em boa parte, eles são diaristas, como faxineiras, e que por causa dos riscos de contaminação no transporte público pararam de trabalhar e pararam de receber, e aí ficou difícil pôr comida em casa e pagar a passagem para ir à escola.

No início, os alunos atendidos pela área de altas habilidades até que viram com bons olhos o novo sistema de aprendizado. “O autodidatismo é uma das características desse tipo de aluno, e num primeiro momento gostaram da ideia das aulas remotas, o que possibilitaria imprimirem seu próprio ritmo”, relembra Glauciete, a professora que atende os chamados superdotados. Infelizmente, pouco mais de um ano depois, a resposta desses alunos ao ensino remoto é a mesma dos que não possuam altas habilidades. “Eles estão completamente esgotados. Não tem mais capacidade de concentração”, conta Glauciete.

Ela lembra que antes da pandemia, quando o atendimento de altas habilidades era presencial, esses alunos chegavam a ficar na escola depois do horário das aulas desenvolvendo projetos, como foguetes. “Porque você estava oferecendo coisas novas e eles estavam completamente envolvidos nisso”. Só que hoje muitos desistiram do atendimento de altas habilidades porque não estão conseguindo entregar nem mesmo as tarefas do ensino regular. Com tristeza, Glauciete explica que “Se esses alunos não têm esse atendimento ou abandonam esse atendimento por falta de internet ou por outras preocupações, isso compromete o rendimento dessas altas habilidades, e elas podem inclusive ser atrofiadas e ele deixar de ser um aluno de altas habilidades ao longo do tempo”.

Uma outra certeza que fica quando se conversa com diretores e professores do Gisno é que, ao menos nessa escola, a educação pública resiste por causa dos próprios profissionais de educação que lá trabalham (105 no total para 1240 alunos de 10 a 17 anos). O diretor Isley Marth admite que 2020 foi um ano perdido, mas que serviu para uma readequação de toda a comunidade escolar com a tecnologia. Com esperança, ele acha que “2021 pode não ser um ano perdido, pois alguns alunos estão conseguindo aprender na plataforma, respondendo muito bem este ano”.

Já a vice-diretora busca, no terrível 2020, um exemplo que traz alento. A direção montou uma força-tarefa e conseguiu que aqueles 30% de alunos que abandonaram a escola voltassem em 2021. “Cada professor ficou com uma turma e foi atrás de quem abandonou a escola”, ela conta. Além da ajuda financeira a essas famílias, o discurso motivacional foi a ferramenta utilizada. “É uma frase comum, mas a pessoa precisa ouvir isso: não desista!  Você vai conseguir! E aí acaba trazendo para você não apenas o aluno, mas também a família”, explica Denize, que não titubeia quando é perguntada sobre que é mais importante atualmente: ensinar ou matar a fome? “Matar a fome. Ensinar vem depois”.

*As doações para a compra de cestas básicas em Brasília podem ser feitas pelo pix 923.498.627-04, CPF da vice-diretora do Gisno.

FONTE PROJETO COLABORA

Na Colômbia, Padre João defende aliança contra a fome

O deputado federal Padre João (PT/MG) regressou na madrugada deste sábado (27) da Colômbia, onde coordenou a participação da delegação brasileira no VII Fórum da Frente Parlamentar contra a Fome na América Latina e Caribe (FPH, na sigla em espanhol).  A articulação internacional de deputados e senadores surgiu no ano de 2009, com o apoio da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO) e é uma rede plural de legisladores de mais de 20 países da região.

Ao lado de colegas de outros países, deputado Padre João destacou a experiência pioneira do Brasil no combate à fome, e que inspirou outras nações/DIVULGAÇÃO

Segundo a FAO, a fome deixou de diminuir na América Latina e no Caribe desde 2014. Em 2018, de acordo com o organismo internacional, a desnutrição afetou 42,5 milhões de pessoas, cerca de 6,5% dos habitantes da região, mais do que a população conjunta do Chile, Uruguai e Equador. Os 60 legisladores participantes do evento, que aconteceu na cidade de Cartagena, conclamaram os países a desenvolver ações urgentes para colocar o direito humano à alimentação no topo das agendas públicas, enfrentando o aumento da desnutrição na região.

Desde que a frente foi criada, parlamentares de diversos países geraram leis de grande impacto na luta contra a fome. No Paraguai, por exemplo, foi aprovada uma lei para proteger a agricultura familiar; no Uruguai aprovaram uma legislação que promove a agroecologia. No Chile destaca-se uma lei de rotulagem muito moderna que está sendo replicada na Guatemala, Paraguai, Argentina, Colômbia e Peru, entre outros países.

Padre João destaca que a primeira experiência de articulação de parlamentares “fome zero” aconteceu no Brasil em 2007, inspirando a criação das mais de 20 frentes que existem hoje em diversos países. “No Brasil nós aprovamos a Lei da Alimentação Escolar, incluímos o direito à alimentação na Constituição e estruturamos, também em lei federal, o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, que hoje é realidade em outros países”, afirmou o parlamentar mineiro.

Discursando para os colegas de outros países, padre João mostrou que desde o ano de 2014 o Brasil vivencia uma destruição diária de direitos sociais e do meio ambiente, e isto se refletiu na precarização das políticas públicas de segurança alimentar e nutricional. “Os novos governos desmontaram instituições e políticas públicas de soberania e segurança alimentar. O Ministério do Desenvolvimento Agrário, que atendia à agricultura familiar, foi fechado e o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA) foi extinto, assim como a Comissão Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica”.

O deputado disse acreditar que a grande tarefa dos parlamentares contra a fome no Brasil é firmar alianças com os movimentos sociais para evitar retrocessos legislativos ainda maiores, que comprometam ainda mais a segurança e a soberania alimentar dos brasileiros. “Nossa luta será em defesa dos territórios, da terra, da água, das sementes e dos bens da natureza, para garantir uma produção limpa de alimentos”.

Fotos: Arquivo pessoal/ Padre João

 

 

about

Be informed with the hottest news from all over the world! We monitor what is happenning every day and every minute. Read and enjoy our articles and news and explore this world with Powedris!

Instagram
© 2019 – Powedris. Made by Crocoblock.