“Ela gosta muito de estudar, está sentindo muita falta”. Essa é a situação que atormenta há mais de 15 dias, uma moradora de Conselheiro Lafaiete, na região Central de Minas Gerais, que não conseguiu matricular a filha de 20 anos, em uma escola estadual, devido a jovem ser cega. No Estado, o ano letivo começou no dia 11 de fevereiro e adolescente, que vai cursar o 1º ano do Ensino Médio teve a matrícula negada.
“A minha filha sempre estudou em escola pública e sempre deu certo. Ela precisa de uma máquina braile, as folhas especiais para a máquina, soroban (instrumento para cálculo) e de um professor auxiliar dentro da sala. E vaga, eles me falaram que tem, mas que não iam matricular por enquanto, porque precisavam ver como iriam atendê-la”, desabafou a mãe Weliane Neiva de Paula Egg.
Sem saber o que fazer para ajudar a filha a se manter nos estudos, a família tem pedido ajuda pelas redes sociais.
“Ela (a filha) já entrou na escola, devido a este problema, quatro anos mais tarde do que deveria. E isso não foi porque ela tomou bomba, mas devido a inclusão, que veio mais tarde”, lembrou a mãe.
A Escola Estadual Geraldo Bitencourt, no bairro Sagrado Coração de Jesus, é a instituição mais perto da casa da família, que mora no bairro São Judas Tadeu. A mãe solicitou a matrícula uma semana antes do Carnaval e até hoje não obteve nenhuma resposta.
A legislação brasileira obriga as instituições de ensino, sejam elas públicas ou particulares, a aceitarem todos os alunos, como explica a advogada Ana Lúcia de Oliveira, presidente da Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/MG).
“Nós temos a lei da diretrizes e bases da educação, temos o plano nacional da educação e a lei brasileira da inclusão de 2015. A educação é direito da pessoa com deficiência. Não se pode negar a matrícula e inclusive tem que ter apoio pedagógico. A discriminação é crime. Os professores devem receber uma capacitação”.
Segundo a advogada, a escola pode ser processada pela família da estudante e a direção pode responder administrativamente e também nas esferas civil e criminal.
“A mãe deve fazer um boletim de ocorrência e levar o caso para a Secretaria de Educação, para que tomem uma medida. Também pode procurar o Ministério Público para denunciar, já que é o órgão fiscal da lei. Ainda, a família pode procurar um advogado e entrar com uma ação por danos morais, porque a estudante está sendo prejudicada, na violação do direto. Mas é importante que família tenha tudo por escrito, documentado, para ter prova ou até gravar as conversas”, orienta.
Ana Lúcia lembra ainda que não há um limite de vagas para pessoas com deficiência nas escolas e que a instituição tem que oferecer os materiais e profissionais para atender as necessidades de cada aluno.
Outro lado
Em contrapartida, a Secretaria de Estado de Educação (SEE) afirma que, “de acordo com a direção da escola, em momento algum foi negada a vaga para a estudante”.
Ainda conforme o Estado, a direção alegou que a mãe da aluna esteve na escola para saber sobre as vagas disponíveis e adquirir informações sobre o processo de matrícula. No entanto, segundo a secretaria, ela não teria levado a documentação e o laudo, que atesta a deficiência da jovem, necessários para o cadastramento da aluna na unidade de ensino.
Na versão apresentada pela Secretaria de Educação, a mãe teria sido informada de que a estudante teria sim a possibilidade de se matricular na escola. A instituição ainda afirma que a direção teria tentado contato com a mulher, mas não teria obtido retorno.
Por fim, a direção da escola afirmou estar aberta e disponível para receber a matrícula da estudante e para todos os esclarecimentos necessários.
A Secretaria de Estado de Educação afirmou, por meio de nota, que todas as escolas da rede estão abertas para receberem matrículas dos estudantes com deficiência. A pasta embasou sua resposta afirmando que a inclusão na escola está prevista na legislação vigente, onde todos têm direito de acesso ao conhecimento sem nenhuma forma de discriminação.
Escola
A Escola Estadual Geraldo Bittencourt conta com 870 alunos matriculados nos três turnos. Esse número envolve os estudantes do Ensino Fundamental, Ensino Médio, Educação de Jovens e Adultos (EJA), Curso Normal Pós-Médio e Técnico de Informática.
Ao ser questionada se há o material e professor auxiliar para atender as necessidades da aluna, a SEE explicou que para casos de deficiência visual, não estão previstos professores. A pasta argumentou que não disponibiliza este profissional uma vez que o objetivo é realizar a inclusão do estudante, e estimular a autonomia e a independência do mesmo.
No entanto, afirmou que são disponibilizados materiais de suporte, como notebook com leitores, ampliadores de tela e sintetizadores de voz para pessoas cegas ou com baixa capacidade visual para estes alunos.
Esses materiais são disponibilizados para o estudante, segundo a SEE, a partir de um laudo apresentado no momento da matrícula atestando o tipo da sua deficiência. Em seguida, a escola faz a solicitação à Superintendência Regional de Ensino dos equipamentos.
Em Minas
Segundo os dados do Educacenso (2014), em todo o Estado, 33.874 estudantes matriculados na Educação Especial, sendo 29.508 matrículas em 2.859 escolas inclusivas (escolas regulares). A maior incidência, segundo a Secretaria de Educação, é refere-se à deficiência intelectual.
A rede estadual conta com 33 escolas especiais, com 4.366 estudantes matriculados nas escolas exclusivas (escolas que atendem somente estudantes com deficiência), segundo informou o governo do Estado.
Fonte:Jornal o Tempo
Imagem:Reprodução