Dona Ana Cândida conversou com o SUPER.FC sobre a relação de amor que criou com o clube ao longo da vida
“Primeiro Deus, segundo meu cardiologista, terceiro o Atlético. O Galo é meu remédio”, aponta a torcedora em entrevista ao SUPER.FC. A alcunha “Vovó do Galo” veio com o tempo, especialmente pela presença constante nas arquibancadas para apoiar o Atlético ao longo das décadas. Nascida em 8 de julho de 1920, dona Ana se tornou uma torcedora-símbolo do clube.
Uma mulher dona de seu tempo. Com um século de vivências, ela não carrega apenas lembranças com o Atlético, mas experiências de vida muito especiais. Firme e bastante lúcida aos 100 anos, a torcedora tem um repertório de valores que faz questão de dividir.
“Primeiro, é pensar positivo. Nunca dei lugar para coisas negativas. Segundo, olhar o ser humano com mais amor, ver o que ele tem de bom e esquecer o que ele tem de errado. Se puder dar uma mãozinha pra alguém, eu darei, como sempre fiz”, aconselha.
Uma relação antiga
A história da Vovó do Galo com o Atlético começou ainda em Conselheiro Lafaiete, sua cidade natal. Os jornais impressos chegavam com certo atraso e sem a frequência dos dias atuais, mas as páginas esportivas acabaram despertando a atenção da professora Ana Cândida. A relação de amor e entrega ao clube tomou como ponto de partida o que ela considera um “mistério”.
“Quando eu olhei o jornal lá no interior, ele chegava mais velhinho, eu abri a página e tinha o lado contrário e o lado do Galo. É um mistério. Meu coração pediu pro lado do Galo. E aí continuei”, relembra a torcedora.
Mesmo apaixonada pela fazenda dos pais e pela rotina em Conselheiro Lafaiete, Ana decidiu se mudar com o marido para Belo Horizonte no começo da década de 50. Na capital, conheceu de perto o clube que a conquistou de longe.
A torcedora se recorda de ir de bonde aos jogos do Atlético no Independência e já levou até um galo vivo para o Mineirão em uma partida contra o Flamengo. Dona Ana não lembra se o animal deu sorte, mas não esquece a bronca que levou da vizinha Maria, dona do animal.
A Vovó do Galo constituiu uma família inteiramente atleticana em Belo Horizonte, um sangue alvinegro compartilhado. Desde então, foram três filhos, cinco netos e um bisneto criados Na mesma paixão. O amor genuíno e doce pelo Atlético é percebido em suas palavras, olhares e em todas as suas manifestações sobre o clube. A torcedora tem seus rituais e brinca que cultiva costumes parecidos com os dos jogadores.
“Você já ouviu falar em mistério? É uma coisa difícil de distinguir. Mistério é mistério. Agora estou sofrendo com esse negócio de não ter jogo. Às vezes eu estou murchada (sic), quieta, mas aí tem jogo. Eu animo, tomo meu banho, me concentro como jogador. Jogador entra em concentração? Eu também. Eles comem banana para não ter câimbra, eu também como. Eu acompanho o Galo de coração”, relata.
Vovó conquista a América
O que cabe em 100 anos de histórias? A Vovó certamente viveu momentos marcantes com o Atlético e cita jogadores que a cativaram, como Carlyle, Taffarel e Luizinho, entre os mais antigos, e Leonardo Silva, Luan e Róger Guedes, entre os mais novos. A torcedora ainda se recorda da experiência mais inesquecível que dividiu com o Atlético, o que certamente é comum a outros torcedores: a conquista da América em 2013.
Dona Ana foi a todos os jogos do Atlético como mandante na Libertadores daquele ano, sempre acompanhada pela família. Na madrugada de 24 para 25 de julho, viu a cobrança de Giménez explodir no travessão de Victor, em decisão contra o Olimpia. A Vovó do Galo viveu a conquista com mais de 58 mil torcedores presentes no Mineirão e outros milhões fora dele. O apogeu de uma paixão.
“Foi a Libertadores (o momentos mais marcante). Eu estava forte, enxergava bastante e aproveitei. Fomos felizes. Só não fui em Marrocos, porque meu cardiologista achou melhor eu não ir. Foi muito marcante para nós”, conta a torcedora.
Para além do Galo
Se da porta para fora dona Ana é conhecida como a Vovó do Galo, símbolo da torcida do Atlético, em casa é chamada de mãe, avó e bisavó. Aos 100 anos, faz questão de lembrar sempre o valor da vida e de transmitir felicidade aos seus, como comenta o neto Marcelo Marques.
“Ela é uma mulher simples, que, apesar de ter nascido num mundo totalmente diferente do que a gente vive hoje, é extremamente atualizada. É impressionante como a cabeça dela evoluiu com o tempo, a forma de enxergar as coisas. Ela não carrega preconceitos da época com ela. Uma mulher evoluída e feliz, que sempre tenta transmitir essa felicidade”, conta Marcelo.
Ana Cândida mora com uma das filhas, com o genro e dois netos. São eles que acompanham a torcedora para os estádios em Belo Horizonte e, quando possível, também fora da capital. Com a idade da Vovó do Galo e as cautelas que são necessárias com ela, às vezes é preciso avaliar se é possível levá-la aos jogos. Esta missão fica nas mãos dos familiares, como conta a neta Sabrina Marques.
“Ela insiste para ir até quando está muito frio. Fala que vai ficar toda encapuzada, pra gente ficar abraçando. Para ela, ela tem que estar sempre nos jogos. No calor, no frio ou na chuva. A gente sempre olha se tem condições ou não de ela ir. Quando não pode ir, fica chateada, acha ruim com a gente, mas porque ela realmente ama o Galo. Ela não vaia, sempre apoia, mesmo quando está perdendo”, comenta Sabrina.