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“Escola pede socorro, não farda”: militarização é criticada em diversas Câmaras da região

A possível implantação do modelo de escolas cívico-militares em cidades da região tem gerado reações contundentes entre vereadores, direções escolares, sindicatos e a comunidade. Conselheiro Lafaiete, Congonhas e Ouro Branco foram incluídas na lista do Governo de Minas como municípios com escolas aptas a aderirem ao projeto, mas o caminho até uma definição está longe de ser pacífico.

Em Conselheiro Lafaiete, cinco escolas estaduais aparecem na lista: Narciso de Queirós, Geraldo Bittencourt, Domingos Bebiano, Augusto José Vieira e General Sylvio Raulino de Magalhães. A resistência tem sido expressiva por parte de diretores, professores e do Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais (Sind-UTE), que tem mobilizado pais e educadores para uma reunião pública marcada para o dia 15 de julho, às 14h, na Câmara Municipal. A proposta será debatida com a participação da comunidade escolar, em um momento considerado decisivo.

Ontem na sessão da Câmara de Lafaiete, o professor Hilário Milagres, diretor da Subsede do SIND-UTE Lafaiete, criticou a falta de informações oficiais e de diálogo com a comunidade escolar sobre os impactos da medida. “Em apenas 19 dias, espera-se que profissionais da educação e famílias decidam sobre um projeto que muda radicalmente o ambiente escolar. Isso é tempo suficiente para uma decisão tão importante que vai impactar o futuro de vossos alunos?”, questionou.

Hilário também mencionou denúncias feitas em outros estados onde o modelo foi implantado, envolvendo casos de violência e tratamento inadequado de estudantes com transtornos mentais como esquizofrenia e Transtorno Opositivo-Desafiador (TOD). “E os alunos que não se adaptarem ao sistema? Serão convidados a sair da escola? Isso é uma forma velada de expulsão”, afirmou.

“Militar não pode ser substantivo”

Em tom combativo, o diretor do Sind-UTE defendeu que o papel da escola pública deve ser democrático, inclusivo e voltado à formação de cidadãos críticos. “Militar na escola não pode ser substantivo, tem que ser verbo. Eu milito, tu militas, ele milita… em favor de uma educação realmente democrática, inclusiva e que instrua o cidadão a ter opinião própria, livre e crítica”, discursou.

Ele encerrou a participação deixando aberta a disposição do sindicato para o debate: “Nos colocamos à disposição para conversar e esclarecer, dentro do possível, pois, na verdade, temos mais dúvidas que afirmações. E, se esse projeto for imposto, ficará a sensação de que nós, educadores, fomos os culpados por tudo o que não vai bem nas escolas”.

A Escola Geraldo Bittencourt está na lista em Lafaiete/REPRODUÇÃO

Congonhas

Em Congonhas, a Escola Estadual Lamartine de Freitas foi apontada como possível participante do programa. A Câmara Municipal já manifestou posição majoritariamente contrária à adesão. Parlamentares têm criticado a ausência de diálogo com a comunidade escolar e apontado riscos à autonomia pedagógica. Nas palavras de um dos vereadores, o modelo “não resolve os problemas da educação, apenas os camufla com aparência de disciplina”.

Para o vereador Rodrigo Mendes (Podemos), o ambiente escolar enfrenta demandas urgentes, como falta de psicólogos, assistentes sociais, profissionais de apoio e infraestrutura adequada. “Lamartine não precisa de militarização. Precisa de atenção, escuta e acolhimento. Precisa de humanização”, resumiu um parlamentar, provocando reações de apoio na Casa.

Ouro Branco

Ouro Branco também entrou no debate após a inclusão da Escola Estadual Cônego Luiz Vieira entre as selecionadas para possível adesão. A vereadora Bruna D’Angela, uma das vozes mais ativas sobre o tema, usou as redes sociais para consultar a população e abriu uma enquete em seu perfil no Instagram. A iniciativa, embora informal, reacendeu o debate na cidade e dividiu opiniões entre aqueles que veem no modelo uma forma de reforçar a disciplina e os que entendem que ele ameaça princípios democráticos da educação pública.

As escolas

As escolas cívico-militares funcionam sob um modelo de gestão compartilhada, onde militares da reserva atuam no setor disciplinar, enquanto os civis permanecem responsáveis pelo ensino. A proposta não transforma as unidades em colégios militares, nem prevê presença armada ou alteração de grade curricular. Ainda assim, especialistas apontam que a presença militar pode gerar ambiente hostil para alunos e professores e fragilizar a gestão democrática das escolas.

Estudos também indicam que a melhoria nos índices de desempenho escolar em modelos similares não é garantida. Em alguns casos, houve redução de notas e aumento da evasão escolar. Críticos também alertam para o custo elevado de implantação, que pode superar R$ 1 milhão por escola, sem que haja comprovação de retorno proporcional em qualidade de ensino.

Com prazo apertado — até 18 de julho — para que as escolas interessadas manifestem oficialmente sua adesão, os próximos dias serão decisivos nas três cidades. Assembleias, audiências públicas e mobilizações devem definir o futuro de cada unidade envolvida.

O que está em jogo, segundo os educadores, vai além de um modelo de gestão: é a defesa da educação pública como espaço plural, democrático e comprometido com a formação cidadã. Em meio a discursos sobre disciplina e ordem, a sociedade precisa decidir se esse é o caminho que deseja seguir para a escola pública mineira.

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