O prefeito diz não querer que a cidade dependa somente da mineração, pois, segundo ele, existe um turismo forte em Congonhas. Anderson Cabido, prefeito de Congonhas, é o décimo primeiro entrevistado da temporada Minas S/A Desenvolvimento e Construção em todas as plataformas de O Tempo. É que Congonhas abriga a obra-prima de Aleijadinho, considerado o maior artista das Américas.
Anderson Cabido quer recolocar Congonhas no Mapa do Turismo do governo federal para apresentar o patrimônio da cidade para o mundo. “Congonhas é uma cidade histórica que tem seis igrejas do século XVIII e em frente aos 12 profetas feitos por Aleijadinho tem um trabalho de recuperação de seis capelinhas com 66 imagens esculpidas em cedro do tamanho real por Aleijadinho que retratam a Paixão de Cristo. Essas imagens têm mais de 200 anos. Estamos fazendo o trabalho de proteção”, conta.
Anderson Cabido conta ainda que Congonhas foi a cidade do Brasil que mais captou recursos do PAC Cidades Históricas. “Foram cerca de R$ 1,5 bilhão para as cidades históricas e Congonhas captou mais de R$ 200 milhões investidos no patrimônio, restauro, ruas, Museu de Congonhas, teatro”, calcula.
O prefeito diz não querer que a cidade dependa somente da mineração, pois, segundo ele, existe um turismo forte em Congonhas. Anderson Cabido fala ainda sobre a universidade federal que vai produzir empresas de base tecnológica proporcionando uma nova alternativa de trabalho e sendo portadora de futuro.
Anderson Cabido também discorre sobre mineração, e a estruturação de um programa robusto de alternativas do mercado de trabalho para os moradores da cidade. Além disso, ele fala sobre arrecadação, impostos, obras na cidade e a necessidade de se criar um ambiente de negócios amigável com crédito, acesso a tecnologia e mercado.
A seguir, a entrevista na íntegra de Anderson Cabido, prefeito de Congonhas:
HL: Quem era o Prefeito Anderson Cabido naquele mandato de 2005 a 2012, e quem é hoje? Você entrou na Prefeitura há 4 meses, basicamente, e nessa nova etapa o que você enxerga da cidade? É copo meio cheio, copo meio vazio, como está a visão do Anderson Cabido de hoje?
AC: Então, a minha visão é uma visão que está associada ao quanto o Mundo, também, se transformou, né. O Mundo se transformou completamente ao longo desse tempo, Deus me deu a oportunidade de continuar me aprimorando, estudando, me aperfeiçoando, mesmo quando eu não estava mais à frente da nossa Prefeitura. Eu entrei em 2005, numa crise terrível que a gente vivia de emprego, uma crise financeira do Município, muito endividado. Vale lembrar que em 2005 foi a primeira geração de prefeitos que veio depois da Lei de Responsabilidade Fiscal, então muitos prefeitos, naquela época, recebiam prefeituras muito endividadas, porque era permitido até então. Olha que absurdo, né, era permitido o prefeito gastar muito mais do que arrecadava e passava a bola para frente, o outro prefeito que tinha que se virar com aquilo. A Prefeitura não é igual ao Governo Federal que tem uma máquina de fazer dinheiro, que manda imprimir dinheiro, como se isso também fosse solução, a gente sabe que não é. Então, hoje isso é um pouco diferente, mas o mundo se transformou, tornou-se muito mais digital, o nível de consciência cidadã cresceu muito, o nível de exigência por parte do eleitor, por parte da população aumentou demais.
HL: As redes sociais, a pandemia… quer dizer, as pessoas estão cobrando mais, não é?
AC: Nossa, as redes sociais transformaram radicalmente a forma de você governar, de você atuar.
HL: A gente está sempre na vidraça, não é?
AC: Está, e não adianta você se esconder. Pelo contrário, você tem que se colocar na vidraça o tempo inteiro, então a gente precisa estar ali divulgando, comunicando, usando mesmo as redes sociais, o que não é simples para nós que nascemos analógicos. Me desculpa te incluir nessa. (risos)
HL: Eu também, claro. Você está com quantos anos?
AC: Eu estou com 54… faço 54 agora essa semana.
HL: Está vendo, eu estou com 55. A gente não tinha essa realidade lá atrás.
AC: Nascemos analógicos e a gente teve que se converter para o digital na marra, mas a gente vivia um mundo analógico ainda. Então, o Mundo se transformou nesse mundo digital, a gente sabe que está acelerando e cada vez mais é uma tendência. Agora, as políticas públicas, antes bastava ter política pública de Saúde, antes bastava ter política pública de Educação, hoje não. Hoje, eu tenho que ter política pública de Saúde para a mulher, para o idoso, para o jovem, para a criança, para a população negra, para o pcd, para o neuro divergente. Então, a gente avança para onde? A gente avança, sobretudo por conta desses avanços tecnológicos todos, a gente caminha em direção a políticas públicas personalizadas. Agora não é mais a política pública para mulher, é uma política pública feita para cada pessoa, porque a gente consegue hoje produzir conhecimento, informação e inteligência para poder gerar isso, e isso muda completamente a forma dos Governos atuarem. Então, se o Governo não se atualiza…
HL: A distribuição de recursos e a segmentação.
AC: A gente vai para uma segmentação extrema, que é a segmentação chegando no nível do indivíduo, que a gente chama da política pública one to one, um para um, que é a política pública feita especificamente para cada indivíduo, e isso faz com que os Governos se alterem completamente, precisem rever por completo a sua atuação, e por isso que é importante a gente estar sempre se atualizando, correndo atrás, investindo na formação da sua equipe de servidores, porque o mundo se transforma e os Governos também se transformam. Existe um uma estatística que fala que dos segmentos todos da sociedade, aquele que mais demora a responder às mudanças tecnológicas do Mundo é justamente a área pública, e não pode ser assim, a gente tem que responder rapidamente, porque as necessidades se alteram, o Mundo se altera a cada dia, o futuro se altera a cada dia, já dizia o poeta “o futuro não é mais como era antigamente”. Então, preparar as nossas comunidades, as nossas cidades para esse futuro super desafiador que a gente tem pela frente é o desafio das atuais gestões, sobre pena da gente, no futuro, ter uma grande separação entre aquelas cidades que conseguiram fazer esse processo de migração e aquelas que não conseguiram e ficaram para trás, e como o mundo digital é muito mais rápido, essa que faz a migração já dispara na frente e as outras vão ficando para trás de uma forma, talvez, irreversível, o futuro vai nos mostrar.
HL: E o que o Anderson Cabido quer fazer, agora, em Congonhas, nesta nova fase, para destravar o Município, desburocratizar, criar um ambiente de negócios cada vez melhor para a Gestão Pública acompanhar esse mundo digital? Não é fácil, mas tem que fazer.
AC: Tem que fazer, você tem que se propor a fazer, você tem que ter a coragem de fazer, você tem que sair da zona de conforto, porque é muito comum a gente chegar e encontrar uma zona de conforto ali e a gente aderir a ela, e não, pelo contrário, a gente precisa sacudir, a gente precisa mobilizar as pessoas, e como é difícil, sobretudo o servidor que às vezes está ali já há muitos anos, não foi devidamente valorizado e tudo mais…
HL: Tem a estabilidade, se fizer bem, se não fizer amém, não vou perder meu emprego.
AC: E você precisa mobilizar essas pessoas, você precisa trazer essas pessoas para o jogo, fazer com que elas entendam que se a gente não se mobilizar, o impacto que isso pode trazer para o futuro da cidade como um todo é ruim, a gente pode ficar de fato para trás.
HL: E, Anderson, eu acho, assim, que Congonhas tem um papel tão importante na história do país, aquele acervo cultural todo que Congonhas tem, que eu não me canso de ir lá visitar, de olhar cada profeta no Santuário de Bom Jesus do Matozinhos. Quer dizer, é um acervo tombado pelo patrimônio mundial da UNESCO, é uma responsabilidade enorme que você tem com esses profetas, com todo o acervo, não somente lá do Santuário, e aí eu vejo você indo lá em Brasília, ao mesmo tempo Congonhas não está no Mapa do Turismo do Ministério do Turismo. Como fazer agora para correr atrás disso tudo e garantir que Congonhas, com todo esse acervo, tenha esse projeto?
AC: Então, é o que você está falando. Congonhas tem a honra e a responsabilidade de abrigar aquela que é a obra prima do camarada (Aleijadinho) que é considerado o Michelangelo das Américas. O maior artista que as Américas viram deixou a sua obra-prima lá em Congonhas. Isso é de uma responsabilidade gigantesca e desde sempre o nosso Governo, no passado, né, e agora retomando, sempre teve um trabalho muito grande de cuidar daquilo ali, de proteger aquilo ali, mas proteger só é pouco. A gente precisa promover aquilo ali para que a cidade entenda que aquilo ali também pode ser uma fonte de prosperidade para a cidade
HL: O turismo, o que ele gera de economia criativa, de recursos, de fonte de renda.
AC: Exatamente, e sem cair naquele lugar comum de ficar reclamando da herança que a gente recebeu. O nosso Governo, no passado, e o que me sucedeu também, porque eu saí em 2012, o Prefeito que me sucedeu saiu em 2020, Congonhas estava no Mapa do Turismo, a gente perdeu essa categoria, esse status importantíssimo nos últimos 4 anos. Então, nós já estamos empenhados para recolocar Congonhas, porque o turismo, não só porque é importante para a Cidade, é importante para poder gerar alternativas de trabalho, renda, emprego para as pessoas, mas o turismo também nos traz uma responsabilidade que é o de apresentar esse patrimônio para o Mundo. Aquelas pessoas que quiserem conhecer esse patrimônio, porque é um privilégio conhecer esse patrimônio, elas precisam ser bem recebidas, bem acolhidas, a gente tem que ter ali uma estrutura adequada para poder receber esses turistas. Então, para além dos benefícios próprios que o turismo gerou, geraria e gerará para Congonhas, a gente tem essa responsabilidade de guardar algo tão valioso e mostrar para o Mundo. Então, aquele que vai sair daqui, da Região Metropolitana, por exemplo, para dar um pulinho ali em Congonhas, ele precisa ser bem acolhido, precisa chegar lá e ver plena conservação desse patrimônio, seja dos profetas e das capelas. São 66 imagens, nós estamos lá fazendo um trabalho agora…
HL: São quantas igrejas lá ?Como está esse acervo?
AC: Congonhas é uma cidade curiosa. Ela é uma cidade histórica, mas como ela é relativamente nova.
HL: Foi emancipada em 1938.
AC: São 88 anos de história. Então, ela não se formou como cidade, e por isso ela tem poucas igrejas.
HL: Mas o que ela tem é um valor agregado que é um dos únicos do mundo.
AC: São 6 igrejas maravilhosas do século XVIII que a gente tem lá, que vale muito a pena conhecer, não só a Basílica, as demais também. A gente está fazendo um trabalho muito especial agora de restauração das imagens, porque todo mundo visualiza os 12 profetas, mas em frente aos 12 profetas tem 6 capelinhas com 66 imagens esculpidas em cedro do tamanho real, tamanho da gente, esculpidas pelo mestre Aleijadinho, que retrata os passos da paixão de Cristo. Agora você imagina, é de 1805 essas imagens, olha isso. Então, nós estamos fazendo 220 anos esse ano.
HL: Mais de 2 séculos.
AC: E cupim? É uma madeira, então nós estamos, agora, fazendo todo um trabalho de proteção.
HL: Pode ser uma madeira de lei, mas ela é suscetível ao tempo.
AC: É suscetível, não tem como, né. A pintura…
HL: Aí vocês estão fazendo todo esse trabalho agora?
AC: Nós estamos fazendo um trabalho lindo, você precisa ver que bacana.
HL: É demorado, demanda recursos. Vocês estão conseguindo esses recursos do Ministério do Turismo? Tem que apresentar projeto, como está essa via-sacra também?
AC: Então, o nosso Governo está remontando toda a estratégia de captação de recursos. A gente sempre foi muito bom em buscar recursos. Congonhas, só para você ter uma ideia e trazer um número, Congonhas foi a cidade do Brasil que mais captou recurso do PAC Cidades Históricas. O PAC Cidades Históricas colocou, sei lá, R$1.5 bilhão para cidades históricas Brasil afora, e Congonhas foi mais de R$200 milhões que a gente investiu no nosso patrimônio, na recuperação, no restauro, na ampliação da nossa área histórica. Ruas, por exemplo, que tinham aquela fiação horrorosa… a CEMIG tem que pensar um dia em como resolver, mas a gente colocou aquilo ali subterrâneo na área histórica toda, a gente fez um museu maravilhoso, que é o Museu de Congonhas, agora foi feito também um teatro maravilhoso que é um dos mais modernos de Minas Gerais, foi feito no Governo que me sucedeu, do Prefeito que agora é meu vice novamente. Então, assim, obras importantes para que o turista vá a Congonhas, tenha prazer de ficar na nossa cidade, gaste o dinheiro lá, gera emprego, possibilita oportunidades para quem não quer viver da mineração. Vai ter o turismo, vai ter a agricultura, nós estamos fazendo um trabalho grande de resgate da produção rural, a população toda veio para a cidade, porque não tinha na zona rural a condição de ter uma vida boa, então estamos fazendo isso. Na área de tecnologia, lá no passado a gente teve a oportunidade de levar uma Universidade Federal para lá, um Centro Tecnológico, e ele hoje está super maduro, já até começou a produzir empresas de base tecnológica, startups, incubadoras que vão proporcionar, também, uma nova alternativa para o congonhense, para o trabalhador, para o jovem congonhense. “Eu quero trabalhar em algo que seja portador de futuro, algo que o futuro vai precisar”. Então ele vai ter, a gente tem ali um curso de Engenharia Mecatrônica para poder trabalhar com robô, a gente tem ali biotecnologia, Engenharia de Telecomunicações, nós estamos aqui numa empresa de telecomunicações, a gente sabe o quanto isso é portador de futuro.
HL: É diversificar a economia local.
AC: É uma obsessão que nós estamos nela, de criar alternativas para que o congonhense não fique excessivamente dependente da mineração, é o conceito, que a gente já falou, da ‘minero dependência’. Esse é um trabalho que profissionalmente eu já vinha fazendo há alguns anos em vários municípios, e agora nós estamos estruturando um programa muito robusto, muito importante, para tirar Congonhas da dependência que a gente tem hoje, excessiva, da mineração.
HL: E como que vocês estão fazendo, Anderson, para poder, primeiro, são dois grandes movimentos: atrair empresas para Congonhas, empresas de todos esses tipos aí, como você falou, tecnologia, atrair essas empresas prestadoras de serviços, de turismo, e ao mesmo tempo despertar nas pessoas um “vamos fazer um curso. Vamos fazer outro curso. Você não precisa nascer e ir trabalhar na mineração. Não é só na mineração que você vai ganhar dinheiro. Você tem um outro futuro aqui”. Quer dizer, é uma balança. Como equilibrar e ter dinheiro para atrair esses dois polos? Quanto custa e o que você está tendo que gastar aí do orçamento para fazer essas parcerias, para ter esses cursos técnicos?
AC: Então, é igual aquela história do sábio. O sábio ensina para a gente “olha, na hora que você transportar os ovos, não coloca todos numa cesta só, porque se aquela cesta cair você está sem nada”. Então, a gente resolveu não depositar todos os nossos ovos na sexta chamada mineração, a gente quer distribuir isso para outros segmentos econômicos que também tem potencial de oferecer para o trabalhador, de oferecer para o nosso jovem oportunidades de levar a vida, de ter uma vida boa. Então, não estamos aqui nos colocando contra a mineração, a mineração é importante para a nossa Cidade, para o Estado, para o País, mas ela não pode viver sozinha, ela precisa estar convivendo com outras atividades econômicas, porque ninguém precisa estar condenado à mineração. Se você quer trabalhar com economia criativa, se você é um artista e quer investir na sua carreira de ator, de dançarino, de músico, você tem que encontrar um ambiente que te proporciona isso na cidade
HL: Você quer abrir uma startup…
AC: Você quer abrir uma startup, você gosta de tecnologia, você gosta de ficar mexendo com computador, com celular, criar jogos, atuar nesse ramo, a cidade precisa te oferecer isso.
HL: Ela tem que ter um ambiente de negócios amigável para isso também.
AC: Esse é o termo, ambiente de negócios amigável, porque o ambiente de negócios amigável, ou seja, um local onde eu possa empreender e que a Prefeitura não está atrapalhando, eu posso empreender e a burocracia não é ruim, eu tenho mão de obra disponível, de qualidade, eu tenho crédito, eu tenho acesso à tecnologia, acesso a mercado, a Prefeitura me ajuda a vender, a Prefeitura eventualmente prioriza comprar do meu negócio, do meu pequeno negócio, então isso tudo estimula, faz com que esse ambiente, local de negócio, vá bem.
HL: E está tendo isso?
AC: É o que a gente fala, né, “cuide do seu jardim que as borboletas aparecem”. Então, quando a gente faz isso, esse trabalho bem-feito, a tendência é de que a gente possa receber novos investimentos, atrair empresas para se instalarem na cidade.
HL: Ter uma cadeia de fornecedores que não seja só para mineração.
AC: Além das próprias empresas locais. Então, assim, para além da mineração, investir nessa atratividade do território é fundamental.
HL: Você estava até falando… vi você falando sobre o projeto da Lei de Liberdade Econômica. Em que ela vai facilitar, qual o ambiente que você está criando para atrair essas empresas?
AC: Então, a gente tem dentro dela uma série de dispositivos que facilitam a vida do empreendedor, como por exemplo aquela lógica do balcão único. O que acontecia antes? O empreendedor que queria se instalar na cidade, ele chegava primeiro no setor de protocolo, aí registrava, aí depois ele tinha que ir na Secretaria da Fazenda, depois tinha que ir lá no Meio Ambiente, depois tinha que ir na Gestão Urbana, no Setor de Obras… virava um tormento, e a gente entende que, primeiro, o empreendedor que está querendo investir na sua cidade, que está querendo pegar seu dinheiro… e eu não vou falar dos grandes, vou falar dos pequenos, às vezes é um dinheiro que ele levou a vida inteira para poder pegar aquilo ali e está querendo montar um negócio.
HL: Trabalhou de CLT, tem o FGTS dele ali que ele quer aplicar.
AC: Esse camarada tem que ser carregado no colo, a gente tem que estender um tapete vermelho, porque é um “maluco” que está querendo investir na sua cidade, que vai gerar emprego, que vai gerar renda, que vai melhorar a arrecadação, que vai diversificar a economia.
HL: Aí ele olha e fala assim “não vou mais não, vou deixar esse dinheiro no Banco”.
AC: É. Essa lei é um programa que o Sebrae também vem desenvolvendo já há alguns anos para melhorar, simplificar e desburocratizar a vida do empreendedor. Sabe aquela coisa de você ter que provar para a Prefeitura que você não é bandido, onde você mora, e você tem que trazer documento registrado com a assinatura reconhecida, você tem que provar para a Prefeitura que você não está devendo ela, você tem que dar uma certidão negativa. ‘Pô’, se alguém está me devendo, eu tenho que saber, você não tem que me provar que não está.
HL: Se está na dívida ativa ou não, aí ela tem que ficar pegando um monte de coisa no cartório.
AC: Exatamente. É simplificar a vida de quem quer empreender, é simplificar a vida de quem quer pegar o seu recurso e gerar riqueza no nosso município. Então, nós estamos investindo e apoiando muito isso, e aí isso vai muito direcionado para os empreendedores locais, para o nosso comércio local, sabe por que, Helenice? Porque vai acontecer uma coisa importante nos próximos anos lá na nossa região, que é a duplicação da rodovia.
HL: Importantíssimo.
AC: Graças a Deus.
HL: Nossa, até que enfim, Anderson. Eu sou de Barbacena e quando eu passo perto de Congonhas, gente, o que é aquilo.
AC: E parece que dessa vez vai sair mesmo. O Governo Federal está empenhado para que essa duplicação saia.
HL: Fizeram a licitação de uma maneira correta, não pelo menor preço, então o pessoal não vai desistir.
AC: E a melhor das notícias, a obra vai começar por Congonhas, vai começar no nosso trecho ali. E aí, o que acontece quando fica fácil?
HL: Todo mundo quer ir para lá, né.
AC: Mas fica fácil sair também. Então, para o consumidor local, para o consumo das famílias, “ah, agora está fácil chegar em Belo Horizonte, vou fazer minhas compras em Belo Horizonte”. A gente precisa melhorar nosso comércio. Então, esse esforço todo também é para poder reter essa riqueza, que hoje já sai e com a duplicação da 040 pode até piorar, pode até sair mais, porque um dos grandes desafios que os municípios mineradores tem, que os municípios menores, como é o caso de Congonhas, que tem 55 mil habitantes, é o de reter a riqueza no seu território, é a Prefeitura comprar mais localmente, porque quando eu compro fora, eu estou mandando dinheiro para fora. Quando uma pessoa sai da cidade para poder comprar na cidade vizinha, nós estamos pertinho de Belo Horizonte, pertinho de Lafaiete, é o dinheiro que está indo embora. Quando eu entro no comércio eletrônico, eu não vou fazer propaganda para nenhuma plataforma aqui, mas quando eu entro no comércio eletrônico e compro ali de uma empresa no comércio eletrônico, estou mandando esse dinheiro lá para a China, quiçá na melhor das hipóteses para São Paulo, para Belo Horizonte, então estimular as pessoas a ter essa consciência de fortalecer e melhorar o nosso comércio para a gente poder comprar aqui no nosso comércio. Inclusive, a gente está pensando em criar uma plataforma de comércio eletrônico de Congonhas, porque antes de eu entrar lá numa dessas plataformas famosas que tem por aí, eu vou entrar no Congonhas.com e vou comprar no comércio da cidade.
HL: Comprar no comércio do fornecedor que está morando ali em Congonhas.
AC: Então, reter essa riqueza nos territórios é importante, porque ela é muito valiosa. Quando eu retenho, ela fica circulando ali na economia, e toda vez que ela está circulando internamente, ela está gerando mais empregos, mais prosperidade na cidade.
HL: Você tem esse desafio aí e também tem que conviver com todas as obras que a cidade tem que fazer. Você me disse que Congonhas está com um orçamento aí de R$1 bilhão de arrecadação, é uma grande arrecadação, é uma das cidades mais ricas de Minas Gerais pela arrecadação. Qual é a prioridade sua com esse dinheiro? A gente tem várias coisas para fazer numa cidade, tem obra, tem saúde, educação, essa capacitação de mão de obra, escola, tem tudo, né. O que você, para esses próximos 4 anos, assim, já está delineando, Anderson?
AC: Então, existem questões que são de curto, médio e longo prazo. Aquilo que é de longo prazo a gente até falou bastante aqui, que é essa questão de a gente diversificar a economia, torná-la menos dependente, isso não acontece rapidamente, isso acontece no longo prazo, e daí a importância de termos políticas públicas que sejam duradouras, que perpassem um Governo e outro, porque é de longo prazo.
HL: Não vai dar só para ser feito no seu Governo, são vários.
AC: Nessa perspectiva de longo prazo, lá atrás a gente trouxe uma Universidade para lá, que não tem relação nenhuma com a mineração, os cursos que a gente tem ali nenhum está relacionado a mineração, propositalmente, para que ela pudesse, a partir de agora, começar a produzir esses efeitos sobre o perfil econômico da cidade e deixá-la menos dependente da mineração, isso no longo prazo. Você vê, tem 18 anos o nosso Campus, né, agora que a coisa começa a causar esse efeito. Agora, do ponto de vista do imediato, nós temos os problemas relacionados à saúde.
HL: Como toda Cidade, né. São UPAs lotadas…
AC: A gente viveu uma desorganização, nos últimos anos, do nosso Sistema de Saúde e a gente está recuperando-o agora. A gente tem uma UPA, que também é herança do meu Governo e do Governo que me sucedeu, o nosso hospital que está sob intervenção já há mais de 10 anos, então nós estamos preparando, a gente tem um projeto de construir um novo prédio para o nosso hospital, que já é um prédio um pouco mais antigo, já não tem a condição de espaço físico, inclusive, para poder atender, mas a nossa rede assistencial está sendo toda reorganizada.
HL: São quantas UPAs? E tem um hospital.
AC: É uma UPA e um hospital, e isso é bem suficiente. Então, inclusive, estamos começando agora a fazer o atendimento de urgência e emergência de baixo risco, aquele da pulseirinha azul e verde.
HL: Média complexidade já tem que vir para Belo Horizonte?
AC: Não, a gente atende, e a gente não atende apenas Congonhas, a gente é um polo de saúde e atendemos 5 outras cidades ali e, assim, a gente tem, na medida do possível, atendido bem, mas estamos no nosso limite. Então, é necessário a gente dar esse novo salto que a gente está preparando aí. Se Deus quiser, ao longo dos próximos anos, a gente vai estar…
HL: Você já tem o orçamento, Anderson, já delineado? Qual vai ser a necessidade para investir na Saúde?
AC: Você falou agora há pouco do orçamento de Congonhas, é algo em torno de R$ 1 bilhão. A gente, hoje, a área que a gente mais investe no município é a área de saúde, cerca de 30% a 35%, sendo que a obrigação do município é investir 15%, o resto deveria vir do cofinanciamento com o Estado e a União, mas a gente põe 35% do nosso orçamento, e a gente espera tirar daí, e de uma parceria também com o Governo Federal, que já começamos a negociar, os recursos para poder construir o novo prédio do hospital, que a gente acha que vai atender bastante, não só a nossa cidade, mas as cidades que estão sob a nossa responsabilidade.
HL: É um hospital de quantos leitos?
AC: São 150 leitos de estimativa. Hoje, no nosso hospital são 75 leitos, sendo que desses 10 são de UTI. A gente pretende levar 20 leitos de UTI e 150 ao todo. É um investimento alto, mas é bem suficiente para poder atender, ainda, por muitos anos a nossa cidade, essa estrutura nova que a gente está propondo.
HL: Esse hospital, você pretende que ele esteja pronto nos próximos 2 ou 3 anos?
AC: A gente pretende entregar o primeiro módulo dele, porque o hospital é algo que a gente vai aos poucos construindo.
HL: É, o enxoval é caro, são vários equipamentos, botar ele para funcionar é um outro orçamento.
AC: E a gente quer ampliar para serviços que não tem hoje, como por exemplo serviço de hemodiálise, a gente não tem hoje na cidade.
HL: A pessoa tem que vir para a capital.
AC: Ou para Belo Horizonte, ou mesmo para Lafayette, ou eventualmente para Barbacena. Então, a gente pretende, até o final desse nosso mandato, já estar com a primeira parte do hospital operando. É claro, exige um esforço enorme, porque não é um recurso pequeno.
HL: Qual é o volume de recursos num hospital desses?
AC: A gente está imaginando que vai ser algo em torno de R$300 milhões.
HL: Que é o que geralmente demanda mesmo, né. E isso vai ter recurso do Governo Federal? Você já foi lá no Ministério das Cidades?
AC: Iniciamos as conversas, nós estamos ainda bem no início do Governo, mas já abrimos esse diálogo lá, uma sinalização, o Governo Federal também tem sensibilidade para essas questões, e a gente imagina que vai ser possível.
HL: Não vai ser um orçamento só da Prefeitura não, né?
AC: Não vai, espero que não.
HL: É, porque senão também acaba comprometendo muito do orçamento.
AC: E o resto das demandas estão aí. A gente tem um outro problema crônico da nossa cidade que é o de mobilidade, então é uma cidade que tem muita dificuldade de mobilidade, porque está muito sobrecarregada de veículos e tudo mais, e são ruas estreitas, é uma cidade histórica.
HL: É uma cidade histórica que tem todos aqueles impedimentos.
AC: Então, a gente tem um plano de expansão urbana ousado para os próximos anos, estamos concluindo um plano diretor, um plano de mobilidade.
HL: O que tem de, assim, que você pode adiantar, uma coisa que vai mudar o traçado da cidade?
AC: Então, a parte central da cidade é conhecida, também, com o nosso sítio histórico, então ela não está muito afeta a grandes intervenções, porque a gente tem ali também… está tombado, a gente tem que proteger ali alguma coisa, mas mesmo assim algumas intervenções vão ser feitas. Agora, a principal lógica do plano diretor é a gente tirar a sobrecarga que hoje tem no centro, é como se a gente estivesse criando um outro centro numa outra região da cidade, e para isso nós vamos tirar a Prefeitura, vai ter um Centro Administrativo. Hoje, a Prefeitura tem mais de 70 imóveis alugados, a gente gasta, hoje, cerca de, sei lá, R$ 500 mil por mês só com aluguéis. Então, com o Centro Administrativo, a gente vai gerar essa economia e, principalmente, vamos tirar todo esse volume de tráfego que hoje chega para o centro da cidade.
HL: E unificar tudo também, não é, Anderson?
AC: E aí gera eficiência, isso gera um serviço público de qualidade para a população.
HL: Mais rápido, mais ágil, em um lugar só, faz tudo ali, é tipo uma Cidade Administrativa, mas do porte de uma cidade de Congonhas. Então, vocês vão construir, também, esses prédios todos?
AC: Que é que é necessário para a gente poder gerar esse padrão de eficiência que a gente imagina, melhorar o atendimento da população, tirar a Prefeitura da concorrência por imóveis, porque, assim, uma das coisas que a mineração causa é a elevação dos preços de aluguel.
HL: Todo mundo tem que ir para lá, morar lá. Como está essa questão? Está uma bolha?
AC: Então, a Prefeitura hoje conta, porque ela está lá alugando também. Quando ela parar de alugar, esses imóveis todos vão para o Mercado, vão estar disponíveis, e a tendência é que os preços de aluguéis diminuam. A gente falava agora há pouco de um ambiente de negócio amigável, se os preços dos aluguéis estão nas alturas, se o comércio tem que ‘urrar’ para poder conseguir pagar o aluguel, não está sendo amigável esse ambiente de negócio, então a gente precisa torná-lo melhor, inclusive, fazendo os preços de aluguéis baixarem, aluguéis de lugares comerciais, quanto aluguéis residenciais.
HL: Quanto está o preço, assim, hoje? O metro quadrado.
AC: É dificílimo encontrar, e quando encontra os preços são muito caros, um padrão de imóveis nem tão bons assim, o que é uma outra preocupação que a gente tem. Portanto, voltando à sobrecarga, a mineração causa o aumento dos preços dos aluguéis.
HL: É, as pessoas têm que morar lá…
AC: Quando a gente tirar a Prefeitura do centro, a gente vai gerar uma disponibilidade de imóveis importante, aí vamos começar a melhorar a mobilidade urbana em Congonhas. Vamos restringir, agora, o tráfego de ônibus.
HL: Também, né, porque caminhões já não podem desde a sua época lá do primeiro mandato.
AC: E ônibus que vão para a mineração, que passam dentro da cidade e que passam no centro, muitas vezes.
HL: Porque também dá o tremor, né? O ônibus também vai rachando tudo pelo peso. Não tem o peso de um caminhão de minério, mas tem um peso também.
AC: Você tem toda razão, tem esse peso, tem esse impacto, mas também o impacto na mobilidade, porque ele está ali lotando a cidade. Então, a gente está propondo alternativas viárias, no nosso plano diretor, para poder facilitar todo esse sistema de mobilidade. Então, assim, concluindo, eu falei daquela visão de longo prazo, essa visão de curto prazo, que é a saúde, é um curto/médio, porque envolve o hospital, e no curto prazo também esses investimentos para poder melhorar a mobilidade. A gente quer, também, retomar muito o padrão de qualidade da Educação, que a gente já teve, Congonhas já foi considerada um dos melhores Sistemas Públicos de Educação de Minas Gerais, premiadíssimo e tudo mais, a gente perdeu isso nos últimos anos e vamos trabalhar para poder recuperar, porque a Educação é essencial para transformar a vida das pessoas.
HL: O que você está pretendendo para Educação, assim, não somente escolas, mas na capacitação do professor, do aluno, ter cursos de línguas, cursos técnicos… você está buscando parcerias também, Anderson?
AC: Estamos buscando parcerias e estamos construindo uma estratégia que vai para além da gente fazer o investimento todo em infraestrutura, em melhoria das escolas, construção de novas escolas, material escolar, uniforme, essa coisa toda que é importante, mas existe todo um trabalho de valorizar o trabalho do professor, não pode ser diferente. Então, tem a valorização do professor, mas também capacitar os professores. Na verdade, o que a gente vê, esse futuro que se avizinha, que a gente está falando aqui, esse futuro da Revolução Digital, da sociedade 4.0 e tudo mais, ou 5.0, tem autores que tratam diferente, é muito importante que os jovens e que as crianças desenvolvam aquelas habilidades socioemocionais que uma escola não cuida muito.
HL: É o soft skills que o pessoal gosta de falar no mercado, né?
AC: A soft skills. Então, assim, capacidade de analisar problemas, de tomada de decisão, de trabalhar em grupo, de pensamento abstrato, de lidar com as pessoas, isso é fundamental. Então, a gente está aproveitando que estamos ampliando a nossa oferta de tempo integral nas nossas escolas para além da matemática, do português, do inglês, da física, da química para a gente poder também trabalhar essas habilidades, e claro, além da cultura, das atividades culturais, de aula de música, de dança e do esporte, a gente também poder trabalhar essas competências que são decisivas e fundamentais para esse mundo, de uma sociedade cada vez mais digital.
HL: Cada vez mais individualista, mas não adianta ter só cursos…
AC: Mas aí é que está, que ótimo você ter falado. A gente precisa tirar ele desse mundo do individualismo, porque, na verdade, ele está sendo impulsionado cada vez mais a pensar só nele.
HL: E aí depois tem que mexer ali no Mercado de Trabalho com um monte de gente dentro de uma empresa, não sabe.
AC: Então, assim, romper essa lógica do individualismo, resgatar a perspectiva da vida em sociedade, de se preocupar com o próximo, de se preocupar com o outro, isso é muito importante, e é importante também a gente trazer para ele, que é um outro trabalho que a gente já está começando em parceria, de novo, com o Sebrae, eu sou suspeito para falar do Sebrae, eu sou de carreira lá, que é o trabalho de desenvolver competências empreendedoras, porque as nossas cidades precisam ser sonhadas, o empreendedor tem esse poder de sonhar, o empreendedor é aquela pessoa que sonha e que executa, e sonhar pequenininho e sonhar grande dá o mesmo trabalho. Então, os nossos meninos e as nossas meninas precisam aprender a sonhar a cidade como ela precisa ser sonhada, sonhada por esses jovens, por essa geração que vem aí, eles sonharem o nosso turismo, entendeu? Poxa, por que que a gente não tem aqui um restaurante, um estúdio, uma coisa ligada à economia criativa, bacana? Por que a gente tem uma universidade produzindo tanto conhecimento aqui e a gente não tem empresas de base tecnológica? Esse sonho precisa povoar a mente dos nossos jovens. Então, a nossa educação caminha muito na perspectiva de trabalhar soft skills, competências interpessoais e tudo mais, mas de trabalhar a capacidade dele de sonhar. A gente não quer gente só sonhando em trabalhar na mineração ou gente sonhando só em ser caminhoneiro, ter um caminhão para poder puxar minério. Quem gosta, bacana! A Prefeitura tem que apoiar, mas não pode ser só isso.
HL: Lá tem minério para mais de 100 anos, como você disse, a reserva, mas tem mais no mundo, não dá para ser só isso.
AC: E quando a gente amplia os horizontes, as pessoas são muito mais felizes, porque o que faz as pessoas felizes é elas saberem que elas têm oportunidades de escolha, que elas não estão condenadas a um único caminho, a um único destino.
HL: Vai nascer, vai ter que ser aquilo na cidade, para ficar na cidade tem que trabalhar só com mineração. Falando em mineração, Anderson, a gente sabe da importância que tem a mineração para a cidade, ela já foi aí um dos principais pontos de mineração de ouro, hoje tendo o minério de ferro, a economia dela é toda baseada, praticamente, na arrecadação e tudo. Você mesmo falou que lá tem reservas de minério para mais de 100 anos, quer dizer, a cidade vai continuar trabalhando com a mineração e é isso aí que você quer também diversificar. Como está, hoje, a mineração em Congonhas? A gente tem novos investimentos, eu estive lá também e vi o seu discurso sobre a expansão da Gerdau (na Usina de Ouro Branco que faz divisa com Congonhas) num investimento de mais de R$ 1,5 bilhão para produção de mais bobinas a quente, quer dizer, para um novo mercado. Eu conversei com o CEO da Gerdau (Gustavo Werneck) e ele falou da importância da usina para a empresa, e tem outros investimentos lá, só que o investimento da Gerdau é de um valor agregado, não é para exportar minério, é para produzir lá na região gerando mais empregos. Como está situado hoje, qual é o desafio que você vê para mineração lá?
AC: Então, a gente tem, em Congonhas, essa condição de a gente ter a mineração e já ter a siderurgia, então uma parte da cadeia produtiva está presente…
HL: Não é só commodity, não é só exportar matéria-prima, né.
AC: É, mas ainda assim é muito menos do que a gente precisa do ponto de vista de agregar valor.
HL: O potencial que tem.
AC: A gente exporta muita matéria-prima, muito minério in natura, se é que a gente pode usar esse termo.
HL: No vagão, né, e vai embora…
AC: No vagão e vai embora, e a riqueza ainda… a gente não falava da família que sai para poder comprar fora da cidade? É uma forma da riqueza ir embora também, quando eu não agrego valor a ela, porque a minha economia não é suficientemente competitiva para eu conseguir agregar valor à sua produção. Isso acontece muito com quem produz café, que o café vai embora, com quem produz leite, que o leite vai embora, não beneficia a quem produz o leite ali e tudo mais, então esse é um desafio que os municípios têm e o nosso não é diferente. A mineração, em Minas Gerais, tem um histórico de conflito muito grande com as cidades, porque as nossas cidades surgiram em torno da mineração, primeiro da mineração do ouro, e ali, com a exploração aurífera, foram surgindo as vilas, as cidades, e depois, naquela mesma região ali, a mineração do ferro. Então, existe uma proximidade muito grande que gera um impacto direto sobre as cidades, e infelizmente a gente não tem uma postura, uma parceria tão positiva assim das empresas nesse relacionamento com a cidade para poder ajudar a minimizar os impactos que elas causam, e o impacto é grande, não é só o impacto ambiental, que é enorme, que é importante, mas não é só o impacto ambiental da poeira, do desmatamento, do risco das barragens e tudo mais, da utilização da água que elas usam, ainda usam. Agora que estamos indo para a mineração a seco, mas ainda usam muita água, então compromete, muitas vezes, o fornecimento de água nas comunidades.
HL: Tem um grande investimento lá da CSN, né, está até prevendo R$ 15 bilhões para aumentar para 16,5 milhões de toneladas de minério de ferro para exportar para o Japão e Oriente Médio. Vocês têm conversado, por exemplo, com essa empresa grande, que é a CSN, que já tem a mina Casa de Pedra, que já é um investimento antigo, nessas contrapartidas? Porque só na obra, eu estava vendo, são mais 4 mil pessoas lá, e 4 mil pessoas são mais que impactos? Na saúde, na educação, a pessoa vai ter que ficar morando lá, quer dizer, o ônus está só com a Prefeitura ou você já iniciou um diálogo, apesar dos seus apenas 4 meses de Governo?
AC: A gente já iniciou o diálogo e já sinalizamos a nossa discordância com o método. A gente entende que a mineração é importante, mas para Congonhas, e essa é a realidade, eu diria, de algumas outras cidades, a mineração está no seu limite.
HL: As pessoas querem a mineração?
AC: Elas querem a mineração, não querem mais mineração, é diferente. Uma coisa é eu querer a mineração do jeito que ela está hoje, que já é bem conflituosa a relação. Crescendo ainda mais, o impacto na qualidade de vida tende a piorar, porque não cabe mais falar de emprego. Vai gerar emprego, mas não para o congonhense, porque hoje a gente já tem muitos trabalhadores que vem de fora, são centenas de ônibus todos os dias trazendo trabalhadores de fora. Então, falar que vai gerar emprego… e pior, o que aconteceu nos últimos anos? A empresa não se preocupou em dar ao congonhense os melhores empregos, os melhores salários, não se preocupou em continuar investindo na qualificação do nosso trabalhador para que ele pudesse ocupar esses postos.
HL: Esses postos vêm de profissionais de fora?
AC: Profissionais de fora, muitos deles, inclusive, de Belo Horizonte. A gente estima que deve ter 20 ônibus de Belo Horizonte todos os dias indo e voltando. Nada contra o trabalhador daqui…
HL: Claro, você quer que tenha pé de igualdade com os moradores de Congonhas.
AC: A empresa perde a oportunidade de maximizar um benefício que ela poderia gerar para a cidade. A gente não falava agora há pouco, de novo, da história de reter riqueza? A gente não falava agora há pouco que a Prefeitura tem que tentar comprar, cada vez mais, na cidade? A mineração não faz isso, as mineradoras não fazem isso, não priorizam os fornecedores locais quando poderiam estar priorizando. Então, é uma forma de você maximizar a sua presença ali sem que ela gastasse quase nada ou nada a mais, porque muitos dos nossos fornecedores ali têm condição de atendimento e pela proximidade têm até, às vezes, uma competitividade maior, né, mas falta uma política nesse sentido, então, assim, não é por conta da arrecadação, não é por conta dos empregos que vão ser gerados. A cidade, se a gente está falando de exaustão mineral, que um dia o minério vai acabar, vai ser exaurir, mas a paciência da cidade já se exauriu, as pessoas estão cansadas com o impacto que a mineração causa. Então, é necessário que a gente contenha um pouco esse crescimento e essa sanha por produzir cada vez mais, mais e mais, porque isso gera, além dos impactos ambientais, que são relevantíssimos, não estou diminuindo em nada a importância deles aqui, gera um impacto, também, social de sobrecarga na vida das pessoas, que as pessoas também chegam a um momento que se cansam, que se esgotam, que adoecem.
HL: E querem saber do Prefeito Anderson Cabido o que ele vai fazer para poder melhorar a qualidade de vida na cidade.
AC: Exatamente, e com esse azar da gente termos empresas cujo diálogo não é tão simples, não é tão fácil.
HL: Você quer melhorar esse diálogo?
AC: A gente quer melhorar, mas sobretudo a gente quer melhorar a contrapartida dessas empresas para com a cidade. Estou falando das empresas todas, a gente quer melhorar a contrapartida e o cuidado que essas empresas têm que ter com a cidade, porque não basta falar que está pagando o royalty da mineração, que é a Cfem. Cfem é obrigação, Cfem é o preço que ela paga por um bem que está debaixo da terra, que pertence a você, que pertence a mim, que pertence a sociedade brasileira, aquele bem que está debaixo da terra não pertence a ela, pertence a sociedade brasileira, porque a constituição fala assim. Quando ela extrai aquilo ali, ela tem que pagar como se fosse uma indenização, é um preço que ela paga por uma matéria-prima que te pertence, que nos pertence, e ela paga muito pouco por isso, paga 3,5%, e esses 3,5% ainda vão ser distribuídos entre União, Estados e os Municípios impactados. Então, é necessário que haja um olhar diferente que passa, por exemplo, com um respeito a cidade, a sua legislação. Muitas dessas empresas, às vezes, nem pagam os impostos que devem ao município.
HL: Você me disse que tem uma questão aí que você está trabalhando na Agência Nacional de Mineração, que é a agência reguladora do setor, de fiscalização, mas que por um lado tem só dois fiscais para o Brasil inteiro e que está tendo aí uma sonegação de impostos, né? Como você tem feito esse trabalho agora? Estou vendo que você tem ido muito a Brasília para poder estreitar esse diálogo, você, como uma pessoa do mesmo partido que o Vice-Presidente Geraldo Alckmin, o PSB, tem toda uma história aí também do PSB, como tem sido esse trabalho, Anderson?
AC: Então, esse trabalho tem sido liderado pela AMIG Brasil, que é nossa Associação Brasileira dos Municípios Mineradores, presidida pelo Prefeito Marco Antônio, de Itabira, grandíssimo amigo, também do nosso partido.
HL: Fiz uma entrevista com ele. Ele, também, enfrenta uma outra questão da Vale.
AC: Mas eu não sei se na sua conversa, não estou lembrado, eu assisti, mas não estou lembrado se ele tocou no assunto dessa sonegação, porque não somos nós Municípios que estamos falando, um relatório do Tribunal de Contas da União identificou que nos últimos 10 anos houve uma sonegação de aproximadamente R $20 bilhões das empresas mineradoras no Brasil nas nossas cidades.
HL: É um problema nacional.
AC: R$ 20 bilhões arrecadados a menos, e porque a gente não tem também ali uma equipe adequada de fiscais para poder fazer esse acompanhamento nas nossas cidades. E não tem por quê? Porque a Agência Nacional de Mineração não consegue fazer o concurso, o concurso não é aprovado, não é autorizado e tudo mais. São 40 mil processos minerais que a gente tem no Brasil para 2 ou 3 fiscais, é impossível. De fato, a gente precisa desse trabalho e o que a gente vê, inclusive lá na minha cidade, é que a produção está aumentando e a arrecadação com o royalty, o Cfem, vem diminuindo.
HL: Vem diminuindo?
AC: Vem diminuindo. Então, assim, no mínimo é estranho, para dizer pouco, é estranho, porque não tem fiscalização, então…
HL: E são várias empresas?
AC: Então, é necessário que haja esse trabalho. A AMIG vem fazendo essa pressão sobre o Governo.
HL: Você é da diretoria da AMIG.
AC: Eu estou na diretoria, inclusive, responsável por fazer o trabalho de diversificação econômica nos municípios mineradores, minerados, eu gosto de falar minerados, e aí é fundamental que haja esse trabalho e essa conscientização, mas bom seria se você não precisasse ser fiscalizada para pagar seus impostos, bom seria que a gente tivesse um sistema informatizado que cruzasse as informações, e como é hoje o nosso imposto de renda, que se você tem uma receita, uma despesa e tudo mais, depois já vem, porque está tudo amarrado, está tudo digitalizado. O nosso sistema de apuração da Cfem não é assim, ele ainda é bastante analógico, então é necessário que haja esse investimento da parte da agência, é necessário que haja esse investimento também do ponto de vista de fazer o concurso público, mas sobretudo que haja a conscientização das empresas de entenderem que elas não precisam ser fiscalizadas para poder pagar adequadamente o que elas devem à sociedade brasileira. Lembrando que esses royalties, uma parte vai para os municípios, mas a outra parte está indo para o Governo do Estado, outra parte está indo para a União, então está a serviço da sociedade como um todo. E só para concluir essa parte, eu acho que ela é muito importante, esse trabalho de fiscalização, que o município poderia ajudar, o município também tem suas limitações. Então, a gente está vendo aí um baixo nível de compromisso, de comprometimento das empresas com os territórios onde elas estão localizadas, e o apelo que a gente faz é esse, né, então quando você pergunta como está o diálogo com as empresas, a gente está tentando construir esse diálogo, mas num outro patamar, em detrimento do interesse público local. A gente precisa respeitar e olhar muito o interesse público local, porque as pessoas adoecem, a cidade adoece, isso gera um impacto que é um impacto, muitas vezes, difícil de ser absorvido pela população.
HL: Então, você está com uma missão aí… a gente já está no final, Anderson, como passa rápido, né? São vários assuntos, vários desafios, conversa boa.
AC: Conversa boa, e você com as suas perguntas sempre cirúrgicas.
HL: Esse povo de economia é terrível, né! (risos) Eu quero sempre saber de números e planos plurianuais, o que nem sempre é possível, e você está acabando de entrar aí, não é, são 4 meses só (como prefeito), e com chão pela frente de 4 anos, mas eu tenho certeza de que vai conseguir fazer o que você está se propondo aí. E esse diálogo que tem que ter com o Governo Federal, Governo Estadual para poder… a Prefeitura sozinha não consegue fazer tudo, tem que ter esse pacto federativo, não é? Você acha que está faltando um pouco, tem que dar uma ajustada nos pinos para ter um diálogo maior?
AC: É fundamental que haja esse entendimento nas 3 esferas: União, Estados e Municípios. Os Municípios precisam ser mais ouvidos, mas antes disso, que não haja sempre uma prevalência do interesse econômico, porque muitas vezes é o interesse econômico subjugando os demais interesses da sociedade, é pelo lucro de alguns poucos que a gente prejudica uma coletividade inteira. Então, esse equilíbrio precisa voltar um dia, nem sei se já existiu alguma vez, mas ele precisa ser maior entre compatibilizar o que é interesse privado e submetê-lo ao interesse público, não é o contrário, não é o interesse público que precisa estar submetido ao interesse privado. Então, a gente tem defendido muito, eu já venho defendendo há algum tempo, e lá em Congonhas agora a gente vai tentar avançar nisso, eu nem tive a oportunidade de comentar isso com você, sei que o nosso tempo já está praticamente encerrado, que é a necessidade dessas empresas terem um negócio que a gente está chamando lá de licença social. Então, não basta ter só a licença ambiental, que é importantíssima, inclusive graças a ela a gente tem conseguido conter algumas coisas aí, mas é pouco, para os dias de hoje a licença ambiental é pouco, a gente precisa ter, de fato, uma licença social, e a nossa proposta em Congonhas, e a gente vai propor isso, inclusive, do ponto de vista de legislação, que a gente tenha uma licença social. Então, para você operar você tem que ter sua licença ambiental, mas você também tem que ter a licença social.
HL: Essa licença social seria criada em nível municipal ou também em nível estadual e federal?
AC: A gente espera, um dia, quem sabe, poder chegar no nível dela ser adotada a partir da União, uma legislação federal e tal, mas a gente vai buscar fazer isso inicialmente no âmbito municipal. A academia já vem debatendo muito esse conceito há algum tempo, existem muitos, inclusive, um grupo de pesquisadores com quem eu tenho contato aqui no Brasil vem debatendo bastante, várias universidades vêm debatendo esse conceito da licença social, mas ainda é um conceito muito ligado à responsabilidade social, a iniciativa partindo da empresa, e o que nós estamos propondo agora é o seguinte: quem concede a licença é o município.
HL: E o que teria nessa licença social, na visão do Anderson Cabido?
AC: Então, nessa licença social a gente precisa fazer a mitigação dos impactos sociais que ela causa, seja os impactos na sobrecarga do serviço de saúde, na educação, na mobilidade, a própria mão de obra, então, assim, a mão de obra que ela utiliza, por exemplo…
HL: Ter vagas para a cidade…
AC: Vagas para a cidade, mas vagas também para as mulheres, por que não? Porque a mineração oferece muito mais empregos para os homens do que para as mulheres, mas as mulheres já têm total condição de ocupar os mesmos espaços que os homens ocupam, mas é muito masculino, então acaba indo mais para os homens. Então, a licença social vai observar vários desses aspectos. Uma coisa importante, bem rapidinho, você sabe que essas empresas são grandes contribuintes da Lei Rouanet, elas aportam recursos em projetos da Lei Rouanet no Brasil todo, e para onde você acha que vão os maiores recursos da Lei Rouanet dessas empresas? Vai para o Eixo Rio/São Paulo.
HL: Ou seja, ter uma reserva de mercado também para Minas Gerais.
AC: Poxa vida, o que a gente tem de projetos culturais, de formação cidadã, de formação de talentos e tudo mais nas nossas cidades e que poderiam ser mais apoiados, melhor apoiados ainda e tudo mais com o recurso que ela já paga, mas que está sendo mal alocado, porque quer eventualmente atender… enfim, privilegiar alguém do interesse em detrimento do interesse das comunidades locais.
HL: Aí você tem que passar esse projeto pelo crivo da Câmara Municipal, tem que ter um diálogo com eles. Você pretende, então, também fazer essa Lei ainda nesses 4 anos? Nesse ano, ano que vem, você já pretende ter isso aprovado?
AC: A gente já tem um esboço dela.
HL: Você vai apresentar esse projeto quando na Câmera, então?
AC: Na verdade, o projeto está praticamente pronto, mas a gente não quer fazer dessa forma, a gente quer chamá-las para o diálogo, mostrar, apresentar “olha vamos fazer um negócio diferente aqui na nossa cidade?”, para a gente acabar com essa história de que as empresas… não, você vai ter a sua licença social, a Prefeitura vai te conceder sua licença social, vamos seguir esses padrões aqui, vamos combinar, empurra um pouquinho para lá, um pouquinho para cá, vamos fechar um certo consenso para eu poder levar isso para a Câmera e aprovar a partir de um diálogo construído com elas.
HL: Você quer ter um diálogo, uma participação de todos os envolvidos, né? Isso é legal, isso é democrático, é republicano.
AC: Não queremos agir com eles como muitas vezes eles agem conosco, queremos ter o diálogo antes que as coisas se estabeleçam, mas se precisar brigar a gente também briga.
FONTE: O TEMPO