Pressionada pela invasão de aço chinês até 40% mais barato, a Maior produtora de aço da América Latina desliga usinas, fecha plantas em Minas e São Paulo, reduz 22% do investimento previsto e aposta na expansão da unidade no Texas, com tarifas americanas, demanda de energia renovável e data centers.
A Maior produtora de aço da América Latina acionou um alerta máximo na indústria brasileira. Depois de anunciar a demissão de milhares de trabalhadores e o fechamento de unidades, a Gerdau suspendeu R$ 2,1 bilhões em investimentos no Brasil e decidiu concentrar a expansão da produção em uma usina no Texas, nos Estados Unidos, onde deve acrescentar cerca de 150 mil toneladas por ano a partir de 2026.
O movimento ocorre em meio à invasão de aço chinês vendido entre 30% e 40% mais barato, boa parte subsidiado, que já responde por quase 30% das vendas internas no país. Executivos da companhia e de outras siderúrgicas alertam que, se nada mudar, a indústria do aço no Brasil pode encolher a ponto de desaparecer, abrindo caminho para um apagão industrial difícil de reverter.
Demissões em massa e investimentos congelados
Segundo a própria empresa, o alto volume de importações levou à demissão de 10 mil colaboradores entre janeiro e julho de 2025, além de uma nova rodada que elimina mais de 1,5 mil postos de trabalho em diferentes unidades.
As plantas de Barão de Cocais, em Minas Gerais, e Mogi das Cruzes, em São Paulo, já foram desativadas, esvaziando economias locais que dependiam diretamente da siderurgia.
Ao anunciar o congelamento de R$ 2,1 bilhões, a Maior produtora de aço da América Latina também comunicou uma redução de 22% nos investimentos previstos para o próximo ano, colocando em espera projetos de expansão em Minas Gerais.
No Brasil, a prioridade passa a ser mineração e sucata, atividades menos intensivas em aço bruto e emprego industrial.
Para os trabalhadores e para as cidades que cresceram em torno das usinas, a mensagem é direta: quando o capital conclui que o ambiente de negócios piorou, ele vai embora e não olha para trás. Ficam o desemprego, o comércio esvaziado e uma base produtiva mais frágil.
Aço chinês barato sufoca siderúrgicas brasileiras
O CEO da Gerdau no Brasil, Gustavo Vernec, tem repetido que o maior player do mercado brasileiro de aço hoje não é mais a empresa, é a China.
A taxa de penetração do aço importado passa de 6 milhões de toneladas em 2025, algo próximo de 30% das vendas internas.
De acordo com ele, o aço chinês chega ao Brasil num patamar de preço que muitas vezes fica abaixo do próprio custo da matéria-prima das siderúrgicas nacionais.
Isso é o que os executivos chamam de dumping: vender com preço artificialmente baixo, sustentado por subsídios estatais, para ganhar mercado mesmo com prejuízo no curto prazo.
As importações de aço da China para o Brasil cresceram mais de 70% em apenas dois anos, muito acima do que o setor projetava.
O Instituto Aço Brasil revisou para baixo as estimativas para 2025, prevendo piora do mercado e queda no uso da capacidade instalada.
Se o setor recuar para algo como 40% de utilização, a produção anual pode cair 13,5 milhões de toneladas, com risco de perda de 37,6 mil empregos diretos, segundo a entidade.
No nível da fábrica, isso significa equipes reduzidas, turnos cortados e unidades inteiras sendo desligadas. Cada trabalhador do setor produz, em média, 359 toneladas de aço bruto por ano. Quando um posto de trabalho some, some junto uma parte relevante da capacidade produtiva do país.
Estados Unidos reindustrializam enquanto Brasil perde fábricas
Enquanto a Maior produtora de aço da América Latina encolhe operações no Brasil, a estratégia para o exterior é exatamente a oposta.
A empresa vai ampliar uma usina no Texas, com foco em atender a alta demanda gerada por projetos de energia renovável e pelo boom de data centers nos Estados Unidos.
Esse movimento é favorecido pelo ambiente de política industrial americana. Ainda no governo Donald Trump, foram aplicadas tarifas de cerca de 25% sobre o aço chinês e 50% sobre produtos considerados estratégicos. O objetivo era claro: proteger a siderurgia doméstica e reativar a base industrial.
O resultado, segundo executivos do setor, foi uma espécie de mini reindustrialização.
Siderúrgicas americanas voltaram a contratar, investimentos industriais cresceram e novos projetos passaram a mirar o mercado dos Estados Unidos, que oferece energia mais barata, crédito mais acessível e regras mais previsíveis do que as encontradas no Brasil.
Aqui, o quadro é mais duro. Medidas antidumping seguem em discussão, mas a entrada de aço estrangeiro continua forte, e a indústria convive com impostos elevados, burocracia pesada e serviços públicos de baixa qualidade.
O índice PMI da indústria brasileira voltou a mostrar contração em novembro, registrando o sétimo mês seguido de encolhimento do setor, enquanto o Caged apontou o pior outubro da série para geração de empregos formais.
Pressão sobre o governo e risco de apagão industrial
O alerta da Maior produtora de aço da América Latina não é isolado. O CEO da CSN, Benjamin Stenbrook, já havia criticado a entrada desordenada de aço estrangeiro, defendendo que o governo Luiz Inácio Lula da Silva adote uma posição mais firme na defesa da indústria e do emprego.
Além da Gerdau, outras empresas de peso fizeram movimentos parecidos.
A Taurus transferiu parte da produção para os Estados Unidos e a Embraer busca ampliar sua presença industrial em solo americano.
A leitura dos executivos é que o Brasil virou um repelente de investimento industrial, enquanto outros países disputam indústrias, energia e cadeias estratégicas.
Na visão de dirigentes do setor, o país corre o risco de entrar na fase final de uma desindustrialização praticamente irreversível, em que fábricas fecham e não voltam mais.
Quando o país perde siderurgia, não perde só aço: perde capacidade de fazer carros, máquinas, obras de infraestrutura, linhas de transmissão de energia, ferrovias e edifícios em escala.
Dependência do aço chinês e perda de soberania produtiva
No curto prazo, o consumidor pode até se beneficiar de um aço importado mais barato. No médio e longo prazo, porém, o risco é outro. Se a indústria local enfraquece demais, o país fica dependente de um único grande fornecedor externo, que passa a ter poder para controlar preço, volume e condições de entrega.
O cenário projetado por executivos do setor é preocupante. Se o Brasil precisar acelerar investimentos em infraestrutura, construção civil ou indústria automotiva no futuro, poderá estar nas mãos de decisões tomadas em Pequim, e não em Brasília.
Bastaria uma mudança de estratégia, um corte de exportações ou um aumento brusco de preços para travar obras e encarecer projetos em todo o país.
É esse risco que faz a Maior produtora de aço da América Latina falar em possibilidade de desaparecimento da siderurgia nacional.
Uma vez fechada, uma usina não reabre da noite para o dia, e a reconstrução de cadeias produtivas inteiras é lenta, cara e, muitas vezes, inviável.
Efeito dominó nas cidades e na vida real do trabalhador
Quando uma gigante como a Gerdau reduz operações, quem paga a conta não é apenas o acionista. É a cidade que perde arrecadação, o comércio que vê o movimento minguar, o jovem que não encontra emprego industrial, o município que deixa de receber investimentos em infraestrutura.
O Instituto Aço Brasil estima que a queda na produção afeta não só empregos diretos, mas toda uma rede de fornecedores de bens e serviços, da logística ao pequeno comércio.
Em muitos municípios siderúrgicos, a fábrica é a engrenagem que gira tudo: sem ela, a economia local entra em modo de sobrevivência.
Enquanto isso, o debate público muitas vezes se concentra em disputas políticas de curto prazo, deixando em segundo plano a discussão central: que tipo de país o Brasil quer ser em termos de produção, emprego e tecnologia.
Um país que exporta minério e importa aço barato ou um país que domina as etapas de maior valor agregado da cadeia.
E agora, o que fazer?
O caso da Maior produtora de aço da América Latina mostra que o tempo para reagir está ficando curto. A empresa já reposicionou sua estratégia, a concorrência chinesa segue ganhando espaço e outros setores industriais começam a repetir o mesmo roteiro de saída do país.
A discussão sobre tarifas antidumping, política industrial e ambiente de negócios deixou de ser um debate abstrato para economistas.
Hoje, ela aparece na forma de fábricas fechadas, empregos perdidos e investimentos bilionários que cruzam a fronteira em direção a ambientes considerados mais competitivos.

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