Cemitérios do país recebem visitas guiadas e viram museus a céu aberto

Atividades incluem pesquisadores que estudam temas ligados à morte

De dia ou de noite, eles percorrem lugares que causam arrepios em muitas pessoas. Entre túmulos e epitáfios, encontram materiais de valor histórico, artístico e cultural. Convictos de que os cemitérios podem ser uma galeria a céu aberto, pesquisadores da Associação Brasileira de Estudos Cemiteriais (Abec) organizaram uma agenda de visitas gratuitas pelo país. A programação faz parte da 21ª Semana Nacional de Museus, que começou na segunda-feira (15).

Dois eventos já ocorreram na última sexta-feira (12) – os passeios guiados no Cemitério São Bonifácio, em Curuçá (PA), e no Cemitério do Araçá, na capital paulista. Estão previstos mais 13 eventos, entre os dias 18 e 28 de maio, em Belém, na capital paulista, em  Campinas, Guarulhos, Piracicaba e Jaú, em São Paulo, em Belo Horizonte (MG) e Torres (RS).

No Rio de Janeiro, a visita será no Cemitério São João Batista, no próximo sábado (20, mediada pelas historiadoras Maria de Fátima Fonseca e Marcia Costa Carneiro, ao lado da pedagoga Isabela Silveira. No cemitério, há um número grande de pessoas famosas sepultadas, como o ex-presidentes Floriano Peixoto, o compositor Tom Jobim e o escritor Carlos Drummond de Andrade. Mas a visita desta vez tem enfoque diferente. O tema é a memória do samba e do carnaval, pensada a partir das desigualdades sociais. 

“A maior parte dos sambistas cariocas foi sepultada em cemitérios da zona norte, uma vez que o São João Batista é historicamente um local de elites. Ali, os poucos negros estão em áreas menos valorizadas. Na nossa visita, dois exemplos são os jazigos de Clementina de Jesus e Donga”, explica a historiadora Maria de Fátima. “A proposta é chamar a atenção para os cemitérios como locais de memória e história da cidade. As desigualdades sociais têm reflexos nos espaços cemiteriais, o que nos mostra que nem a morte é igual para todos”. 

Rio de Janeiro (RJ) - Visitas em cemiterios - Semana de Museus - Cemitério do Araçá, São Paulo. Foto: Divulgação

Rio de Janeiro (RJ) – Visitas em cemiterios – Semana de Museus – Cemitério do Araçá, São Paulo. Foto: Divulgação – Divulgação

Maria de Fátima pesquisa no mestrado os funerais das artistas Carmen Miranda e Clara Nunes. O foco é entender mudanças na perspectiva sobre o luto no século 20 e o papel da mídia em estimular a comoção pública. O interesse pelo tema da morte surgiu durante o período mais crítico da pandemia de covid-19. Para ela, foi um jeito de lidar com o próprio medo de morrer. 

“Estudar a morte foi a forma que encontrei não apenas para a temer menos, mas também para valorizar a vida. Quando estudamos a história da morte, percebemos o quanto o tema se tornou tabu na sociedade contemporânea. Foi desnaturalizada, quando na verdade é o reverso da vida. Isso interfere na nossa capacidade de elaborar o luto quando perdemos alguém querido. Sofremos mais e sozinhos”.

O estigma sobre a morte é uma das explicações para as visitações em cemitérios ainda serem vistas com desconfiança no Brasil, de acordo com o historiador Paulo Renato Tot Pinto. Ele é de Piracicaba, integra a diretoria da Abec e estuda o tema da morte na música sertaneja. Paulo entende que o país precisa valorizar mais os cemitérios como espaços museológicos, mesmo que fora dos padrões tradicionais. Ele cita exemplos bem-sucedidos de valorização patrimonial e turística, como o cemitério da Recoleta, em Buenos Aires, na Argentina, lugar que, paradoxalmente, recebe muitos brasileiros que visitam o país vizinho. 

“Quando você mostra que não é apenas um lugar para sepultar pessoas, mas que lá existem esculturas que foram construídas, entre outras coisas, relações sociais de afeto, elas conseguem entender melhor a cidade dos mortos. Que nada mais é do que um reflexo da cidade dos vivos. Lá você tem ruas, divisões entre o centro e a periferia, a ostentação de materiais. Principalmente quando você analisa sepulturas do século 19 e do início do 20, e vê que as pessoas tentavam se diferenciar socialmente até depois da morte”. 

Paulo defende que os cemitérios guardam múltiplas riquezas. Não à toa, a Abec reúne pesquisadores de diversas áreas do conhecimento: história, antropologia, sociologia, pedagogia, arquitetura, geografia e até medicina. Ela foi fundada em 2004, a partir de um encontro que ocorreu na Universidade de São Paulo (USP). Há associados em quase todos os estados do país, em Portugal e nos Estados Unidos. A cada dois anos, eles se encontram para debater sobre esculturas, elementos arquitetônicos, costumes, relações sociais, configuração espacial e outros temas cemiteriais. 

Rio de Janeiro (RJ) - Visitas em cemiterios - Semana de Museus - Cemitério do Araçá, São Paulo. Foto: Divulgação

Rio de Janeiro (RJ) – Visitas em cemiterios – Semana de Museus – Cemitério do Araçá, São Paulo. Foto: Divulgação – Divulgação

Fomentar uma agenda de estudos e de visitas guiadas ajuda, assim, a manter a vida nos cemitérios. Mais do que a morte física, o que preocupa os pesquisadores é a morte pelo apagamento da memória. 

“Você morre quando é esquecido. Quando você utiliza o cemitério para visitas e passeios, está rememorando e trazendo à vida aquelas pessoas que estão sepultadas ali. Se elas são esquecidas, realmente morrem e somem da história”, analisa Paulo Renato Tot. “Você vê nos cemitérios do país muita degradação, muito roubo. Quando você ocupa o espaço, ele entra no olhar do Poder Público de forma diferente. E as pessoas entendem que os roubos que acontecem ali não são dos materiais em si, como o bronze. Mas que foram roubados o patrimônio, a história e uma parte da cidade”. 

Programação de visitas aos cemitérios 

18/05 – Cemitério Santa Izabel – Belém/PA 

19/05 – Cemitério da Saudade – Campinas/SP 

20/05 – Cemitério São João Batista – Rio de Janeiro/RJ  

20/05 – Cemitério São João Batista – Guarulhos/SP 

20/05 – Necrópole de São Paulo – São Paulo/SP 

20/05 – Cemitério da Saudade – Campinas/SP 

21/05 – Cemitério São Judas Tadeu – Guarulhos/SP 

21/05 – Cemitério da Saudade – Campinas/SP 

21/05 – Cemitério Municipal Campo Bonito – Torres/RS 

21/05 – Cemitério da Saudade – Piracicaba/SP 

21/05 – Cemitério da Consolação – São Paulo/SP 

26/05 – Cemitério Ana Rosa de Paulo – Jahu/SP 

28/05 – Cemitério do Bonfim – Belo Horizonte/MG

Para inscrições e mais informações, acesse a conta oficial da Abec no Instagram.

Edição: Graça Adjuto

FONTE AGÊNCIA BRASIL EBC

BDMG abre edital para incentivar municípios a privatizar cemitérios

Num curto espaço de tempo, a instituição financeira publicou edital, abriu consulta, enviou correspondências aos municípios

O Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG) quer incentivar os municípios a privatizarem os cemitérios do Estado. Num curto espaço de tempo, a instituição financeira publicou edital, abriu consulta, enviou correspondências aos municípios e hoje, 30, cobra o envio das respostas pelas administrações públicas. 

O objetivo é mapear municípios interessados em conceder cemitérios, rodoviárias e frota de veículos de mobilidade urbana à iniciativa privada por meio de parceria pública-privada (PPP). São três questionários, dois deles com mais de 40 perguntas e que, no mínimo, incitam bastante curiosidade. 
Um dos itens refere-se aos cemitérios públicos, e entre as 45 questões abordadas há perguntas como qual o total de inumados (enterrados), de sepulturas, de jazigos perpétuos, de velórios instalados, se a área é tombada – ou está em processo de tombamento, também o percentual de inadimplentes dos jazigos perpétuos e é claro, se há sepultamentos gratuitos. Um terço das perguntas querem saber, especificamente, sobre a receita de cada um dos espaços. 

Ao fim, ainda no formulário, o BDMG solicita o envio de planilha de custos/despesas e a certidão de matrícula dos imóveis, na qual estão os cemitérios a um destinatário de e-mail iniciado com as letras PPP, alusivas à parceria pública-privada. Ao ser perguntada se haveria privatização destes equipamentos públicos, a instituição respondeu que “as possíveis alternativas de modelo de gestão só poderão ser identificadas a partir da elaboração deste diagnóstico, considerando a realidade de cada município”. 

Promover a privatização do direito de sepultar, ser sepultado e permanecer sepulto é no mínimo, ‘indigno aos cidadãos’, comentou um agente público que preferiu não ser citado.

Coincidência ou falta de sorte, todas as prefeituras consultadas pelo Aparte, nenhuma delas havia recebido a correspondência enviada pelo BDMG. A coluna ouviu secretários de obras, de serviços, de projetos, de transportes e trânsito e de infraestrutura, além de assessorias de comunicação, procuradores, ouvidores e chefes de gabinetes de diferentes municípios, mas nenhum sequer tinha ciência sobre a consulta pública, iniciada no dia 13.

Um bônus aos que aderirem à consulta, o BDMG oferecerá capacitação por meio de workshop online. O resultado da consulta será publicado pelo Banco até o dia 16 de novembro.

FONTE O TEMPO

about

Be informed with the hottest news from all over the world! We monitor what is happenning every day and every minute. Read and enjoy our articles and news and explore this world with Powedris!

Instagram
© 2019 – Powedris. Made by Crocoblock.