27 de abril de 2024 15:06

Mais de 4 milhões de motoristas profissionais potenciais usuários de drogas não serão fiscalizados até o fim do ano

Medida é fruto da Deliberação 268 do Contran, que foi determinada pelo ministro Renan Filho e confirmada pela PRF

De acordo com a apuração do SOS Estradas, aproximadamente de 4,5 milhões de motoristas de caminhão e ônibus – obrigados por lei a fazerem o exame toxicológico – não cumpriram a lei. Destes pelo menos 2 milhões usam drogas regularmente.

Além disso, os 4,5 milhões não serão autuados até o fim deste ano pela falta do exame, conforme Deliberação 286 do Contran, fruto de iniciativa do ministro Renan Filho e do  comunicado da Polícia Rodoviária Federal (PRF).

O governo beneficia quem não cumpre a lei, em detrimento da maioria dos motoristas profissionais que cumpriram suas obrigações. Com o agravante de que os que não fizeram o exame colocam em risco a vida dos usuários das rodovias e vias urbanas, inclusive dos que realizaram o exame toxicológico, como previsto na legislação.

A estimativa é de que, dos 4,5 milhões de motoristas sem exame, ao menos 40% são usuários usam drogas regulamente, o que representa quase dois milhões de profissionais sem condições de dirigir compartilhando, diariamente, as estradas e as ruas com milhões de brasileiros. A estimativa do SOS Estradas é baseada em várias pesquisas realizadas nos últimos anos, inclusive pelo Ministério Público do Trabalho (MPT).

A situação é ainda mais grave do que parece, explica o coordenador do SOS Estradas, Rodolfo Rizzotto, autor do estudo “As Drogas e os Motoristas Profissionais.”

“Temos 11,5 milhões de condutores das categorias C, D e E. Portanto, 4,5 milhões que não cumpriram a lei representa um total de 40% possíveis usuários de drogas, conduzindo veículos pesados, verdadeiras armas de destruição em massa. Na nossa avaliação, quem não aparece para fazer o exame que detecta uso regular de drogas nos últimos 90 dias deve ser considerado no mínimo como suspeito pelas autoridades.”

SOS Estradas fez a estimativa baseada em várias pesquisas e operações com teste de drogas, pincipalmente a que foi realizada pelo Ministério Público do Trabalho

Pesquisa do MPT comprovou a importância do exame

Pesquisa realizada em 2019 pelo Ministério Público do Trabalho, Tribunal Superior do Trabalho do Mato Grosso do Sul e com apoio da PRF, mostrou queda de 60% no uso de drogas por motoristas profissionais, entre 2015, último ano sem exame, e 2019, quando o exame já era exigido havia três anos.

Mesmo assim, nos motoristas testados – todos voluntários – ainda foi possível obter laudos positivos em quase 20% dos que foram examinados. Esses dados confirmam a estimativa do SOS Estradas de que pelo menos 2 milhões de usuários ainda estão na pista; principalmente quando 4,5 milhões estão com o exame vencido.

Durante seminário realizado na Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), no Maio Amarelo, o procurador do Ministério Público do Trabalho (MPT), Paulo Douglas Almeida, que há mais de 15 anos investiga o uso de drogas por motoristas profissionais, enfatizou que o exame toxicológico de larga janela atenuou a exploração a que são submetidos os motoristas, até porque desestimula jornadas abusivas, que muitas vezes levam ao uso de drogas para permanecer acordado.

Na ocasião, ele também destacou que interesses privados são priorizados em detrimento do interesse público. “Aspectos importantes da Lei 13.103 (Lei do Caminhoneiro), como o exame toxicológico, que atenuou essa lógica perversa, vêm sendo atacados mais uma vez sob o primado do econômico sobre o social.”

Paulo Douglas lembrou ainda a incoerência da Medida Provisória 1153/22, que determinava o adiamento do controle para quem não faz o exame. Ele considerou um contrassenso porque compromete uma política pública que reduz a exploração dos motoristas e acidentes (sinistros).

Cocaína é usada por 70% e rebite está em 3º lugar no ranking das drogas

 Os laboratórios registraram mais de 300 mil casos de motoristas testados positivo para as drogas no país. Em 70% dos casos, o predomínio foi do uso de cocaína. As anfetaminas, o popular ‘rebite’, está em terceiro lugar no ranking das drogas utilizadas.

Além disso, outros dois milhões de condutores testados apresentavam a presença de drogas no organismo, mas receberam um laudo negativo porque a quantidade encontrada está abaixo do nível definido na regulamentação do exame. É mais um indício dos 20 % de drogados, previstos pelo SOS Estradas.

Os dados são ainda mais graves considerando que 4,5 milhões de motoristas sequer compareceram para realizar o exame. A alegação de desconhecimento não pode ser utilizada porque foram realizadas numerosas campanhas esclarecendo a necessidade do exame há cada 30 meses.

Essa frequência de testagem é fundamental para garantir o sucesso de política pública. O papel do exame é de prevenção, o que foi comprovado com mais de 70 mil motoristas das categorias A e B (moto e carro) que tentaram obter a CNH das categorias C, D e E mas foram impedidos porque não passaram no exame. “A prevenção é a melhor arma na redução de acidentes e uso de drogas.”, acrescenta Rizzotto.

Constitucionalidade  toxicológico foi reconhecida por unanimidade no STF

No mesmo dia em que o governo preparava uma Deliberação – que mais uma vez adiava a punição, e poucos dias após o veto do presidente da República, que extinguiu da chamada “multa de balcão” com veto do art. 165-D da Lei 14.599/23- o STF votou por unanimidade (11×0) a constitucionalidade do exame toxicológico.

Na avaliação do ministro relator, Alexandre de Moraes, a medida busca promover a segurança no trânsito, impondo “razoável e legítima restrição ao exercício da profissão de motorista, pois, além de reduzir os riscos sociais inerentes à categoria, atende a um bem maior, que é a incolumidade de todos os usuários de vias públicas”.

Famílias de vítimas sofrem as consequências

A incolumidade mencionada pelo ministro Alexandre de Moraes é confirmada pelo caso concreto ocorrido em abril deste ano, na BR-376, próximo de Ponta Grossa, no Paraná.

Na ocasião, a professora Vanessa Maciel, de 37 anos, e seu filho Pedro, de 7 anos, morreram quando um caminhoneiro, com exame toxicológico vencido há mais de dois anos, colidiu com 19 veículos e parou somente quando matou mãe e filho. Como se não bastasse, o veículo estava com manutenção precária, conforme a perícia comprovou.

ADIADA: Governo adia punição mas não as mortes como da professora Vanessa e seu filho Pedro. Foto: Arquivo Pessoal

Lauro Maciel, pai de Vanessa, lembrou que caso a CNH do motorista com exame vencido estivesse suspensa, como previa originalmente a lei, sua filha poderia estar viva. “Vivemos num país que não pune quem não cumpre a lei. Hoje minha família está sofrendo. Perdi minha filha e meu neto.”

Nada impede que o senhor Lauro encontre o motorista que matou seus entes queridos dirigindo outro caminhão até 28 de dezembro deste ano.

Impunidade ganhou espaço no governo anterior e é reforçada no atual

A situação piorou durante o governo Bolsonaro, que resolveu adiar a punição aos motoristas irregulares, inclusive protelar a multa para quem não fez o exame toxicológico no prazo previsto, 1º de julho de 2025. Absolutamente incoerente com um governo que dizia ser contra o uso de drogas.

O Congresso corrigiu essa aberração. Curiosamente, agora o novo governo adia para 29 de dezembro a fiscalização e o presidente Lula, vetou a chamada “multa de balcão”, que punia quem não cumpriu o exame.

Fica evidente que ambos os governos priorizaram os motoristas que não cumprem a lei em detrimento dos que fizeram o exame.

PRF quando flagra caminhoneiros com drogas para uso pessoal, e os libera após TC

Um retrato desta realidade ocorreu nesta quinta-feira (29) no Piauí. A PRF flagrou dois caminhoneiros conduzindo carretas e transportando animais, que admitiram estar com drogas para uso pessoal para suportarem a jornada. Os casos foram registrados na BR-316 na altura de Valença (PI).

Um deles estava de posse de mais de 40 ‘rebites’ (anfetamina), e o segundo mais de 60 comprimidos, sendo que este sequer possuía habilitação para dirigir carreta. Provavelmente porque não passaria no exame toxicológico, obrigatório para motoristas das categorias C, D e E, necessárias para dirigir, respectivamente, caminhão, ônibus e carreta. Além disso, já havia sido preso pela PRF, em 2021, portando 28 cartelas com 420 comprimidos da mesma substância. Indício claro de tráfico de drogas.

Como é de praxe nesses caso, a PRF constatou a ocorrência de porte de droga para consumo pessoal e foram lavrados Termos Circunstanciados (TC) por descumprimento do Art. 28 da Lei. 11.343/06. Os dois homens se comprometeram a comparecer em audiência judicial referente à prática delituosa.

Depois disso, o procedimento normal é liberar os condutores para continuar sua viagem com a carga e sem a droga. Portanto, colocando vidas em risco e, provavelmente, comprando mais droga adiante.

A interpretação que vigora há muitos anos é esta. Evidente que não por culpa da PRF, muito menos dos agentes, mas das demais autoridades que não definem claramente o que o policial pode fazer.

Lei favorece o portador de drogas que estiver dirigindo

Pela mencionada lei, os caminhoneiros flagrados pela PRF com drogas estão sujeitos a:

I – advertência sobre os efeitos das drogas; II – prestação de serviços à comunidade; III – medida educativa de comparecimento a um programa ou curso educativo.

Naturalmente que isso depende do juiz determinar e que eles compareçam em audiência, caso seja marcada algum dia.

PRF diz que só vai autuar quem estiver com exame vencido a partir de 29 de dezembro de 2023 e deixa usuários de drogas mais tranquilos

No sábado (1º/7) a Polícia Rodoviária Federal divulgou várias questões envolvendo o exame toxicológico, após a sanção da Lei 14.599/23. Diz o texto da PRF:

“… Deixar de fazer o exame toxicológico, ou então dirigir após ter sido reprovado no exame, é considerada infração de natureza gravíssima, punida com multa de R$1.467,35 e suspensão do direito de dirigir por três meses. Além disso, se o condutor reincidir na infração dentro de um período de 12 meses, o valor da multa é dobrado.

Adicionalmente, as novas regras acabaram com a chamada ‘multa de balcão’, aplicada pelos DETRANs no momento da renovação da habilitação, ao constatarem a não realização de algum dos exames toxicológicos intermediários, que ocorrem a cada dois anos e meio.

Conforme já havia sido previsto pela própria Lei 14.599/23, o Contran, através da Deliberação 268/23, estabeleceu um prazo até 28/12/2023 para os condutores regularizarem os exames, caso estejam vencidos.”

Fiscalização da PRF sobre exame toxicológico

“A fiscalização da PRF relacionada à regularidade do exame toxicológico será iniciada após findo o prazo adicional já estabelecido pelo Contran, ou seja, os condutores que porventura estiverem com o exame em situação irregular, estão sujeitos à autuação a partir do dia 29/12/2023.

O adiamento da fiscalização e autuação para quem não cumpriu o prazo do exame toxicológico periódico obrigatório, dentre os quais, usuários de drogas, atende a Deliberação 298 do Contran, publicada a mando do ministro dos Transportes, Renan Filho.

O Congresso Nacional havia dado uma última oportunidade aos motoristas que não fizeram o exame obrigatório para testar drogas de não serem multados em R$ 1.465,37, desde que seguissem o escalonamento do Contran.

Na prática, por critérios que já foram usados no passado, a Senatran faria um calendário mensal de quem deveria cumprir a obrigação, conforme o tempo de atraso. Com isso, o motorista poderia regularizar sua situação, desde que fizesse o exame e obtivesse o laudo positivo. Mas o ministro decidiu simplesmente ignorar o escalonamento e deu 6 meses para todo mundo.

A multa de balcão, mencionada pela PRF, fazia parte da legislação anterior no art. 165-D. Mas foi vetada pelo presidente Lula, garantindo aos motoristas que não cumpriram a lei total impunidade.

É importante lembrar que mais de 7 milhões de motoristas das categorias C, D e E, estão com o exame em dia. Mas o governo garantiu impunidade aos 4,5 milhões que não fizeram o exame para drogas.

Outro veto, aplicado ao inciso I do § 5º do art. 148-A, impede o agente de trânsito de autuar o condutor que aparece no sistema da Senatran com laudo positivo para drogas registrado na sua CNH. O veto permite que o motorista continue dirigindo automóveis e motocicletas, sem restrições.

Ambos os vetos e outros podem ser derrubados pelo Congresso Nacional que deverá se manifestar nos próximos dias.

FONTE ESTRADAS.COM.BR

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