De acordo com Fundecitrus, resultado de 2024/2025 pode ser 24,36% menor em comparação à safra anterior
Responsável por 75% do comércio internacional de suco de laranja no mundo, o Brasil tem um cenário turbulento pela frente na produção de frutas cítricas. De acordo com dados divulgados neste mês pelo Fundo de Defesa da Citricultura (Fundecitrus), a safra de laranja 2024/25 no cinturão citrícola, formado pelo interior de São Paulo e pelo Triângulo/Sudoeste mineiro, deverá ser a pior em mais de três décadas. As condições climáticas e o greening, doença causada por uma bactéria, foram apontados como principais fatores para essa perspectiva pessimista.
“As altas temperaturas e ondas de calor, com baixo índice de chuvas, contribuíram para a projeção, assim como o greening, principal praga da citricultura e que completa 20 anos desde sua detecção no país”, explica Vinícius Trombin, coordenador da pesquisa de estimativa do Fundecitrus.
A expectativa é que a produção da citricultura nos dois estados atinja 232,38 milhões de caixas de 40,8 quilos cada na próxima safra, o que representa uma queda de 24,36% em relação à safra anterior. O patamar previsto é o menor desde que o órgão iniciou sua pesquisa de estimativa, há dez anos, e também inferior aos dados da Associação Nacional dos Exportadores de Sucos Cítricos (CitrusBR) desde a década de 1980.
Marcos Fava Neves, professor da Universidade de São Paulo (USP) e sócio da Harven Agribusiness School, afirmou que a situação já era “preocupante”, mas que agora ficou “extremamente alarmante”. “Será necessário acompanhar a cotação do suco no mercado internacional, mas a tendência é de alta nos preços”, analisa.
Em 2023, o estoque de suco de laranja do país atingiu o segundo menor volume dos últimos 13 anos. As indústrias brasileiras tinham, em 31 de dezembro, 463.940 toneladas de suco estocadas, ligeiramente superior às 434.943 toneladas de 2022, total insuficiente para acalmar um mercado que tem sentido os efeitos dos problemas climáticos e de pragas em seus pomares de laranja.
Greening: a “dengue” dos cítricos
José Edson Pereira, o Edinho, é produtor agrícola desde 1998 junto com o irmão Ernane. Juntos, eles produzem uma média de 50 a 100 toneladas de laranja e mexerica por ano na Fazenda Sítio Novo, localizada no município de Piedade dos Gerais, que fica a cerca de 100 km de Belo Horizonte. Por lá, ele e diversos produtores da região têm enfrentado o greening: doença causada por diferentes tipos de bactérias e que pode acabar com lavouras se o agricultor não realizar a poda das plantas contaminadas.
“Faço a manutenção regular, cortando as plantas doentes e replantando. O problema é que uma muda leva de dois a três anos para produzir novamente, então acaba reduzindo nossa produtividade. No futuro, penso em não cultivar mais a laranja em certos locais e vou substituí-la por outros produtos, como a abóbora cabotiá, o tomate e o maracujá.”
De acordo com a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural de Minas Gerais (Emater-MG), apesar de não haver um número exato, estima-se que Piedade dos Gerais concentre cerca de 300 agricultores familiares que cultivam a tangerina Pokan e outros tipos de frutas. Só em 2023, a produção de cítricos foi de 1.300 toneladas – 500 delas destinadas ao Ceasa e 800 para outros mercados.
Matheus Sales, engenheiro agrônomo da Emater-MG, afirma que é realizado um trabalho individualizado e constante junto aos produtores – incluindo análise do solo, adubação, seleção de mudas de qualidade, aplicação de inseticida e manutenção dos pomares.
“Na orientação aos produtores costumamos comparar o greening com a dengue. Se o inseto picar uma planta doente ele pode picar uma planta saudável e transmitir o problema. Por isso, é possível combater os insetos com inseticida, mas a planta doente precisa ser eliminada. Infelizmente, muitos produtores ainda não têm consciência e acabam não realizando a poda. A doença pode acabar com uma lavoura inteira em poucos anos.”
Segundo o Instituto Mineiro de Agropecuária (IMA), o greening foi detectado pela primeira vez em Minas Gerais em 2005 e está presente em 78 municípios.
Infelizmente, essa não é a única praga que tira o sono dos produtores. Na fazenda de Edinho, ele também enfrenta a mosca negra e a Clorose Variegada dos Citros (CVC), conhecida como “amarelinho”. “Já cheguei a perder 10 hectares por causa dessas pragas. Cada hectare tem cerca de 500 plantas, então foi um prejuízo considerável”, afirma.
Diferentemente de produtos como o milho, que são plantados todos os anos, uma plantação de laranjas e mexericas pode render cerca de 20 anos de colheitas ao produtor. É a chamada agricultura perene. Após o plantio da muda, uma árvore pode levar de dois a três anos para começar a produzir. Por isso, a perda de plantas que já são frutíferas são tão sentidas por quem produz.
Edinho conta que costuma fazer uso dos inseticidas recomendados para cada tipo de problema, mas alega que já não vê resultados tão efetivos – principalmente em relação à mosca negra. “Não pretendo aumentar a quantidade desses insumos. Isso implicaria gastar mais, não só com os produtos, mas também com aluguel de máquinas e mão de obra. Também é necessária a manutenção das peças, pois os agrotóxicos são muito abrasivos.”
Em relação ao clima, ele afirma que os produtores enfrentaram uma chuva com granizo há cerca de três anos, que arrasou diversas plantações. “O desafio deste ano tem sido o calor. As temperaturas mais elevadas favorecem a proliferação de insetos e, por causa da pouca chuva, as frutas crescem pouco. A verdade é que vivemos em uma fase de mudanças climáticas e não sabemos o que esperar nos próximos anos”, diz.
Força-tarefa
Como forma de tentar amenizar os danos causados pelo greening, o poder público e a iniciativa privada investem em ações para auxiliar os produtores. O IMA, que monitora os dados sobre a praga no estado, afirma que aproximadamente 880 citricultores enviaram o relatório informando sobre seus pomares em julho de 2023.
A Emater-MG também realiza capacitações de seus técnicos para prevenção e controle do greening nas lavouras do estado. Os cursos já aconteceram em Lavras e Santa Rita do Sapucaí, no Sul de Minas, e em Uberaba e Uberlândia, no Triângulo Mineiro. Ainda serão promovidos encontros para os técnicos da Zona da Mata e Campo das Vertentes.
Também foi realizada, em junho deste ano, a 49ª edição da Expocitros, um dos maiores eventos de citricultura da América Latina. No evento, que aconteceu em Cordeirópolis (SP), a Syngenta, focada em tecnologias e inovações para o campo, apresentou algumas soluções para ajudar o produtor a combater a doença.
Além de apresentar um inseticida foliar desenvolvido para controlar de forma eficaz o psilídeo, inseto vetor do greening, a empresa também orientou os produtores sobre a importância de realizar o manejo adequado dos pomares e a erradicação das plantas doentes.
Segundo o Fundecitrus, só em 2023 a incidência média de laranjeiras com sintomas de greening no cinturão citrícola de SP e MG foi de 38,06%, o que corresponde a aproximadamente 77,22 milhões de árvores doentes do total de 202,88 milhões de laranjeiras. Esse índice foi 56% maior do que o de 2022, estimado em 24,42%.
Escalada de preços
Em março, o mercado de laranja já tinha o maior preço real em 30 anos, com a caixa da fruta custando cerca de R$ 100 em algumas regiões de São Paulo.
De acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulado dos últimos 12 meses, houve alta considerável nos preços dos cítricos vendidos no país. A tangerina (+58,02%) foi a que mais subiu de preço, seguida da laranja-pêra (+36,41%), limão (+33,61%), laranja-lima (+26,32%) e laranja-baía (+10,63%).
Em BH, só foram revelados os aumentos da laranja-lima (+26,32%) e laranja-pêra (+39,44%).
(Com informações da Folhapress e Agência Minas)
FONTE O TEMPO