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Peças do órgão musical de Mariana retornam da Espanha após cinco meses

Expectativa é de que o instrumento, único fora da Europa, volte a funcionar em 8 de dezembro

Após cinco meses na Espanha para restauração, já estão de volta a Mariana, na Região Central do estado, os dois someiros do órgão musical da Catedral Basílica Nossa Senhora da Assunção, joia barroca da primeira vila, cidade e diocese de Minas. Someiros são as caixas que armazenam e distribuem, para os tubos, o ar produzido pelos foles do instrumento, o Arp Schnitger, construído entre 1700 e 1710 na Alemanha, e presente, desde 1753, na chamada Sé de Mariana.

As peças chegaram nesta segunda-feira (8/9), e a expectativa é de que o órgão musical, mudo há cerca de 10 anos, volte a encantar moradores e visitantes no próximo 8 de dezembro, data consagrada a Nossa Senhora da Conceição, que foi a primeira padroeira do templo, antes de ele se tornar catedral, e tem uma legião de devotos no município.

“É um dia de muita alegria para a paróquia, a arquidiocese e toda a comunidade. Desde abril, quando as peças seguiram para a Espanha, acompanhamos todo o processo, e, agora, daremos continuidade para a montagem do órgão musical. Estamos felizes, pois as pessoas poderão desfrutar do seu som nas celebrações religiosas e no dia 8 de dezembro”, disse o pároco e reitor da catedral, padre Geraldo Buziani.

O prefeito da cidade, Juliano Duarte, também manifestou sua satisfação, certo de que o instrumento poderá potencializar o turismo religioso, pois se tratar do único órgão desse tipo fora da Europa. “Ele está mudo há 10 anos, e voltará a soar novamente. Por meio da Secretaria Municipal de Patrimônio Cultural e do Fundo Municipal de Patrimônio Cultural, estamos fazendo um investimento de R$ 1,2 milhão para o restauro das peças que acabaram de chegar.

Ao longo da maior parte de sua história, Mariana teve os dias embalados ao som do órgão Arp Schnitger, Monumental, de grande beleza artística e instalado, desde o início, em pequena “varanda” interna projetada por Manuel Francisco Lisboa, pai do mestre Aleijadinho, o instrumento é o único do seu tipo – e quilate, por se tratar de uma joia rara acústica – fora da Europa.

Em março, conforme mostrou o Estado de Minas, estava para começar um novo capítulo nessa trajetória, com o envio, no mês seguinte, a uma oficina especializada na Espanha, dos dois someiros. “Eles são o pulmão do órgão, a parte invisível do instrumento, que tem 1.039 tubos e dois teclados”, contou a organista e regente da Sé, Josinéia Godinho, ao mostrar as peças feitas em carvalho, em Hamburgo, no Norte da Alemanha.

Órgão musical da Catedral de Mariana-MG, que voltará a funcionar em 8 de dezembro com peças (someiros) restaurados
Órgão musical da Catedral de Mariana-MG, que voltará a funcionar em 8 de dezembro com peças (someiros) restauradosRaissa Alvarenga/Prefeitura de Mariana/Divulgação

A musicista explicou a necessidade de envio à oficina, na Espanha, para execução do reparo nas peças a cargo do organeiro francês radicado no país ibérico, Frédérick Desmottes: “Há quase uma década, devido à restauração da catedral e depois à pandemia, o Arp Schnitger está mudo, longe das cerimônias litúrgicas e apresentações artísticas”.

FERRAMENTAS

Com o fechamento da Sé de Mariana em 2016, a parte sonora do órgão foi desmontada e armazenada, enquanto a caixa (do instrumento) continuou na igreja, passando também pelo restauro dos elementos artísticos. Já no fim de 2022, na última fase de preparação para a reabertura do templo, foi detectado ataque de cupins nos dois someiros, impossibilitando a remontagem. “Foi feita a descupinização, mas se tornaram necessários reparos e a remontagem do órgão por especialista. Em vez do especialista Frédérick Desmottes passar um período em Mariana, ele achou melhor que enviássemos os someiros para sua oficina, em Cuenca, na qual há o material, ferramentas e instalações adequadas”, esclareceu, na época, a organista e regente.

Os recursos para o serviço (R$ 1,2 milhão) são provenientes do Fundo Municipal de Cultura, com aval do Conselho Municipal do Patrimônio Cultural de Mariana (Compat), e apoio da prefeitura local, Arquidiocese de Mariana e Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Todo o transporte, de Mariana (via Confins) ao destino final (Cuenca), foi acompanhado pela arquiteta e especialista em cultura e arte barroca, Deise Cavalcante Lustosa.

SONS DA FÉ

O órgão da Sé de Mariana, batizado com o nome de Arp Schnitger (1648-1719), radicado em Hamburgo e um dos construtores desse tipo de instrumento mais celebrados de sua época, se apresenta como espetáculo em todos os sentidos. Logo após ver os someiros na sacristia, a equipe do EM, guiada pelo padre Geraldo e por Josinéia, subiu até a tribuna ao lado do coro, no segundo pavimento da igreja, onde fica o instrumento ladeado por dois anjos e com um maior no topo, chamado de “Anjo do trompete”.

Na foto, o Padre Geraldo Dias Buziani, paéraco e reitor da Catedral de Mariana e Josineia Godinho organista
Na foto, o Padre Geraldo Dias Buziani, paéraco e reitor da Catedral de Mariana e Josineia Godinho organistaAlexandre Guzanshe/EM/D.A. Press

Considerado um dos instrumentos mais valiosos do Brasil, contando com projeção e interesse internacionais, o órgão da Sé faz parte de um pequeno acervo de pouco mais de 30 instrumentos da manufatura do grande organeiro estabelecido em Hamburgo. “Hoje em dia, se comparam os órgãos construídos por Arp Schnitger, em termos de qualidade e importância para a história da música, aos violinos de Stradivarius”, disse Josinéia, em referência ao artesão e luthier italiano Antonio Giacomo Stradivari (1644-1737), famoso pelos seus instrumentos de corda.

A história do ícone da Catedral da Sé causa tanto fascínio como seu som angélico agrada os sentidos, com os repórteres puderam constatar em outras reportagens. Após construído em Hamburgo, entre 1700 e 1710, o instrumento foi instalado provavelmente em uma igreja franciscana portuguesa, e, na sequência, colocado à venda em 1748. Adquirido pelo rei de Portugal Dom João V (1689-1759), das mãos do organeiro João da Cunha para atender a uma solicitação do primeiro bispo de Mariana, dom Frei Manoel da Cruz (1690-1764), foi enviado de presente, à diocese, por dom José I (1714-1777, filho de dom João V). “Pela estada em Mariana, o instrumento foi protegido de desastres naturais e guerras, o que fez dele também um dos órgãos com grande porcentagem de material original do século 18, diferente da maioria dos outros restantes na Europa. Importante lembrar que ele veio com um manual, com todos os detalhes para montagem”, informou padre Geraldo.

FONTE: ESTADO DE MINAS

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