Parque no Norte de Minas reúne cânions, cavernas monumentais, pinturas rupestres e a maior estalactite do mundo
Imagine caminhar por um vale esculpido durante milhões de anos, atravessado por um rio que moldou cânions, cavernas gigantescas e reúne vestígios deixados por seres humanos há 12 mil anos. Esse é o Parque Nacional Cavernas do Peruaçu, cujo Cânion foi reconhecido em 13 de julho como o primeiro Patrimônio Mundial Natural da Unesco em Minas Gerais. O título coloca a região ao lado de destinos como o Grand Canyon, nos Estados Unidos, e as Cataratas do Iguaçu.
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O parque está localizado entre Januária, Itacarambi e São João das Missões, no Norte de Minas. São cerca de 480 km a partir de Belo Horizonte. A entrada é controlada pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), e o acesso só é permitido com guia credenciado — uma forma de garantir a segurança do visitante e a preservação das cavernas. Atualmente, são nove atrações disponíveis, e é necessário agendar com antecedência.
Esta é a segunda reportagem da série Belezas do Sertão Mineiro, que mostra o potencial turístico, cultural e histórico do Norte de Minas após o reconhecimento do cânion do Parque Nacional Cavernas do Peruaçu como Patrimônio Mundial da Unesco.
O Peruaçu está em uma zona de transição entre Cerrado, Caatinga e Mata Atlântica. Essa combinação gera um mosaico de paisagens: veredas com buritis, matas secas que perdem as folhas na estiagem e ipês que colorem o vale no inverno. Para quem conduz turistas diariamente, essa riqueza tem também um significado espiritual. “É algo deixado por Deus. Ele preparou o sertanejo, que vive em um local árido, sem indústria, para o turismo que vem com o reconhecimento da Unesco”, diz o guia Adailton José de Santana Oliveira, o Joe Cavernas, morador de São João das Missões.

Gruta do Janelão: a joia do parque
Entre as mais de 200 cavernas conhecidas, a Gruta do Janelão é o cartão-postal. A trilha de 5 km leva cerca de cinco horas, entre descidas, travessias e paradas para contemplação. Dentro do cânion, os paredões chegam a 100 metros de altura, o equivalente a um prédio de 33 andares. É nesse cenário que está a Perna da Bailarina, considerada a maior estalactite do mundo, com 28 metros de comprimento — quase o tamanho do Cristo Redentor. Estima-se que ela levou cerca de 140 mil anos para se formar.
(Foto: Alex de Jesus / O TEMPO)
“Estar aqui é como estar em casa. A caverna é um lugar incrível, muito diferente. Foto nenhuma traduz. Você precisa vir para sentir. Parece que está em outro planeta. É um lugar de paz e espiritualidade”, completa Joe.

Quem também vive essa conexão diariamente é Vanilza Ferreira Lima Almeida, condutora há quase 30 anos. “Eu sou do município de Itacarambi. Esse selo da Unesco veio a calhar, porque a beleza tem que ser exposta, não pode ficar escondida. Isso é vida, a mão de Deus. A gente esquece todos os problemas lá fora. É tudo”, afirma.
O Peruaçu é também um mergulho no tempo profundo. As rochas do vale se formaram em um antigo mar que cobria Minas Gerais há mais de 500 milhões de anos. Ali estão registros da megafauna, fósseis preservados nas cavernas e até pinturas rupestres deixadas pelos primeiros humanos que habitaram a região.
Uma das atrações que guardam registros rupestres é a Gruta do Caboclo, local em que arqueólogos identificaram pela primeira vez o estilo de pintura que leva o nome da caverna. A técnica se destaca por evitar sobreposições: os desenhos são feitos sempre em áreas livres, valorizando cada traço. Outra característica marcante é a prática de retoques e repinturas sobre figuras já existentes, criando camadas de tempo e memória. A visita ao espaço dura cerca de uma hora e meia.
(Foto: Alex de Jesus / O TEMPO)
Para a chefe do Núcleo de Gestão Integrada Peruaçu, Dayanne Sirqueira, o que torna o parque único é a soma dos seus valores naturais, históricos e humanos. “É uma junção dos atributos físicos, que são as cavernas, a parte da história que envolve a arqueologia, mas também os vários povos que habitam aqui. As pessoas daqui têm um diferencial muito grande. Esse conjunto faz com que a região seja tão especial”, afirma.
Dayanne destaca ainda o potencial transformador da visitação: “Muitas pessoas chegam sem saber que estão dentro de uma unidade de conservação. Ao visitar o parque, descobrem que não é só turismo, mas também história e preservação ecológica. A experiência vira uma imersão e traz conscientização.”
Peruaçu em 3D: experiência virtual amplia acesso ao patrimônio mundial
Para quem não tem a oportunidade de viajar até o Norte de Minas, seja por limitações físicas, distância ou questões financeiras, a tecnologia 3D abriu um novo caminho para conhecer as belezas do Parque Nacional Cavernas do Peruaçu. Desde fevereiro, está disponível um tour virtual que permite explorar o cânion e suas grutas em alta definição, de forma interativa e gratuita.
O projeto foi idealizado pelo engenheiro civil e pesquisador Alexandre Lobo, que em 2018 conheceu a tecnologia usada no mercado imobiliário para apresentar imóveis. “Como trabalho com engenharia civil e com cavernas, pensei em juntar as duas coisas. Fiz um experimento por conta própria, digitalizei a Lapa Bonita e levei ao ICMBio. Eles gostaram da ideia”, contou. Depois de dois anos de execução, o projeto foi aprovado em 2023 e lançado oficialmente neste ano.
Segundo ele, a primeira motivação foi a acessibilidade: permitir que pessoas impossibilitadas de visitar o parque pudessem viver a experiência virtual. “Sempre tive vontade de divulgar a beleza do Peruaçu. Além disso, com autorização especial, registramos áreas intangíveis, que normalmente só são abertas a pesquisadores. Isso é bacana porque até quem vai ao parque pode conhecer lugares que não teria acesso”, explicou.
A visita virtual é multinível: começa com uma maquete 3D que mostra o relevo e o cânion; em seguida, o usuário pode navegar por sobrevoos em 360° e acessar pontos de interesse, como a Lapa do Caboclo, o Arco do André, a Lapa dos Desenhos e a monumental Gruta do Janelão. “Para mim, a Gruta do Janelão é a caverna mais bonita do Brasil. Conheço especialistas da União Internacional de Espeleologia que a consideram a mais bonita do mundo”, destacou Lobo.
FONTE: O TEMPO