×



Minas figura entre os estados com maior índice de violência política

Boletim divulgado pela Unirio sobre o tema mostra que, entre julho e setembro, foram registrados 11 episódios de ataques a lideranças políticas em Minas

Entre julho e setembro de 2025, o estado registrou 11 episódios de ataques a lideranças políticas, o terceiro maior número do país, segundo o mais recente boletim do Observatório da Violência Política e Eleitoral (OVPE), vinculado à Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio). O número de casos no estado de Minas Gerais representa 12,1% dos 91 casos mapeados em todo o território nacional no período.

Os dados reforçam uma tendência já observada nos últimos anos: Minas tem figurado de forma recorrente entre os estados com maior incidência de episódios violentos relacionados à disputa política. O relatório aponta que o estado foi superado apenas por São Paulo, que registrou 15 casos (16,5%), e Rio de Janeiro, com 12 casos (13,2%), no trimestre.

O levantamento mostra que, em Minas Gerais, o tipo de violência mais comum foi a psicológica, com cinco registros, o maior número entre todos os estados. Esse tipo de agressão é caracterizado por seus impactos no estado mental e emocional direcionados a políticos, servidores públicos e familiares, configurando 26,4% dos casos nacionais.

O estado também contabilizou quatro episódios de violência física e duas ocorrências classificadas como violência semiótica, que envolve o uso de símbolos, gestos ou mensagens para intimidar adversários. Não houve registros de violência econômica ou sexual no período.

Ao todo, Minas teve 23 casos de violência política em 2025, atingindo desde vereadores do interior até deputados federais. Os casos registrados até setembro incluem o homicídio do ex-vereador Raul Alves, no Sul de Minas, o atentado a tiros ao vereador Ricardo Balila (MDB), no Alto Paranaíba, e o  sequestro do ex-prefeito de Cristina, João Dionísio, no Sul de Minas.

No período, prefeitos e parlamentares também sofreram ameaças de morte, tanto online quanto presenciais. Destacam-se também os ataques baseados em identidade, com casos de racismo contra a deputada federal Célia Xakriabá (Psol), transfobia contra a vereadora Juhlia Santos (Psol) e ameaças misóginas a outros nomes políticos.

Conforme o levantamento, o deputado federal Nikolas Ferreira (PL) foi o político com mais registros no período, sendo alvo de quatro incidentes que incluem até ameaças de morte.

O levantamento do Observatório da Violência Política e Eleitoral é realizado desde 2019 e publicado em boletins trimestrais. A edição mais recente reúne casos registrados entre julho e setembro de 2025, envolvendo lideranças políticas, agentes públicos e familiares. Nesse período, o mês de julho concentrou a menor quantidade de ocorrências, com 24 episódios, enquanto agosto contabilizou 31 e setembro, 36.

No contexto nacional, a violência física segue como a mais recorrente, com 34 casos (37,4%), seguida da semiótica (27 casos; 29,7%) e da psicológica (24 casos; 26,4%). O estudo da Unirio também indica que o Sudeste segue como a região mais conflituosa do país, concentrando 40 dos 91 casos registrados (43,9%) entre julho e setembro. Em seguida, aparecem o Nordeste, com 27 episódios (29,7%), e as regiões Sul e Centro-Oeste, com oito registros cada (8,8%). O Norte responde por seis casos (6,6%).

Em entrevista ao Estado de Minas, o coordenador do observatório, Miguel Carnevale, explicou que o terceiro trimestre apresentou uma redução no registro de casos em relação ao trimestre anterior, o que considera um movimento natural fora dos períodos de campanha. “A gente tem, nas eleições, um pico de ocorrência de episódios violentos e, conforme vai se afastando das eleições, esses episódios vão se reduzindo”, afirmou o pesquisador à reportagem.

Ele destacou que o cenário nacional de violência política se reproduz, em menor escala, em Minas Gerais. “Minas está ali em terceiro ou quarto colocado entre as unidades federativas no ranking de episódios violentos. E esses episódios são de naturezas diversas: casos de natureza física, que acabam tendo um pouco mais de impacto e maior divulgação, mas também episódios de natureza psicológica — seja incitação à violência, ameaças ou alguma forma de impedimento do exercício político pleno”, disse. “Essas violências são influenciadas por fatores distintos, mas Minas Gerais sumariza bem o cenário de violência contra lideranças que a gente tem no Brasil”, completou.

Violências por partido

O boletim também revela a distribuição partidária das vítimas no trimestre mais recente. Ao todo, 19 legendas tiveram lideranças ou familiares atingidos. O Partido Liberal (PL) aparece no topo da lista, com 16 casos (17,6%), seguido por PSD (12,1%), União Brasil (9,9%), PT (7,7%) e Psol (6,6%).

Historicamente, os partidos PL e PT figuram entre as siglas mais atingidas em grande número de boletins. No primeiro trimestre de 2025, por exemplo, o PT registrou 16 casos e o PL, 14, liderando as estatísticas nacionais de violência partidária.

Carnevale também comentou sobre a presença recorrente de PL e PT entre os partidos mais atacados nos relatórios, fazendo uma avaliação sobre o contexto da polarização política.

“É difícil fazer uma avaliação muito direta dessa dinâmica de polarização. Ela definitivamente afeta esses casos, mas não a totalidade dos episódios. Você pega um episódio na esfera municipal e, às vezes, é uma ponte muito grande para conectar diretamente com essa dinâmica. Mas, por exemplo, o Nikolas Ferreira, que, nesse trimestre, sofreu quatro episódios de violência, está inserido nessa dinâmica. É uma figura de projeção nacional, inserida nesse contexto de polarização, de polêmicas, de embate direto.”

Para ele, o fenômeno não pode ser explicado apenas pela divisão ideológica. “Tem alguns casos em que a gente consegue fazer um link mais próximo com a dinâmica de polarização, e outros estão mais ligados à disputa política tradicional — disputa por poder regional, poder econômico, nos municípios e no estado.”

Metodologia

Para a pesquisa, a coleta de dados é feita com base no monitoramento contínuo de veículos de comunicação, a partir de alertas do Google configurados com um conjunto específico de palavras-chave relacionadas à violência política. As informações obtidas são depois validadas pela equipe de pesquisadores, com o objetivo de descartar mortes naturais, acidentais ou sem razão conhecida.

A metodologia considera como violência política “qualquer tipo de agressão que tenha o objetivo de interferir na ação direta das lideranças políticas, como limitar a atuação política e parlamentar, silenciar vozes, impor interesses, eliminar oponentes da disputa, restringir atividades de campanha, dissuadir oponentes de participar do processo eleitoral e/ou impedir eleitos de tomar posse”.

Histórico de violência

Apesar de uma redução nacional de 30% no número total de ocorrências em comparação ao trimestre anterior, Minas permanece entre os estados com mais registros do país. Desde o início do monitoramento, em 2019, Minas Gerais raramente saiu do “top 5” nacional em casos de violência política. O estado tem alternado entre picos de agressões físicas e ameaças.

No primeiro trimestre de 2020, Minas somou 17 ocorrências, se consolidando entre os estados mais violentos. No terceiro trimestre daquele ano, durante o início oficial da campanha municipal, foram quatro homicídios, incluindo o assassinato do candidato a vereador Cássio Remis (PSDB), em Patrocínio.

No acumulado de 2019 e 2020, o estado contabilizava 46 casos, permanecendo entre os cinco mais atingidos do Brasil. Já em 2021, o primeiro trimestre trouxe oito registros, colocando Minas na terceira posição nacional, atrás apenas de São Paulo e Rio de Janeiro. Naquele ano, o estado liderou os episódios de ameaça, empatando com o Rio de Janeiro e o Rio Grande do Sul, com quatro ocorrências cada.

O quadro se agravou com a proximidade das eleições de 2022. No terceiro trimestre daquele ano, Minas contabilizou 22 casos, o terceiro maior número do país. O período ficou marcado pela intensificação das ameaças virtuais, que atingiram parlamentares como Duda Salabert (PDT) e Andréia de Jesus (PT), ambas alvos de campanhas de ódio nas redes sociais.

O aumento da hostilidade fez Minas liderar o ranking nacional no quarto trimestre de 2022, com 15 casos, um feito inédito até então na série histórica. A liderança se repetiu no trimestre seguinte, de 2023, com 13 ocorrências. O cenário atingiu seu ponto mais crítico no quarto trimestre de 2023, quando Minas liderou o número de assassinatos políticos no país: seis homicídios, o que representou 31,6% de todos os assassinatos de lideranças políticas no Brasil naquele período.

FONTE: ESTADO DE MINAS

Receba Notícias Em Seu Celular

Quero receber notícias no whatsapp