IPHAN emitiu Ordem de Serviço para as obras de restauro da capela, que foram iniciadas em 23 de janeiro de 2025. O projeto de revitalização era aguardado com interesse pela comunidade belo-valense e visitantes. Em breve, o patrimônio poderá ser reaberto à visitação.
Ermida dedicada ao Nosso Senhor dos Passos
Obra-prima dedicada ao Nosso Senhor dos Passos é considerada a mais preciosa das ermidas existentes em propriedades rurais de Minas. A decoração interna apresenta talhas douradas, quadros, e pinturas barrocas. O retábulo-mor em estilo rococó é atribuído ao escultor português Francisco Vieira Servas. A pintura do forro dedicada à Ascenção do Senhor Jesus Cristo e seis painéis laterais são atribuídos ao professor das artes – desenho e pintura – Manoel da Costa Athayde, nascido em Mariana -1762 a 1830 – considerado um dos maiores pintores sacros do século XVIII.
A restauração de todas as suas peças foi finalizada em 2013, no entanto, a ermida foi fechada devido à falta de recursos para implantar serviços referentes à reestruturação das paredes e engradamento de madeiras, que não estavam previstos no contrato. Por meio do Edital no. 92/2024, em novembro, Associação Pró-Cultura e Promoção das Artes – APPA selecionou a empresa “A3 – Restauros – Adriano Furini”, para executar serviços de restauros dos elementos artísticos integrados, pendentes. A obra terá duração de quatro meses, porém não foi informado o valor do contrato.
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A decoração interna da ermida apresenta retábulo-mor com talhas douradas em estilo rococó, e quadros e pinturas de grande valor artístico.
O executor da obra afirmou que a capela está em bom estado de conservação, mas há problemas na estrutura que devem ser revistos. – “Serão realizados: proteção do telhado com remoção de telhas quebradas que causam goteiras; engradamento, substituição de peças que estejam danificadas por cupim; remontagem dos painéis laterais, do retábulo-mor com os nichos e o forro. O retoque final de nivelamento e reintegração pontuais exigem trabalhos de profissionais qualificados para a perfeita finalização;” ressaltou Adriano Furini.
Boa Esperança: 250 anos de História
No livro Bens Tombados no Brasil encontra-se oregistro do casarão: – É uma construção dos fins do século XVIII ou princípios do século XIX. O historiador Ivo Porto de Menezes argumenta que se trata de uma casa construída em 1775, já pertencente à família Monteiro de Barros, em 1790. O português Manuel José Monteiro de Barros nascido na Freguesia de São José das Marinhas, Braga, Portugal, empolgado pelas riquezas que o ouro proporcionava, veio para o Brasil por recomendação do tio Padre Broa que residia em Congonhas do Campo; ali se estabeleceu. Manuel foi contemplado com várias sesmarias. Em uma delas, construiu o vasto latifúndio da Boa Esperança que virou modelo agropecuário na região. Anos mais tarde, o imóvel seria administrado pelo filho Romualdo José Monteiro de Barros, Barão de Paraopeba. A partir do final do século XIX, a propriedade passou por mãos de diversos proprietários, até ser vendida para o Estado de Minas Gerais, sob a administração do IEPHA-MG.
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A casa da fazenda foi reconhecida como patrimônio nacional em 1959, pelo Instituto do Patrimônio Histórico, Artístico e Nacional (IPHAN) e inscrita no Livro de Tombo de Belas Artes, com parecer do poeta Carlos Drummond de Andrade. A casa e todo o terreno equivalente a 318 hectares foram tombados pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais – IEPHA-MG – em 1975.
Patrimônio nacional com pouca aplicabilidade
Desde o ano de 2018, a administração da Boa Esperança está sob a responsabilidade da Associação Pró-Cultura e Promoção das Artes – APPA, através de um Termo de Parceria / 2018 com o IEPHA-MG. A instituição responsável por desenvolver projetos de ações de requalificação e promoção de visitas, com a finalidade de dar vida ao patrimônio não avançou com uma proposta de vigor para o imóvel.
Sob o encargo do Estado de Minas Gerais desde 1974, a que se ressaltar o fato do proprietário tê-la mantida erguida, e preservado sua estrutura que se encontra em boas condições. Entretanto, nesses 50 anos de gestão do Estado, não houve avanço com um projeto que pudesse dar vida ao imóvel. O Estado burocrático da Cultura não evoluiu para administrá-la como um empreendimento cultural sólido, atrativo, que gerasse renda e trabalho e, proporcionasse um turismo ecológico, cultural e histórico.
É fundamental que o Estado de Minas Gerais, IPHAN, IEPHA-MG, APPA e Município de Belo Vale sentem-se, para viabilizar um projeto que dê destino à sua difusão e ocupação. Sobretudo, que investigue e resgate os antigos e abandonados pátios de produção, as ruínas e vestígios arqueológicos; além do ecoturismo com o aproveitamento da atrativa mata nativa e riachos abundantes no entorno do patrimônio.
APHAA-BV: história pela proteção da Boa Esperança
Meu interesse pela Fazenda Boa Esperança vem desde criança. A primeira vez que vislumbrei a casa, estava despedaçada, desamparada e abandonada. Em 1985, fui cofundador e primeiro presidente da Associação do Patrimônio Histórico, Artístico e Ambiental de Belo Vale (APHAA-BV), entidade que teve sua fundação motivada por uma denúncia contra o convênio 014/84 do governo do estado, entre IEPHA-MG e Escola de Veterinária da UFMG para funcionamento de um Centro de Pesquisas, na área do imóvel.
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Projeto da Escola de Veterinária previa criar cerca de 500 porcos para venda, junto às paredes do casarão. O esgoto da manga escorria a céu aberto para as águas do riacho da cachoeira, a qual foi fechada para o uso dos jovens da comunidade.
O projeto não funcionou e pôs em risco a integridade do bem. Em abril de 1986, o convênio foi rescindido. Em 2007, publiquei o livro “Fazenda Boa Esperança – Belo Vale”: às páginas 58 e 59 revelei os danos causados ao patrimônio pelas atividades indevidas que ali estavam sendo desenvolvidas. O livro faz homenagem ao patrimônio e clama para com a sua revitalização e função. Desde então, acompanhei cada atividade que acontece no patrimônio nacional, símbolo da arquitetura colonial mineira do século XVIII.
“Bons presságios”
A expressão Boa Esperança significa “bons presságios”. O espaço de ocupação da fazenda tem muitos atrativos a oferecer: uma enorme área verde de mata nativa e um riacho cristalino com bela cachoeira podem ser transformados em um parque natural. A população aguarda ansiosa pela reabertura do envolvente patrimônio.
Tarcísio Martins, jornalista; pesquisador história de Belo Vale; fotografias.