O Guará é ave típica de manguezais, de faixas litorâneas, portanto, nunca existiu em terras piranguenses. A ave foi incorporada ao brasão e à bandeira do município pela administração em 1983. A partir da década de 1990, um livro, intitulado “Conhecendo Piranga”, até hoje referência da história piranguense no ensino municipal, passou a reproduzir a ideia de que o pássaro citado, integrante do brasão e da bandeira do município, vivia às margens do rio Piranga. No entanto, em 1960, o jornal Piranguense “Estrela da Manhã” (n.° 100) já havia postulado o fato do pássaro Guará não ter existido em nossa região, pois estava restrito aos manguezais em determinados segmentos da faixa litorânea do país.
Como, então, explicar a origem ou as origens do antigo nome “Guarapiranga”? Uma clássica referência no assunto, o dicionário de Aulete, atrela o vocábulo “Piranga” a “barro vermelho” ou, simplesmente, como adjetivo “vermelho”. Por esta via interpretativa, ideias difundidas como a do lobo guará ou da planta ou árvore da qual os índios extraiam uma tinta vermelha poderiam explicar a temática, porém, sem a necessária correspondência documental para o caso de Piranga, fato de suma importância para confirmar a evidência. Até hoje, a única evidência histórica sobre o assunto vem da célebre obra intitulada Códice Matoso (1999, p.257), no qual se encontra o principal documento histórico escrito sobre Piranga no período colonial, publicado em 10/12/1750. O autor da memória, Luís José Ferreira Gouveia, enfatizou que “como naquele tempo havia muito pássaro vermelho no rio, e PEQUENOS, intitularam ao rio [o nome] Guarapiranga, que é o que quer dizer este nome, e lhe ficou o nome e este distrito dos ditos pássaros”. O termo “Guarapiranga”, então, significaria pássaro vermelho, não o guará, típico das faixas litorâneas. Uma das hipóteses, como observou o geógrafo piranguense William Maciel, poderia ser o Tiê-sangue (Xau-baêta, Tiê-piranga ou Canário-baêta), ave símbolo da mata atlântica, uma das mais espetaculares do mundo por sua plumagem vermelha no macho.
Por enquanto, uma conclusão é certa: o pássaro Guará (Eudocimus ruber), cuja imagem figura no brasão e na bandeira do município (Lei Municipal n.º 615, de 18/07/1983), não representa a realidade histórica dos trezentos anos do município. Inclusive, o brasão está incorreto em relação às normas de heráldica no que diz respeito à data, pois não utiliza o marco de fundação oficial ou de emancipação do município, respectivamente 08/12/1695 e 01/04/1841. A obra “Conhecendo Piranga”, por sua vez, como qualquer obra que com o passar dos anos precisa ser revisitada, carece de uma nova edição consoante à nossa realidade.
FONTE PATRÍCIO GUARA DRONE