Histórias que movem Moinhos, Moinhos que movem a história

Cerca de oito mil anos antes de Cristo, o homem deu início à produção de grãos para se alimentar. Foi então que surgiu o moinho para triturar os grãos. A partir de então, essa invenção foi totalmente incorporada à produção de alimentos. Assim como plantar e cultivar os grãos, os moinhos também passaram a ser incluídos no processo de fabricação de mantimentos através da trituração. Essas engenhosas construções, também são citadas em várias partes das Escrituras. No Brasil, o moinho veio com os colonizadores tão logo a terra por aqui começou a ser cultivada e dado inicio a produção de grão após o “Descobrimento do Brasil”. Certamente, os povos indígenas já tinham por aqui seus conhecimentos próprios de moagem de alimentos.
Modelos de moinhos:

Construir um moinho, embora a estrutura fosse (e ainda é) relativamente simples,
sempre foi necessário possuir conhecimentos significativos e diversos na sua construção

  • além da forma construtiva do casebre que abriga o moinho, é preciso ainda conhecer
    a dinâmica de funcionamento.

Os moinhos sempre tiveram fundamental importância na vida rural. Fosse apenas para a manutenção da subsistência familiar, fosse como elemento de impulsão da economia.
Trazendo os fatos um pouco mais próximos, os moinhos fazem parte da paisagem rural e também constitui-se em uma importante parte construtiva nas pequenas casas e/ou grandes fazendas onde vivem os povos do campo, em quase todo o território mineiro.
Outra grande importância também deve ser atribuída aos moinhos – o seu valor histórico e cultural. Desde 2018, o IEPHA (Instituto Estadual do Patrimônio Histórico
e Artístico de Minas Gerais) órgão responsável pelas políticas públicas de preservação do Patrimônio Cultural do Estado, criou e mantém o Cadastro dos Moinhos de Milho e Casas de Farinha, objetivando a identificação desses espaços enquanto Patrimônio Cultural de Minas Gerais. Lamentavelmente, essa ação do IEPHA ainda na está no leque de visão e entendimento de todos.
Existe em Portugal (País de Primeiro Mundo) um museu dedicado à preservação dos moinhos, é o Museu do Moinho Vitorino Nemésio.

As pedras dos moinhos

Existia na localidade de Esperança, em Itaverava, distrito de Queluz de Minas (atual Conselheiro Lafaiete), uma família de exímios mestres canteiros (a cantaria é o ofício ou arte de trabalhar blocos de rocha bruta em peças como elemento estrutural, ora como ornamentação e, muitas vezes, atende às duas funções. Essa arte veio de Portugal e chegou ao Brasil em 1549 através do arquiteto e militar Luís Dias). Essa família, no entanto, transformava os blocos de pedras brutas em pedras de moinhos, únicas e de qualidade sem igual em toda a região.
O patriarca dessa família de Itaverava era Vicente Ozório da Silva (casado com Ana Félix de Souza), dos oito filhos homens, sete eram mestres canteiros (Sebastião,
José, Jurandir, Euclides, Juraci, João e Antônio), apenas um dos irmãos não desenvolveu a habilidade para trabalhar a pedra. Até os anos de 1950 quase todos os
filhos ainda moravam com pai, alguns mesmo casados não deixaram de lado o gosto em transformar pedra em peça indispensável ao funcionamento de uma engenhosa máquina chamada moinho.
Durantes longos anos Sebastião com seus filhos se dedicavam e sobreviviam, às vezes, da fabricação dessas pedras de moinhos. A fama da qualidade das pedras que a família produzia corria longe. Encomendas chegavam, e muitos, de diversas localidades. Os blocos de pedras eram retirados na pedreira do Pé do Morro, localidade de Itaverava.

Mesmo com ferramentas rudimentares, as pedras eram extraídas em larga escala.
Segundo conta Juraci Marques (popularmente conhecido como Juraci da Sanfona), aos 84 anos (únicos dos irmãos canteiros ainda vivo e residente do Bairro Rezende), o pai, Sebastião Osório e os filhos trabalhavam de forma incessante, ali mesmo, na pedreira, diariamente, muitas vezes até durante a noite, à luz de lamparina para dar conta das encomendas. Muitas dessas pedras estão espalhadas por vários moinhos na região.
Havia quem buscasse as pedras diretamente no local da fabricação, algumas eram entregues nas casas dos compradores. Muitas eram trazidas para Queluz de Minas e eram embarcadas nas locomotivas. Existia ainda, um ponto de venda na saída da cidade em direção à Itaverava, onde hoje nas proximidades é o início da BR 482, na Chapada.
Juraci conta que cada pedra levava em média de dez a quine dias para ficar pronta, e elas eram fabricadas em dois e três tamanhos. Ele diz se lembrar claramente de como era grande a procura pelas pedras que a sua família fabricava. Fala ainda de seu pai ensinando aos filhos as várias técnicas usadas no oficio, mas que tudo começava na escolha certa da pedra e do corte a ser feito. Vicente Ozório explicava sobre a cor, veios, textura e onde deveria ser retirado pedaço de pedra, que, depois de trabalhado se transformaria em um par de mós (mó do latim – mola). Abaixo uma estrutura tradicional de pedras de moinho:

Enquanto alguns se abstêm em reconhecer aquilo que (também) constitui nosso verdadeiro Patrimônio Cultural, cabe à nós, os agentes e donos da história, contá-la
quantas vezes for necessário. Aos demais, cabe qualquer coisa.
“As nossas raízes, cultura, memória e história são fatores fundamentais de preservação, para que não se cometa os mesmos erros do passado.”

Por Luiz Otávio da Silva – Pesquisador e Pós-graduando em História.

Em tempo: Molinologia é uma área de estudo que se dedica ao conhecimento dos moinhos tradicionais nos seus aspetos técnicos, sociais e culturais.

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