30 de abril de 2024 18:53

A familía de Bernardo Guimarães e o legado deixado para Conselheiro Lafaiete

Comumente se ouve ou se lê sobre o grande romancista e poeta brasileiro Bernardo Guimarães (Bernardo Joaquim da Silva Guimarães, 1825-1884) quando de sua estada em Queluz de Minas. Conta-se muito sobre a obra “A Captiva Isaura”, conta-se (MUITO) pouco sobre a as aulas que ele lecionava de latim e francês para os jovens queluzianos (ou queluzenses, como alguns preferem). Seria também louvável que ele fosse lembrado por tudo aquilo que mesmo não morando na saudosa e romântica “Queluz Mineira”, fez por honra e graça de nossa Minas Gerais. A exemplo, o grande jornal “A Atualidades”, que para os historiadores é fonte indispensável de pesquisas.

Retomando ao que se propõe o título deste artigo, enalteço o legado deixado pela Família Guimarães a nossa Conselheiro Lafaiete, pois a contribuição do clã não foi somente a de Bernardo Guimarães. Trazendo um pouco à luz do conhecimento para nossa gente, apresento-lhes o Doutor Pedro Bernardo Guimarães, filho derradeiro (o oitavo) de Bernardo Guimarães e de Dona Teresa Gomes de Lima Guimarães, falecida em 1934. O Doutor aqui apresentado foi Engenheiro Geógrafo, Deputado Estadual, Professor, Jornalista e Grande Orador (as escritas em versais são intencionais). Foi ainda o primeiro historiador da cidade de Itajubá, quando escreveu o livro “Município de Itajubá” que foi editado pela Imprensa Oficial de Minas Gerais.

No ano de 2018, através do Requerimento nº 264/2018, o Vereador Marcelo Krauss Rezende, da cidade de Itajubá, solicita que Casa Legislativa daquele município encaminhasse ao Conselho de Patrimônio Histórico, sugestão de Tombamento da referida obra de Dr. Pedro. Requerimento justificado pela magnitude que representa(va), o trabalho de historiografia do ilustre filho caçula de Bernardo Guimarães. Doutor Pedro publicou outras obras de grande relevância para nosso Estado, como “Fastos – História de Minas”.

“Pedro Bernardo Guimarães era o caçula do autor de “A Escrava Isaura”, Bernardo Guimarães. Não conheceu o pai, pois, quando o poeta e romancista vila-riquense morreu, Pedro ainda não tinha nascido. Dona Teresa estava no segundo mês de gravidez. Pedro nasceria postumamente sete meses após a morte do pai, em 19 de outubro de 1884, no velho sobrado da família, no Alto das Cabeças, em Ouro Preto.

Dos filhos do romancista, foi o único que se dedicou à política, tendo sido deputado do Congresso Mineiro, ‘notabilizando-se na Câmara pelos seus discursos e pela sua independência de caráter’. Da prole Bernardiana foi o que mais escreveu, não só em jornais e revistas, como em livros. Teve intensa atividade jornalística, que se assinala desde a meninice até os últimos minutos de sua vida (…).” Excerto extraído do Requerimento nº 264/2018. Itajubá, Minas Gerais.

Pedro Bernardo Guimarães – Arquivo da Internet (https://www.oguiadeitajuba.com.br/).

Como fatos importantes que unem o Doutor Pedro Guimarães à nossa cidade, cito seu trabalho em educandários da cidade quando por aqui residiu por duas vezes. Reconhecidamente um célebre Professor, trabalhou em dois importantes educandários de Queluz, sendo um deles o Gymanasio Queluziano onde o consagrado escritor Bernardo Guimarães (seu pai) também havia lecionado.

No tempo em que residiu em Queluz, mais precisamente no Bairro de Lafayette, Doutor Pedro também se tornou conhecido e repeitado pela sua grande capacidade discursiva, enquanto orador. Era convidado a proferir seus belos discursos em várias ocasiões, inclusive em momentos fúnebres. E não foram somente os ares deda cidade Queluz de Minas que testemunharam seus discursos, mas toda região.

Ainda morando por aqui, em 1928, quando era também colaborador do Jornal de Queluz, outro fato de extrema importância aconteceu, foi quando recebeu o comunicado que havia sido eleito para a Societè Academique d’Histoire Internationale de Paris, fundada pelo grande poeta e escritor francês Frederic Mistral (Maillane, 8 de setembro de 1830 — Maillane, 25 de março de 1914). A principal ora de Mistral foi “Mireia” que conta o amor de Vincent e da linda Mireia, uma provençal. História equiparável à de Romeu e Julieta e que se tornou tema de ópera em 1863, por ninguém menos que Charles Gounod.

Frederic Mistral – Arquivo da Internet.

Já em fevereiro do ano de 1929, Doutor Pedro Bernardo Guimarães projeta e escreve mais uma vez o nome de nossa Queluz de Minas nos anais da História e da Cultura do Brasil.

Foi partindo daqui, desta terra, pisando sobre as pedras das nossas ruas estreitas e respirando o nosso ar, que Doutor Pedro consolidou a maior iniciativa de preservação da memória de Bernardo Guimarães. Qual teria sido? Foi a aquisição, pelo Governo ao Governo do Estado de Minas Gerais, da casa onde viveu e escreveu sua melhores obras o grande Bernardo Guimarães. Foi nesse ano que a casa foi incorporada ao patrimônio do Estado.

Tal e grande feito, levou Doutor Pedro a comunicar formalmente a Academia Brasileira de Letras acerca do grande acontecimento – a transferência da casa onde morou o pai, em Ouro Preto, para o Governo Mineiro.

Eis um trecho da carta enviada à Academia:

“Exmo sr. presidente [sic] de Academia Brasileira de Letras – Saudações –

Tenho a honra comunicar a v.ex., em nome da minha mãe, a viúva Bernardo Guimarães, no meu e dos meus irmãos, que o exmo sr. presidente Antônio Carlos, em nobilíssimo gesto que mais positiva a superioridade intelectual do preclaro mineiro que atualmente dirige os destinos do Estado, acaba de adquirir, adjudicando-o ao patrimônio de Minas, o prédio em que durante muitos annos viveu, escreveu suas melhores obras e veio a fallecer em Ouro Preto, meu saudoso pae, o romancista Bernardo Guimarães (…)”.

Ainda em fevereiro do corrente ano, a Academia de Brasileira de Letras remete a Doutor Pedro Bernardo Guimarães a seguinte resposta:

“Academia Brasileira de Letras – Rio de Janeiro, 22 de fevereiro de 1929.

Ilmo. Sr. Professor Pedro Guimarães – Gymnasio Queluziano.

Accusando o officio de 10 do corrente no qual V. S. comunicava em seu nome e no da Excellentissima Viuva Bernardo Guimarães, haver o sr. Presidente do Estado de Minas Gerais , adquirido prédio onde viveu, falleceu, em Ouro Preto, tenho o prazer de, por minha vez, comunicar-lhe que, lido o seu officio, em sessão de ontem, foi louvado o o acto de benemerência patriótica de S. Ex. o Sr. Antônio Carlos, que assim, mais uma vez demonstra seu carinho pelas nossas tradições históricas e literárias.

Congratulando-me, pois com V. S. e a Excellentissima Viuva Bernardo Guimarães, agradeço-lhe a gentileza da comunicação, e prevaleço-me da oportunidade para apresentar a V. S. as expressões de minha elevada consideração e distinto apreço.
O 1º secretario (a): OLEGARIO MARIANNO.”

Depois de alastrada a notícia da grande atitude da Família Guimarães e do Governo Mineiro em salvaguardar a casa onde viveu o Bernardo Guimarães, em Ouro Preto, o Jornal de Queluz publicou, com o título “A casa de Bernardo Guimarães e da cabeça de Tiradentes” uma extensa transcrição da correspondência de O Globo.

Eis a matéria:

“QUELUZ DE MINAS, 12 –

Estamos informados que o governo de Minas, em um significativo gesto de homenagem, fez converter ao patrimônio do Estado a casa onde viveu e falleceu em 1884 popular consagrado escriptor e poeta Bernardo Guimarães.

Esse prédio, de estylo colonial, é um vasto sobrado da Rua das Cabeças, na antiga e legendária cidade de Ouro Preto. Sendo das mais velhas das edificações da ex-capital, prende-se ao seu passado a legenda que se refere à tragedia da Inconfidencia, envolvendo a na tradição de ter sido o santuário accidentalmente escolhido para guardar a cabeça de Tiradentes, mysteriosamente desapparecida, dias após o suplicio, do poste de ignomínia em que a collocára, para exemplo do povo, a justiça colonial.

Ao que dizem as chronicas daquelle tempo, um fanático pelo Herde dessa conspiração liberal, valendo-se do descuido dos guardas e das brumas de certa noite, roubou o craneo do martyr, sem que as devassas abertas conseguissem descobrir seu paradeiro. A preciosa reliquia foi objecto de secreta veneração, até que um dia, velho e alquebrado, o mystico ladrão, sentindo approximar-se a morte, chamou o padre Silveira Gatto e, em sigillo de confissão, entregou-lhe o craneo descarnado de Xavier.

(…)
Querendo ter certeza relativamente da administração mineira no sentido de ter conservado a casa histórica, fomos hoje, procurar o Dr. Pedro Bernardo Guimarães, filho do escriptor mineiro, e que actualmente reside nesta cidade, onde è lente do Gymnasio Queluziano. Pedro Bernardo Guimarães que regresava na véspera de Bello Horizonte, recebeu-nos em sua residência, à Rua Marechal Floriano Peixoto, dizendo-nos:

Voltei, hontem, de Bello Horizonte onde deixei concluída a formalidade da transferencia da casa em que morou meu pae, Bernardo Guimarães, ao patrimonio do Estado. Positivou-se assim a vontade manifestada por esse espírito culto, que é o Dr. Antonio Carlos, em que só vi durante as nogociações e nas diversas vezes que o procurei no Palácio da Liberdade, gestos de nobreza excepcional quanto ao nome e à memoria do meu projenitor. Recebendo minha septuagenaria mãe, juntamente em dia em que o assoberbavam múltiplos negocios da adiministração, S. Ex. Foi de uma figalguia empolgante.

(…)
Pedro Guimarães, concluindo a entrevista, disse-nos mais:
-Não ficou só ahi o presidente Antônio Carlos. Determinou mais que se erigisse no cemiterio da egreja de S. José, em Ouro Preto, um mausoléo a que sejam recolhidos os despojos de Bernardo Guimarães (…). Recolhi os ossos de meu pae a uma urna de zinco que está guardado no cemiterio daquelle templo oropretano, onde aguardam o prometido jazigo em que repousem (…).”

Doutor Pedro Bernardo Guimarães faleceu no ano de 1948, na cidade de Uberlândia, onde era Professor, em quatro Educandários. Nessa mesma cidade foi Secretário da Prefeitura, em 1933.

Recentemente, tive o prazer, assim como em outros momentos em conversar, ao telefone, com Senhor Anchieta (neto de Doutor Pedro Guimarães e bisneto de Bernardo Guimarães) sobre este artigo que eu pretendia publicar, quando tomei a liberdade em perguntar a ele se eu poderia citá-lo no texto. Ele, dotado de extrema polidez, disse-me que seria um honra para ele. Disse-me ainda inda que não tinha conhecimento de todos os (grandes) fatos citados por mim. Prometeu-me, quando possível, enviar-me algum material sobre o Doutor Pedro Bernardo Guimarães, um homem a quem devemos o reconhecimento e reverências!

A História não termina aqui.

“A memória é a consciência inserida no tempo.”
(Fernando Pessoa)

Por Luiz Otávio da Silva – Pesquisador, Pós-graduando em História e Pós-graduando em
Arquitetura e Patrimônio.

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