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‘Exposed’ de traição cresce na internet; ato pode ter consequências jurídicas

Relatos têm despertado cada vez mais o interesse das pessoas, que viralizam essas histórias nas redes sociais

A história de uma mulher que alega ter sido traída pelo marido com o próprio pai tomou conta das redes sociais em novembro. Você pode até não ter pesquisado ou lido detalhes sobre o assunto, mas com certeza viu “pularem” na tela recortes desse caso, que ocorreu em Araraquara, no interior de São Paulo, revelado após a publicação de imagens que seriam dos dois homens mantendo relações sexuais. No mesmo período, também tomamos conhecimento, via redes sociais, do caso da mulher que foi flagrada traindo o marido com o patrão na praia e do homem que foi visto na igreja com a amante. Todas essas histórias viralizaram, mobilizaram o “tribunal da internet” e, ao mesmo tempo, levantaram alguns questionamentos: por que esses casos geram tanto interesse? E quais as consequências dessa exposição, inclusive perante a Justiça? 

O “exposed” de traição nas redes sociais não é uma novidade. Entretanto, é algo que tem se repetido com muita frequência e repercutido nas redes. Para compreender esse “movimento”, é preciso levar em consideração alguns fatores, conforme explica a psicóloga e terapeuta sexual Renata Lanza de Melo Franco, especialista em sexologia e educação sexual. “Pode ser por vingança, para fazer a pessoa exposta sofrer, prejudicando-a de alguma forma; pode ser para provar para outras pessoas que de fato houve uma traição; ou para dar uma satisfação à sociedade”, afirmou. 

“Denunciar a ‘pulada de cerca’ de alguém na internet é sem dúvida uma forma de vingança. Trata-se de um comportamento reativo-destrutivo, pois traz consigo, na maioria das vezes, consequências muito negativas”, pontuou a terapeuta cognitivo-comportamental e mestre em relações interculturais Renata Borja, em entrevista a O TEMPO em fevereiro deste ano. Segundo ela, esse ato, em um primeiro momento, pode trazer uma sensação de alívio e de prazer, porém a terapeuta alertou: “Isso engana o cérebro, que não percebe as consequências negativas dessa atitude. Dessa forma, acabamos buscando o mesmo comportamento no futuro, formando assim um círculo vicioso”. 

Renata Lanza concorda que essa atitude pode trazer um alívio, mesmo que momentâneo, para quem expõe. “Talvez ajude a pessoa traída a lidar com o trauma quando ela recebe apoio, seja financeiro, emocional, jurídico ou psicológico. Uma exposição também pode encorajar outras vítimas a também se manifestarem, dependendo do caso”, completou a psicóloga. Entretanto, a especialista pondera que o grande interesse na internet sobre esses “exposeds” de traição tem relação com outros fatores que vão muito além de apoio à pessoa traída.  

“Existe uma ilusão de que, na internet, estamos ‘protegidos’, então temos o direito de julgar o quanto quisermos – o famoso ‘tribunal da internet’”, observa Renata Lanza. “Além disso, há certo prazer em ver que a vida do outro também tem problemas, não apenas a nossa, o que também pode acarretar uma sensação de alívio por aquilo não ter acontecido conosco. E também a boa e velha curiosidade e interesse pela vida alheia como entretenimento, pelo simples prazer de fofocar”, acrescentou. 

Para Renata Borja, essa exposição de traição nas redes sociais pode trazer uma falsa sensação de acolhimento, e, no geral, a vingança não é algo bem-visto na sociedade. “Na verdade, ela tende a contribuir para o afastamento de pessoas, assim como o aumento de relacionamentos conflituosos, ressentimento, ruminação e, consequentemente, sensação de abandono e desamparo”, frisou. 

Essa exposição pode deixar outros impactos na vida das pessoas envolvidas. “Pode causar preocupação com a imagem social e profissional, medo de julgamentos alheios, fofocas, constrangimento, possibilidade de bullying entre crianças e adolescentes, exclusão social e profissional”, alertou a psicóloga e terapeuta sexual Renata Lanza de Melo Franco. “Pode prejudicar também no âmbito legal, pois expor determinadas situações nas redes sociais pode gerar consequências jurídicas e até indenização”, frisou.  

Consequências jurídicas 

Expor uma traição nas redes sociais pode, sim, virar caso de Justiça. É o que explica o advogado especialista em direito digital e redes sociais Pedro Romanelli. “No Brasil, expor informações pessoais na internet, como forma de vingança ou para causar constrangimento, pode configurar crime. A Lei Carolina Dieckmann, por exemplo, criminaliza a invasão de dispositivos eletrônicos para obtenção de dados sem autorização. Além disso, o Código Civil prevê a possibilidade de indenização por danos morais em casos de exposição indevida”, afirmou. 

Segundo Romanelli, expressar a frustração e mágoa é direito do ser humano e pode ser considerado liberdade de expressão, desde que feito com equilíbrio. “A pessoa traída tem o direito de expor seus sentimentos e os fatos que estão acontecendo com ela, mas é preciso ter muito cuidado para não cometer abusos”, alerta o advogado. “Dependendo do que se fala e do que se faz, pode configurar crime”, acrescentou.  

“A pessoa que traiu ser exposta nas redes sociais não gera nenhum tipo de processo, nem por dano moral. Mas o que se faz dentro da exposição pode ser crime. Só será considerado crime se no momento da raiva eu quebrar o carro da pessoa, ameaçá-la, difamá-la”, ressalta. “Compartilhar questões intimas, conversas particulares, acusar sem provas, prejudicar o outro e ofender pode configurar abuso de direito de liberdade de expressão, e esse é o limite a não ser ultrapassado”, disse o advogado, que completa que a penalidade pode ser pagamento de multa, prestação de serviço e até mesmo a prisão.  

No caso de Araraquara, por exemplo, a divulgação do vídeo de sexo entre sogro e genro é considerado um crime previsto no artigo 218-C do Código Penal Brasileiro: “Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar ou divulgar, por qualquer meio – inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática –, fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de estupro ou de estupro de vulnerável ou que faça apologia ou induza a sua prática, ou, sem o consentimento da vítima, cena de sexo, nudez ou pornografia”. 

Por isso, Pedro Romanelli afirma que é preciso cautela. “Esse tipo de exposição pode gerar uma grande repercussão; isso pode ser prejudicial para todos os envolvidos. A exposição da traição não ajuda o traído nem o traidor”, ponderou.

FONTE O TEMPO

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