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Mudanças climáticas agravam cenário da dengue em MG, que pode ter ‘resquícios’ de epidemia

Altas temperaturas e chuvas torrenciais favorecem desenvolvimento e reprodução do mosquito transmissor da doença

Inverno com temperaturas de verão e chuvas torrenciais, com grandes volumes de água em curtos períodos. Os efeitos das mudanças climáticas favorecem a procriação do mosquito transmissor da dengue e impactam na situação da doença em Minas Gerais. O Estado viveu, no início deste ano, a pior epidemia da sua história e pode enfrentar um novo período crítico nos próximos meses. A circulação de um sorotipo diferente também preocupa, por aumentar o risco de casos graves.

Conforme dados do último boletim epidemiológico, divulgado pela Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) em 18 de novembro, o Estado registrou, em 2024, 1.091 mortes causadas pela dengue. Os casos confirmados somam 1.340.980. Embora tenha havido uma queda desde maio, as autoridades alertam para a possibilidade de aumento exponencial nos próximos meses. Por causa da preocupação com relação à doença, no fim da última semana o Ministério da Saúde, conforme previsto em lei, promoveu o Dia de Conscientização de Combate à dengue.

O infectologista Leandro Curi explica que a dengue é sazonal, com pico de incidência no verão, cujas características são calor e tempo úmido. Além disso, as infecções têm um perfil cíclico, com picos ocorrendo a cada três ou cinco anos. No entanto, ele ressalta que, para o período entre o fim deste ano e o início de 2025, “pode haver resquícios da última epidemia”, com número elevado de casos. 

“Como tivemos um início de ano muito complicado, estamos trabalhando como se esse cenário [de epidemia] possa acontecer”, esclarece o subsecretário de Vigilância em Saúde da SES-MG, Eduardo Prosdoscimi. “Esperamos que não seja um cenário ruim, mas precisamos estar preparados”, admite.

O gestor acrescenta que as mudanças climáticas agravam o cenário das arboviroses. “Estamos vivenciando recordes de temperatura. Tivemos temperaturas altíssimas no inverno. Todo esse cenário é propício para a mudança do perfil epidemiológico da dengue. A epidemia deste ano foi sem precedentes”, analisa.

Calor acelera crescimento do mosquito

O calor está diretamente associado ao desenvolvimento do Aedes aegypti, mosquito transmissor da dengue, chikungunya e zika. Quanto mais quente, mais rápido o inseto chega à fase adulta, explica a bióloga Fernanda Raggi Grossi. Como exemplo, ela cita o tempo de desenvolvimento das larvas até a fase adulta.

“As temperaturas ideais da água para as larvas ficam entre 17°C e 34°C. Quanto maiores, menor é o tempo de desenvolvimento”, explica. No extremo mais frio, o tempo de encubação é estimado em cerca de duas semanas, enquanto no mais quente em apenas três dias.  

As chuvas torrenciais também são citadas pela especialista como fatores que aumentam os pontos de reprodução. Isso porque, também devido à pouca permeabilidade do solo em áreas urbanas, alagamentos e enchentes são comuns, favorecendo o acúmulo de água parada. “Isso facilita a infestação do mosquito em novas áreas”, explica. 

Casos mais graves

Com fatores favoráveis ao aumento de casos, a circulação do sorotipo 3 da dengue preocupa as autoridades. Segundo a SES-MG, o tipo 1 ainda é o predominante, mas o tipo 3 tem apresentado crescimento no País. Em maio do ano passado, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) alertou para a possibilidade de uma nova epidemia causada por esse sorotipo.

“É preocupante porque o vírus encontra uma população ainda vulnerável, sem anticorpos para esse sorotipo”, explica o infectologista Leandro Curi. A última epidemia causada pelo sorotipo 3 da dengue no Brasil ocorreu no início dos anos 2000.

O vírus da dengue possui quatro sorotipos. A infecção por um deles gera imunidade contra o mesmo sorotipo, mas é possível contrair dengue novamente se houver contato com um sorotipo diferente. Além disso, há mais chances de complicações a partir da segunda infecção.

“Isso mostra a necessidade de capacitarmos o manejo clínico, para cuidar de maneira adequada do paciente. Com mais de um sorotipo, nosso organismo pode ter uma possibilidade de casos mais graves. Mas, se tivermos um manejo adequado, acompanhando e fazendo o acompanhamento correto, certamente os casos graves tendem a reduzir”, afirma o subsecretário Eduardo Prosdocimi.

Vacinação ainda engatinha  

Desde fevereiro deste ano, há vacina contra dengue disponível na rede pública de saúde para crianças e adolescentes de 10 a 14 anos. A restrição da faixa etária se deve à limitação do número de doses disponíveis, devido à capacidade de fabricação do laboratório Takeda, responsável por produzir e distribuir a vacina Qdenga. No entanto, a cobertura vacinal está aquém do esperado pelas autoridades em saúde.

Em algumas cidades, como Belo Horizonte, houve a ampliação da faixa etária devido à baixa procura. Na capital mineira, podem ser vacinadas pessoas de 6 a 14 anos. Ainda assim, a cobertura vacinal para a primeira dose é de 32%, enquanto para a segunda dose é de 10,85%. O município tem realizado campanhas de conscientização para incentivar os pais e responsáveis a vacinarem seus filhos.

O imunizante também está disponível pela rede particular para pessoas de até 60 anos, com custo aproximado de R$ 350 por dose. “A vacinação será uma ferramenta de médio a longo prazo. Para a atual sazonalidade da doença, não será um elemento para reduzir os danos em grande escala, mas é uma medida muito eficaz. Tendo vacina disponível, é nossa primeira recomendação”, analisa o subsecretário Prosdoscimi.

Para 2025, o Ministério da Saúde anunciou a aquisição de 9,5 milhões de doses da vacina, o dobro das 4,7 milhões compradas neste ano. Outra possibilidade é uma vacina que está sendo desenvolvida pelo Instituto Butantan, mas que ainda não foi apresentada à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

Enquanto não há imunizante disponível para vacinação em massa, o papel individual continua sendo a principal forma de evitar uma situação crítica com a dengue, reforça o subsecretário. “O combate às arboviroses é um hábito de saúde coletiva. Cerca de 80% dos focos de água parada estão dentro de casa. Se a população se engajar, com dez minutos por dia, teremos um período sazonal mais tranquilo”, completa.

FONTE: O TEMPO

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