Homenagem a um grande autor mineiro ganha espaço em Conselheiro Lafaiete, na Região Central do estado, em cenário que reúne uma “cascata” de livros, fonte do saber, e um coração que traduz o amor pela literatura. Inaugurada em dezembro, no Centro da cidade, a Praça Escritor Bernardo Guimarães reverencia a memória do romancista cuja obra mais conhecida, “A Escrava Isaura”, ganhou o mundo e emocionou pessoas em vários idiomas. Trata-se do primeiro passo de uma série de comemorações, pois em 2025 será celebrado o bicentenário de nascimento de Bernardo Joaquim da Silva Guimarães.
Ocupando um antigo depósito de sucata a céu aberto, o novo espaço público – iniciativa da prefeitura local, com recursos próprios, e projeto do artista visual e filho da terra Jorge Fonseca – “nasceu da vontade de resgatar o sentimento literário local e de não deixar esmaecer o importante legado literário brasileiro”, diz o secretário municipal de Cultura, Rafael Lana, também presidente do Circuito Villas e Fazendas de Minas Gerais
Lana ressalta que Lafaiete (antiga Queluz) foi, no passado, “um reduto de intelectuais, de um povo que amava os livros e onde as casas tinham ao menos uma flor”, o que deu à localidade a fama de “cidade dos livros e das flores”. A informação consta de um Anuário de Minas Gerais de 1913. Havia no município oito bibliotecas públicas, consideradas as mais importantes do estado.
A PRESENÇA NA CIDADE
Natural de Ouro Preto, Bernardo Guimarães (1825-1884) morou durante alguns anos em Conselheiro Lafaiete, “inclusive durante a escrita de ‘A Escrava Isaura’”. A praça em sua homenagem fica em frente ao terreno em que ficava o casarão onde o escritor morou, na Rua Desembargador Dayrell de Lima (no lugar, há hoje um hipermercado). A iniciativa do Executivo municipal recebeu o apoio do Ministério Público de Minas Gerais e da Academia de Ciências e Letras de Conselheiro Lafayette (ACLCL).
O projeto da Praça Escritor Bernardo Guimarães foi entregue ao artista visual Jorge Fonseca, hoje residente em Ouro Preto. “Recebi o convite como uma missão muito forte. Espero que este espaço atraia muitos estudantes e sirva para estimular a leitura, valorizar a história, fortalecer a educação”, afirma o artista, que trabalhou durante seis meses para concluir a obra.
O conjunto abriga a escultura de corpo inteiro, em escala real, do autor, resultado do trabalho do escultor Felipe Rodrigues, de Piranga, na Zona da Mata, e três monumentos concebidos por Jorge Fonseca, criador do Fiotim (Museu em Movimento). Segundo Rafael Lana, a praça foi idealizada como “espaço de imaginação, de incentivo à convivência e à interação do leitor com a literatura”.
FONTE DOS SABERES
O secretário informa que na parte superior, a escultura “A Fonte dos Saberes” evoca o formato de uma nascente, de uma onda de livros em constante movimento, em evolução. Na central, a estátua de Bernardo Guimarães, sentado sobre um pedestal de livros e com um deles aberto nas mãos, pronto para compartilhar suas ideias com os visitantes, emoldurado pela escultura “O Escritor em seu Mundo”. Aí está uma estante estilizada, “que parece lançar livros em uma cascata, simbolizando a generosidade do conhecimento”.
ivros, que se estende em dois bancos, convidando o visitante a interagir com o espaço. “A inauguração marca não apenas uma reparação da cidade com os descendentes do famoso autor, mas a eternização do reconhecimento da sua importância para a memória de Lafaiete.” Durante a inauguração, foi entregue uma carta assinada por familiares do escritor.
Na obra central da praça destaca-se a estátua de Bernardo Guimarães sentado sobre um pedestal de livros e com um deles aberto nas mãos, pronto para compartilhar suas ideias com os visitantes, emoldurado pela escultura “O Escritor em seu Mundo”
Na entrega do espaço à comunidade, o prefeito Mário Marcus Leão Dutra destacou a importância de se valorizarem a história e os ícones culturais da cidade. “Bernardo Guimarães foi mais do que um escritor. Ele é parte viva do legado cultural e histórico de Lafaiete. Esta praça é um tributo à sua obra e à sua contribuição para a literatura brasileira e mundial”, afirmou. O espaço inclui jardins temáticos, bancos estilizados e painéis que contam a história do escritor e sua relação com a cidade.4
O evento celebrou também os 30 anos da ACLCL, cujo presidente, Moisés Mota, aproveitou para reforçar o papel da instituição na preservação do patrimônio literário e cultural: “Esta praça e o Circuito Cultural representam a união de esforços entre o poder público, a academia e a comunidade para manter viva a memória de nossa cidade e seus ilustres moradores”.
VIDA E OBRA
Patrono da cadeira nº 5 da Academia Brasileira de Letras, da cadeira nº 21 do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais e da de nº 15 da Academia Mineira de Letras, Bernardo Guimarães nasceu em Ouro Preto, em 15 de agosto de 1825, e morreu em 10 de março de 1884, na mesma cidade . Aos 17 anos, em Conselheiro Lafaiete, participou de combates na Revolução Liberal de 1842. Formou-se na Faculdade de Direito de São Paulo (1847), cidade onde se tornou amigo dos poetas Álvares de Azevedo (1831-1852) e Aureliano Lessa (1828-1861). Os três e outros estudantes fundaram a Sociedade Epicuréia. O livro mais conhecido do escritor é “A Escrava Isaura”, publicado pela primeira vez em 1875 pela editora do livreiro J.B. Garnier. Narra as agruras de uma jovem que vivia em uma fazenda do Vale do Paraíba (RJ). O romance se tornou novela de sucesso internacional, em 1976 e em 1977, e depois em 2004. Conforme pesquisa do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais, Bernardo Guimarães foi ainda juiz municipal e de órfãos de Catalão, Goiás. Exerceu o cargo até 1854. Em 1858, mudou-se para o Rio de Janeiro. Oito anos mais tarde, foi nomeado professor de retórica e poética do Liceu Mineiro, de Ouro Preto. Entre 1873 e 1879, Bernardo Guimarães lecionou línguas clássicas no antigo liceu de Conselheiro Lafaiete. No período, publicou, além de “A Escrava Isaura” (1874), “Novas Poesias” (1875), “Maurício ou os Paulistas em São João del-Rei” (1876) e “A Ilha Maldita e o Pão de Ouro” (1878).
- Texto: Gustavo Werneck (EM)
- Foto: Eduardo Sacramento