A Paróquia de São Brás, sediada no município de São Brás do Suaçuí, outrora distrito de Suaçuí, vai comemorar nesta quarta-feira, 28, o tricentenário de início dos ritos litúrgicos na primitiva capela dedicada ao seu padroeiro. À construção do templo original, precedeu-se uma sequência de fatos notáveis que preparam o lugar para a ocupação colonizadora.
Primeiro, fez-se a construção de um caminho novo ligando o povoado do Rio das Mortes ao de Congonhas do Campo. A seguir, no dito caminho, em meio a vários córregos e às margens esquerda do rio Paraopeba e direita do rio Camapuã escolheu-se um ponto de paragem que foi chamado de Sugua suhi. Posteriormente, fabricou-se no referido ponto um sítio com plantação de grãos e criação de animais. Depois, veio o reconhecimento oficial da existência do lugar por meio da concessão de uma sesmaria no ano de 1713. Logo após, criou-se um Regimento das Ordenanças de pé para proteção das pessoas e de seus patrimônios.
Por último e em sexto lugar, ergueu-se uma capela, filiada à matriz de Nossa Senhora da Conceição de Congonhas do Campo e dedicada ao bispo e mártir São Brás cuja devoção veio para Suaçuí na bagagem espiritual de duas famílias pioneiras que se fixaram na Paragem: a do casal de sesmeiro João Machado Castanho e Margarida Fernandes, provenientes da vila de Sorocaba, e a do oficial de carpinteiro Anselmo Mendes da Cruz e de sua mulher Bárbara Pires Dória, oriundos da freguesia de São Sebastião, região norte do atual estado de São Paulo. Em ambos os lugares, vivia-se o devotamento ao Santo Bispo.

Feita a Capela, que trouxe consigo a mudança da classificação de Suaçuí de paragem para distrito, completou-se o ciclo da criação necessária ao povoamento e a multiplicação aconteceu em toda a sua jurisdição, alcançando dentre outros locais, a Boa Vista, a Fazenda do Tanque, o Cafundó, a Serra do Caixeta, o Lopes, o Sítio do Padre João, o Caeté, o Mato Dentro, a Paraopeba, o Pequeri, o atual munícipio de Jeceaba, a Fazenda Gamela, o Palmital, a Cova da Onça, o Córrego das Mamonas e o Pires.
Em meio à violência daqueles tempos, quis a providência que o protagonista do primeiro rito com registro preservado ocorrido dentro da capela de São Brás trouxesse em seu nome a lembrança de um símbolo da paz, no âmbito do Catolicismo. Em uma segunda-feira, aos 28 de maio de 1725, foi concedida sepultura a um paroquiano que viveu privado da liberdade e sendo chamado de Francisco, escravo de João dos Santos.
Com a construção da capela de São Brás, Suaçuí passou a oferecer a seus habitantes um espaço para vivência da fé e proporcionou alternativas de convivência para seus aplicados, uma vez que a vida social se dava em torno das missas, procissões e outras celebrações religiosas.
Aumentaram dessa forma os atrativos do lugar para os migrantes da Colônia e do Reino. Aos poucos, novos moradores foram se instalando. Vieram de diversos locais de Minas e de outras capitanias como São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco e Bahia e ainda de Portugal, tanto do continente quanto das ilhas. Entre eles, o distrito de Suaçuí recebeu no ano de 1727 seu primeiro capelão-residente, o padre português Jacinto Cardoso Osório, natural da freguesia da Foz do Douro, bispado do Porto.

Nas duas décadas seguintes, o número de núcleos familiares ou de unidades de produção econômica formados por africanos, brasileiros e portugueses aumentou de pelo menos 29 para 92. Em volta da capela, começaram a ser erguidas várias casas como ponto de apoio dos moradores de sítios e fazendas para o cumprimento semanal de seus deveres religiosos ou como estabelecimentos comerciais. Em 1743, o arraial de Suaçuí já estava formado.
Da estrutura física da capela original pouco ficou registrado. Sabe-se que possuía grades, confessionário, sacristia, patrimônio anual de 6$000 réis, imagens de São Brás e de São Miguel, em seus respectivos altares, e ainda de Nossa Senhora do Rosário e de Santa Ana, tida como intercessora de um milagre ocorrido no século XVIII, no distrito de Suaçuí, em favor de um escravo de Maria das Neves de Oliveira, atingido no rosto pelos chifres de um boi.
No ano de 1750, essa referida capela parece ter ganhado sua planta baixa atual. Em conformidade com as Constituições Primeiras do Arcebispado da Bahia, que eram seguidas pelos bispados brasileiros e determinavam o reparo e a restauração ao invés da demolição, deu-se início em Minas, após a criação do bispado de Mariana, a um movimento de transformação das capelas e matrizes feitas com material pouco resistente em obras de pedra e cal, com a devida ampliação do espaço, quando necessário, como aconteceu com a matriz de Nossa Senhora da Conceição, de Antônio Dias, e com a então capela e depois matriz de Santo Antônio, de Itatiaia.
Nesse contexto, é possível considerar que a capela de São Brás tenha tido suas paredes reconstruídas com o acréscimo da capela-mor e dos dois corredores laterais, onde foram inseridos o batistério e as duas torres, de forma a torná-la compatível com uma matriz, dado o crescimento do distrito e do arraial de Suaçuí.

O trabalho de colocação de toda a pedraria encontrava-se concluído no dia 21 de julho de 1753 e foi feito pelos pedreiros Manoel e José Pereira Gomes, contratados pelo exímio mestre-pedreiro português José Pereira dos Santos. A eles, juntaram-se o carpinteiro Manoel Marques Francisco e o carapina Bartolomeu Rodrigues Rabelo, também portugueses, encarregados de fazer todo o madeiramento da obra.
A documentação encontrada revela que enquanto os trabalhos de construção e de embelezamento prosseguiam nas décadas de 50 e 60, missas eram rezadas e batizados, casamento e sepultamento eram realizados no interior da capela. Ao mesmo tempo, era fundada a primeira associação religiosa de Suaçuí de que se tem notícia: a Irmandade de Nossa Senhora do Rosário da capela de São Brás do Susuahy dos Irmãos Pretos, que tinha como pré-requisito a existência de uma igreja ou de um altar que a acolhesse, altar este erguido na nave da capela de São Brás, do lado da epístola.
Em frente a ele, o espaço estava livre para que outro altar fosse construído. No ano de 1758, a capela de São Brás recebeu do português João Ribeiro da Costa uma doação testamentária no valor de 200$000 réis para a construção de um altar dedicado a São Francisco de Assis. Por razões não comprovadas prevaleceu a escolha do altar dedicado à Nossa do Carmo.
Ainda que São Francisco não tenha sido agraciado com um altar na capela de São Brás, a devoção dos habitantes de Suaçuí a ele permaneceu inabalada. Seguidamente, ela era expressa nos nomes que os pais davam aos filhos por ocasião do batismo, nas doações pias que eram registradas em testamentos e na escolha de seu hábito como mortalha por parte dos testadores.
Quanto à autoria da talha dos retábulos seu interior, em virtude da ausência de documentos relativos à contratação e ao pagamento dos trabalhos pode-se até o momento apenas presumir a participação do artífice lusitano Felipe Vieira em sua feitura, tendo em vista as semelhanças com algumas obras por ele executadas na atual cidade de Ouro Preto e em virtude de comprovadamente ele ter residido no arraial de Suaçuí na segunda metade do Setecentos, quando declarou viver de seu ofício de escultor.
Ao que indica, parte das obras de embelezamento já estavam concluídas no ano de 1761, pois aos 10 dias do mês de outubro do referido ano, o português João Ribeiro da Cruz obteve da Câmara Episcopal do bispado de Mariana pelo valor de $125 réis uma provisão para que o Pároco de Congonhas do Campo colocasse uma imagem de Nossa Senhora da Conceição na capela de Suaçuí.
No ano seguinte, após ser conduzido por seis outros padres, o curato do distrito de Suaçuí passou pela primeira vez às mãos de um filho da Terra, o padre João Antônio da Silva Leão, batizado na capela de São Brás, em 1734. Encaminhado à cidade do Rio de Janeiro para estudar e tomar estado clerical por seu gosto, João Antônio retornou a Minas Gerais e matriculou-se no Seminário de Nossa Senhora da Boa Morte para receber as ordens menores e maiores. Cursou Moral por seis meses e foi examinado e aprovado em canto pelo mestre-capela Manoel da Costa Dantas, recebendo conjuntamente no ano de 1759 as ordens de diácono e presbítero. Serviu inicialmente na capela de São Gonçalo da freguesia dos Carijós e a seguir veio para Suaçuí, onde exerceu seu ministério por cerca de 25 anos.
A partir do ano de 1786, pelo menos outros sete sacerdotes estiveram à frente da capela de São Brás, sendo os dois últimos o ouro-pretano Manoel da Cunha e Melo, domiciliado no arraial de Suaçuí na década de 20 do século XIX, e o suaçuiense Lúcio Fernandes Lima, ordenado no ano de 1831, que se revezaram na função de cura. Além de capelão, o padre Lúcio Fernandes Lima foi o primeiro professor da primeira escola pública masculina aberta no arraial de Suaçuí, no ano de 1835.
Durante a primeira metade dos anos oitocentos, foram iniciadas as obras da capela de Nosso Senhor dos Passos e intensificadas as devoções a Ele e à Nossa Senhora das Dores, fazendo surgir no distrito de Suaçuí um escultor até os dias de hoje não identificado, mas já nominado no meio acadêmico como o Santeiro de Suaçuí. São de autoria desse Santeiro ou de sua oficina as imagens do Senhor Morto e do Senhor dos Passos existentes no acervo patrimonial da Paróquia de São Brás e as peças idênticas da matriz de Nossa Senhora da Piedade da cidade de Pará de Minas.
Decorridos 125 anos de inauguração da capela primitiva, o distrito e arraial de Suaçuí conquistaram sua primeira autonomia, quando a capela se tornou matriz. Pela lei provincial nº 471, de 1º de junho de 1850, o curato de São Brás, filiado à freguesia de Congonhas Campo até o ano de 1832 e daí em diante à freguesia do Brumado, foi elevado à categoria de Paróquia, sendo nomeado como seu primeiro vigário o padre congonhense José Bonifácio Teixeira Campos, que permaneceu na função por 60 anos.
Desde então a matriz de São Brás passou por diversas intervenções de reparos e restauros. A primeira delas ocorreu no ano de 1864, data na qual a torre do lado da epístola e o frontispício foram desmanchados até o alicerce e refeitos sob a condução do empreiteiro e oficial de pedreiro e canteiro, José Joaquim Gonçalves Simões, morador no distrito de Santa Ana do Morro do Chapéu, atual município de Santana dos Montes.
Avistada dos quatro pontos cardeais da cidade, a matriz de São de Brás guarda em seu interior um rico e belíssimo conjunto de obras de cantaria, pintura e talha do estilo rococó, representativo das crenças religiosas e da cultura material setecentistas. Testemunha tricentenária de milhares de trajetórias de vida, ela se constitui como a única edificação do século XVIII existente no Município e congrega em si de forma harmoniosa a história, a tradição e a fé de seu povo.