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Prefeitura de Congonhas é alvo de auditoria do TCEMG que escancara falhas graves e indícios de superfaturamento em obra habitacional orçada em quase R$100 milhões

Obra orçada em quase R$ 100 milhões teve contrato rescindido após constatação de sobrepreço, falhas no projeto e execução irregular. Relatório do Tribunal de Contas responsabiliza gestão do ex-prefeito Cláudio Antônio de Souza, o Dinho.

Uma obra habitacional milionária, que deveria beneficiar famílias em situação de vulnerabilidade em Congonhas, virou símbolo de má gestão, desperdício de recursos públicos e possíveis irregularidades graves. Auditoria do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE-MG), a que nossa reportagem teve acesso, revelou uma série de supostas falhas estruturais, orçamentárias e administrativas na construção do Conjunto Habitacional Goiabeiras. Orçado em mais de R$ 99 milhões, o contrato foi rescindido antes mesmo de a obra avançar significativamente.

Uma das principais críticas à condução do projeto diz respeito à forma como a desapropriação do terreno foi realizada. O terreno, adquirido pelo município por aproximadamente R$ 28 milhões, foi comprado sem que nenhum estudo prévio tivesse sido feito — nem análise de solo, nem levantamento topográfico, tampouco qualquer etapa de terraplanagem, cita o TCE.

As irregularidades ocorreram durante a gestão do ex-prefeito Cláudio Antônio de Souza, conhecido como Dinho, que governou o município entre 2021 e 2024. De acordo com o TCE-MG, o projeto básico que fundamentou a licitação foi elaborado de forma irresponsável, sem estudos técnicos essenciais, como sondagem de solo e análises geotécnicas. O relatório destaca erros grosseiros, como previsão de serviços já executados anteriormente pela empresa loteadora, itens superestimados e ausência de detalhamento técnico, o que comprometeu desde o orçamento até a segurança da obra.

O superfaturamento identificado pela auditoria ultrapassa R$ 2,8 milhões apenas em serviços de terraplenagem. Além disso, foram incluídas no orçamento obras de infraestrutura já realizadas, como pavimentação e drenagem, gerando pagamentos em duplicidade. Ainda assim, a gestão Dinho insistiu na continuidade da licitação, mesmo diante das evidências de que o projeto estava incompleto e tecnicamente frágil.

Firmado com o Consórcio CH Goiabeiras que é formado pelas empresas Conata Engenharia, Infracon Engenharia e Construtora Sinarco, o contrato foi assinado em novembro de 2023, com previsão de 24 meses para conclusão. No entanto, menos de um ano depois, a execução foi interrompida e o contrato rescindido.

Até a oitava medição, mais de R$ 3,9 milhões foram pagos, parte deles por serviços não respaldados contratualmente. O relatório responsabiliza não apenas o ex-prefeito, mas também integrantes-chave da administração anterior. Entre eles, estão o urbanista Douglas Montes Barbosa, por não exigir os estudos técnicos necessários; Libertad Lamarque Guerra Souza, ex-secretária de Desenvolvimento e Assistência Social, por aprovar orçamentos inflados; e atual Vereadora Simônia Maria de Jesus Magalhães (PL), ex-secretária de Obras, por validar documentos técnicos repletos de incoerências.

Outras figuras centrais na sequência de irregularidades também foram identificadas. O então secretário de Obras e Infraestrutura, Saulo de Sousa Queiroz, atuante até outubro de 2024, foi signatário do primeiro termo aditivo contratual, mesmo diante de graves falhas. O aditivo previa quantitativos de materiais de segunda e terceira categorias, sem a substituição de material de primeira, e apresentava cálculos equivocados. A assinatura permitiu o prosseguimento de serviços baseados em metodologias técnicas frágeis e sem justificativas conforme exigência legal, o que resultou na publicação de um termo considerado irregular. Como gestor do contrato, cabia a Saulo adotar postura cautelosa, o que não ocorreu, segundo TCE.

Já a então secretária Municipal de Desenvolvimento e Assistência Social, Júlia Andrade de Freitas Correa, que ocupou o cargo entre janeiro e dezembro de 2024, também assinou o termo aditivo com os mesmos vícios. O documento, que carecia de respaldo técnico e jurídico, permitiu a continuidade de serviços com base em estimativas infundadas e sem justificativas legais. Na condição de agente pública responsável, ela deveria ter zelosamente verificado as exigências legais antes de validar o aditivo.

Outro ponto crítico foi a execução contratual. O engenheiro Ivan Lopes Fernandes, fiscal da obra, atestou medições com pagamentos superiores ao saldo contratual, autorizando serviços não previstos no projeto básico. Também se omitiu diante dos atrasos em relação ao cronograma, o que comprometeu o controle técnico e financeiro da obra. Como engenheiro civil e fiscal nomeado, cabia a ele formalizar qualquer extrapolação de quantitativos e zelar pela execução regular do contrato, o que não foi feito, segundo o TCE.

O mesmo tipo de conduta foi adotado por Saulo durante a execução da obra. Além de signatário do termo aditivo, ele também atestou medições irregulares, pagamentos acima do previsto e omitiu-se quanto aos atrasos acumulados. Como responsável direto pelo setor gestor do contrato, sua omissão contribuiu para ampliar a distância entre os valores previstos e os efetivamente executados.

A auditoria do TCE-MG conclui que a obra, além de paralisada, representa um prejuízo social e financeiro expressivo. Famílias que aguardavam moradias continuam desassistidas, enquanto milhões de reais do erário foram empregados em um projeto cercado de falhas técnicas, administrativas e legais.

O atual prefeito, Anderson Cabido, que assumiu em janeiro de 2025, foi intimado a tomar providências urgentes. O Tribunal recomendou a revisão completa do projeto, a realização dos estudos técnicos necessários e a abertura de nova licitação somente após sanadas todas as irregularidades.

A fiscalização integra o Plano Anual de Fiscalização de 2024 e pode embasar futuras ações de responsabilização civil, administrativa e criminal, além da tentativa de recuperar os recursos públicos mal aplicados.

Enquanto isso, o conjunto habitacional patina e o povo aguarda ansiosamente o sonho da casa própria…..mas quando? Leia abaixo o relatório técnico completo do TCEMG. O jornal está aberto ao contraditório.

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