O bordão “Quando eu era criança pequena lá em Barbacena” foi reconhecido, por lei, como frase cultural da cidade localizada no Campo das Vertentes, a cerca de 100 quilômetros de Juiz de Fora. A Lei nº 5.353 foi sancionada na última segunda-feira (23), pelo prefeito Carlos Du (PSD), a partir de projeto do vereador Sandro Heleno (Rede). A frase mencionada poderá ser utilizada em ações culturais, educativas, turísticas e promocionais do Município, como forma de valorização da identidade local.
Embora na proposta o vereador tenha colocado que “o bordão foi eternizado pelo personagem Aldemar Vigário, interpretado pelo saudoso Chico Anysio, na clássica ‘Escolinha do Professor Raimundo’”, a frase era utilizada pelo personagem Joselino Barbacena, interpretado por Antônio Carlos Pires, na década de 90, e Ângelo Antônio, na versão mais recente do programa humorístico.O Instituto Histórico e Geográfico da Borda do Campo e Cercanias divulgou uma nota contundente nesta semana, manifestando forte crítica à recente Lei Municipal nº 5.353/2025, sancionada em Barbacena, que declara como frase cultural do município o bordão popular “Quando eu era criança pequena lá em Barbacena…”
Repercussão
Embora a norma tenha sido aprovada com a justificativa de valorizar a linguagem popular, o Instituto aponta que a expressão — popularizada por um programa humorístico nacional — carrega um histórico de ambiguidade e estigmatização, associando-se frequentemente ao passado manicomial da cidade, tema delicado que exige reflexão crítica e respeito à memória das vítimas.
A entidade questiona a falta de debate público, a ausência de consulta ao Conselho Municipal do Patrimônio Histórico e Artístico (COMPHA) e a apropriação simbólica da cultura popular por meios institucionais, sem considerar as diversas leituras possíveis da frase. Para o Instituto, a decisão é vista como superficial, performática e descolada das reais necessidades culturais da cidade.
“Causa-nos apreensão que um elemento tão controverso seja elevado à condição de ‘frase cultural’ por ato estatal, sem escuta pública ou participação dos órgãos competentes”, destaca um trecho da nota.
O texto ainda denuncia que a lei se insere no fenômeno de “inflacionamento legislativo”, caracterizado por uma enxurrada de leis simbólicas, sem impacto concreto, que servem mais ao marketing político do que à construção de políticas públicas reais.
A entidade finaliza reafirmando que a identidade cultural de Barbacena não se decreta, mas se constrói coletivamente, com base no pluralismo, na crítica histórica e no compromisso com a superação de estigmas. O episódio reacende o debate sobre os limites do poder público na definição de símbolos culturais e o papel da memória coletiva no processo de formação da identidade local.