A nova legislação redefine regras do crédito, amplia garantias ao idoso e fortalece mecanismos de renegociação ao preservar o mínimo existencial, reorganizar dívidas e impor responsabilidade às instituições financeiras.
A Lei 14.181/2021, conhecida como Lei do Superendividamento, mudou a forma como o sistema financeiro deve lidar com dívidas de consumidores, em especial de idosos.
A norma incluiu no Código de Defesa do Consumidor e no Estatuto do Idoso regras específicas para prevenir o superendividamento, garantir a preservação do mínimo existencial e organizar renegociações com participação de todos os credores, em prazos que podem chegar a cinco anos, sob supervisão judicial quando necessário.
Na prática, isso significa que aposentados e pensionistas que não conseguem mais pagar todas as dívidas sem comprometer despesas básicas passaram a ter instrumentos legais para proteger parte da renda, revisar contratos e propor planos de pagamento globais, envolvendo bancos, financeiras e demais credores de consumo.
Proteção reforçada ao orçamento do idoso
A lei reconhece a condição de hipervulnerabilidade dos consumidores idosos, que muitas vezes vivem de renda fixa, são alvo de ofertas insistentes de crédito consignado e têm mais dificuldade para compreender contratos complexos.
Por isso, o texto legal determina que a renegociação considere a renda líquida necessária à subsistência, observando gastos com moradia, alimentação, saúde, transporte e outras despesas essenciais.
Além de alterar o Código de Defesa do Consumidor, a Lei 14.181/2021 também modificou o Estatuto do Idoso para explicitar a vedação a práticas de assédio e pressão comercial na oferta de crédito, reforçando a necessidade de tratamento diferenciado para esse público.
Estudos recentes apontam que a população idosa está entre os grupos com maior crescimento de inadimplência no país, o que torna essas salvaguardas ainda mais relevantes.
Mínimo existencial e limites ao comprometimento da renda
Um dos pilares da lei é a proteção do mínimo existencial, conceito que impede que o pagamento de dívidas consuma toda a renda do consumidor.
A lei definiu o instituto e delegou a regulamentação do valor de referência ao Poder Executivo.

Essa regulamentação veio com o Decreto 11.150/2022 e foi posteriormente ajustada pelo Decreto 11.567/2023, que fixou em R$ 600 o valor mínimo que deve permanecer reservado às despesas básicas nos casos de superendividamento.
Especialistas em direito do consumidor ressaltam que, embora exista esse piso normativo, a aferição do mínimo existencial continua vinculada à realidade de cada caso, levando em conta renda, composição familiar e custo de vida local.
Tribunais têm aplicado a lei de forma a evitar que descontos sobre aposentadorias e benefícios inviabilizem a subsistência do idoso, especialmente em situações de consignados com forte comprometimento de renda.
Crédito responsável e combate a abusos
A legislação introduziu no Código de Defesa do Consumidor o dever de crédito responsável, exigindo que instituições financeiras apresentem, de forma clara e destacada, o custo total da operação, taxas de juros, encargos, risco de inadimplemento e consequências do atraso.
Ofertas que prometem empréstimos “sem consulta” ou “imediatos” sem explicar custos e condições entram no radar de práticas abusivas e podem ser questionadas pelos órgãos de defesa do consumidor e pelo Judiciário.Play Video
Também ficam vedadas formas de cobrança que exponham ou constranjam o devedor, como ameaças, contatos em horários inadequados ou comunicação com terceiros para pressionar o pagamento.
Nesses casos, o idoso pode registrar reclamação em órgãos como Procons, Defensorias Públicas e na plataforma consumidor.gov.br, que concentram tentativas de solução administrativa antes de eventual ação judicial.
Renegociação global e atuação do Judiciário
Quando o endividamento se torna impagável, a lei prevê um procedimento específico de repactuação de dívidas.
O consumidor apresenta um quadro completo de suas dívidas de consumo e propõe um plano de pagamento que não pode ultrapassar cinco anos, preservando o mínimo existencial e respeitando, tanto quanto possível, as garantias originalmente contratadas.
Numa primeira etapa, busca-se a conciliação com todos os credores em audiência, que pode ocorrer em juízo ou em câmaras especializadas.
Se algum credor não comparece, a lei admite sanções como suspensão da exigibilidade do débito e sujeição do ausente ao plano aprovado, desde que cumpridas as exigências legais.
Mesmo quando as propostas das instituições são consideradas insuficientes, o Judiciário pode intervir para revisar cláusulas, redistribuir pagamentos e fixar um plano judicial compulsório, desde que o superendividamento e a boa-fé do devedor estejam comprovados.
Quais dívidas podem ser incluídas

A proteção da Lei do Superendividamento volta-se às dívidas de consumo contraídas de boa-fé, como empréstimos pessoais, consignados, financiamentos de bens, cartão de crédito, cheque especial e contas de serviços essenciais, incluindo água, luz, gás e telefonia.
Essas dívidas podem ser incluídas no plano global, desde que vinculadas a relações de consumo e sem fraude.
Ficam fora tributos, multas, pensão alimentícia, crédito habitacional, crédito rural e dívidas com garantia real, além de débitos assumidos com má-fé ou destinados à aquisição de bens de luxo.
A análise concreta cabe ao juiz, que verifica a origem do débito, a finalidade do crédito e a existência ou não de relação de consumo protegida pelo Código de Defesa do Consumidor.
Portabilidade, revisão contratual e juros menores
A legislação também estimula a portabilidade de crédito, permitindo que o consumidor leve sua dívida para outra instituição que ofereça juros menores ou prazos mais adequados.
A revisão de cláusulas abusivas — como venda casada, tarifas indevidas ou seguros adicionados sem consentimento — ajuda a ampliar a concorrência e pressionar os custos do crédito para baixo.
Essas medidas têm impacto maior sobre aposentados e pensionistas, público que costuma acumular consignados e cartões com juros elevados.
Economistas e órgãos de defesa do consumidor destacam que a eficácia dessas ferramentas depende de informação clara, comparação de propostas e apoio técnico.
A simples troca de banco, sem análise do custo efetivo total, pode apenas alongar a dívida sem resolver o superendividamento.
Onde buscar ajuda para renegociar
Antes de procurar o Judiciário, a orientação é organizar todas as dívidas, listar valores, taxas de juros e datas de vencimento, calcular quanto da renda sobra após o pagamento das despesas essenciais e, a partir disso, definir quanto é possível destinar ao plano de pagamento.
Esse diagnóstico ajuda no momento de apresentar propostas concretas às instituições financeiras.
Procons estaduais e municipais, Defensorias Públicas, Ministérios Públicos, Cejuscs e a plataforma consumidor.gov.br atuam como portas de entrada para renegociações.
A depender da complexidade, o idoso pode acionar o Judiciário para abrir processo de superendividamento com repactuação global.
Esse caminho costuma ser decisivo quando os descontos comprometem grande parte da aposentadoria ou quando há assédio recorrente na oferta de consignados.

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