Ao se falar em planejamento público há de se considerar diversas informações, principalmente o que, efetivamente, se pode contar para executar a visão do futuro, o histórico, as estatísticas e até mesmo indicadores de resultados. Não obstante, ao se tratar de vislumbrar objetivos e traçar caminhos para o Turismo, tanto as informações quanto as interações dessa área no município são, por vezes, ainda mais complexas, aí reúnem-se o público, o privado, o mercado, mão de obra local, oferta, demanda, impactos sociais, culturais, econômicos em um só território que convive relações não turísticas e de visitação.
Promover uma festa no centro da cidade talvez não vá agradar a todos. E no planejamento isso é um ponto a se considerar – mesmo na crença que interfira “somente” no cotidiano dos moradores locais – simplesmente porque a política cultural e turística deve ser bem-vinda, deve ser querida e agraciada pelos “de fora” e pelos “de dentro”. Dentre as principais obras sobre planejamento turístico há diversos entendimentos, seja o turismo como uma atividade comercial focada na dinamização econômica, e como uma concepção de atividade humana que envolve para além do viés econômico, aspectos socioculturais da interação visitado-visitante. Ao se considerar que a atratividade de um território pode ser potencializada quando as propostas de promoção do bem-estar incluem a população local, é possível tecer caminhos perenes diretamente conectados às políticas em prol à qualidade de vida.
No estudo do turismo não há poucas variáveis a se considerar e mesmo com um controle assíduo do seu planejamento, tomando em conta “onde se quer chegar”, diagnóstico, controle, elaboração e implementação, é comum observar o risco de ser subordinado e submisso a outras ações públicas, dado a sua falta de percepção de interrelações e consequentemente pouco protagonismo. Segundo estudiosos, mesmo que o planejamento turístico seja reconhecido como uma área prioritária para o desenvolvimento de destinos, há uma grande distância entre o que é planejado e o que é implementado.
Recentemente, Minas Gerais têm apresentado resultados importantes quanto ao turismo, observa-se maior empenho do governo e das redes de turismo, em investimentos, promoção das afinidades culturais e destinos turísticos. A pauta tem despertado maior relevância e interesse de municípios em desenvolver seus trabalhos, inclusive, após aumento da alíquota de ICMS Turismo na Lei Robin Wood e maior participação. Foram 840 de 853 municípios de Minas Gerias que participaram do programa de captação de recursos ICMS Patrimônio Cultural no exercício para 2025. O engajamento profícuo faz parte de um processo, que se organizado, organicamente nas diversas localidades, tende a ter vida longa.
Em Entre Rios de Minas, município de 15 mil habitantes, observa-se uma linha de referência local para que aconteça a aproximação as pautas de turismo e cultura, por meio do envolvimento da população e florescer das afinidades culturais locais. É o caso de calendário cultural que privilegia festivais de Arte e Cultura – Mutirão Cultural e Gastronômico – Festival Gastronômico Receitas de Família. Considerados Patrimônios Culturais Municipais os eventos trazem à cena a produção artística e culinária da cidade e reforça sua importância e orgulho. Como mencionado pelo jornalista Marcelo Batista que foi jurado no Receitas de Família: “Uma comunidade empenhada em oferecer suas melhores histórias, suas melhores decorações, e as mais saborosas receitas de família, algo que transcende o tempero, a cocção, o cheiro, a competição. Uma grande e colaborativa família em um dia de festa. Como um almoço de domingo na casa da avó com as crianças brincando do terreiro e a viola tilintando alto no alpendre. Mulheres, homens, crianças e jovens se divertindo como uma só família.” Ao mesmo tempo que haja um processo em via, o desenvolvimento do turismo requer mais e além e não tem fim, pois deve tomar em conta a relevâncias dos seus impactos sociais, econômicos e culturais por suas políticas implementadas.
A 70 km de Entre Rios de Minas, está Tiradentes. Um caso de sucesso, mas nem tanto. Vive um desafio oposto, trazer para dentro do planejamento turístico, os próprios Tiradentinos que ficaram à mercê do mercado turístico e vivem um processo de gentrificação – valorização da área central e aumento do custo de vida. Segundo artigo de abril de 2023, de Natália Oliveira, do jornal O Tempo, “Turismo afasta moradores de Tiradentes do Centro e os ‘empurra para a periferia”, pesquisa da UFMG mostra que o avanço do turismo no centro histórico fez com que os moradores não se sentissem pertencentes à aquela região. É preciso pensar a cidade não somente com a cabeça econômica.
Em referência ao autor Beni (1998), ressalto, o que ao meu ver, serve como base para o desenvolvimento, e mais se aproxima ao conceito a interpretar: “Turismo é o estudo do homem longe do seu local de residência, da indústria que satisfaz suas necessidades, e os impactos que ambos, ele e a indústria, geram sobre os ambientes físicos, econômicos e socioculturais da área receptora.” Há quem diga que hoje a tendência das melhores experiências de turismo vai além do simples consumo de produtos e serviços, é de se levar em conta outras percepções e sentimentos.
Felipe Ribeiro é especialista em Política e Gestão Cultural pelo Itaú Cultural.
O artigo tem origem na pós-graduação em Turismo Público e Desenvolvimento Regional pela UFJF.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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- OLIVEIRA, N. Turismo afasta moradores de Tiradentes do Centro e os ‘empurra para a periferia, Jornal O Tempo. 9 de abr de 2023. Disponível em: https://www.otempo.com.br/cidades/turismo-afasta-moradores-de-tiradentes-do-centro-e-os-empurra-para-periferia-1.2843654#:~:text=A%20pesquisa%20realizada%20 pelos%20alunos,antigos%20e%20com%20menor%20renda.