Alienação fiduciária permite retomada rápida de imóveis financiados por bancos, com prazos curtos, procedimento cartorial e impactos diretos sobre a propriedade e a posse do bem, inclusive em contratos residenciais, segundo regras da Lei 9.514 e decisões judiciais recentes.
A Lei 9.514, em vigor desde 1997, criou no Brasil o regime da alienação fiduciária de imóveis e autorizou que a cobrança e a retomada do bem ocorram, em grande parte, fora do Poder Judiciário.
Nesse modelo, o procedimento se desenvolve principalmente no âmbito do cartório de registro de imóveis e pode culminar na consolidação da propriedade em nome do credor caso a inadimplência não seja regularizada dentro dos prazos legais.
Na prática, a perda do imóvel pode ocorrer em poucos meses a partir do primeiro atraso, a depender da sequência dos atos cartoriais e do tipo de contrato firmado.
Embora seja comum a afirmação de que todo o processo ocorre “sem decisão judicial”, a legislação prevê que a retirada forçada do ocupante do imóvel, quando não há desocupação voluntária, dependa de ordem judicial específica.
Como funciona a alienação fiduciária na legislação brasileira
Na alienação fiduciária, o devedor permanece na posse direta do imóvel enquanto cumpre o contrato, mas a propriedade resolúvel fica vinculada ao credor até a quitação integral da dívida.
Somente após o pagamento da última parcela é que o imóvel passa definitivamente ao nome do comprador.
Em caso de inadimplência, a lei autoriza o credor a iniciar um procedimento extrajudicial para constituir o devedor em mora.
Se o débito não for regularizado dentro do prazo legal, a propriedade pode ser consolidada em nome do credor, abrindo caminho para a venda do imóvel em leilão público extrajudicial.
Especialistas em direito imobiliário costumam destacar que esse desenho jurídico busca dar maior segurança ao crédito imobiliário, ao reduzir o tempo e os custos de recuperação do bem em caso de inadimplência, em comparação com o antigo modelo da hipoteca judicial.
Intimação do devedor e início do procedimento cartorial
O ponto de partida formal do procedimento é a intimação do devedor realizada pelo cartório de registro de imóveis, a pedido do credor.
A Lei 9.514 determina que o devedor seja intimado para pagar as parcelas vencidas, as que vencerem até a data do pagamento, além de encargos contratuais e despesas, no prazo de quinze dias corridos.
A forma dessa intimação costuma ser um dos aspectos mais discutidos posteriormente no Judiciário.
Juristas e decisões judiciais ressaltam que a intimação pessoal é a regra, e que a utilização de edital exige a comprovação de tentativas reais e documentadas de localização do devedor.
Quando esses requisitos não são observados, a validade do procedimento pode ser questionada.Play Video
Financiamento habitacional e imóvel residencial
No caso de financiamentos destinados à aquisição ou construção de imóvel residencial, a legislação prevê um tratamento específico.
O artigo 26-A da Lei 9.514 estabelece um procedimento diferenciado, que amplia o intervalo entre a intimação e a consolidação da propriedade, somando-se ao prazo inicial previsto no artigo 26.
Na prática, esse regime especial pode resultar em um período mais longo para regularização da dívida antes da consolidação, em comparação com contratos que não se enquadram como financiamento habitacional residencial.
Ainda assim, especialistas alertam que, mesmo nesses casos, os prazos seguem sendo curtos e exigem atenção imediata do mutuário.
Após a consolidação da propriedade em nome do credor, o Superior Tribunal de Justiça tem entendimento consolidado de que não é mais possível a purgação da mora, restando ao devedor apenas as alternativas previstas em lei para essa fase do procedimento.
Leilões extrajudiciais e regras previstas em lei
Consolidada a propriedade, o credor deve promover a venda do imóvel por meio de leilão público extrajudicial.
A Lei 9.514 estabelece prazos para a realização do primeiro leilão e, caso não haja interessados, para a realização de um segundo certame, com critérios distintos de valor mínimo.
Nessa etapa, a atenção costuma se voltar para a regularidade do edital, a publicidade do leilão e a observância do valor mínimo exigido.
O Superior Tribunal de Justiça tem decidido que, embora a lei autorize a venda pelo valor da dívida no segundo leilão, a arrematação não pode ocorrer por preço vil, sob pena de prejuízo desproporcional ao devedor.
Quando o imóvel não é arrematado nos leilões
O texto original apontava a possibilidade de o devedor perder o imóvel e ainda permanecer responsável pela dívida.
Esse cenário, no entanto, não se aplica quando os dois leilões previstos na Lei 9.514 são frustrados nas condições legais.
Nessa hipótese específica, o artigo 27, parágrafo 5º, da lei estabelece que a dívida é considerada extinta, ficando o imóvel definitivamente com o credor.
O entendimento vem sendo reiterado em decisões recentes do STJ, que afastam a possibilidade de cobrança de saldo remanescente quando não há arrematação nos dois leilões.
Por outro lado, quando o imóvel é vendido por valor superior ao montante da dívida e das despesas do procedimento, a legislação garante ao devedor o direito de receber a diferença, conhecida como sobejo.
Esse repasse é frequentemente objeto de disputa judicial quando o devedor alega falta de transparência na prestação de contas.
Principais disputas judiciais envolvendo alienação fiduciária
Na experiência relatada por advogados que atuam na área, os litígios envolvendo alienação fiduciária tendem a se concentrar em três frentes principais: a regularidade da intimação e da constituição em mora, a correção dos valores exigidos para purgar a mora e o cumprimento rigoroso das regras relativas aos leilões.
Como o procedimento é fortemente baseado em atos registrais, erros formais ou falhas de informação podem ter impacto direto sobre o resultado do processo.
A partir do momento em que a consolidação é registrada na matrícula do imóvel, as possibilidades de reversão se tornam mais restritas, e a discussão costuma migrar para a validade dos atos já praticados.
O que observar desde o primeiro atraso no pagamento
Para quem enfrenta dificuldades financeiras, o ponto central é que os prazos previstos na Lei 9.514 são objetivos e começam a produzir efeitos relevantes a partir da intimação cartorial.
Em contratos de financiamento habitacional residencial, a janela para regularização tende a ser maior, mas não elimina o risco de consolidação em curto espaço de tempo.
Quando o procedimento avança para os leilões, passam a valer regras específicas quanto a valores mínimos, prazos e publicidade, além da definição sobre eventual saldo a ser devolvido ao devedor.





