GARIMPANDO NO ARQUIVO JAIR NORONHA
Avelina Maria Noronha de Almeida
avelinaconselheirolafaiete@gmail.com
NOTÍCIAS DE CONSELHEIRO LAFAIETE – 14
“Até há bem pouco tempo, antes da faminta verticalização que começou a engolir os horizontes de Lafaiete, uma igrejinha singela, no alto de um morro, poderia ser avistada de quase toda parte da cidade.
Em 16 de janeiro de 1752 foi criado o distrito do Campo Alegre dos Carijós com a elevação da freguesia, por Alvará Régio, à categoria de colativa, passando a ter privilégios régios.
Um ano ante, em 1751, Manuel de Sá Tinoco conseguiu a provisão autorizando a construção da Igreja de Santo Antônio, a qual já estava concluída em 1754.
Quando a provedor da Irmandade de Santo Antônio de Queluz, de nossa cidade, era Matusalém Rezende Jardim, um familiar do historiador Joaquim Rodrigues de Almeida levou até o provedor um livro antigo onde havia importante registro histórico da Igreja de Santo Antônio, encontrado pelo historiador entre acervo antigo da fazenda Água Limpa, em Carijós, depois Queluz e hoje Conselheiro Lafaiete.
O Irmão Allex Assis Milagre fez profundos estudos dos documentos ali presentes escrevendo um artigo em que colocou as principais provas documentais recolhidas pelo Monsenhor, do qual aqui transcrevemos alguns trechos:
“Até há bem pouco tempo, antes da faminta verticalização que começou a engolir os horizontes de Lafaiete, uma igrejinha singela, no alto de um morro, poderia ser avistada de quase toda parte da cidade. É a igreja de Santo Antônio, cuja história se entrelaça com o desenvolvimento do Campo dos Carijós, no século XVIII.
A origem dessa igreja é por volta de 1741, quando esteve em Carijós um missionário por nome Frei Jerônimo e benzeu aquele pedaço de terra, no Morro das Cruzes, para que ali fosse construída a igreja da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos. Entretanto, passaram-se quase dez anos e a construção não tivera início, quando, então, o capitão Manoel de Sá Tinoco requereu e obteve, a 14 de março de 1751, de Dom Frei Manoel da Cruz, primeiro bispo de Mariana, provisão para erigir e construir patrimônio para Santo Antônio.
Ao contrário da maioria dos templos católicos, construídos nas Minas Gerais do século XVIII e XIX, a igreja de Santo Antônio não foi construída para abrigar uma irmandade. O Capitão Manoel de Sá Tinoco, antes de lucrar provisão para construir a dita igreja, teve que se indispor com a comunidade do Rosário, que se julgava dona e possuidora do terreno junto ao Morro das Cruzes. Assim sendo, recorreu ao bispo de Mariana nos seguintes termos:
‘Exmo. Revmo. Sr., diz o Capitão Manoel de Sá Tinoco, morador na freguesia de Nossa Senhora da Conceição. Campos dos Carijós, comarca do Rio das Mortes. Que ele suplicante, quer edificar uma capela com invocação de Santo Antônio, junto ao mesmo arraial, donde se acha o Morro das Cruzes, fazendo-lhe patrimônio com bens de raízes, livres e desembargados com paramentos e o que mais que lhe for necessário, tudo à sua custa, ficando, assim, gozando de privilégio de padroeiro e protetor da dita capela e porque junto daà dita passagem, onde o suplicante quer edificar a dita capela, o Revmo. Frei Jerônimo, missionário que foi nestas Minas, há oito para nove anos, demarcou e, dizem benzer para a Irmandade dos Pretos do Rosário um pedaço de chão para fazerem uma capela que a dita Irmandade do Pretos não cuidaram,até o presente, levantar e só querem impedir ao suplicante que aquela obra tão pia com o frívolo pretexto de quererem fazer capela para Nossa Senhora do Rosário. Para Va. Exa. Reverendíssima lhe faça mercê conceder ao suplicante a licença para edificar a sobredita capela para cuja obra tenho alguns materiais prontos e necessários para a obra justa ou presente e não tem o suplicante dúvida consentir em que na dita capela se coloque Nossa Senhora, sendo padroeiro Santo Antônio para quem intenta fazer a dita obra.’
[…]
Consultada a Irmandade do Rosário, ela consentiu em ceder o terreno, desde que a imagem de sua padroeira fosse colocado no bico do altar, o que foi feito por Tinoco. A provisão da igreja de Santo Antônio foi passada a 14 de agosto de 1751.
O Capitão Manoel de Sá Tinoco era casado com D. Úrsulla das Virgens, com contrato de aras. Portanto, qualquer doação que desejar-se fazer, teria que ter o consentimento de sua esposa. Por isso, D. Úrsula passou procuração, a 23 de dezembro de 1757, a seu marido, dando-lhe plenos poderes para administrar todos os bens; então, a 13 de janeiro de 1758, em presença do tabelião da Vila de São José, a ‘ESCRITURA DE DOAÇÃO DE BENS QUE FAZ O CAPITÃO MANOEL DE SÁ TINOCO E SUA MULHER ÚRSULLA DAS VIRGENS À CAPELA DE SANTO ANTÔNIO DO ARRAIAL DOS CARIJÓS’. Devido à ação de insetos e umidade nos arquivos, tornou-se impossível a transcrição da dita escritura, todavia podemos ver que a constituição do patrimônio se faria através de doação de parte dos rendimentos anuais da fazenda da ‘Água Limpa’, de sua propriedade que fazia divisa com as terras de Antônio Francisco França, de Phelippe Antônio (?), Antônio Dutra da Costa, e Francisco da Sylveyra Gigante e Amaro Pereyra. O promotor só aceitou essa segunda escritura depois que D. Úrsulla escreveu a seguinte declaração:.
‘Por esse de minha letra é sinal, digo, eu, D. Úrsulla das Virgens Sacramento, que de minha livre e espontânea vontade, aprovo uma escritura de doação que meu marido,o Capitão Manoel de Sá Tinoco fez dos reditos de uma fazenda que possuímos cita na freguesia de Nossa Senhora da Conceição do Campo dos Carijós, para patrimônio de uma capela da invocação do Senhor Santo Antônio, filial desta matriz, a qual escritura hei por boa e firme e valiosa com o selo de própria mão assinar. E por este me obrigo em todo o tempo, nem em parte alguma, reclamar ou ir contra ela, antes quero que, hoje e para todo o sempre, se lhe dê todo o seu inteiro e devido cumprimento e para todo tempo constar, fiz este de minha letra, e sinal. Carijós, 7 de julho de 1758 anos (a) Úrsulla das Virgens Sacramento.’ .
Juntada a declaração acima ao, o juiz do tribunal eclesiástico, Mons. Ignacio Correia de Sá, mandou qu fossem ouvidas as testemunhas a fim de certificar se a fazenda “Água Limpa” era, realmente, de propriedade do suplicante. Após confirmado, o cônego Manoel Castello Branco exarou a seguinte sentença nos autos:
‘Vistos estes autos de patrimônio da capela de Santo Antônio da freguesia de Nossa Senhora da Conceição dos Carijós, testemunhas inquiridas, documentos e o mais que dos autos consta; mostram que, por petição do capitão Manoel de
Sá Tinoco e sua mulher se tem feito doação para o dito patrimônio, na quantia de nove mil réis, pagos anualmente dos reditos de uma fazenda, cita na mesma freguesia do Carijós, na passagem chamada Água Limpa; daquela fazenda são verdadeiros senhores e possuidores, os ditos doadores que a possuem de todo e qualquer embaraço = ajunte tudo. Visto. aceito a dita doação por parte da Igreja e julgo por bem o dito
Sá Tinoco e sua mulher se tem feito doação para o dito patrimônio, na quantia de nove mil réis, pagos anualmente dos reditos de uma fazenda, cita na mesma freguesia do Carijós, na passagem chamada Água Limpa; daquela fazenda são verdadeiros senhores e possuidores, os ditos doadores que a possuem de todo e qualquer embaraço = ajunte tudo. Visto. aceito a dita doação por parte da Igreja e julgo por bem o dito patrimônio em que para seu testemunho se lhe (ilegível) sua senhora; pagos os autos. Mariana, 12 de novembro de 1758. – (a.) Manoel Cardozo Frazão Castello Branco.’
Encerrou-se, assim, o processo de patrimônio da Igreja de Santo Antônio, ficando o Capitão Manoel de Sá Tinoco como seu protetor. Após sua morte, D. Úrsulla das Virgens ficou com o padroado, direito esse após sua morte passando a seus filhos padre Manoel de Sá Tinoco e o doutor José de Sá Tinoco. Dona Úrsulla das Virgens Sacramento faleceu em Carijós onde foi sepultada no interior da igreja matriz a 15 de agosto de 1799. Após a morte de , tomaram conta do templo sua viúva, Úrsula das Virgens, e, posteriormente, seus filhos Dr. José de Sá Tinoco e Manoel de Sá Tinoco.
Tempos depois, foi doado para os fundadores da Irmandade de Santo Antônio de Queluz, fundada em 16 de outubro de 1870 pelo Barão de Queluz, Joaquim Lourenço Baêta Neves, que foi seu primeiro provedor.
(Continua)