6 de maio de 2024 06:43

Olivais oferecem experiências diferenciadas para os turistas no Sul de Minas

Em época de colheita, fazendas que produzem o azeite de oliva na região programam visitas guiadas e degustações

Pouca gente desconfia, mas o azeite de oliva tem propriedades milagrosas: serve como anti-inflamatório, fortalece os ossos, auxilia na prevenção de doenças cardíacas e diabetes e atenua os sintomas da artrite. Mais recentemente, o “ouro líquido”, como foi batizado pelos mediterrâneos, também tem feito muito bem ao turismo na serra da Mantiqueira. 

Em uma extensa faixa de terra de cerca de 3.000 hectares, localizada entre os Estados de Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro, proliferam desde 2018 oliveiras de diversas espécies. Segundo estimativas da Empresa de Agropecuária de Minas Gerais (Epamig), são mais de 200 pequenos produtores espalhados por 80 municípios, 60% deles em Minas Gerais. 

Dados da Associação dos Olivicultores dos Contrafortes da Mantiqueira (Assoolive), que reúne cerca de 35 agroindústrias, mostram que a produção estimada para este ano é de cerca de 100 mil litros, batendo o recorde de 80 mil litros alcançado em 2018. “A cada dia surgem novos produtores”, afirma Moacir Nascimento, presidente da entidade. 

Oliveira e turismo 

A produção é recente porque apenas em fevereiro 2008 foi realizada a primeira extração de azeite de oliva extravirgem na serra da Mantiqueira, abrindo caminho para seu cultivo e expansão. Dois anos depois, a produção saltou de 40 litros para 500 mil litros, com investimentos em pesquisas, melhoramentos de mudas e tecnologia por parte da Epamig. 

“Hoje, tem retorno quem está aliando a olivicultura ao turismo”, afirma Pedro Moura, pesquisador da Epamig. Muitos dos olivais se dotaram de infraestrutura para receber os turistas, oferecendo visitas guiadas e degustações. Outros abriram empórios para venda de produtos e restaurantes. Todos, no entanto, sentem os benefícios do turismo. 

Maria da Fé 

Para florescer, as oliveiras necessitam aliar condições climáticas (mais de 300 horas de frio e temperaturas abaixo de 12°C) e altitudes acima de 1.000 m. Para produzir frutos, demoram um pouco mais: cerca de quatro anos. Segundo Pedro Moura, é uma cultura de custo alto, que exige muitos cuidados e investimentos. A colheita também acontece uma única vez por ano, de janeiro a março. 

Por reunir todas essas características, o centro da produção de azeite na Mantiqueira é Maria da Fé, notoriamente a cidade mais fria de Minas. Na região, existem pelo menos 13 fazendas com olivais em municípios como Aiuruoca, Pedralva, Baependi e Poços de Caldas. Há cerca de 90 marcas de azeite registradas que abastecem o mercado local e são vendidas aos turistas. 

Poços de Caldas 

O olivicultor Moacir Carvalho Dias, proprietário da fazenda Irarema, tem uma das melhores estruturas para receber os visitantes. Em 2017, por questões de custos, ele substituiu a cultura do café pela do azeite, utilizando 86 hectares da área para cultivar oliveiras. “Nós produzimos azeite, mas o turismo é responsável pela grande fatia de nosso lucro”, afirma. 

Ele aproveitou a vocação turística de Poços de Caldas, município localizado a 15 minutos da fazenda, para abrir a propriedade à visitação. No feriado de Carnaval, por exemplo, recebeu 1.480 turistas, mas a média é 500 de pessoas por final de semana. Na programação, ele oferece um pacote fechado com almoço ao custo a partir de R$ 80 ou visitas guiadas com degustação. 

“Faço uma visita ao olival, dou uma aula sobre azeite, mostro o processo de produção e termino o passeio com uma degustação”, conta Dias. No local, ele montou uma lojinha com produtos feitos à base de azeite, como sabonetes e hidratantes. Há, ainda, o sorvete, em que a gordura hidrogenada é substituída pelo azeite, o que ele define como “gelato mais elaborado”. 

A família toda colabora nos processos: o pai Maurício cuida das árvores; a irmã Gabriela, do restaurante e da cafeteria; a mãe Mônica, da produção dos cosméticos. O negócio já tem um pé na sustentabilidade: o azeite é produzido com a ajuda da energia solar. Nada é desperdiçado: o bagaço vira adubo; o caroço, lenha; a folha da oliveira, chá e tintura. O azeite que sobra na máquina é reaproveitado para a produção de sabonete. 

A fama da Irarema não vem do azeite, mas dos antepassados. O avô de Dias, Moacyr de Carvalho Dias – seu homônimo “só que com y”, enfatiza ele – foi o inventor da fórmula do requeijão cremoso em flocos na década de 1950. “Xixo”, como era mais conhecido, morreu em 2017, mas deixou como herança a veia gastronômica da família. 

Catas Altas da Noruega 

Outro Moacir, o Nascimento, engenheiro florestal, comprou em 2008 uma propriedade em Catas Altas da Noruega, ao lado de uma área de preservação ambiental, e, para torná-la produtiva, plantou 600 mudas de oliveiras. Atualmente, são 3.000 pés de diversas idades e uma produção pequena de 1.200 litros, mas com expectativa de triplicar esse volume até 2024. 

Enquanto desenvolve seu projeto em longo prazo, ele e a mulher, Maria de Lourdes, recebem os turistas na Estância do Pinheiro para um passeio de três horas nos olivais, com palestra sobre azeite e degustação. O custo é de R$ 50 a R$ 70 por pessoa. Para quem se interessa em pernoitar, ele montou duas suítes na propriedade, ao custo de R$ 300 a diária. 

Nascimento, que também é presidente da Associação dos Olivicultores dos Contrafortes da Mantiqueira (Assoolive), explica que o azeite produzido na Mantiqueira é o suco natural da azeitona sem adição de conservantes. O fruto é moído, e o líquido sai fresco, pronto para ser consumido. A produção em Minas Gerais é pequena e ainda não é suficiente para abastecer o mercado interno. 

Baependi 

O período que mais se consume azeite no Brasil e no mundo é a Semana Santa. “A colheita em Minas é em fevereiro e março, o que faz nosso azeite ter mais frescor do que o europeu, cuja colheita é em setembro e outubro”, afirma Pedro Moura. A recomendação, segundo o pesquisador da Epamig, é que o azeite seja consumido rápido, porque é um produto que, quanto mais novo, melhor. 

“Quanto mais novo, mais expressivas são as características de aroma e sabor, além das propriedades benéficas à saúde. O ideal é consumir o azeite no primeiro ano em que ele é produzido”, ressalta Moura. 

Procurar os sabores mais intensos do azeite é a proposta de Vanessa Bianco, sócia-proprietária do Olivais Gamarra, no santuário do Vale do Gamarra, em Baependi. Vizinhos do Parque Estadual da Serra do Papagaio, dois sítios têm uma área plantada de cerca de nove hectares. A colheita se encerrou antecipadamente no início deste mês, em 3 de março. 

A olivicultora conta que prefere os colher as azeitonas mais verdes por causa dos sabores mais intensos. Pedro Moura corrobora a afirmação de Vanessa: “Azeitonas mais verdes proporcionam um azeite com mais amargor e picância, mas o rendimento também é menor. Já azeitonas mais maduras rendem mais e resultam em um azeite bem mais suave”. 

Vanessa oferece visita guiada ao olival e ao lagar (local da produção) para que o visitante possa comparar os diferentes tipos de azeites. As visitas para grupos de até 30 pessoas custam entre R$ 40 e R$ 100 e devem ser agendadas com antecedência. Uma das atrações da fazenda é a extração feita como era antigamente, por uma prensa mecânica, a única existente no Brasil. 

A Olivais Gamarra também realiza eventos pontuais durante o ano, como concertos de músicas nos olivais e jantares harmonizados. Nos dias 2 e 13 de abril, estão agendadas duas apresentações do projeto Azeite com Arte no Vale do Gamarra e em Caxambu, respectivamente. Na fazenda, ela ainda improvisou um show-room para receber os visitantes. 

Pedralva 

Em Pedralva, Alícia Gonçalves, da Fazenda Fio de Ouro, perpetua a tradição da família. O pai, Armando, ainda cuida do olival e do lagar. Para aproveitar a onda turística de Maria da Fé, o restaurante Casa Grappolo foi inaugurado em maio do ano passado, todo em vidro e com vista para o olival, permitindo ao turista acompanhar a colheita enquanto degusta o azeite. A previsão da colheita deste ano é de produção de 30 mil litros de azeite.

Na visita guiada à fazenda de 75 hectares, o turista conhece sete variedades de azeites e seus processos de extração. Se a viagem ocorrer em época de colheita, ele pode experimentar o azeite logo que é extraído. Caso a visitação aconteça em outra época do ano, a novidade é o azeite de abacate, produzido desde o ano passado, porém mais ácido e adocicado do que o de oliva. 

Morangos orgânicos 

Na mesma linha de unir turismo e azeite, a fazenda Maria da Fé deve produzir 10 mil litros neste ano. Para queimar etapas, Mirta Bonifácio adquiriu a propriedade com as oliveiras já plantadas. As visitas guiadas levam ao olival, ao lagar e a degustações sensoriais. O passeio custa R$ 30 por pessoa e dura uma hora, mas é necessário pré-agendamento por telefone. 

O azeite tem levado olivicultoras como Mirta a aproveitar a fama do “ouro líquido” da serra da Mantiqueira para oferecer aos visitantes outros produtos típicos da região, como o doce de leite e o morango orgânico. Ela reconhece que as pesquisas da Epamig com o azeite não só atraíram empreendedores, como ela, para a região, mas também está movimento a economia e o turismo. 

Feiras 

Os interessados em conhecer mais sobre o azeite produzido na serra da Mantiqueira terão oportunidade em dois momentos. No dia 25 de março, a Epamig realiza o 17º Dia de Campo de Olivicultura, integrando a programação do Azeitech na comemoração do Dia do Campo. Em abril, o município de Maria da Fé promove mais uma edição da tradicional Festa do Azeite Novo. 

História do azeite 

As oliveiras, árvores seculares citadas inclusive na Bíblia, foram trazidas para o Brasil pelos portugueses por volta do século XIX, embora seja uma planta originária do Sri Lanka e do Oriente Médio. Como o azeite era dos principais produtos comerciais de Portugal, a Coroa determinou a erradicação de todas as plantações de oliveiras no Brasil. 

O cultivo, no entanto, retornou em 1935, quando o português Emílio Ferreira dos Santos adquiriu um terreno em Maria da Fé, em 1933. Ele achou as condições climáticas muito parecidas com as de Portugal e convenceu a esposa e os filhos a se mudarem para o Brasil, trazendo seis mudas de oliveira. Na década de 1940, o agrônomo Washington Alvarenga Viglioni pegou mudas para estudar e as plantou onde hoje fica a estação de pesquisa da Epamig em Maria da Fé. 

As primeiras azeitonas foram colhidas em 1960, e 14 anos depois, em 1974, foi criada a Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig), que assumiu a estação de pesquisa em 1975. Desse então, os pesquisadores se debruçam na missão de fazer o cultivo da planta em maior escala. Eles também trouxeram mudas da Espanha, Grécia e Itália para entender qual delas se adaptaria melhor ao nosso clima. 

Espécies de azeitonas 

Vários tipos de azeitonas, os chamados “cultivares”, adaptaram-se ao Sul de Minas. Entre eles estão Arbequina (de origem espanhola, mais suave e frutado); Grappolo 541 (oriundo da Itália, frutado, herbáceo e com moderado amargor), Koroneiki (originário da Grécia, que produz um óleo mais picante), Maria da Fé (nacional, desenvolvido pela Epamig, tem características de azeite encorpado, com picância e amargor moderado) e o Blend (referência à mistura de dois ou mais azeites, resultando desde um mais suave até um mais forte). 

Serviço

Conceitos que indicam qualidade em azeites

Frutado: Pode ser sentido no aroma e no sabor e está diretamente ligado ao frescor. Pode ser mais ou menos intenso, remeter a fruta verde ou madura, pode lembrar campo (verde), tomate, amêndoas. 

Amargor: É sentido sobre a língua e pode ser mais ou menos intenso.  

Picância: É sentida quase na garganta. Pode ser muito ou quase nada picante.  

Herbáceo: Azeite com sabor semelhante ao de ervas, com notas de grama cortada. 

Saiba mais sobre as visitas

Epamig: Conheça um pouco mais o trabalho da Epamig

Fazenda Irarema: Acesse Fazenda Irarema e conheça os produtos. Visita guiada aos sábados, domingos e feriados, das 9h às 16h. Pacote de tour guiado com almoço a partir de R$ 80. 

Olivais Gamarra: Saiba mais sobre a fazenda e sua produção de azeite em Olivais Gamarra. Visitas guiadas custam entre R$ 30 e R$ 100. 

Estância do Pinheiro: Visitas guiadas entre R$ 50 e R$ 70 por pessoa. Acesse Instagram / @oliveiscatassaltasdanoruega ou Facebook / Estância Pinheiro ou confira pacotes no site d agência de ecoturismo Andarilhos da Luz. Hospedagem na fazenda a R$ 300 a diária para o casal.

Fazenda Maria da Fé: Confira os produtos em Fazenda Maria da Fé e agende visita pelo telefone (35) 99221-8607. Visitas guiadas a R$ 30 por pessoa. 

Fazenda Fio de Ouro: Conheça sobre a fazenda e sua produção de azeite em Azeite Fio de Ouro. Visita guiada + degustação a R$ 30 por pessoa.

FONTE O TEMPO

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