Uma segunda reunião foi realizada em 09 de março, na Pousada Vargem do Cedro, Boa Morte, entre a Vale S/A e moradores atingidos, em função de atividades da mineradora na serra Dos Mascates. O debate deu sequência às tratativas para atender às reivindicações dos moradores. A empresa trouxe para a reunião oito funcionários ligados às relações com a comunidade, e propôs visitar, individualmente, cada morador, para formalizar sua intenção, até o final de março.
O primeiro encontro aconteceu no mesmo local, em 02/02/2022. Naquele momento, os moradores convocaram a Vale S/A para apresentar danos e prejuízos causados pelos impactos ambientais e ações da mineradora na parte baixa da Boa Morte. Foram relatadas perdas agrícolas com inundações, equipamentos elétricos e eletrônicos queimados, prejuízos pela falta de hóspedes nas pousadas e restaurantes, pânicos causados por músicas da sirene, sirene que não funcionou, além do medo de rompimento da Barragem Marés II, classificada nível de risco 1, pela Agência Nacional de Mineração (ANM). Uma representante da Vale S/A registrou em ata as solicitações, e colocou que iria apresentar à empresa para avaliação e encaminhamentos.
Na nova reunião, o clima dos moradores quanto ao retorno de suas solicitações não foi dos melhores. A empresa não apresentou proposta, partiu para uma discussão técnica sobre o funcionamento de seus equipamentos, e não respondeu a muitos dos questionamentos dos tensos participantes. Ao final, Poliana Franco, responsável pelas relações das comunidades do “Corredor Sul”, propôs visitar, individualmente, cada morador, ouvi-lo e formalizar um processo. “É preciso organizar as ideias e colocá-las no papel, para estabelecer um plano e possível acordo;” pontuou Poliana, que estabeleceu até o final de março para realizar as visitas. Os atingidos solicitam o descomicionamento – esvaziamento da barragem Marés II -, e querem urgência no atendimento de suas solicitações pela Vale S/A.
Assustados e insatisfeitos, moradores não participaram da simulação de emergência
O toque da sirene, as placas de sinalização de fuga, e a possibilidade da barragem se romper são as maiores preocupações dos atingidos, que querem acompanhar as atividades executadas na barragem, através de visitas periódicas. Em 15 de março, a Vale S/A realizou um simulado de emergência; interditou a Rodovia MG-442 e tocou as sirenes. A adesão dos atingidos não deu o resultado esperado; insatisfeitos disseram que já vivem sob tortura, e preferem ficar no trabalho a participar de tal ato. “Não importamos com a riqueza da Vale, mas sim com nossas vidas. Nossas propriedades estão sendo desvalorizadas e precisamos garantir nosso sustento e segurança;” fala de um morador que não quis se identificar, mas que foi ouvida durante toda a reunião.
Vale S/A busca consentimento da comunidade da Boa Morte
Por outro lado, na mesma reunião, o funcionário da Vale S/A Ricardo Alvares, coordenador de “Povos Indígenas e Comunidades Tradicionais Sustentabilidade, citou que sua empresa está em fase de renovação da Licença Geral para o empreendimento minerário da Mina de Fábrica. Ricardo pontuou que Boa Morte é uma comunidade quilombola, com Certificação de Auto-Reconhecimento pela Fundação Cultural Palmares, desde 2004. Ainda, situada em Área de Influência Direta (AID), isto é, dentro de um raio de 8 km do empreendimento. Desta forma, é feita consulta prévia à comunidade, para obter o consentimento, conforme exigido pela convenção no. 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Até então, as tentativas da Vale S/A de se aproximar da comunidade da Boa Morte, parecem que não estão sendo positivas. É fundamental que a comunidade esteja unida e que garanta sua proteção. Para isso, a Associação Comunitária da Boa Morte (ACBM) é fundamental para organizar os debates e apresentar as decisões dos moradores. O debate deve passar pelas aprovações do CODEMA e do Conselho de Cultura, fóruns que dão suporte ao representante do município – prefeito, para a emissão de novas “Declarações de Conformidade”.
Secretaria do Meio Ambiente, três novos pedidos de empreendimentos minerários
A secretária de Meio Ambiente de Belo Vale, Kelly Cristina dos Santos apresentou na reunião do Conselho de Cultura, em 10/03/2022, três novos pedidos de “Declaração de Conformidade” para instalação de empreendimentos na serra Dos Mascates. A secretária demonstrou preocupação, uma vez que as minas seriam situadas em áreas de preservação, entorno de unidades de conservação tombadas e próximas à comunidade da Boa Morte. Segundo a secretária, há um agravante, pois o município não dispõe de uma norma de uso e ocupação do solo, exigida por lei, conforme artigo 10, parágrafo 1º da Resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA -, no. 237/1997.
A serra Dos Mascates não comporta outros empreendimentos que venham aumentar os impactos na Rodovia MG-442 e nas nascentes de água, além de trazerem maiores impactos e danos para a vida dos moradores de sua encosta.
Córrego Marés pode ter água com níveis elevados de metal pesado.
Uma situação preocupante: o córrego Marés está assoreado, com águas turvas e grande quantidade de fino de minério no seu leito e margens. Na reunião, o representante da APHAA-BV solicitou que a Vale S/A apresente o resultado das análises de monitoramento das águas, com destaque para os níveis de metais pesados. – “Há outras mineradoras que contribuem para a poluição, contaminação e baixa qualidade das águas, e devem ser investigadas;” alertou.
Tarcísio Martins, jornalista e ativista socioambiental.