27 de abril de 2024 15:50

‘Pinga ni mim’: Saiba qual a melhor cachaça de Minas Gerais e mais sobre a bebida

Malvada, água-benta, birita, branquinha, caninha, dengosa, engasga-gato, canjebrina, caninha, pinga… Bebida símbolo de Minas gerais, a cachaça ganha diferentes nomes de acordo com a região e com o nível de empolgação quem a consome.

Seja pura, misturada em drinks, na culinária, seja branca ou descansada em tonéis de madeira, a cachaça ocupou espaços. Dos mais simples aos mais sofisticados.

O mercado que gira em torno da cachaça vem crescendo cada vez mais, tanto ancorado na paixão nacional, quanto no potencial de expansão do comércio da bebida.

Desde os modos de fazer, características e receitas de drinks, até a participação da bebida na economia e os impactos do consumo no corpo, conheça tudo sobre a cachaça neste guia preparado pelo BHAZ.

Onde surgiu a cachaça?

A bebida que traz à roda causos cheios de imaginação, também carrega fantasia e mais de uma história possível para sua origem.

Segundo o Instituto Brasileiro da Cachaça, historiadores reúnem três versões mais fortes sobre o local e o contexto da primeira destilação da bebida no Brasil. Há uma única certeza: a bebida nasceu no litoral do país entre 1516 e 1532.

A Ilha de Itamaracá, no Pernambuco; Porto Seguro, na Bahia, e São Vicente, no litoral de São Paulo, disputam o posto de marco zero da cachaça no Brasil.

Como surgiu a cachaça?

Outra teoria controversa gira em torno da origem: foi ideia trazida pelos portugueses ou foi uma grande sacada dos escravos nos engenhos?

A teoria dos portugueses diz que eles estavam acostumados a tomar uma bebida destilada feita do bagaço da casca de uva. Logo, teriam tido a ideia de fazer o mesmo processo com o caldo da cana-de-açúcar, resultando na primeira cachaça no Brasil.

Uma outra versão indica que a bebida nasceu do olhar apurado e observador dos escravos que trabalhavam nos engenhos. Ao ferverem a garapa durante a produção de açúcar, uma espuma tinha que ser retirada de tempos em tempos.

O resíduo era descartado cochos dos animais e misturado à ração. Os escravos teriam notado certa diferença no comportamento do gado, que parecia mais disposto quando se alimentava da mistura.

Foi então que teriam decidido experimentar o líquido formado pela espuma e incluído nas poucas opções de consumo de que dispunham.

Segundo essa teoria, não demorou para os portugueses se apropriarem de mais essa riqueza.

Como a cachaça se tornou símbolo de Minas Gerais?

Com a descoberta do ouro na região que viria a se transformar em Minas Gerais, bandeirantes de todas as partes chegaram a nossas terras. Os exploradores se alojavam aos pés de montanhas próximas à mineração e se aqueciam com a bebida nas noites frias.

A produção passou a crescer nas terras mineiras, transformando o estado em símbolo da cachaça no país.

Diferença entre cachaça, pinga e aguardente

Para além de diferenças nomeações pelas regiões brasileiras, uma dúvida comum entre consumidores é a diferenciação entre cachaça e pinga. E a aguardente, onde entra nessa história?

Segundo Cléber Santiago, presidente da Apacs (Associação dos Produtores Artesanais de Cachaça de Salinas), a principal diferença está na graduação alcoólica.

“Pela legislação, a cachaça tem o teor alcoólico de 38% a 48%. Aguardente, de 38% a 54%. Então, as cachaças também se enquadram como aguardentes”, explica. 

Apesar da popularidade do termo “pinga”, que muitas vezes se refere à cachaça, Cléber defende uma separação.

“Na verdade, nem poderíamos igualar cachaça e pinga. Os produtores preferem que chamemos apenas de cachaça mesmo”, conta Santiago. 

Produção de cachaça na cidade mineira de Salinas (Arquivo pessoal/Cléber Santiago)

Qual a forma correta de tomar cachaça?

Segundo Cléber, as formas de tomar cachaça variam entre os consumidores. “Vai do gosto de cada pessoa. Tem gente que enche o copo de cachaça e vira, e outras pessoas bebem de maneira mais correta, a meu ver, que é a degustação”. Esse modo consiste em tomar um pouco do líquido, deixá-lo na boca, misturar com a saliva e só depois, engolir. 

Há também a opção de fazer drinks e coquetéis com o aguardente de cana-de-açúcar. Caipirinha, raspadinha alcoólica, batida de paçoca e bombeirinho são alguns exemplos.

Diferença entre cachaça branca e amarela

Majoritariamente, existem duas cores mais conhecidas de cachaça: a branca e a amarela. Mas além desses aspectos, o que difere uma da outra?

“A cachaça branca é a ideal para fazer drinks, como a caipirinha. Ela não fica em barris de madeira após a produção, e sim, é armazenada na dorna de inox. Já para beber pura, a maioria das pessoas prefere a cachaça amarela, com mais sabor e cheiro da madeira do barril. A coloração da bebida fica mais amarelada ou avermelhada, a depender da madeira”.

Para envelhecer a cachaça, os seguintes tipos de madeira são os mais comuns: amburana, carvalho, jequitibá e imbuia.

Além da coloração, a madeira vai influenciar em aspectos sensoriais da cachaça, como o aroma. Dependendo do local e tempo de armazenamento, a bebida ganhará sabor mais frutado, adocicado, acastanhado ou floral.

Cachaças brancas e amarelas agradam diversos públicos (Valter Campanato/Agência Brasil)

Qual a melhor cachaça?

De acordo com o produtor, existem cachaças para todos os gostos. Como a bebida é versátil, fica difícil classificar tipos entre “melhor” ou “pior”.

De qualquer forma, existem cachaças produzidas artesanal e industrialmente, a compra e preferência ficam a cargo do consumidor. 

“Dá para usar [as madeiras] carvalho, amburana, bálsamo, ou deixar a bebida branca, mais forte, mais fraca… a cachaça é um produto muito amplo que cai bem em quase todos os drinks, principalmente a caipirinha. Por exemplo, a cachaça consegue substituir a vodka em drinks e até mesmo amaciar carnes”, diz Cléber. 

V Ranking da Cúpula da Cachaça 2022

O grupo Cúpula da Cachaça reúne profissionais de diferentes formações, mas com um grande elo em comum: a especialização em cachaça. Em 2014, 2016, 2018, 2020 e 2022, a iniciativa elegeu as melhores cachaças do Brasil no Ranking Cúpula da Cachaça.

concurso, que reúne todas as cachaças legalizadas do país, tem o objetivo de ser o mais abrangente do Brasil e é distribuído em três fases: voto popular, seleção dos especialistas e cúpula da cachaça.

Confira as três melhores cachaças de cada categoria no mais recente ranking da Cúpula da Cachaça, de 2022:

Categoria Brancas

1ª – Da Quinta Prata: nota 84,43
2ª – Pindorama Prata: nota 81,86
3ª – Tiê Prata: nota 81,14

Categoria Armazenada/Envelhecida

1ª – Anísio Santiago/Havana: nota 84,08
2ª – Estância Moretti 4 Madeiras: nota 83,4
3ª – Baobá Ouro: nota 80,73

Categoria Premium/Extra Premium

1ª – Pardin Porto: nota 80,67
2ª – Vechio Albano Extra Premium: nota 77,75
3ª – Middas Reserva dos Proprietários: nota 77,03

Algumas bebidas expostas na Cachaça Trade Fair de 2018, em São Paulo (Rovena Rosa/Agência Brasil)

Mercado em expansão

Entre janeiro e novembro de 2022, Minas Gerais subiu do 5º para o 3º lugar em exportação de cachaça no Brasil, ficando atrás apenas de São Paulo e Pernambuco.

O estado mineiro responde por 11,2% do valor exportado pelo Brasil. Os dados foram levantados pelo Instituto Brasileiro da Cachaça (Ibrac).

“A cachaça está tomando um rumo muito grande no mercado e na cultura do brasileiro. Ainda há aquele preconceito, mas isso está mudando”, afirma Cléber Santago.

Além de presidente da Apacs, Cléber é administrador da Cachaça Havana, uma das marcas mais tradicionais de Salinas (MG) e de todo o Brasil. De coloração amarela, a bebida é envelhecida com a ação da madeira do tipo bálsamo.  

Em 2022, aconteceu a 31ª edição da Expocachaça em BH; tradicional feira é a maior referência do setor no Brasil (Andreza Miranda/BHAZ)

O produtor celebra o crescimento das marcas e da fiscalização. “Isso faz com que as pessoas legalizem as empresas, registrem as marcas, os artefatos de produção. Temos esperança que o mercado dê um salto bom para recompensar um imposto muito alto no produto, por ser uma bebida alcoólica”. 

O avô de Cléber, Anísio Santiago (1912-2002), fundou a Havana no início da década de 1940. O produtor foi pioneiro na formalização da produção e do comércio de cachaça.

“Meu avô sempre falava que queria transformar a cachaça em uma bebida especial, como o whisky, algo que todos tinham orgulho em beber. E ele conseguiu: a Havana é reconhecida como Patrimônio Imaterial e Cultural de Salinas. “, orgulha-se Cléber.

A Cachaça Havana foi reconhecida como patrimônio (Arquivo pessoal/Cléber Santiago)

Como fazer cachaça

Na conversa com o BHAZ, Santiago detalhou o processo de produção artesanal da Cachaça Havana. O profissional ressaltou que a madeira tem um papel importante na feitura de cachaças, afetando a coloração e o sabor da bebida.

“Normalmente, a maneira de produção das cachaças é a mesma, passando por lavagem, moagem, fermentação e destilação. O que difere as cachaças é a madeira. O bálsamo deixa uma coloração amarela, a amburana proporciona um gosto mais amargo, já o carvalho deixa a bebida mais avermelhada”, afirma.

A matéria prima da cachaça é a cana-de-açúcar. “Temos um selo orgânico, e observamos o produto desde o plantio até o envelhecimento. Após o corte da cana, fazemos uma lavagem para deixá-la bem limpinha. Depois, passa na moagem, no filtro decantador, onde algumas impurezas decantam”, inicia. 

Cana-de-açúcar é a matéria prima da cachaça (Arquivo pessoal/Cléber Santiago)

Posteriormente, o líquido vai para o tanque. “Lá, fazemos a mistura do caldo. Normalmente, esse caldo fica com mais de 20% de doce, o chamado brix da cana. Mas ela só pode ir para a fermentação com 15% de doce. Então, vamos colocando água e medindo, até o teor de doce atingir essa porcentagem”, pontua Santiago. 

A próxima etapa é a fermentação, um processo vivo no qual as leveduras tiram o doce que tem no caldo e transformam-no em álcool. “Depois dela, fazemos a destilação desse caldo, que se tornou um vinho. Nessa parte, separamos a cachaça do vinho”. Agora, é utilizado o equipamento conhecido como alambique.

Etapa de fermentação (Arquivo pessoal/Cléber Santiago)

Cléber explica que a atuação do alambique se assemelha a uma tampa de panela. “Acendemos o fogo embaixo e a tampa fica úmida, molhada. Esse vapor quente, com a água fria que cai em cima do capelo, condensa e se transforma em cachaça. Depois de destilada, ela vai para o armazenamento”, conta. 

A cachaça pode ser armazenada em dornas de inox e barris de madeira, e até ser vendida antes mesmo de envelhecer. “Tudo depende do que eu vou querer lá na frente, inclusive a graduação alcoólica”, diz Santiago. No caso, a cachaça Havana possui coloração amarela e é envelhecida com a ação do bálsamo.  

Mecanismo do alambique tem atuação crucial na produção da cachaça (Arquivo pessoal/Cléber Santiago)

Beber cachaça faz mal?

BHAZ também conversou com a médica angiologista Joana Kalil, que explicou os efeitos da bebida no corpo. Segundo a profissional da saúde, podem até existir benefícios, mas, para isso, o consumo consciente deve prevalecer.

“Muito se fala mundialmente sobre a ingestão prejudicial de bebida alcóolica ao nosso organismo. Com a cachaça, isso não é diferente. Contudo, alguns estudos apontam que a cachaça, sobretudo a envelhecida, possui algumas ações. Há propriedades vasodilatadoras, função antioxidante e anticoagulante, elevando o ‘colesterol bom’. Nesses casos, a gente pode ter um pequeno benefício do seu uso consciente”, inicia.

Porém, é preciso tomar cuidado com essas características da bebida. “Vale ressaltar que o consumo não deve ser encorajado para que as pessoas abusem do destilado. Caso bebido em quantidades mais moderadas ou elevadas, o líquido pode provocar um prejuízo importante ao nosso organismo”, alerta Joana.

“É muito importante complementar que não podemos definir a cachaça como algum tipo de tratamento ou prevenção de infarto ou trombose”, afirma a médica.

A ideia é corroborada pelo produtor Cléber Santiago: “O grande problema é o vício, quando as pessoas acabam bebendo muito. Tem pessoas que começam bebendo pouco, e vão aumentando. Isso é perigoso”, completa. 

O que a cachaça faz com o fígado?

Então, quais os possíveis efeitos da bebida no fígado? “O uso da cachaça de forma moderada ou elevada a longo prazo pode trazer riscos e danos muito importantes ao órgão”, apresenta Joana Kalil. Confira os possíveis malefícios que esse consumo pode causar no fígado, de acordo com a angiologista:

  • Inflamação generalizada, prejudicando todas as funções do fígado
  • Esteatose hepática, um acúmulo de gordura que pode se desenvolver para uma hepatite alcóolica
  • Cirrose hepática, em último caso. Esse já é um quadro irreversível, onde o paciente pode apresentar diversas alterações do organismo, secundárias à cirrose. Muitas vezes, ele precisa ser encaminhado para a fila do transplante de fígado.

Quantas doses de cachaça posso tomar por dia?

Com isso, é comum surgir uma dúvida entre os amantes da bebida: será que tem uma quantidade segura para o consumo? “De acordo com a OMS (Organização Mundial da Saúde), a dose máxima e consciente do uso de cachaça deve ser de 25 a 30 gramas por dia, ou seja, uma a duas doses”, informa Joana. Ela também lembra que o usuário também está em risco de evoluir para as alterações hepáticas citadas.

“O consumo excessivo de bebida alcóolica, não somente da cachaça, é prejudicial para o organismo como um todo. Vamos fazer o uso com consciência, preservando nossa saúde corporal”, finaliza a médica.

Como fazer caipirinha

Aprenda uma forma simples de fazer caipirinha, uma das bebidas mais conhecidas (e queridas) do Brasil.

Ingredientes

  • 1 dose de cachaça branca (60 ml)
  • 1 limão (de preferência, do tipo Taiti)
  • 2 colheres de sopa rasas de açúcar
  • Gelo até encher o copo

Modo de fazer

  • Após lavar e secar o limão, corte as extremidades da fruta. Corte o limão na metade e retire os “meios”, a parte branca. Depois, fatie-o em gomos.
  • Insira os pedaços de limão e as duas colheres de açúcar dentro de um copo, e macere suavemente com um pequeno pilão. Tente não fazer isso de forma muito forte, para não amargar.
  • Complete o copo com os cubos de gelo, adicione a cachaça e sirva!
Caipirinha é uma bebida clássica que leva cachaça (Beatriz Kalil Othero/BHAZ)

Como fazer quentão com gengibre e cachaça

Confira abaixo uma receita fácil e rápida de quentão, bebida em que a cachaça é a base. De acordo com as quantidades abaixo, a receita rende 10 porções. No total, o preparo demora cerca de 20 minutos.

Ingredientes

  • 900 ml de cachaça
  • 10 fatias de gengibre
  • 1 ½ xícara de chá de água
  • 1 ½ xícara de chá de açúcar
  • 1 laranja cortada em rodelas
  • 1 maçã sem casca, picada
  • 2 limões cortados em rodelas
  • 10 cravos-da-índia
  • 2 canelas em pau

Modo de fazer

  • Utilizando uma panela de tamanho grande, derreta o açúcar em fogo médio. Dica: despeje-o aos poucos;
  • Quando ele se tornar um caramelo, coloque a água e mexa até os “gomos” de açúcar derreterem;
  • Despeje o resto dos ingredientes na panela – gengibre, cachaça, laranja, maçã, limão, cravo e canela. Tome cuidado para mexer de maneira amena, sem amassar as frutas;
  • Coloque a tampa na panela e deixe a mistura cozinhando até ferver;
  • Desligue o fogo e sirva!

FONTE BHAZ

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