Projeto visa desviar caminhões de minério das BRs 040 e 356 para reduzir acidentes; moradores querem ser ouvidos
Lugarejos repletos de vida e história que podem ser suprimidos com a passagem de caminhões de minério de ferro. Essa é a mensagem que as comunidades de Itabirito, cidade da região Central, tentam passar para o poder público e demais envolvidos na criação de uma “estrada do minério”. A iniciativa, que visa desviar o fluxo desses veículos das BRs 040 e 356, com a intenção de reduzir acidentes, é necessária, segundo eles, no entanto, não como está sendo proposta.
Claudio Aguiar, membro ativo do Vozes do Bação, grupo composto por representantes das comunidades de São Gonçalo do Bação, Ribeirão do Eixo, Saboeiro, Macedo, Teixeira e Córrego do Bação, lamenta as mortes nas estradas que, em sua opinião, são provocadas na maioria das vezes por uma irresponsabilidade dos condutores das carretas. Como frequentador assíduo das BRs, ele afirma que os caminhões não costumam trafegar pela direita, como estabelecido em lei.
Logo, Aguiar expressa sua preocupação em relação à responsabilidade em casos de acidentes envolvendo carretas de minério e questiona quem é responsabilizado quando ocorrem fatalidades. A crítica recai sobre a falta de responsabilização por parte das empresas produtoras e receptoras do mineral. Ele sugere que o obstáculo enfrentado vai além da negligência, imprudência ou imperícia da gestão pública, apontando para uma desatualização total dos órgãos gestores.
O integrante do Vozes do Bação, que reúne profissionais de várias áreas, como analistas ambientais, engenheiros, turismólogos, produtores culturais, agricultores familiares, ressalta que, desviar o tráfego para dentro dos distritos, como proposto na “Rodovia do Minério” não resolverá o problema: apenas mudará de localidade e pessoas continuarão sendo afetadas. Por esse motivo, ele deseja que a solução seja amplamente debatida e outros pontos de vista sejam analisados.
“Não é aceitável que milhões de pessoas sejam condenadas a morrer rapidamente debaixo de ferros, ou devagarzinho por ver gerações sendo completamente exterminadas porque, da noite para o dia, começaram a passar 1.500 carretas na porta de casa. É como se os distritos fossem obrigados a ser extintos por um projeto acochambrado, que não quer tratar o problema de verdade e, sim, empurrá-lo para debaixo do tapete, onde existem pessoas vivendo há 300 anos”, lamentou.
Terminal ferroviário que receberia o minério de ferro gera preocupações
Um das principais preocupações das comunidades diz respeito à construção do Terminal Ferroviário do Bação (TFB). O empreendimento da Bação Logística faz parte do escopo do projeto idealizado por prefeitos de cidades do Quadrilátero Ferrífero e demais membros de um grupo de trabalho (GT) da Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais e do Brasil (Amig). Estima-se que a ferrovia seria capaz de escoar oito mil toneladas de minério de ferro.
Márcio Ziviani, professor aposentado da Escola de Engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e membro da Comissão Especial-Terminal de Minérios da Associação Comunitária de São Gonçalo do Bação, diz que os distritos não são contra a iniciativa, mas são contrários a sua proximidade com o centro histórico e seu modo de operação. Ele afirma que é necessário a empresa fornecer respostas concretas sobre os possíveis impactos na região.
Conforme Ziviani, a associação enviou ofícios para a Bação, questionando, por exemplo, qual seria a intensidade do barulho da operação, quanta poeira iria para os distritos e como seriam solucionados os problemas gerados pelo tráfego de carretas nas estradas que dão acesso às comunidades. Porém, a empresa tem se negado a respondê-los. Segundo ele, a companhia também se negou a analisar alternativas que a comunidade produziu para a localização.
“Se está havendo manifestação com relação ao turismo que está sendo prejudicado em Congonhas e Ouro Preto pela utilização de uma estrada que não foi feita para transportar minério, o que vai acontecer com o turismo e com a cultura de São Gonçalo do Bação? São perguntas que estamos fazendo e não temos tido respostas”, enfatizou, destacando a história da comunidade e região, com atividades que poderiam ser um caminho à diversificação econômica de Itabirito.
Prefeito assegura que as comunidades de Itabirito serão ouvidas no processo de criação da “estrada”
Segundo o coordenador do grupo de trabalho da Amig e prefeito de Congonhas, Cláudio Antônio de Souza, foi entregue ao Centro de Autocomposição de Conflitos e Segurança Jurídica (Compor), do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), no dia 29 de novembro, apenas uma ideia para desafogar as BRs 040 e 356 e diminuir acidentes. Essa solução, de acordo com ele, seria capaz de reduzir de 600 a 1.200 viagens de carretas de minério por dia nas estradas.
Souza ressalta que a proposta é inicial e passará por diversas discussões técnicas, jurídicas, ambientais, sociais e econômicas. E reitera que existem várias questões em aberto e que serão construídas ao longo do percurso até a meta final, visto que se trata de uma obra complexa, que demanda tempo e aprovações. Neste sentido, ele não garante que o TFB fará parte do projeto e diz que somente estudos vão apontar qual o melhor caminho, de fato, para a “estrada”.
O prefeito ainda afirma que o Compor realizará, posteriormente, uma mediação entre os atores envolvidos na “Rodovia do Minério”, o que inclui escutar membros das comunidades de Itabirito e dos demais municípios que compõem a “estrada”. E assegura às comunidades: “Enquanto eu estiver participando do grupo de trabalho, eu não abro mão de que sejam ouvidos”.
A reportagem tentou entrar em contato com o prefeito de Itabirito e participante do GT da Amig, Orlando Caldeira, mas sem sucesso. Sobre os questionamentos da associação comunitária referentes ao TFB, não encontrou nenhuma forma de contato com a Bação Logística.
FONTE DIÁRIO DO COMÉRCIO