De diferentes regiões do estado, refrigerantes mineiros criados dos anos 1940 para cá acionam memórias e despertam paixões
Das nostálgicas garrafinhas do Del Rey ao sabor “diferentão” do Abacatinho, Minas Gerais já provou que sabe inovar quando o assunto é refrigerante. Opção é o que não falta para quem gosta da refrescância da bebida misturada ao vasto universo de possibilidades gastronômicas que só a terra das Gerais sabe proporcionar. Pequenas, médias e até grandes marcas do mercado têm investido na criação de novos sabores, embalagens e possibilidades para os refrigerantes, alinhados aos propósitos ecológicos e às novas diretrizes nutricionais para o ramo.
No fim da década de 1940, a distribuidora de bebidas Naná, em Divinópolis, na Região Centro-Oeste de Minas, produzia o Guaraná de Divinópolis e bebidas alcoólicas tradicionais como quentão, cachaça e aguardente. Com o crescimento da empresa familiar, boa parte dele atribuído ao guaraná, o refrigerante precisava de um novo nome que representasse o momento de prosperidade. Ponche era a bebida do momento nos anos 1960 e chique foi o adjetivo utilizado para ilustrar as novas perspectivas para a marca, que passou a trabalhar apenas com o refrigerante. Ponche mais chique com um pouquinho de estilo virou… Pon Chic.
A pequena fábrica hoje é totalmente automatizada. O Pon Chic pode ser encontrado nos sabores guaraná, abacaxi e laranja e em diversas embalagens e tamanhos. A capacidade de produção supera quatro mil litros por hora e cerca de 100 mil litros por mês, de acordo com Felipe Lopes, neto do fundador, José Lopes Ferreira, e gerente da marca. Apesar da produção volumosa, a empresa atua com um corpo de 14 funcionários e atende num raio de 140 quilômetros ao redor de Divinópolis.
Criado há cerca de 70 anos, o Pon Chic mostra que a redução de conservantes e açúcares não deve ser uma pauta para o futuro. “Nutricionalmente falando, o Pon Chic é melhor do que a maioria dos refrigerantes do mercado, porque os outros usam edulcorantes, que são açúcares sintéticos, e o nosso é feito com açúcar de cana, que é natural”, explica Felipe.
De acordo com o gerente, a produção será ampliada em 25% neste ano e, até 2026, chegará ao dobro. E as metas não param por aí. Produtos como água sabor limão e Pon Chic em lata também estão na agenda de lançamentos e a clientela pode (e deve) ficar otimista.
Gostinho de infância
O Pon Chic é o único refrigerante servido no restaurante Roça Grande, que se mudou, na semana passada, para a Rua São Paulo, no Bairro Lourdes, em Belo Horizonte. Isso porque a chef e proprietária Mariana Gontijo traz o interior em suas raízes, o que se reflete nas escolhas de cada produto da casa, que tem o propósito de divulgar e valorizar a cultura alimentar da roça, caipira, sertaneja e brasileira.
Natural de Moema, na Região Centro-Oeste de Minas, ela se lembra com carinho das mesas das festas infantis que eram decoradas com Pon Chic e bala de coco. Além da memória afetiva, o refrigerante se tornou destaque no Roça Grande pelo desejo da chef de valorizar pequenos produtores regionais.
Há quem diga que é arriscado deixar de servir os tradicionais refrigerantes que já estão consolidados no paladar do público. Mariana jogou alto e acertou em cheio. O Pon Chic faz o maior sucesso e por si só já atrai clientes. “Tem gente que só vem aqui tomar Pon Chic, leva um fardo inteiro”, conta. Quem ainda não conhece, quando é convidado a experimentar, apaixona-se logo de cara: “Ninguém nunca reclamou. Os clientes sempre experimentam e adoram.”
Só em Minas
Um dos mineirinhos mais tradicionais, o Guarapan se mantém firme no mercado e está conquistando cada vez mais “fiéis”. A bebida surgiu na década de 1940 por acaso, em uma experiência não-autorizada feita por um técnico na linha de produção da fábrica da antiga Refrigerantes Minas Gerais (REMIL). O “elemento x” que conquistaria o coração dos mineiros era a mistura-base do Guaraná Taí com maçãs e outros componentes. Desde 2000, o refrigerante pertence à Coca-Cola FEMSA Brasil, que manteve a receita e o sistema de produção.
O Guarapan é vendido em dois tamanhos: na lata de 220ml e na embalagem pet de dois litros. Para a gerente de categorias da Coca-Cola FEMSA Brasil, Luciana Chimenti, o segredo do sucesso, para além do sabor, está no afeto. “O Guarapan é um refrigerante de maçã que está na memória afetiva dos mineiros, lembranças de aniversários, festas e almoços, entre tantas outras confraternizações”, aponta.
Apesar do grande sucesso por aqui, a marca não é comercializada em outros estados. “Ter um refrigerante 100% mineiro, como o Guarapan, é importante, porque permite que nossa empresa atenda por completo às necessidades e preferências dos consumidores locais, construindo uma conexão mais forte com a comunidade e promova um sentimento de orgulho e identidade entre os consumidores mineiros”, explica Chimenti. Conexão essa que fica explícita na embalagem que brada o “orgulho de ser mineiro”.
Guaraná com limão
Por falar em acidente, o sabor do mais novo refrigerante de Belo Horizonte, o Guaramão, foi definido por acaso. Em razão da pandemia, Eduardo Quick, proprietário da marca, fechou uma empresa de delivery para produtos orgânicos e naturais que administrou por 10 anos. No momento de reabertura do comércio, em 2021, ele recebeu um convite especial de seu irmão, Rafael Quick, que estava inaugurando um bar e precisava da sua expertise com sucos naturais para criar uma bebida artesanal não alcoólica para incrementar o cardápio.
Eduardo estudou, testou e chegou a duas receitas: extrato natural de guaraná com limão e frutas vermelhas com limão. Os dois sabores seriam servidos na inauguração do bar Juramento 202, no Bairro Pompeia. No entanto, os pedaços das frutas vermelhas entupiram a torneira da chopeira e a bebida não chegou nem a ser servida. O guaraná com limão, por outro lado, fez o maior sucesso. E assim surgiu o Guaramão, com 35% menos açúcar do que outros refrigerantes.
“Não tive tempo de organizar a parte comercial, mas, desde 2021, as distribuidoras me procuram para comprar. Agora, três anos depois, estou estruturando a empresa e trabalhando com a expansão da marca para outros estados, como Rio de Janeiro e São Paulo”, relata Eduardo.
Novidades na área
Para este carnaval, a Guaramão misturou a sua refrescância e leveza a bebidas alcoólicas produzidas em BH. A cachaça de jambu Jambruna, misturada ao refrigerante, formou o Jambrunão, que é vendido em lata. Outra novidade enlatada é o Guaramão + Yvy, feita com banana, tangerina, maracujá, vodca da destilaria mineira Yvy e Guaramão. Segundo Eduardo, essas parcerias vieram para ficar.
O Guaramão zero açúcar deve sair do “forno” ainda em 2024 e a marca também está investindo em garrafas de vidro para comercializar a bebida.
Conheça outros refrigerantes criados em Minas
Por Maria Dulce Miranda
Abacatinho: o refrigerante de Ubá, na Zona da Mata, é feito com a folha do abacateiro. Criado em 1946, tem um sabor diferente, que não lembra em nada a fruta;
Guaraná Mineiro: lançado na década de 1960, em Uberlândia, no Triângulo Mineiro, o refrigerante adocicado conseguiu sucesso na região. Anos depois, a marca passou a produzir também os sabores limão e laranja;
Guaranita Cibal: comercializado desde 1946, o refrigerante Cibal nasceu em Passa Quatro, no Sul de Minas. Além do Guaranita, de guaraná, a marca também produz refrigerantes de laranja, cola, uva e citrus;
Jota Efe: a empresa Bebidas Jota Efe existe desde 1949 em Ouro Fino, no Sudoeste do estado. O refrigerante com o mesmo nome da marca é vendido nos sabores guaraná, limão, abacaxi, laranja, maçã, cola e uva;
Mantiqueira: criado em 1974, o refrigerante começou a ser produzido em um casamento na cidade de Itamonte, no Sul de Minas. A bebida está disponível nos sabores cola, guaraná, abacaxi, laranja, uva e limão;
Mate Cola: o refrigerante lançado em 1949, em Teófilo Otoni, no Nordeste de Minas, mistura folhas de erva mate, cola e chapéu de couro;
Mate Couro: a famosa bebida à base de mate e chapéu de couro começou a ser vendida em 1947, em Belo Horizonte. Mais tarde, foi criada uma linha com sabores: guaraná, uva, cola, laranja, limão, abacaxi e tangerina.
FONTE ESTADO DE MINAS