Contas preliminares do tributarista Eduardo Fleury apontam que novo imposto brasileiro pode ultrapassar 27%, patamar hoje praticado pela Hungria; especialistas ponderam, no entanto, que carga não será maior que a atual
A inclusão das carnes na cesta básica com imposto zero e outras alterações feitas no texto que regulamenta a reforma tributária, aprovado pela Câmara dos Deputados nesta quarta-feira, 10, podem fazer com que a alíquota do novo Imposto sobre Valor Agregado (IVA) brasileiro se torne o maior do mundo.
As contas ainda são preliminares, mas, de acordo com o economista e tributarista Eduardo Fleury, fundador do escritório FCR Law e chefe da área de direito tributário, a alíquota do IVA brasileiro deve chegar a pelo menos 27,2% – acima dos 27% da Hungria, hoje a maior do mundo. O Ministério da Fazenda informou que está atualizando os cálculos com as mudanças feitas pelos deputados, e deve divulgar uma projeção oficial em breve.
Os cálculos iniciais da equipe econômica do governo apontavam que, se não houvesse nenhuma exceção – ou seja, se nenhum setor tivesse tratamento diferenciado na reforma tributária -, a alíquota padrão ficaria entre 20,73% e 22,02%. Mas a cada item que entra nas taxas com desconto, a alíquota-padrão sobe mais um pouco.
Fleury, que participou das discussões do projeto a convite do Congresso, tem um conta mais conservadora em relação ao impacto da isenção das carnes no IVA. Ele entende que esses produtos vão aumentar a alíquota base em 0,4 ponto porcentual, abaixo do 0,53 estimado pela Fazenda e do 0,57 ponto previsto pelo Banco Mundial.
Além disso, outras alterações na proposta, como ampliação de benefícios a medicamentos, ao setor imobiliário e cooperativas, terão impacto de pelo menos mais 0,3 ponto percentual, podendo chegar a 0,5. Como a alíquota-padrão prevista pela Fazenda era de 26,5%, chegaria-se a 27,2% na conta mais conservadora, podendo alcançar 27,4%.
“Ainda é preciso olhar no detalhe a redação final do texto, mas creio que somente as proteínas terão impacto em torno de 0,4 ponto porcentual, o que deve fazer com que a alíquota passe de 27%. Importante frisar, contudo, que essa conta é uma estimativa com muitas variáveis”, pontuou Fleury.
O economista entende que, mesmo com as mudanças, o efeito líquido da reforma é extremamente positivo e lembra que o Brasil hoje já estava no topo de carga tributária sobre o consumo. “IPI, ICMS, PIS/Cofins e ISS já arrecadam o valor correspondente a esta alíquota. Então, não vamos pagar mais”, afirmou.
Nesta quarta-feira, 10, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que a equipe do secretário extraordinário da reforma, Bernard Appy, está fazendo os cálculos sobre o impacto das alterações do novo texto.
“Não podemos inverter a lógica da reforma, que é a de manter a carga tributária. Quanto menor o número de exceções, menor a alíquota. Mas a carga não será alterada. Isso (as exceções) pode fazer aumentar a alíquota-padrão; a cada exceção se faz um cálculo”, disse o ministro.
Trava ‘frágil’
Como antecipou o Estadão/Broadcast, o texto aprovado nesta quarta-feira traz uma trava para que a alíquota-padrão não seja maior do que 26,5%, que era a projeção de alíquota segundo a proposta enviada pela Fazenda ao Congresso.
A trava passaria a valer a partir de 2033, depois do período de transição da reforma tributária, que começa em 2026. Caso a alíquota ultrapasse o limite, o governo seria obrigado a formular, em conjunto com o Comitê Gestor do IBS, um projeto de lei complementar com medidas para reduzir a carga tributária.
Fleury considera, no entanto, que esse dispositivo não garante que a alíquota fique dentro desse patamar, já que a lei exige apenas que um novo projeto de lei seja encaminhado ao Congresso pelo Executivo.
“O texto é bem frágil. Ele só obriga o governo a mandar o projeto, mas não obriga que Estados e municípios reduzam as alíquotas, o que seria inconstitucional”, diz.
Ele entende como um equívoco a inclusão das carnes na cesta básica, porque são itens consumidos também pela parcela mais rica da população brasileira. “Colocar a carne na cesta básica vai concentrar renda. A carne mais cara é consumida pelos 10% mais ricos; logo, eles vão poupar muito mais recursos do que os 10% mais pobres vão economizar”, afirmou.
FONTE ESTADÃO