Artista faz boneco gigante de padre e é excomungada no interior de Minas

A mulher desfilou com o boneco em festa religiosa e precisou ser escoltada por militares. Pároco a havia alertado sobre proibição do uso da sua imagem

Após fazer um “bonecão” do padre responsável pela Paróquia São Sebastião, em Sabinópolis, no Vale do Rio Doce, a artista e arquiteta Celina Barroso foi excomungada da igreja católica em praça pública. O caso aconteceu na sexta-feira (16/8) durante a festividade religiosa de Nossa Senhora do Rosário, quando o conjunto folclórico “Grupo do Bonecão” desfilou com uma caricatura do pároco como uma crítica à gestão paroquial. Segundo Celina, o padre estava centralizando as decisões da igreja e cometendo irregularidades em sua administração. 

O boneco gigante, semelhante aos bonecos tradicionais de Olinda, em Pernambuco, foi produzido em conjunto com o grupo, que confecciona as caricaturas todos os anos para o desfile que antecede o mastro, momento em que uma bandeira com a imagem da santa homenageada é erguida pelo pároco e organizadores.

No entanto, durante a cerimônia, o padre José Geraldo anunciou a excomunhão da artista. “É um desrespeito o que ela acabou de fazer. Eu pedi: ‘não saia [com o boneco], dona Celina’, e ela saiu. Ela está excomungada”, repetiu em praça pública durante o evento religioso. 

No entanto, essa tensão começou em janeiro deste ano, quando o padre destituiu uma comissão da associação da festa. Segundo Celina, o pároco teria abolido a lista de festeiros que estava preenchida até 2034 e escolheu os organizadores deste ano por conta própria, além de comparecer às reuniões da associação somente acompanhado de uma advogada. A gestão paroquial afixou um banner próximo à caixa do dízimo, pedindo valores para os fiéis a partir de R$14,12. “Até as crianças estavam preocupadas em pagar o dízimo”, relata. 

Diante do que a arquiteta chamou de “centralização financeira” da festa, ela resolveu confeccionar um “bonecão” realista do padre e sua advogada como uma crítica. “Eu faço bonecos realistas desde os anos 1990. O primeiro foi o ex-governador Newton Cardoso, que na época estava sendo muito criticado pelos servidores estaduais. Eu sempre faço para homenagear ou para criticar, nesse caso foi uma crítica para chamar atenção para esse caso”, explica Barroso. 

Quando decidiu utilizar a imagem do pároco, alguns familiares e membros do grupo folclórico se opuseram, mas Celina começou a confecção do bonecão realista utilizando argila e fibra de vidro. A informação chegou aos ouvidos do padre, que enviou uma carta registrada em cartório para a artista pedindo que ela não levasse a ideia adiante. “Não autorizo o uso da minha imagem para músicas, escritos, mesmo que de forma caricata, sob pena de indenização por danos morais”, afirmou. 

Durante uma missa em que aconteceu o desfile dos bonecos, o padre ameaçou excomungar a artista caso ela utilizasse o artefato. “Ela está usando a minha imagem sem a minha autorização Se o boneco sair, a bandeira não sai. A igreja vai ficar fechada. Eu sou um pastor, não sou um palhaço. Sou ungido pelo Senhor, essas mãos foram ungidas há mais de 10 anos. Eu não aceito que façam isso com padre nenhum, eu a excomungo”, exclamou. 

Celina relata que o padre usou uma foto dela e do boneco durante a celebração ao fazer a afirmação. Tremendo que fiéis radicais a perseguissem, ela registrou um boletim de ocorrência na Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG) e pediu por escolta para desfilar com o boneco. 

No dia do mastro 

Na noite de sexta-feira, os grupos folclóricos, entre eles o Grupo do Bonecão, saíram com destino à rua da Igreja do Rosário. Celina estava acompanhada por militares e carregava a caricatura gigante do padre, porém, o cobriu com um pano preto escrito “censura” ao passar pela igreja. Durante o desfile, entre vaias e aplausos, fiéis jogaram bebidas no boneco.

No momento de erguer a bandeira de Nossa Senhora do Rosário, o padre comunicou que a mulher estava excomungada, finalizou o procedimento e fechou a igreja sem dar a “bênção final”. 

‘A excomungada’

Após a festa, a artista vem recebendo mensagens de repreensão e apoio da comunidade católica da cidade. “Eu já não ia à igreja, não faz diferença. O problema é que as pessoas começaram a me colocar apelidos, me chamam de ‘a excomungada’”, conta Celina. 

“Eu tenho um escritório de arquitetura na cidade e tenho medo que isso possa me prejudicar financeiramente”, destaca a artista, que pretende oficializar uma denúncia no Ministério Público de Minas Gerais. 

O que diz a paróquia 

Em nota divulgada nas redes sociais, a Paróquia de São Sebastião de Sabinópolis saiu em defesa do pároco. “Os atos ofensivos dirigidos ao padre José Geraldo são inaceitáveis e causam vergonha aos verdadeiros católicos e às pessoas de bem de nossa comunidade. Esses comportamentos não refletem os valores de respeito, fé e união que sempre guiaram nossa paróquia e nossa cidade”, declara. 

Procurado pelo Estado de Minas, o padre José Geraldo não se pronunciou sobre o caso. 

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil afirma que não tem conhecimento sobre o caso. “Certos pecados particularmente graves são punidos pela excomunhão, a pena eclesiástica mais severa, que impede a recepção dos sacramentos e o exercício de certos atos eclesiásticos (66) e cuja absolvição, por conseguinte, só pode ser dada, segundo o direito da Igreja, pelo Papa, pelo bispo do lugar ou por sacerdotes por eles autorizados”, explica em nota.

FONTE ESTADO DE MINAS

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