Em 94% dos municípios mineiros, não há vagas suficientes em creches para atender todas as crianças de 0 a 6 anos. Os dados motivaram a criação do “Projeto Crescer Juntos: Creches e Oportunidades”, do Ministério Público de Minas Gerais, em parceria com outros órgãos estaduais. A iniciativa prevê que promotores de Justiça acompanhem as administrações municipais para garantir a existência de escolas e a oferta de vagas em todas as cidades mineiras. O programa é coordenado pelo Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça de Defesa da Educação (CAO-Educ). Segundo dados apresentados pelo MPMG, mais de 63 mil famílias aguardam na fila por uma vaga em unidades de ensino para crianças menores de 6 anos.
Lançamento
Durante o lançamento do projeto, as instituições assinaram um protocolo de intenções para o desenvolvimento de estratégias e ações integradas. “Esse projeto carrega os sonhos das crianças de hoje e de amanhã”, disse o procurador-geral de Justiça, Paulo de Tarso Morais Filho, pois, segundo ele, o acesso integral a creches ainda é um direito que não se tornou realidade. “Para mudar essa realidade, é preciso a colaboração de todos”.
De acordo com dados apresentados pela coordenadora do Caoeduc, promotora de Justiça Giselle Ribeiro de Oliveira, menos de 40% das crianças mineiras são atendidas por creches públicas ou privadas. E 94% dos municípios têm fila de espera. “Nós estamos falando em mais de 63 mil crianças aguardando vagas em creches”, disse. Mas esse número pode ser maior, pois, segundo ela, muitas famílias não sabem que têm esse direito.
A promotora Giselle Ribeiro explica que o programa surgiu a partir dos dados do Censo Escolar de 2023 e das primeiras informações de 2024, que mostram que, em Minas, a taxa de atendimento em creches — públicas ou privadas — foi de apenas 34%. “Isso é um problema que também representa uma violação de um direito fundamental das crianças: o acesso à educação. Então, todas essas questões e o fato de a legislação que deveria resolver esse desafio não estar sendo aplicada nos motivaram a criar o projeto”, afirma a coordenadora do CAO-Educ.
Em um primeiro momento, o Centro de Apoio à Educação levantou dados junto aos executivos municipais para subsidiar o trabalho dos promotores em suas comarcas. Entre as informações reunidas estão quantas crianças estão fora da escola e quantas estão na lista de espera. “Também foram levantadas informações sobre os orçamentos municipais e sobre os programas federais — se o município aderiu ou não para obter verbas destinadas a essa causa. Com isso, elaboramos um primeiro dossiê e o repassamos aos promotores.”
O projeto prevê quatro eixos principais: levantamento da demanda reprimida e análise da realidade local; fomento de acordos com os municípios, com metas, prazos e indicadores claros; articulação com instituições parceiras para mobilização de recursos; e controle social.
Apesar de a frente estar sendo oficializada agora, muitas famílias já vêm travando uma batalha para garantir que suas crianças tenham acesso à educação, principalmente nos primeiros anos. Segundo o Ministério Público estadual, a falta de vagas tem provocado o ajuizamento constante de ações individuais e coletivas na Justiça.


“O diferencial desta ação é que, agora, queremos que as políticas públicas municipais sejam estruturadas. Não adianta o município oferecer vagas apenas para todas as crianças nascidas hoje, porque amanhã a realidade será outra. Os municípios precisam implementar políticas permanentes, planejadas e com previsão orçamentária. É um movimento contínuo, não pontual. Nosso objetivo é que as administrações se atentem a isso e elaborem políticas sérias”, enfatiza a promotora.
Mais fiscalização
A deputada estadual Ana Paula Siqueira (Rede) afirma que a articulação do Ministério Público será fundamental para compreender o panorama da oferta de escolas voltadas à primeira infância. Durante o lançamento do programa, ela explicou que, até o momento, não há informações precisas sobre o que está implementado em cada município, já que as creches são de responsabilidade integral das administrações municipais.
Para a parlamentar, os dados são importantes também para ampliar a capacidade de fiscalização das comissões da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). “É importante destacar, ainda, a questão da proteção das crianças, que infelizmente são vítimas de diversas violações — inclusive sexuais — muitas vezes dentro do próprio lar, que deveria ser o lugar mais seguro. A creche é uma oportunidade de acesso à educação, mas também de promoção da dignidade, da igualdade de gênero e da equidade entre as nossas crianças.”
A ação conta com o apoio do Tribunal de Contas do Estado (TCE-MG), da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime-MG) e do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG). Embora tenha como objetivo “caminhar junto aos municípios”, caso fique constatado que as administrações não demonstram interesse em atender às demandas educacionais da cidade, o MPMG poderá adotar medidas legalmente previstas, como o envio de recomendações, a celebração de termos de ajustamento de conduta e o ajuizamento de ações judiciais.