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Vale vai investir cerca de R$ 4,6 bilhões para conter “o pó preto” da poeira, diz gerente de Meio Ambiente. Em Itabira? Não, no porto de Tubarão, ES

No destaque, malha de wind fences, barreira com material apropriado para conter poeira no porto de Tubarão (ES)

Foto: Vitor Nogueira/Divulgação/Vale

Carlos Cruz

Até o final da implantação do Plano Diretor Ambiental, orçado em cerca de R$ 4,6 bilhões, e que vem sendo inplementado desde que foi assinado um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) após investigações da Polícia Federal, em 2018, por determinação da Justiça Federal, a mineradora Vale promete reduzir em até 93% o “pó preto” que despeja sobre as cidades no entorno do porto de Tubarão, na grande Vitória (ES).

Se o itabirano não andasse devagar, e não cruzasse os braços diante de todos os impactos decorrentes da mineração, investimentos robustos dessa ordem também poderiam ser alocados em Itabira, com medidas mais eficazes no combate à poeira – e que não fossem meros nebulizadores (neste fim se semana, apenas três foram vistos em funcionamento irrigando taludes nas minas) e caminhões-pipa.

No Espírito Santo, onde políticos cobram, o Ministério Público cumpre com mais veemência as suas obrigações – e a Polícia Federal investiga e aponta as ineficiências de medidas anteriormente adotadas –, a mineradora Vale está sendo obrigada a investir muito mais do que era o seu desejo nas medidas de controle.

Dentre as medidas, impostas pela lei e justiça que age, como também pela pressão de políticos e da sociedade (sim, esta também é omissa em Itabira, com raríssimas exceções) está uma extensa malha de wind fences, que vem a ser uma barreira com material apropriado, instalada nos pátios internos para diminuir a velocidade do vento e a emissão de poeira.

É dessa forma que a empresa busca conter a poeira no porto, além de intensificar a aplicação de polímeros (cal e cimento), mais canhões e nebulizadores que aspergem névoas para diminuir a emissão de particulados em sua origem, nos pátios de estocagem e no embarque do minério.

Caminhão fora-de-estrada levanta poeira em estrada na mina: sinal que o sistema de irrigação não funciona em Itabira (Foto: Carlos Cruz)

Investimentos

O investimento que a empresa terá de fazer neste ano no porto de Tubarão, por acordo judicial, é robusto. Trata-se de dar continuidade às medidas que veem sendo implantadas há cerca de quatro anos.

“Nós já assinamos em torno de R$ 1,4 bilhão em contratos, em obras que já finalizaram, mas o nosso investimento total é da ordem de R$ 4,6 bilhões até o final da implantação do Plano Diretor Ambiental”, informou ao jornal A Gazeta o gerente de Meio Ambiente da mineradora, Romildo Fracalossi, que já exerceu a mesma função em Itabira.

Segundo ele, a ampliação dessa rede de controle de poeira vai gerar cerca de 1,8 mil empregos diretos, “a maioria contratada no Espírito Santo”, acrescentou Fracalossi.

Caso de sucesso?

A serra do Esmeril era tão imponente e coberta por vegetação nativa como ainda é parte da serra do Curral, em BH. Foi descaracterizada com a supressão da floresta remanescente da Mata Atlântica para extração de itabiritos (Foto: acervo IBGE)

Para o próximo mês, quando a Vale celebra a sua fundação, em 2 de junho de 1942, segundo o prefeito Marco Antônio Lage (PSB), será anunciado um “pacote de investimentos” que é para transformar Itabira em um “case” de sucesso em reabilitação e reparação de danos causados pela mineração.

Em entrevista a este site, o prefeito adiantou alguns desses investimentos, mas não informou os valores que serão alocados para tornar Itabira um caso de sucesso internacional, digno de colocar a Vale no rol das empresas listadas no ESG (Environmental, Social and Governance).

Trata-se do novo modismo, depois das sucessivas ISO’s, inclusive a 14001 (ambiental), para as grandes multinacionais ficarem bem no mercado de ações, como se fossem cumpridoras da responsabilidade ambiental, social e governança. Mas pelo visto é só para “inglês ver”, ou seja, para os acionistas que só pensam no lucro fácil das especulações em bolsas de valores.

Diante dos investimentos que estão sendo feitos no Espírito Santo, para o pacote de bondade da mineradora em Itabira ser significativo, não pode ficar abaixo de R$ 5 bilhões só para atender às demandas imediatas – e nem de longe quitar a sua dívida histórica com o município que possibilitou a acumulação de capital que transformou a então Companhia Vale do Rio Doce na grande multinacional que é atualmente.

Poeira em grande escala

Poeira em Itabira é poluição que se repete todos os anos na estiagem sem que prefeito e vereadores cobrem providências (Foto: Reprodução)

Itabira sofre como nenhuma outra cidade do mundo com a poeira de minério e sílica que vem das minas da Vale – e que ocupam uma extensão de mais de 15 quilômetros entre Cauê e Conceição.

A situação se agravou principalmente depois de meados da década de 1980, quando a mineradora adquiriu as chamadas Minas do Meio, da Acesita.

Foi quando numa tratorada, utilizando enormes correntes de ferro, suprimiu toda a vegetação nativa (Mata Atlântica) que cobria a serra do Esmeril, deixando o solo descoberto para extrair o itabirito em seu subsolo.

Salvo a ação civil pública instaurada pelo então promotor José Adilson Marques Bevilácqua, em 1985, a pedido do jornal O Cometa, para apurar e definir as medidas de controle para conter a poeira e reabilitar paisagísticamente a serra do Esmeril, o que ainda está para acontecer, muito pouco se fez na cidade para cobrar ações práticas e eficazes para minimizar esses impactos ambientais que afetam a saúde e o bem-estar da população itabirana.

Exceção foi a reabertura da mesma ação civil, no final do governo de Ronaldo Magalhães:

Prefeitura reabre ações ambientais contra a Vale, instauradas em 1985 com base em reportagens do jornal O Cometa

Omissões e paralisia

Se o prefeito, o atual e os anteriores, assim como os vereadores e o Ministério Público cumprissem o dever de zelar pelo bem-estar e pela saúde da população itabirana, esses fortes impactos de meio ambiente (e de vizinhança) – que irão se repetir em Belo Horizonte, caso seja mantida a licença ambiental para minerar na Serra do Curral – já há muito tempo Itabira poderia dispor de ações mais eficientes para conter a poeira e os danos paisagísticos.

Mas nada fazem e a omissão é ainda patente. Trocam o pó de minério que entra pelas vias áreas respiratórias dos itabiranos e invade as suas residências por filigranas de recursos não tributários (ICMS a mineração não paga, por força da Lei Kandir) que a Vale repassa ao município como se fossem dádivas.

Se os políticos itabiranos (o prefeito atual, principalmente), assim como os vereadores e o Ministério Público, de fato e não de ficção, preocupassem com a saúde dos itabiranos, não estariam negociando migalhas com a empresa, mas medidas eficazes para, de imediato, diminuir a poeira e as doenças respiratórias, como é o caso das instalações de wind fences, que devem ser instaladas pelo menos nos locais que mais geram poeira e que estão sem vegetação.

Mas nada disso acontece na Cidadezinha Qualquer. É consequência uma letargia atávica que vem de mais de 80 anos, conforme já descreveu Drummond em Vila de Utopia.

“A cidade é paralítica. Mas, de sua paralisia provêm a sua força e a sua permanência. Os membros de ferro resistem à decomposição. Parece que um poder superior tocou esses membros, encantando-os. Tudo aqui é inerte, indestrutível e silencioso. A cidade parece encantada. E de fato o é. Acordará algum dia? Os itabiranos afirmam peremptoriamente que sim. Enquanto isso, cruzam os braços e deixam a vida passar. A vida passa devagar em Itabira do Mato Dentro.”

FONTE VILA DE UTOPIA

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