Municípios têm até março para tomar uma decisão e formalizarem entrada na proposta de indenização
Das 49 cidades elegíveis ao acordo de reparação da tragédia em Mariana, apenas 12 já aderiram à proposta. Assinado pela União e pelo governo dos estados de Minas Gerais e Espírito Santo com a mineradora Samarco em outubro, a repactuação levou nove anos para ser firmada, mas mesmo após o longo prazo de espera, a adesão entre os municípios é baixa, representando apenas 24,5% da quantidade total.
O acordo prevê o repasse de R$ 6,1 bilhões para as cidades afetadas pelo rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, na região Central do estado, em novembro de 2015.
Em Minas Gerais, os municípios de Ponte Nova, Iapu, Santana do Paraíso, Marliéria, Córrego Novo e Sobrália formalizaram sua entrada no acordo, enquanto no Espírito Santo, as cidades de Anchieta, Fundão, Serra, Linhares, Conceição da Barra e São Mateus também aderiram.
O prazo para adesão dos municípios ao acordo é de 120 dias contados a partir da homologação judicial do documento, que ocorreu em 6 de novembro. Assim, as cidades têm até meados de março para tomar uma decisão. Porém, para firmar o acordo brasileiro, os municípios devem abrir mão de outros processos. Conforme a Samarco, o pagamento só será efetuado após a formalização da desistência dessas ações junto às respectivas cortes, conforme os prazos estabelecidos pelo Termo de Adesão.
É o caso do processo em andamento em Londres, na Inglaterra. O julgamento é uma ação cível movida por cerca de 600 mil vítimas do rompimento da barragem, 46 cidades e, aproximadamente, 1.500 empresas, autarquias e instituições religiosas contra a BHP Billiton.
O escritório Pogust Goodhead, que representa os afetados, pede uma indenização de R$ 230 bilhões à Justiça inglesa, onde a mineradora anglo-australiana era listada quando a tragédia ocorreu. Deste total, os municípios solicitam R$ 52 bilhões.
Conforme o Pogust Goodhead, quatro cidades saíram do processo que corre no Reino Unido. Com isso, o escritório segue representando 42 prefeituras brasileiras. Não foi informado, entretanto, quais foram os municípios que deixaram o julgamento e quais se mantiveram.
Prefeito de Mariana à época do rompimento da barragem, em 2015, Duarte Júnior (Republicanos) reforça que, desde o início, a condução em relação ao acordo de indenização não considerou as demandas dos municípios afetados, o que os levou a entrar, por exemplo, com o processo em Londres.
Na avaliação de Duarte, a repactuação foi positiva para os governos estaduais e federal, porém, as cidades enfrentam um embate, considerando que ainda não há certezas quanto ao julgamento em andamento na Inglaterra e que os municípios teriam que arcar com os custos do processo.
“O acordo é muito bom para a União e para os Estados, mas quem fez a BHP vir para o Brasil discutir esse acordo foram os municípios que entraram com ação na Inglaterra. A BHP sabe que, lá, o valor pode ser muito mais caro, e aí veio para fazer o acordo aqui. Mas, infelizmente, hoje o prefeito ainda fica com esse problema gigante na mão, porque se assina um acordo aqui, vai ter depois que responder o escritório inglês que vai entrar pedindo a execução do pagamento do contrato”, diz. “No meu ponto de vista, hoje, o acordo é muito ruim para todos os municípios, e não somente para Mariana.”
Repactuação prevê R$ 170 bi em repasses
O acordo de repactuação de Mariana firmado no Brasil prevê o repasse de R$ 170 bilhões por parte da Vale e BHP, acionistas e controladoras da Samarco, que terão a obrigação de pagar o valor ao poder público em um prazo de vinte anos. Deste total, R$ 100 bilhões serão voltados para ações do poder público, com R$ 6,1 bilhões aos municípios por adesão.
Conforme a Samarco, para as cidades que formalizaram a adesão nos primeiros 30 dias após a homologação, já foi realizado um repasse em dezembro que somou R$ 26,8 milhões. A mineradora informa que os demais desembolsos serão feitos conforme os prazos estipulados.
“Os recursos são voltados à reparação e a iniciativas de fortalecimento ambiental e socioeconômico nas cidades atingidas pelo rompimento da barragem”, explica. “A Samarco segue em diálogo com os demais municípios para viabilizar novos repasses e assegurar uma reparação definitiva dos danos provocados pelo rompimento.”
Questionado sobre o porquê da baixa adesão, o Governo de Minas, por meio da Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão de Minas Gerais, reforçou que os municípios afetados poderão decidir autonomamente sobre a sua adesão ao acordo de repactuação.
O Executivo ainda lembra que o prazo para o município formalizar a adesão ainda está em vigor, com duração de 120 dias a partir da data de homologação.
Municípios cobram maior participação
Logo após a homologação do acordo, em novembro do ano passado, a Associação Mineira de Municípios (AMM) acionou o Supremo Tribunal Federal (STF) na tentativa de rever o documento. Entretanto, conforme o presidente da AMM, Marcos Vinicius Bizarro, tal ação ainda permanece parada na Justiça. Ele explica que a medida ocorreu porque os municípios teriam sido apenas “coadjuvantes” na elaboração de todo o acordo.
Além disso, na avaliação do presidente da AMM, o acordo teria sido uma “imposição” às cidades e aos estados, considerando que não haveria outra alternativa a não ser aderir à repactuação. Por outro lado, ele pontua que os municípios do processo em Londres participaram da construção da ação.
“Nós orientamos os municípios que, antes de assinar qualquer coisa, que entendam o que é o acordo em si, compreendam que esse recurso financeiro vai ser disponibilizado em 20 anos e (compreendam) as obrigações, porque tem parte no acordo onde o município passa a ser executor de obras que, teoricamente, eram responsabilidade das empresas, não dos municípios, porque depois, lá na frente, virão os órgãos fiscalizadores e quem vai ter que responder pelos atos é o prefeito”, afirma.
Marcos Vinícius complementa que a transição entre gestores das prefeituras entre 2024 e 2025 também deveria ser considerada pelos prefeitos antes de assinarem. “É uma decisão que impacta, principalmente no futuro, porque no momento em que você assinar, você se obriga a ser executor de obras”.
FONTE: O TEMPO