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Catas Altas (MG): conheça a cidade famosa pela fabricação dos vinhos de jabuticaba

Pequena cidade aos pés da Serra do Caraça foi fundada na época do descobrimento do ouro em Minas Gerais

Catas Altas é uma pequena cidade de pouco mais de 5 mil habitantes no interior de Minas Gerais, nos pés da Serra do Caraça. Sua formação remonta à época da busca por ouro na região, no final do século século XVII, por volta de 1694. Desde o começo, aquele território ganhou esse nome exatamente pela abundância de ouro, inclusive nos pontos mais altos dos morros que marcam toda a paisagem do lugar, que se emancipou de Santa Bárbara mais recentemente, em 1995. Por causa da busca pela riqueza que as terras anunciavam, sua habitação passou a crescer rapidamente. Não se sabe, ao certo, quem descobriu, de fato, a região onde se localiza a cidade. No entanto, atribui-se sua fundação a Domingos Borges, em 1703. E é esse pacato município que os leitores da Tribuna conhecerão nesta reportagem, que dá continuidade às histórias da Estrada Real, a partir da viagem proposta pela Secretária de Cultura e Turismo do Estado de Minas Gerais (Secult-MG) a jornalistas de todo o país.

Na concepção das cidades, naquela época principalmente, era preciso que houvesse uma igreja. A primeira de Catas Altas foi a de Santa Quitéria, no alto de um dos morros e que, atualmente, passa por uma reforma. Com fachadas que remontam ao barroco, em pouco tempo ela já não era capaz de abrigar a quantidade de pessoas que frequentavam as missas. Foi preciso, então, construir uma outra maior. Como conta Luan Lima Ribeiro, guia que acompanhou os jornalistas no passeio, a nova igreja foi construída a quatro quilômetros de onde era, na época, o vilarejo. Um dos motivos era que, como de costume, as igrejas precisavam ficar em pontos altos, como se os fiéis estivessem mais próximo de Deus. E ali era o lugar ideal: no alto e com vista aberta para a Serra do Caraça.

A Igreja de Nossa Senhora da Conceição começou a ser construída em 1729, onde hoje é o Centro de Catas Altas. Sua construção perdurou por anos, e ela só ficou pronta em 1780. Por fora, também com aspectos barrocos, parece tratar-se de uma igreja simples. Mas, ao abrir a porta, uma surpresa: ela é ainda mais rica do que se imagina. Cheia de adornos que ocupam o espaço do chão ao teto, chama atenção exatamente pelo exagero de tirar o fôlego, apesar de possuir pontos ainda inacabados. Além de ter sido o principal templo do lugar, a igreja funcionava, na época, como câmara. “Por isso que a estrutura é única: metade da nave é a tradicional igreja barroca que a gente conhece; só que a outra tem uma arquitetura que lembra os plebiscitos franceses”, pontua Luan sobre suas peculiaridades.

(Foto: Nereu Jr)

Do ouro à escassez

Durante um bom tempo, Catas Altas se manteve como um dos arraiás mais ricos e populosos de Minas Gerais. Isso fica claro tanto na construção da igreja (apesar da demora em sua construção ter sido, entre outros fatores, por falta de verba) quanto das casas que ficam ao redor da praça principal, também aos pés do templo e com um pano de fundo também deslumbrante: a Serra do Caraça. São casas simples, mas que, na época do ouro, tinham um outro sentido e uma forma de impor. Parte delas, inclusive, segue preservada e ocupada, como pela Prefeitura da cidade. E, não à toa, Cata Altas foi cenário para a gravação de “Se eu fechar os olhos agora”, minissérie da TV Globo.

Mas o ouro não durou tanto. As minas foram se esgotando, e o lugar foi ficando abandonado, com as pessoas indo rumo a outras possibilidades, inclusive na região. Nesse cenário, era comum, por exemplo, que alguns passassem fome. E em 1868 chega a Catas Altas o Monsenhor Manuel Mendes Pereira de Vasconcelos. Ele era pároco no Santuário do Caraça e foi transferido para o arraial. Lá, se deparou com a falta de insumos básicos. E, sem o ouro, aqueles que não tinham saído ainda do lugar, não tinham encontrado outras formas de subsistência. Ele decide, então, ensinar a plantar uva e, com ela, fazer vinho. A população foi aprendendo: tinha aqueles que plantavam e aqueles que faziam a bebida. O costume pegou. Em 1884, ele publicou um manuscrito com informações úteis para a fabricação. E foi isso que colocou Catas Altas no mapa da produção de vinhos, inclusive no mundo.

Vinho de jabuticaba de Catas Altas

O vinho foi fabricado durante um bom tempo. E em 1889 um novo costume surgiu em Catas Altas: o vinho de jabuticaba. Diferente do licor, é produzido como um vinho de uva mesmo, mas como a jabuticaba já era abundante na região, passou-se a usar essa fruta para produzir as bebidas. Matérias da época dão conta de seu sabor peculiar. A tradição, no entanto, foi perdida no século XX e, em 1949, de acordo com a Associação de Produtores Artesanais de Catas Altas (Aprovart), Anastácio de Souza resgatou o costume, a partir da fermentação da jabuticaba. Mais uma vez, a população recuperou o modo de fazer e passou a produzir o vinho de jabuticaba: ensinamento que foi sendo passado dos avós para os pais e os filhos. Ainda hoje, também existe a produção dos vinhos feitos de uva na cidade, ainda que de forma mais tímida.

A Aprovart, por sua vez, surge em 2001 em Catas Altas com o intuito de capacitar os produtores da cidade no aprimoramento de seus produtos, dentre eles o vinho de jabuticaba, e firmar a tradição na cidade. Desde sua fundação, realiza a Festa do Vinho, que é uma oportunidade de moradores e turistas conhecerem o que é produzido por ali. Em 2007, então, eles passaram a realizar o concurso que elege os três melhores vinhos de jabuticaba da cidade. Isso movimentou ainda mais a produção e a região que, em maio, recebe pessoas de todo o Brasil, no evento que conta com diversas atrações.

Conheça o vinho Aluar

Catas Altas
Jesuína aprendeu, aos 12 anos, a fazer vinho de jabuticaba com sua mãe; hoje, ela vive de sua produção (Foto: Nereu Jr)

Fazer o vinho de jabuticaba é mesmo tradição das famílias. É isso que conta Jesuína Pereira de Souza que, com seu vinho Aluar, ficou em primeiro lugar da competição deste ano. Ela começou a produzir com 12 anos, vendo sua mãe fazendo em casa, para consumo próprio. Ela seguiu esse costume e, como a mãe, fazia para presentear a família, principalmente no Natal. Uma prima percebeu que seu vinho de jabuticaba era diferente. Sugeriu que ela entrasse na Aprovart para aprimorar o que já sabia. Mesmo com receio, entrou. Dessa forma, poderia colocar seu “vinho na praça”.

Para conhecer a produção de Jesuína, basta entrar em contato em seu Instagram. A Aprovart tem, bem no Centro de Catas Altas, uma loja que comercializa os vinhos e outros produtos feitos na cidade. As informações estão no Instagram da Aprovart.

FONTE TRIBUNA DE MINAS

Jesuína foi entendendo que muito do que sua mãe fazia era intuitivo. Mesmo criança, confessa que tomava o vinho de jabuticaba e sentia uma queimação. Isso porque sua mãe colhia a fruta em outubro, e em dezembro a família já o bebia no Natal. Era a falta da fermentação no tempo correto, depois ela descobriu. São necessários 180 dias para que o vinho esteja, de fato, pronto. E é o que ela faz atualmente. “Tudo no tempo do vinho.”

Ela começa a produção colhendo as frutas junto com suas sobrinhas nos pés que tem em casa e em um sítio em Catas Altas. “Eu subo no pé mesmo. Se eu não subir, não fui eu que fiz o vinho. Tenho que participar de todas as etapas”, brinca. Depois, junto com seu marido, seleciona os melhores frutos, lava, amassa e começa todo o processo que sabe de cor. Esse processo, inclusive, ela prefere fazer sozinha, para que nada saia de seu controle.

Jesuína começou a fazer isso ainda dentro de uma pequena adega no porão de sua casa. Na primeira Festa do Vinho que participou, em 2010, fez 150 garrafas. Vendeu todas já no segundo dia do evento. Neste, ela já ficou em segundo lugar na competição, o que a surpreendeu e incentivou a continuar a produção. Ela ficou no pódio em praticamente todas as festas que participou. E, enquanto isso, via aumentar tanto sua produção quanto seu espaço, ainda dentro de casa. Mas ainda queria ganhar o primeiro lugar, vitória essa que chegou nesse ano. “Agora, eu estou feliz e realizada porque cheguei no primeiro lugar.” Neste ano, ela produziu cerca de 1.200 vinhos e já aguarda outubro para começar tudo de novo, como gosta.

Sua produção segue e ela recebe os turistas em sua casa, onde continua fazendo o vinho de jabuticaba, o licor, as compotas e as geleias. Além de receber, de um típico jeito mineiro, com queijos e contação de histórias, gosta de falar sobre os processos e incentivar que outras pessoas encontrem aquilo que, de fato, gostem de fazer. “Eu acho que todo mundo tem um talento, basta buscar dentro de si que você é capaz de fazer suas delícias. O meu talento eu custei a descobrir. Eu fazia muitas coisas: bordava, costurava, fazia crochê, um tanto de coisa, mas nunca tinha me encontrado. Quando comecei a fazer o vinho, eu vi que era isso.”

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