Proposta, que vai ao plenário, cria cota de cadeiras para mulheres no Legislativo e ‘quarentena’ para que juízes e militares disputem eleições. Impressão de comprovantes de votação foi incluída pela oposição.
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou nesta quarta-feira (20) o projeto que atualiza e reúne uma série de legislações eleitorais.
Chamado de novo Código Eleitoral, a proposta consolida, renova e unifica, em uma única lei, diversas outras normas eleitorais. É, portanto, um apanhado de legislações.
O texto estabelece, entre outros pontos, uma regra de afastamento para que militares e juízes possam disputar eleições . Também cria uma cota que destina 20% das cadeiras do Legislativo para mulheres.
O projeto prevê proibições para o uso de inteligência artificial nas campanhas eleitorais. Buscando apoio da oposição, o relator do projeto, senador Marcelo Castro (MDB-PI), recuou de trechos que endureciam penas para mentiras no processo eleitoral, mas manteve as punições existentes.
A oposição conseguiu, por 14 votos a 12, incluir um trecho que obriga a implantação do voto impresso nas eleições — a medida havia sido rejeitada anteriormente por Castro.
Pela proposta, a impressão de comprovante de votação terá de ser implantada na eleição seguinte à eventual sanção do novo código.
A proposta estabelece, ainda, mudanças no prazo de inelegibilidade de políticos condenados por alguns tipos de crimes. Entidades de transparência eleitoral afirmam que essa medida pode enfraquecer a Lei da Ficha Limpa.
Com a conclusão da análise pela CCJ, o texto vai à votação no plenário principal do Senado. Nesta quarta, os membros do colegiado aprovaram um requerimento que pede urgência à proposta.
Uma versão anterior do texto já foi aprovada pela Câmara em 2021. Se a proposta de Marcelo Castro for aprovada pelos senadores do jeito que está, os deputados terão de analisá-la novamente.
Para que as regras entrem em vigor nas eleições de 2026, o Senado e a Câmara precisam concluir a análise do projeto antes de outubro deste ano.
Entenda abaixo, nesta reportagem, alguns dos principais pontos da proposta aprovada pela CCJ (clique para seguir ao conteúdo):
Quarentena e desincompatibilização
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O texto cria uma quarentena de um ano para que militares, juízes, policiais e membros do Ministério Público disputem as eleições.
Isso significa que, se quiserem disputar eleições, esses profissionais terão de se afastar do cargo um ano antes da disputa eleitoral.
Pelo texto, quem não cumprir a regra será considerado inelegível. A medida vale para:
- membros do MP;
- guardas municipais;
- policiais federais, rodoviários federais e ferroviários federais;
- policiais penais e civis;
- policiais militares;
- emilitares das Forças Armadas.
Originalmente, o relator havia proposto uma quarentena de quatro anos. Em julho, após pressão de parlamentares, ele recuou e reduziu o prazo pela metade. Na última semana, em mais uma tentativa de construir consenso, ele voltou a reduzir o período para um ano.
Além disso, o projeto aprovado pela CCJ também unifica os prazos de desincompatibilização de cargos para disputar eleições. De forma geral, o limite para que um agente público deixe o cargo será fixado em 2 de abril do ano do pleito. Haverá exceções.
Hoje, os prazos são diferentes para cada função e variam entre três meses a seis meses da eleição.
Cota para mulheres
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A proposta cria uma cota de 20% de assentos para mulheres na Câmara dos Deputados, nas Assembleias Legislativas e nas Câmaras Municipais.
O texto prevê um mecanismo que determina que, se o índice não for alcançado, candidatos masculinos serão trocados por mulheres.
- As primeiras trocas serão feitas na distribuição das sobras eleitorais.
- Caso a baixa de mulheres persista, as trocas atingirão as vagas distribuídas pelo formato tradicional de distribuição de cadeiras no Legislativo — o do quociente partidário.
Há também uma regra que estabelece que, se nada disso for suficiente, uma nova eleição será convocada.
O parecer de Marcelo Castro mantém as atuais cotas de recursos públicos e de candidaturas para mulheres — hoje, em 30%. Em votação separada, a CCJ decidiu incluir um trecho que mantém a atual cota de, no mínimo, 30% de candidaturas femininas.
A proposta aprovada flexibiliza, porém, o uso desse dinheiro nas campanhas. Segundo o texto, os partidos poderão destinar recursos da cota de gênero para pagar despesas comuns com outras candidaturas.
A possibilidade será permitida quando a legenda considerar que haverá “benefício para campanhas de mulheres e de pessoas negras, conforme o caso, a seu próprio juízo”.
Fake news
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O projeto pune a divulgação de fatos “sabidamente inverídicos” para atrapalhar o processo eleitoral. Segundo o texto, esses conteúdos serão considerados propagandas irregulares.
A proposta considera delito eleitoral a divulgação desse material durante a campanha eleitoral e nos três meses anteriores ao pleito.
De acordo com o projeto, quem divulgar conteúdos com informações falsas antes das eleições poderá ser punido com multa entre R$ 30 mil e R$ 120 mil. A punição também seria aplicada à desinformação contra o sistema eleitoral.
Durante a campanha, informações falsas contra candidatos ou contra o sistema eleitoral poderão levar à pena de reclusão de um a quatro anos, além do pagamento de multa.
Hoje, a divulgação de mentiras pode ser punida com detenção de dois meses a um ano, e multa. O relator tentou elevar a punição, mas, tentando acordo com a oposição, decidiu manter o texto atual.
Pela proposta, a pena de reclusão poderá ser aumentada, de 1/3 até a metade, em algumas hipóteses:
- se o crime for cometido em meios de comunicação ou redes sociais;
- e se for cometido contra mulher, cor, raça ou etnia.
Tentando conquistar apoio da oposição, Marcelo Castro recuou também na inclusão de mecanismos para punir quem divulga notícias falsas para atingir o sistema eleitoral.
Na versão original do parecer, ele havia proposto que a prática seria considerada uma hipótese para aumento de pena. O texto votado nesta quarta, no entanto, não prevê qualquer medida nesse sentido.
Apesar disso, o projeto estabelece que, se uma plataforma digital não cumprir ordem judicial para retirar conteúdos das redes, a empresa poderá ter de arcar com a multa aplicada ao candidato punido.
Inteligência artificial

O parecer aprovado pela CCJ determina que o uso nas campanhas eleitorais de conteúdos produzidos por inteligência artificial ou manipulados deverá ser identificado.
Segundo o texto, todas as peças que forem submetidas as tecnologias de manipulação deverão trazer — “de forma explícita, destacada e facilmente perceptível” — um alerta de que aquele conteúdo é sintético.
A proposta proíbe o uso de IA para gerar conteúdo sintético ou simular vozes e imagens de pessoas vivas ou falecidas nos seguintes casos:
- para favorecer qualquer candidaturas;
- para prejudicar candidaturas adversárias;
- para criar simulações de narrativas políticas;
- para apresentar feitos da candidatura;
- para atuar como apresentador de propaganda política.
Ficha Limpa
A proposta traz mudanças no prazo de inelegibilidade de políticos condenados pela Justiça.
Entidades de transparência eleitoral afirmam que essa medida representa um retrocesso na Lei da Ficha Limpa.
Hoje, o político fica impedido de disputar eleições desde a condenação, pelo tempo da pena e por mais oito anos. O texto aprovado pela CCJ reduz esse tempo para alguns tipos de crimes.
Pela proposta, o político ficaria impedido de disputar eleições pelos oito seguintes à condenação por um órgão colegiado do Judiciário pelos seguintes crimes:
- contra a economia popular, a fé pública e o patrimônio público;
- contra o patrimônio privado, o sistema financeiro, o mercado de capitais e os previstos na lei que regula a falência;
- contra o meio ambiente e a saúde pública;
- eleitorais, para os quais a lei comine pena privativa de liberdade;
- e de abuso de autoridade, nos casos em que houver condenação à perda do cargo ou à inabilitação para o exercício de função pública.
Na prática, a mudança permite que candidatos em cumprimento de pena possam concorrer a cargos eletivos.
A regra atual será mantida, no entanto, para crimes como lavagem de dinheiro. E também:
- contra a administração pública;
- de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores;
- de tráfico de entorpecentes e drogas afins, de racismo, de tortura, de terrorismo e hediondos;
- de redução à condição análoga à de escravo;
- contra a vida e a dignidade sexual;
- e praticados por organização ou associação criminosa.
➡️Outras mudanças
- parlamentares cassados pelos pares:
Parlamentares (deputados, senadores e vereadores) que forem cassados pelos pares terão a inelegibilidade contada a partir da decisão que decretar a perda do mandato. Ou seja, ele não poderá disputar eleições nos oito anos seguintes à sua cassação.
Hoje, os parlamentares que são cassados ficam inelegíveis pelo resto do mandato e por mais oito anos. O texto aprovado na CCJ diminui, na prática, o tempo de inelegibilidade.
- governadores cassados por assembleias:
Governadores e prefeitos que tiverem o mandato cassado pelas assembleias estaduais ou câmaras municipais também não poderão disputar eleições nos oito anos seguintes à sua cassação.
Pela proposta aprovada na CCJ, a contagem será a mesma aplicada aos parlamentares — a partir da decisão que decretar a perda do mandato.
Atualmente, a inelegibilidade vale pelo resto do mandato e por mais oito anos. O texto aprovado na CCJ diminui, na prática, o tempo de inelegibilidade. A mudança valerá também para vice-governadores e vice-prefeitos.
- políticos condenados por abuso de poder político e econômico:
O projeto também estabelece que condenados por crimes eleitorais terão mudança na contagem do período no qual não poderão concorrer a postos políticos.
O texto prevê que o candidato ficará impedido de disputar eleições por oito anos, com a contagem iniciada no dia 1º de janeiro seguinte ao pleito no qual ele cometeu o delito.
Hoje, essa contagem é feita a partir do dia da eleição na qual o crime ocorreu.
Voto impresso
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A oposição conseguiu aprovar, em votação separada, a inclusão de um trecho que obriga a implementação do voto impresso nas eleições brasileiras.
Segundo o texto, a medida terá de ser implantada na primeira eleição seguinte à sanção do novo Código Eleitoral.
A proposta, aprovada por 14 votos a 12, prevê que, após a confirmação dos votos de cada eleitor, a urna deverá imprimir o registro de cada voto. Na sequência, o comprovante será depositado, sem contato manual do eleitor e de forma automática, em uma urna lacrada para fins de verificação.
A inclusão do voto impresso contrariou a orientação do relator, Marcelo Castro, ele havia rejeitado a medida sob argumento de que a “segurança da nossa urna eletrônica, que tem sido utilizada desde 1996, é hoje, sobejamente reconhecida”.
Moderação de conteúdo na internet
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A proposta não traz qualquer impedimento para a moderação de conteúdo, pelas plataformas digitais, durante a campanha eleitoral. Para o relator, essa medida “não configura controle editorial”.
A moderação de conteúdo é utilizada para derrubar, sem qualquer decisão judicial, postagens que infringem leis ou os termos de uso das redes.
Segundo o texto, no entanto, as plataformas terão de divulgar — até 1º de junho do ano eleitoral — as políticas e regras de moderação.
A proposta estabelece que a moderação ou limitação do alcance de conteúdos “não deve ser implementada visando a desequilibrar a igualdade de condições entre candidatos”.
A remoção de conteúdos pelas redes poderá ser questionada judicialmente.
Disparos de mensagens

O parecer de Marcelo Castro proíbe disparos de mensagens em massa. O uso dessas ferramentas poderá levar a punições.
Segundo o texto, não serão considerados disparos em massa o envio de mensagens a pessoas que solicitaram anteriormente ou aquelas feitas em conversas privadas.
Pesquisas eleitorais
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O projeto cria uma espécie de “índice de confiança” para pesquisas eleitorais. O indicador vai comparar índices registrados em levantamentos do instituto de pesquisa e o percentual efetivamente obtido por um candidato eleito ao Executivo nas últimas eleições.
Segundo o texto, todos os levantamentos terão de ser divulgados com esse indicador.
A proposta também permite a realização de pesquisas no dia anterior às eleições e a divulgação de levantamentos no dia das eleições.
Nova multa para eleitores
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O projeto eleva para R$ 5 a multa para quem não se justificar e deixar de votar. Atualmente, o eleitor que se ausenta deve pagar R$ 3,51 por turno.
O não pagamento e consecutivas ausências injustificadas nas eleições podem levar ao cancelamento do título de eleitor.
TSE
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O projeto derruba e modifica uma série de trechos aprovados pelos deputados que poderiam impactar nas funções do Tribunal Superior Eleitoral.
O texto mantém as chamadas consultas — mecanismo utilizado para que o TSE se manifeste e estabeleça acerca de determinado tema —, mas determina limites para anos eleitorais.
Segundo o projeto, para que os entendimentos sejam aplicados nos pleitos, as consultas terão de ser respondidas até 5 de março.
A proposta de Marcelo Castro derrubou um mecanismo introduzido pela Câmara que permitia ao Congresso derrubar resoluções e outras normas do TSE, quando parlamentares acharem que os textos extrapolaram os limites do tribunal.
Segundo o senador, a medida seria “flagrante inconstitucionalidade”.
Castro também derrubou um trecho que determinava que qualquer mudança e introdução de novas tecnologias de votação teriam de ser aprovadas pelo Congresso.
Transporte gratuito
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O parecer de Marcelo Castro propõe colocar em lei que deverá haver transporte gratuito em dias de eleição. O texto consolida decisão tomada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Gastos eleitorais e partidários
A proposta permite que partidos gastem recursos de campanha para pagar babás, creches e escolas de filhos, com até seis anos, de candidatas ao longo do período eleitoral.
O projeto também prevê que será possível usar recursos públicos para contratar seguranças pessoais a candidatos ameaçados.
O texto proíbe o uso de moedas virtuais para o recebimento de doações ou para pagar gastos de campanhas. Também impede o uso de cartões pré-pagos.
O relator do projeto, senador Marcelo Castro, retirou da proposta um trecho, aprovado por deputados, que autorizava empresas a doar dinheiro para custear as despesas mensais de manutenção de partidos políticos.
Prisão nas eleições
A proposta aprovada reduz o período que impede a prisão de eleitores antes e depois das eleições. Hoje, as prisões são proibidas cinco dias antes e nas 48 horas seguintes ao pleito.
Pelo texto aprovado pela CCJ, essa proibição passará a existir três dias antes e 24 horas depois do pleito.
Por outro lado, o projeto ampliou as hipóteses autorizadas para prisão. Atualmente, podem ser presos eleitores que cometem crimes em flagrante, que tenham sentença criminal condenatória por crime inafiançável, ou por desrespeito a salvo-conduto.
A proposta inclui nessa lista:
- eleitores com mandado de prisão em aberto referente a crimes dolosos contra a vida;
- e eleitores integrantes de organizações criminosas que tentem interferir no pleito eleitoral.
Entre outras mudanças, a proposta também amplia a multa para quem joga santinhos em locais de votação ou vias próximas.
Prestação de contas
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A proposta cria um mecanismo que encaminha a aprovação de contas de campanhas e partidos caso haja demora na análise pela Justiça Eleitoral.
O texto prevê que, se não houver manifestação do órgão técnico da Justiça Eleitoral em 360 dias, as contas receberão parecer técnico favorável. Ainda assim, será necessário que o plenário das Cortes Eleitorais aprovem.
O prazo é menor do que o que havia sido sugerido pela Câmara em 2021 — os deputados queriam que o limite fosse de 180 dias e que as contas fossem consideradas aprovadas diretamente.
Além disso, o parecer determina que os pareceres técnicos tratem somente de questões “estritamente formais, sendo vedado tecer considerações” sobre condutas de políticos.
A proposta mantém entendimento da Justiça Eleitoral de aprovação a contas que tenham percentual de irregularidades não superior a 10% do fundo partidário, desde que “não tenha havido má-fé”.
O relator excluiu obrigação de serem informados os passageiros de voos fretados para campanhas. Continua, no entanto, a obrigação de apresentar, entre outras coisas, notas fiscais.
FONTE: G1